Nota da Autora:
Olá, pessoal! Não, eu não morri! Bem, eu ando bastante ocupada — a semana de provas da minha escola está se aproximando, bem como a estreia da nova temporada do meu Blog (dps eu passo o link para quem estiver interessado)...
A todos que leem e comentam muito obrigada pelo apoio! É isso o que mantém minha história viva!
Sem mais delongas, ao capítulo de hoje...
----
Capítulo 20 – Atos de Guerra (Parte 1) — Sangue
Quando Ireas achava que o curso dos eventos melhoraria...
Wind retirou-se para outro quarto, deixando-me sozinho naquele recinto. Meu coração palpitava como jamais o fizera antes. Eu sorria e apalpava meus lábios buscando compreender — por acaso ele realmente me beijara? Foi só imaginação minha ou era algo real?
Meu rosto se abria em um involuntário sorriso, pois jamais me sentira assim. Deitei-me no catre novamente, e pus minhas mãos atrás de minha cabeça, tentando dormir. Estava completamente irrequieto, sem saber como reagir. Por fim, consegui relaxar e fechei meus olhos...
***
(Narrado por Liive Do Inferno/ Liive of Hell)
Ah, como não suporto o Andarilho! Não sei por que raios ando com ele... Só o aturo porque Brand e Rei Jack o têm como alguém de confiança... Um Yalahari metido, sempre dado aos vícios, que se entrega facilmente aos prazeres da vida...
Pobre Ireas... Ele não sabe com quem está lidando... Ter a amizade desse homem pode ser a pior coisa que lhe venha a acontecer...
Vamos parar com meus devaneios, e voltemos ao que interessa. Estava eu em Svargrond completamente à toa, bebendo a segunda — ou seria quinta? — dose de hidromel da noite. Não quis permanecer na casa de Mandarinn; apesar de ter ficado mais tranquilo por ver Keras bem, não conseguia suportar a presença de Andarilho que, desde que conheci o jovem druida, sempre me censurou quanto ao meu comportamento frente a ele.
Voltei meus olhares para a saída da taverna de Dankwart. Havia um bom batalhão de meus conterrâneos saindo da cidade para atender ao chamado de Thais e Edron — Mandarinn avisara ao Rei da chegada de Morgaroth. Vi muitos guerreiros brilhantes saindo da cidade, deixando para trás esposas e filhos. O mais triste era a despedida das bárbaras de suas famílias; muitas tinham crianças de colo, as quais eram deixadas com seus maridos — se fossem eles xamãs ou comerciantes locais. Do contrário, eram deixadas sob a tutela dos guardas das casas comunais.
Eu havia perdido minha família para uma manada de mamutes enfurecidos e fui criado nessas mesmas casas comunais. Doía-me ver mães abrindo mão de cumprir o dever de administrar a família para servir sua pátria, mas o dever chamava, e escolhas tinham que ser feitas.
Eu também havia sido convocado para ir à caça ao temido demônio do Triângulo do Terror em uma facção especial do batalhão, mas eu não estava tão certo sobre minha ida. Ainda que fosse forte, não estava tão bem treinado como a maioria de meus conterrâneos. Verdade seja dita, nunca gostei de dedicar-me a um intenso treinamento do manejo de meu escudo e machado. É muita perda de tempo produtivo, diga-se de passagem.
Então, eis que ouço um grito vindo de fora da taverna. Só havia civis na cidade e os guardas — Eirik, Fynn e Sirik. Decidi sair para ver o que era...
A cidade estava em chamas; mulheres e crianças corriam por suas vidas; aqueles que eram nativos de Carlin correram para os barcos, deixando os bárbaros para trás. Não havia sinal dos guardas em parte alguma. Vi muito sangue nas ruas, e as casas já se esfacelavam ao sabor daquela dança pirotécnica. Com os olhos arregalados, andei vagarosamente pelo assentamento quase deserto.
O sangue era oriundo dos xamãs mortos; xamãs que tentaram impedir a ressurreição de Morgaroth ao usarem os poderes que tinham sobre o vento para congelarem os Cultistas. Seus corpos haviam sido brutalmente mutilados — em muitos não se viam mais os braços ou as pernas, bem como havia cortes profundos e de uma extrema violência nos torsos de todos — e estavam expostos para apreciação pública, crucificados. O que havia sobrado de seus cadáveres sangrentos estava amarrado firmemente às estacas. Certamente foram mortos além das montanhas de Hrodmir e teleportados para a cidade.
Aproximei-me com um fascínio macabro; dentre aqueles xamãs, um me chamou a atenção — Os cabelos cinza-azulados, semelhantes aos de Keras, arranjados em enormes dreadlocks; a máscara que outrora cobrira seu rosto não se encontrava mais lá, e revelava uma face ligeiramente parecida com a de Keras — ainda que mais masculina. Eu sabia quem era aquele homem...
— Hjaern... — Sussurrei completamente pasmo e horrorizado — Essa não...
Eu me aproximei do corpo mutilado do xamã. Sua perna esquerda e seu braço direito haviam sido arrancados da base do osso, o que dava a ele uma imagem muito assustadora até para os padrões de um bárbaro. Havia um papel dobrado pendendo de sua cinta, e aproximei-me mais para pegá-lo.
Apesar do tremor que tomara conta de minhas mãos, tentei usar o mínimo de força possível para abrir o envelope. Era a letra de Ireas! Decerto ele tentara contatar Hjaern... Pena que ele jamais receberá uma resposta...
“Hjaern, Svargrond — Nibelor.
Caro irmão,
Eu consegui! Obtive mais informações acerca de nossa misteriosa mãe! Como vê, ela ainda está viva e à minha procura! Bem, a verdade é que ainda estou de mãos atadas, pois continuo sem saber como, e o quê, ela é... Mas prometo que descobrirei tudo!
Tenho esperanças de que tudo se resolverá logo, sabe? Ainda que sejamos adultos, tenho fé que poderemos viver como uma família... Ainda que seja uma família bem peculiar. Torço para que nossa mãe seja apenas uma druidisa que se perdeu, pois sei que, quando chegar a hora, eu e você juntaremos forças para salvá-la.
Com alegria na alma,
Ireas Keras
P.S.: Como está Silfind? Você me havia dito que algo bom estava para acontecer a vocês... Mande-me notícias o mais breve possível!
Eu pus minha mão esquerda sobre minha boca. Havia algo escrito no rodapé da carta; a letra não era nem a de Ireas muito menos a de Hjaern.
A verdade jamais virá à tona
Seria a letra da mãe de Ireas? Todas as evidências indicavam isso... E tive mais certeza quando senti um frio do além, vindo detrás de mim. Minha sombra se projetou além de minha altura de uma forma nada plausível considerando a falta de iluminação na cidade.
Eu virei meu pescoço vagarosamente para dar de cara com uma figura encapuzada e mais ou menos de minha altura — meço por volta de 1,87 m. Tudo o que podia ver através do negro véu eram seus olhos em um demoníaco tom rosa-choque com um brilho avermelhado, e somente suas femininas mãos pálidas eram visíveis das mangas do maligno traje.
— Você é um dos amigos de Ireas... De meu filho... — Disse-me a criatura com uma voz doce como o som de uma flauta, porém traiçoeira como uma naja — Você me será bem útil...
Eu não sei o que ocorreu após aquele macabro encontro. Do que consigo me lembrar, uma nuvem negra de brilho arroxeado me envolveu e senti minha alma sendo retirada brutalmente de meu corpo. Não sei se ainda estou vivo ou se morri, mas sei de uma coisa:
Ireas corre um grande perigo.
***
(Narrado por Ireas Keras)
Acordei com um humor incrível. Nunca havia imaginado que dormir em uma rede seria tão confortável. Ainda sonolento e esfregando minha mão esquerda em meus olhos, procurei pelos meus pertences e os encontrei ao lado de uma bancada com alguns rolos de ataduras.
Cuidadosamente retirei as faixas antigas, revelando as cicatrizes de meu encontro com os Cultistas: havia muitos vergões em minhas costas; meus braços tinham cicatrizes longas e doloridas das cordas e chicotes que foram usados para me agredir. Cada desenrolar de atadura doía de tal maneira que os eventos daquele dia voltavam à tona de uma forma brutal e cruel.
Eu balançava a cabeça a fim de afastar de minha mente tais imagens.
— Exura Gran — Pronunciei a fórmula de cura intensa, que fez os pontos feridos de minha pele brilhar e desaparecerem por completo — Enfim, livre dessa fantasia horrorosa de múmia...
Vesti meu robe e pus minha mochila dourada nas costas pronto para sair da casa de Mandarinn. Foi naquele momento que me lembrei de Wind. A porta de seu quarto estava aberta e entrei no recinto.
O cavaleiro dormia tranquilo na rede que se encontrava próxima à janela. Suas mãos estavam atrás de sua cabeça — postura típica dele. Aproximei-me pé ante pé do ruivo e inclinei-me até sua face, dando-lhe um beijo de despedida um tanto atrapalhado.
Girei em meus calcanhares e dirigi-me à saída da casa. Verdade seja dita, gostaria que meu desajeito tivesse atuado naquele momento; provavelmente eu o teria derrubado da rede, acordando-o de um modo inesperado. Certamente, ele me seguiria para onde eu estivesse me dirigindo...
Isso era o que uma parte de mim queria. A outra... Era a minha resposta-padrão ante qualquer situação de minha vida: deveria seguir sozinho. A verdade é que eu temia por Wind e os demais no que dizia respeito à minha mãe. Eu queria que ela fosse alguém bom que estivesse apenas perdido e confuso, mas não sabia se ela era isso. As cartas dela não me diziam absolutamente nada... E eu não queria que ninguém mais se arriscasse por mim.
Eu fechei a porta da casa de Mandarinn lentamente e fui abordado por Brand.
— Aonde vai? — Indagou o paladino de cabelos prateados.
— Eu não sei... — Respondi com um largo suspiro — Não sei onde procurar... — Encostei-me na parede da casa e deixei-me deslizar até o chão, sentando-me na relva esmeralda — Digo, ela sabe onde estou, mas eu não tenho a menor ideia de onde ela pode estar...
— Você não está querendo desistir, está? — Indagou-me Brand em um tom de raiva — Se for isso, garanto que você não sairá dessa cidade vivo! — Ele continuou o discurso com uma voz ainda mais firme ao ver que eu arregalara meus olhos — Eu, Wind e os demais não te salvamos para você desistir de sua missão! — Ele soltou um largo suspiro, fez uma pausa e voltou ao seu calmo tom de voz — Nós queremos te ajudar, Keras, mas você não nos deixa! E eu não consigo entender o porquê...
Eu me levante, mas mantive minhas costas apoiadas nas tábuas de madeira. Olhei para Brand com melancolia.
— Não posso dizer... Não ainda — Falei afastando-me da casa — Prometo que falarei mais quando eu tiver mais respostas...
— Então terá que suspender suas buscas por um tempo. Morgaroth está de pé — Declarou o paladino em um tom solene — E alguns dizem que Ghazbaran voltará à vida em breve, pois os xamãs de Svargrond que guardavam seu túmulo gelado foram mortos por Cultistas...
Eu parei de caminhar a exatos cinco passos de distância de Brand e voltei meu rosto horrorizado para Brand.
— Todos... Mortos?! — Declarei com o horror estampado em minhas faces — Você tem certeza?
— Absoluta. — Disse-me Brand com pesar — Todos tiveram seus corpos brutalmente mutilados de algum modo, e o que restou de seus cadáveres ainda tintos de sangue fresco foi crucificado e exposto no centro de Svargrond.
Não podia acreditar. Aquilo não estava acontecendo! Se todos os xamãs foram mortos só podia significar uma coisa...
— Hjaern... — Sussurrei para mim mesmo de tal sorte que Brand não fora capaz de meu ouvir. Uma lágrima escorreu pelo meu rosto; respirei fundo e roguei — Leve-me até Svargrond!
Brand assentiu e emprestou-me a quantia necessária para a viagem. Juntos, zarpamos para a minha terra. Na medida em que Porto Esperança ficava para trás, eu sentia meu coração se apertar. Como queria que Wind tivesse acordado! Por que eu tinha que ser tão teimoso?
— Não se preocupe — Disse-me Brand com um sorriso de compadecimento — Ele vai achar um modo de te seguir. Ele sempre te acha, não é? — Ele voltou seus olhos para o mar — E não vai ser diferente dessa vez... E eu espero que fiquemos bem...
Voltei meus olhares para ele que, por sua vez, fitou-me com espanto.
— O quê? Ele não te contou? Eu, Rei Jack e Wind fomos convocados para compor a Brigada Real de Thais para combatermos Morgaroth frente a frente. O seu pedido me fez adiantar meus horários em relação aos demais membros desse pelotão especial.
Vimos a ilha da Baía da Liberdade aparecer à nossa frente. Nos portos monitorados pelos oficiais de Thais, havia alguns guerreiros trajados de forma distinta. Alguns empunhavam armas de combate corpo-a-corpo; outros, arcos e bestas de várias sortes. Mais distantes e em menor número havia aqueles que empunhavam armas mágicas — como o meu cajado. Era uma divisão da Brigada Real.
— Terei que descer aqui. — Disse-me Brand com tristeza — Logo chegarão Rei Jack e Wind... Espero que você tenha se despedido dele, por via das dúvidas.
Eu não consegui esboçar nenhuma reação senão espanto e igual tristeza.
Acenei para o paladino dos olhos rubros, que me deu um sorriso e uma saudação. Segui minha viagem a Svargrond com um pesar enorme. Brand tinha que estar errado.
Hjaern tinha que estar vivo.
Continua...