Capítulo 11 - O homem de preto
Janor Benson - Venore
– Calma aí, assassino – exclamou Bert.
Jan estava vagamente consciente da voz do companheiro dos Corredores Verdes se aproximando enquanto desferia uma sequência de socos no rosto de um ladrão. A face que estava sendo brutalizada por ele pertencia a um rapaz jovem que havia roubado algumas frutas de uma venda local. Agora, seu rosto liso e assustadiço estava cheio de hematomas e manchado de sangue.
Os punhos de Jan doíam terrivelmente, e ele podia imaginar que o sofrimento de seu alvo, que buscava - inutilmente - se defender com suas débeis mãos, deveria ser muito pior.
– Que merda você está fazendo? – exclamou Bert, finalmente alcançando Jan e empurrando-o com violência para o lado. Jan não protestou. Ficou plantado, cabisbaixo, no mesmo lugar em que havia caído após ser arremessado, fitando o anel cinzento que agora adornava seu indicador direito.
– Sabe que temos que entregá-los vivos – continuou Bert, fuzilando Jan com o olhar.
– Eu… sei – disse Jan, baixinho. Sentia-se nauseado, e com o gosto de bílis subindo-lhe à garganta.
Bert olhou-o, com uma irritação que parecia deslocada em seus olhos calmos e frios.
– Você sempre foi meio sem controle – ele disse –, mas agora, está desvairado. O que aconteceu?
Jan não respondeu; apenas ficou sentado e olhando para o nada. Em um bolso de sua capa, amassava o pedaço de papel que Lenore havia lhe deixado, uma semana atrás, enquanto os acontecimentos do dia anterior revolviam em sua mente inquieta como um turbilhão. O bilhete dizia:
A sessão para admitir novos membros acontecerá na taverna Bar do Trasgo Verde, daqui a exatamente seis dias, ao pôr dos sóis.
Gostei muito de trabalhar com você hoje, assim como também adoro nosso tempo juntos! Estarei lá quando você sair pela porta, com o anel dos libertadores no dedo.
Sua,
L.
Jan havia se apresentado no local descrito no crepúsculo do dia anterior. Era verdade que estava entusiasmado para se tornar um membro dos libertadores, mas queria, mais do que tudo, encontrar Lenore.
O local onde aconteceria a tal "sessão de admissão de novatos" era uma taverna inconspícua nas partes mais baixas da cidade, que ficavam próximas ao pântano e portanto só eram frequentadas por pessoas sem nenhum bom motivo para estar ali - ou sem alternativas. Os transeuntes que perambulavam por aquelas baixadas no sul, onde as ruas eram rotas, as casas escuras, e a sordidez do pântano impregnava tudo como uma praga, eram quase como ghouls. Drogas, fome, ou alguma das inúmeras pragas do pântano haviam cobrado o seu preço da população da baixa Venore.
Um lugar perfeito, pensara Jan, para um encontro entre rebeldes. Na verdade, o bar onde aconteceria a sessão ficava à vista da grande casa de Ottokar - um dos lugares mais nobres, e ao mesmo tempo, mais deprimentes, da cidade. Ottokar, como era conhecido, outrora havia sido uma das pessoas mais ricas de Venore. Hoje em dia, era quase como um mendigo, pouco diferente do resto das pessoas que viviam por ali. Havia gastado toda a sua fortuna, tempo e energia para tratar dos pobres e doentes. Quando apelara para a nobreza da cidade, e até para o próprio rei, para que o ajudassem com recursos para continuar sua missão de vida, recebera completo silêncio. O grande galpão de Ottokar, cujas janelas eram remendadas, e de onde se podiam ouvir gritos de doentes estirados em camas e sofrendo durante seus últimos dias, era uma das grandes vergonhas de Thais. Jan não se surpreenderia se o próprio Ottokar fosse um libertador. Decidiu que procuraria por um anel suspeito em sua mão caso o visse algum dia, pois conhecia-o apenas de reputação.
O Bar do Trasgo Verde estivera apinhado de gente, mas a maioria dos presentes parecia estar em boa forma e gozar de boa saúde, ao contrário de grande parte dos habitantes do local. Também não aparentavam estar ali para gastar ouro com álcool barato. Na verdade, a maioria daquelas pessoas - jovens como Jan - viera desacompanhada, e lançava olhares suspeitos para todo lado e para todos os outros. Na certa haviam recebido um convite similar ao dele. Ele se perguntara quantos libertadores existiriam em Venore, e como funcionava sua rede de comunicação.
Quando Jan já começava a se tornar impaciente, principalmente porque Lenore não estava em nenhum lugar, algo acontecera. O taverneiro, um velho de aparência decrépita, de repente pigarreou e chamou a atenção de todos. Só então Jan reparou no pequeno anel cinzento que abraçava seu indicador. Era quase do mesmo tom da pele macilenta do ancião.
– Ele começará a recebê-los. Por favor, formem uma fila por ordem de chegada – ele proclamara, com uma voz fraca.
Jan se organizou junto aos outros, que, como suspeitava, estavam ali pelo mesmo motivo. Será que conheceria o líder dos libertadores? Parecia pouco provável. Talvez alguém de sua confiança, encarregado de peneirar novos membros.
– Você tem alguma ideia do que vai acontecer? – Jan perguntara à pessoa que estava na sua frente, após um longo tempo de espera. Era um homem alto, negro e de músculos bem definidos, trajado em vestes verdes e carregando às costas um arco similar ao do próprio Jan, além de uma aljava com flechas de obsidiana incomuns no continente. O sujeito olhou para trás e encarou Jan com olhos escuros e solenes.
– Nenhuma – respondeu ele, com uma voz profunda. – Recebi um convite anônimo.
Jan assentiu.
– Alguma coisa… parecida aconteceu comigo. Você não parece ser daqui. Ankrahmun? – arriscou.
Seu interlocutor negou com a cabeça.
– Porto Esperança.
– Vocês estão tendo problemas com Thais em um lugar tão longe assim? – indagou Jan, arregalando os olhos.
O sujeito virou-se para encarar Jan melhor.
– Tá brincando? Não há um lugar do mundo no qual Thais não queira pôr as mãos. Depois que perderam Darashia, há mais e mais soldados do continente chegando. Eu nem sabia que Thais
tinha tantos soldados.
Jan deu um sorriso melancólico.
– Parece familiar. O mesmo está acontecendo aqui.
– E você é daqui? Como se chama? – perguntou o homem portenho.
– Não. Sou da Baía da Liberdade. Minha terra foi colonizada, como a sua – respondeu Jan, omitindo que sua família na verdade viera de Thais como parte daquela força colonizadora. – Me chamo Raymon. E você?
– Omari – respondeu ele, e Jan deu-se por satisfeito, mesmo havendo boas chances daquele também ser um nome falso.
– Meu povo nunca aceitou a dominação de Thais – continuou Omari. – São uns intrometidos. Tiquanda deveria ser deixada em paz. Só o que eu queria é que os portenhos seguissem o exemplo de Darashia e expulsassem os thaianos. Mas a maioria é muito covarde. Por isso estou aqui.
– Você sabe como anda Darashia? – perguntou Jan. Notícias sobre a
Joia do Deserto, a antiga cidade localizada no continente de Darama, custavam a chegar naqueles tempos. Todos já sabiam que havia acontecido alguma batalha ali. Sangue thaiano fora derramado, e o antigo governo da linhagem de Daraman, restabelecido. Mas era como se uma cortina de névoa houvesse se instalado entre o povo do deserto e o resto do mundo. O trâmite para dentro e fora de Darashia havia sido dificultado, e mensagens eram interceptadas. Talvez Omari, que vinha do mesmo continente, soubesse de algo.
– Não faço ideia – respondeu ele. – Eles se fecharam, e estão cautelosos em relação a estrangeiros. Mesmo nós, que mantivemos boas relações com os darashianos por séculos, muitas vezes somos mandados embora. Não sei se os culpo. A tentativa de ocupação de Thais causou muitos danos, e a ferida é recente.
Jan assentiu, e nada mais disse.
– Ei, grandão, chegou a sua vez – disse o taverneiro esquelético, e parecia estar se referindo a Omari, pois Jan se deu conta de que ele era o próximo da fila.
O guerreiro de Tiquanda acenou para Jan e entrou por uma portinha lateral indicada pelo taverneiro.
Jan batia os pés e tamborilava com os dedos sobre o balcão empoeirado e com mil manchas diferentes de bebida - além de outras coisas menos aprazíveis.
– O que é que acontece lá dentro, meu amigo? – perguntou para o taverneiro.
O velhote apenas o olhou de maneira insolente, e Jan percebeu que um de seus olhos eram aquosos. O olho bom tinha um tom de azul pálido. O taverneiro deu uma cusparada no chão do próprio bar, e continuou realizando o seu
serviço - por falta de uma palavra melhor. Estava claro que o trabalho, ao menos naquele dia, era apenas servir de recepcionista para o que quer que estivesse acontecendo por trás daquela porta, pois ele sequer se dava ao trabalho de receber pedidos ou entregar bebidas. As estantes atrás de si no bar pareciam estar dominadas por garrafas cheias de poeira e teias de aranha.
Depois de um tempo, que pareceu a Jan uma eternidade, Omari saiu pela mesma porta que entrara. Jan reparou que ele brincava com um anel cinzento que girava no seu dedo indicador. Ele passou por Jan novamente ao sair, cumprimentando-o. Jan quase o chamou, quando o taverneiro anunciou:
– Sua vez, moleque. Agora você vai ficar sabendo – e ele revelou um sorriso que era mais gengiva do que dentes.
Sem perder tempo, Jan entrou pela portinha, que levava a uma área mal iluminada por trás do bar. Ele passou por um corredor estreito e baixo, que lembrava algum túnel sórdido de minhocas da podridão, e seguiu intuitivamente para o fim do corredor. O taverneiro não lhe dissera que deveria se dirigir para lá, mas parecia o certo a fazer, já que as outras portas pelas quais passava estavam fechadas, e a que havia no final do corredor, entreaberta. Uma luz lúgubre e bruxuleante, como de vela, escapava pela porta e clareava um pouco do caminho.
Jan bateu com o nó dos dedos antes de entrar, e o som pareceu anormalmente alto.
– Venha – disse uma voz convidativa do outro lado.
Jan abriu a porta rangedoura e apreendeu a cena.
O lugar em si era mais ou menos o que esperava: um quartinho pequeno, sujo e feio, típico de tavernas de segunda linha que também funcionavam como pousadas para os elementos menos louváveis da sociedade. Havia uma cama, sem dúvida dotada de uma prodigiosa população de pulgas, e uma escrivaninha rachada no centro da sala. Uma vela posta sobre a mesa, quase no fim, lançava sua luminosidade triste sobre o ambiente. O que fez a boca de Jan produzir um pequeno O de surpresa, no entanto, foi o sujeito que se encontrava ali, sentado do outro lado da escrivaninha, olhando para ele com um brilho nos olhos e sorrindo um sorriso suave.
O homem era pálido. Na verdade, era tão branco, que Jan se perguntou se algum dia já havia caminhado sob os sóis. Sua pele também era macilenta, e não parecia haver qualquer camada de músculos entre ela e os ossos que haviam por baixo. Outro detalhe desconcertante de sua pele: era lisa como a de um bebê. Não havia um único pelo em toda a extensão visível de seu corpo, incluindo na cabeça, e sua careca reluzia sob a luz da vela. Seus olhos, no entanto, eram o pior. Embora tudo naquele homem sugerisse a imagem de algum predador morto-vivo cruel e faminto que espreitava nas trevas, os olhos não eram pequenos como os de um tigre ou de uma cobra. Eram negros, grandes, sempre muito abertos. Absorviam tudo com uma curiosidade quase infantil que não sugeria nenhuma maldade superficial. No entanto, mergulhando-se mais fundo em seu olhar, não era possível evitar uma espécie de repulsa, como quando se observa uma cena proibida. Para completar, ele também se vestia de negro da cabeça aos pés. Jan sentiu um leve arrepio na nuca ao fitá-lo.
– Você saiu de uma história clichê infantil? – perguntou ele. – É algum tipo de feiticeiro das trevas?
O homem teve a pior reação de todas diante do comentário impertinente. Ele ampliou seu sorriso fino, revelando dentes brancos como ossos.
– Algo assim – ele respondeu. – Por favor, sente-se.
Ele estendeu a mão magérrima em um gesto afável, dirigindo a atenção de Jan para a outra cadeira que havia sido colocada à frente da escrivaninha. Jan reparou que ele também possuía um anel cinzento na mão esquerda, embora o dele fosse anormalmente pequeno, a fim de não escapar de seu dedo esquelético.
– Qual é o seu nome? – perguntou Jan, dando um passo na direção da cadeira, mas ainda não se sentando.
O sorriso suave do homem de preto se alargou ainda mais. Parecia ser uma característica permanente de sua fisionomia.
– Qual é o seu? – ele devolveu.
Jan não respondeu. Apenas ficou encarando-o, com uma mão pousada sobre o encosto da cadeira.
– Nomes têm poder. Não concorda? Não é bom que saibamos muitas coisas um sobre o outro – prosseguiu o sujeito.
Jan assentiu, e sentou-se com um movimento lento e deliberado.
– Você chegou tarde. É um dos últimos da fila, presumo? – indagou o homem de preto.
– Eu cheguei exatamente na hora marcada.
– E a maioria dos outros chegou muito antes. Quase não sobraram anéis.
Jan deu de ombros.
– Me aceite, ou não. De qualquer maneira, eu nem sei se quero participar mais desse grupo. Você me dá calafrios, companheiro, me desculpe dizer. Você é o líder?
– Você tem coragem – respondeu o homem de preto. – Podemos usar alguém como você.
– Eu não sei se gosto do termo
usar.
– Não estamos todos sendo usados por alguém? Assim funciona o mundo. Até mesmo os deuses nos usam, se você acredita nessas coisas. Eu não acredito. Prefiro fazer meu próprio destino. Você me parece alguém de constituição similar.
– E o que preciso fazer para me tornar um
libertador, afinal? – perguntou Jan. – Apenas colocar um desses anéis? Eu não sou muito de me enfeitar, para falar a verdade.
– Claramente, eu tampouco – rebateu o homem de preto, que de fato não tinha nada no corpo além de suas vestes negras e do anel cinzento. – Mas é preciso.
– O que esse anel faz?
O homem de preto retirou a própria joia e colocou-a sobre a escrivaninha. Em seguida, abaixou-se por trás da mesa, e voltou com um anel similar, porém ligeiramente maior.
– Experimente-o.
– Por que você não o coloca primeiro? – incitou Jan. Qualquer pessoa que não havia nascido ontem sabia que não era prudente sair colocando anéis dados por estranhos.
O homem sorriu, e colocou o anel maior em seu polegar, o único dedo no qual ele servia.
– Eles são… uma
ferramenta de reconhecimento – disse ele.
– O que isso quer dizer?
– É realmente mais fácil se você colocá-lo.
Jan suspirou, e pegou o anel, não sem alguma relutância. Imaginou que iria sentir algum arrepio de energia mágica ao tocá-lo, mas parecia apenas um anel ordinário de ferro frio. Colocou-o no indicador.
– Não parece muito poderoso – observou.
– Sim, eu preciso de algo a mais – disse o homem de preto.
– Do quê?
Ele então retirou de alguma gaveta oculta da escrivaninha um outro objeto: uma pequena agulha.
– Uma gota de seu sangue – ele disse, como se estivesse dizendo que precisava de um par de sapatos novos.
– Você só pode estar brincando.
O homem de preto lançou um olhar avaliativo, e talvez, com um ligeiro quê de decepção afetada, para Jan.
– Eu pensei que você fosse corajoso.
– Mas não sou insano. Isso…
– Pense um pouco – interrompeu o homem de preto. – Se você está aqui, é porque alguém de sua confiança deu-lhe o endereço de nossa reunião. Esta pessoa lhe causaria algum mal?
Jan não respondeu.
– Ele ou ela com certeza também tinha um anel similar – continuou o sujeito. – Por acaso esta pessoa parecia estar em más condições? E além disso, você deveria ter imaginado que não seria apenas o anel. Um anel pode ser roubado facilmente.
Jan bufou.
– Certo. Me dá essa agulha – ele confiava em Lenore. Ainda não sabia exatamente o porquê e o quão longe iria sua confiança, mas ela existia. E resolveu que faria aquilo de uma vez, antes que se arrependesse. – O que eu faço?
– Tire uma gota e derrame-a sobre o anel – respondeu o homem de preto. Jan fez como ele dissera.
O rapaz observou, tenso, enquanto o homem de preto produzia de suas vestes uma varinha de feiticeiro. Não era como a de Lenore. A dela era dinâmica; sugeria vida. A dele era branca e retorcida, como um galho morto de um carvalho velho nas Planícies Devastadas. O feiticeiro pronunciou algumas palavras. Jan não identificou nenhuma palavra mágica que conhecesse, e continuou sem sentir nada de diferente, mesmo com o anel.
Então, o homem de preto recolocou o próprio anel em seu dedo fino.
– Que diabos é isso? – exclamou Jan, com um sobressalto de surpresa.
Quando o homem de preto recolocara o próprio anel, uma sensação peculiar invadiu o corpo de Jan. Era como se o anel em seu dedo estivesse em contato com sua mana, canalizando-a na direção do outro anel. Jan sentiu que ambos os anéis estavam
conectados de alguma maneira fundamental e inefável. O homem de preto escondeu a própria mão por trás da escrivaninha, mas Jan intuía exatamente onde ela estava, pois sentia a ressonância mágica que havia entre os dois anéis mesmo com a barreira visual. Não sabia se era fruto de sua imaginação, mas sentia até mesmo seu dedo vibrar levemente.
– Como é que todo mundo não usa algo assim? – exclamou Jan. – Isso é genial!
– Porque o reino de Thais, e a maioria dos povos livres, baniu este tipo de magia há muito – respondeu o homem de preto.
– Por que eles fariam isso? Parece que seria apenas mais um instrumento de dominação nas mãos dos thaianos.
O homem de preto sorriu.
– A fonte não é aprazível para as sensibilidades atuais.
– O que isso quer dizer? – perguntou Jan, franzindo o cenho.
– Você é feiticeiro? Adoraria discutir os pormenores mágicos por trás deste anel, mas duvido que fosse de muito interesse para você.
Jan assentiu. Realmente não estava muito interessado em como o anel funcionava. Deixaria aquilo para Lenore explicar, talvez, logo que a visse novamente. Agora que era um membro dos libertadores, ela não poderia lhe negar informações.
Jan ouviu o homem de preto discorrer sobre mais algumas questões importantes sobre o funcionamento dos libertadores, e fazer-lhe algumas perguntas, e logo saiu porta afora. Não prestara atenção plena no que ele lhe dissera após a entrega do anel. Estava distraído demais com o estranho efeito de conexão que ele sentira entre o seu anel e o do sujeito - e que posteriormente foi repetido com o anel do taverneiro - e principalmente com a perspectiva de ver Lenore logo após sair da taverna.
– Ela nunca apareceu, Bert – lamentou-se Jan, voltando ao presente, ainda sentado e amontoado na estrada feito um boneco de trapos.
Bert encarou-o com uma sobrancelha levantada.
– Então, a sua namorada te deu um bolo? É por isso que você quase matou esse sujeito? – ele perguntou, trabalhando em conter e amarrar o ladrão que haviam capturado.
Jan contara a Bert sobre Lenore, e sobre o suposto encontro que teriam na noite anterior, mas não deu detalhes sobre o resto. Ele girava distraidamente o seu novo anel, que agora estava inerte, significando que não haviam outros libertadores por perto - pelo menos nenhum utilizando o anel.
O jovem sorriu um sorriso melancólico, recordando-se do bar, da ausência de Lenore, e também do que acontecera depois.
– Isso também – Jan respondeu, baixinho.
– O que mais? – perguntou Bert.
– Quando voltei para meu quarto na estalagem, vi que uma carta havia sido passada por baixo da minha porta.
– Da sua namorada?
Jan deu uma risada seca, que rapidamente se perdeu em um soluço.
– Do meu pai. Ele está na cidade, e quer me encontrar.