BARBARIAN USANDO XBOW
ESTOU HYPADO
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BARBARIAN USANDO XBOW
ESTOU HYPADO
Rs quem nunca curtiu essas tres task ? Bom capítulo Iri!
Champz
A baixinha é arretada manda ver mesmo bate com gosto nos jacares
Essas duas ai vao aprontarr to so vendo so vendo se conheceram atraves de uma vomitada isso ai vai dar amizade forte 0/
Send me more baby send me more
Oi
Muito bons os últimos capítulos! O encerramento do arco e a transição para o novo ficaram bem ricos com esse rito de passagem que você introduziu, foi bem criativo e importante pra afirmação da personalidade ambiciosa e aventureira da Bradana, pra felicidade do nosso Mikhail Barbarruna (que nome legal pqp). E agora ela já foi pra bem longe da terrinha dos anões, coragem e audácia não faltam pra moça kkkkk
Tá ficando cada vez melhor a história, segue aí que continuo acompanhando daqui! Abraços
Bom até que enfim terminei de ler, é bastante conteúdo já, a musica de fundo ali do filme ajuda um pouco a entrar no clima, mas vamos lá.
Quando li no começo não entendi muito a estrutura, no decorrer dos capítulos que ficou bem mais claro, o tema inicial do basilisco me fez lembrar de umas histórias, que o pessoal falava que seria uma espécie de boss do tibia, depois falaram que eles já habitavam kazzordom antes dos anões, pelo menos no subterrâneo, a parte superior eram dos orcs, mas que seja, é um tema muito interessante e que sempre atrai a atenção de todos, muitos mistérios giram em torno desse assunto, principalmente por que não tem uma quest clara sobre o assunto (até onde sei).
Sobre a história achei muito bonita a narrativa dela, os detalhes das ações que dão aquele tcham por assim dizer, claro que no começo tinha pensado na miscigenação de um anão com uma humana meio diferente (tipo a mulher barbuda dos circos), mas o carisma dela que se destaca mesmo, mas é uma ótima história e vou acompanhar assim que possível.
Saudações!
Infelizmente, não cumpri o combinado... Mas, não tem problema! Vamos ao capítulo novo, com as respostas devidas:
Spoiler: Respostas aos Comentários
Agora, sem mais delongas, o Capítulo de hoje!
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Spoiler: Bônus Musical
Capítulo Dois — O Marido
… A vida, às vezes, se encarrega de separar.
Bradana continuou sua caçada, firme e forte; naquela noite em que encontrou a mulher chamada Audrey Raines, ela se ofereceu para encontrar um local para que a mestiça pudesse repousar e, durante o período em que esteve na cidade, ambas se aproximaram.
A Filha do Raio descobriu coisas interessantes sobre Audrey; ela, apesar de ter uma aparência muito jovem, já era mais madura que Bradana, com cerca de vinte e sete anos de idade; era, também, nascida em Thais de uma família não muito rica, mas nada pobre, e foi incentivada a treinar desde muito cedo por seus pais. De seu avô, ao completar vinte anos, ganhou sua primeira arbalesta, e, com ela, começou a ganhar o mundo.
Audrey Raines tinha gostos relativamente comuns; gostava de conversas, de adquirir e revender produtos (alguns ela guardava para si, como tintas cosméticas e botas), caçar com amigos ou em solitário, boas bebidas (apesar de que parece gostar de algo que não se assemelha a cerveja e tem um cheiro de álcool mais forte*) e descansar em sua casa após uma “caçada bem produtiva”, segundo as palavras da própria Audrey.
Entretanto, mal sabia Bradana que Audrey Raines tinha muito mais coisas a se descobrir do que aquelas que ela lhe havia previamente revelado…
****
(Narrado por Bradana)
Essa moça é incrível. Incrível, eu digo! Ela caça muito bem, é viajante, destemida, habilidosa… Bonita… Ela é muito divertida também, e tem me ajudado bastante!
Nesses últimos dias, cacei as feras como havia prometido a Grizzly Adams; em muitas situações, foi bem simples: entrei na caverna, esperei até um dos animais entrar em meu campo visual e armei minha besta devagar.
— Vem com a mamãe… — Falei, baixinho, desafiadora.
O crocodilo devia ter uns cinco metros de comprimento; não estou de palhaçada, o bicho era enorme! Ele avançou para cima de mim, rosnando e com as mandíbulas prontas para me estraçalhar. Eu precisei de três tiros (talvez quatro), para derrotar aquele ali.
Aos poucos, fui pegando o jeito da coisa. Todo o dia, de pouco em pouco, eu ganhava experiência de caçada e coragem para ir mais longe.
— Então, o que vai ser hoje, Bradana? — Indagou Grizzly, bem-humorado. — A lista de criaturas é variada, e estou ansioso para ver o que vai querer dessa vez.
— Puxa, eu não sei… — Repliquei, em dúvida. — Digo, caçar algumas das criaturas mais próximas da cidade é legal, mas já estou me cansando… Tem alguma sugestão?
— Bom, acho que Golens de Pedra** podem ser interessantes. — Falou o caçador veterano. — Ou Terracupins***, que são uma praga chatinha na passagem de Kha’zeel...
— Que tal Banuta?
Uma terceira voz, familiar para mim, se manifestou, e eu não pude deixar de abrir um sorriso: Atrás de mim, na entrada da cabana de Grizzly, estava ela. Audrey. Impecável como sempre. Ela estava na penumbra formada pelo teto de palha da cabana, e dava para ver o brilho de seus olhos. Hoje, eles pareciam brilhar em um tom verde meio azulado.
— Banuta? — Indaguei, sentindo meu rosto arder em brasa, como se eu estivesse horas sob o calor dos sois.
— É uma área inóspita, um relicário a céu aberto. — Replicou Audrey com um sorriso de canto. — E os adversários que você encontrará lá serão primatas de um bom tamanho. Ouvi dizer que há quem pague bem pelas peles deles.
Olhei para Grizzly rapidamente, sentindo meu rosto arder. Nossa, estava muito quente! Ele ponderou um tempo, olhando-me de cabo a rabo.
— Bom, é fato que Bradana é uma caçadora e tanto. — Falou o veterano caçador, coçando a barba. — Mas… Banuta é uma área mais complicada em termos de logística. Ir e voltar, para ela, vai ser um trajeto bem longo, sem falar que aqueles símios são bem mais fortes do que aparentam.
— Se ela achar que dá conta… — Replicou Audrey, dando de ombros, com o mesmo sorriso maroto. — Bem, eu, de toda forma, vim reportar meus feitos a você. Concluí mais uma caçada de Cães Infernais**** com gosto.
Audrey se aproximou da bancada de Grizzly e colocou uma bolsa pesadamente sobre ela; o barulho foi mais alto que esperava e eu assustei, fascinada com aquilo: o corpo de Audrey era tão mirrado que eu nunca imaginaria que ela seria capaz de carregar coisas tão pesadas sem parecer se esforçar muito para isso. Fiquei um tempo parada ali, observando a cena.
— É assim que eu gosto! — O caçador esfregou as mãos, empolgado. — Vejamos o que temos aqui…
Vi Grizzly tirar da mochila de Audrey dezenas de objetos; restos de animais, que funcionavam como um memento das caçadas feitas pela paladina. Eram centenas de patas, ossadas, caveiras e outros objetos que foram rapidamente trocados por mais e mais moedas de platina. Meus olhos, diante de tanto dinheiro, ficaram muito arregalados… E eu senti uma pontada de inveja de meus ganhos frente a ela.
— Nossa, Audrey, suas visitas aqui são sempre uma alegria! — Disse Grizzly, chamando minha atenção para o presente. — Meus bolsos estão chorando agora, mas logo lucrarei horrores revendendo cada uma dessas belezinhas para alquimistas, cozinheiros e afins!
— Fico feliz com isso. — Replicou a mulher, com um sorriso de canto. — Bom, eu vou ficar um tempo sem te visitar, Grizzly… Uma pessoa especial está me requisitando para ir em umas terras estranhas ao norte de Quirefang, então…
— Quanto tempo você vai ficar fora?! — Indaguei sem pensar, como se eu tivesse caído da cama após um sonho estranho. — Você volta, né?!
— Ora essa, Bradana! — Audrey replicou, franzindo o cenho e sorrindo, talvez sem entender minha preocupação. — Claro que eu volto, sua boba! Não vai ser algo complicado, pode ficar tranquila!
O olhar dela… A serenidade que aqueles olhos de opala passavam. Eu concordei, fascinada com aquela calma diante do desconhecido; talvez, se Audrey tivesse nascido uma Anã, certamente seria uma comedora de Dragões… Talvez uma filha da Terra… Ou do Fogo…
Ou seria uma Filha do Raio, como eu?
Fiquei um tempo ali, parada, olhando ela. Observando seu jeito de falar, de contar suas histórias… O leve aceno que deu, mexendo os dedos em ordem, um após o outro, e saindo com elegância, com a arbalesta em suas costas. Fiquei parada ali até sentir um beliscão em meu braço.
— Ai!
— Tibia para Bradana! — Adams trouxe-me rispidamente de volta à realidade. — O que vai ser?
— Por ora… — Falei, ainda distraída. — Terracupins mesmo… E Gárgulas… E Golens de Pedra.
*****
Segui com minha caçada; passaram-se dias e algumas dezenas das criaturas. Fiquei muito tempo em cavernas escuras, apertadas e com mais declive do que o esperado; Terracupins tinham mordidas fortes e de veneno amargo, ardido e muito incômodo; muitas foram as vezes que tive que recuar para depois avançar, frustrada com a pouca habilidade de cura que eu tinha.
Suas carapaças avermelhadas eram fortes, e virotes estavam sendo uma péssima solução para abatê-los. Abandonei o movimento de carga e recarga de minha besta para empunhar lança e escudo, na esperança de derrotá-los mais facilmente.
— Exori Con! — Entoei naquela caverna escura, ouvindo o eco de minha voz que, em um instante, converteu em uma lança a mana que eu tinha, descendo em direção ao Terracupim como se fosse justiça divina.
Eu estava exausta, com calor e cansada… Das três criaturas que escolhi caçar, apenas os Gárgulas, por algum motivo estranho que não faz o menor sentido, traziam consigo algum tipo de alimento. Muitas foram as vezes que arranquei de seus destroços sacos de couro contendo algumas batatas dentro. Ao menos era o suficiente para me manter acordada e ativa, pois podia parar para assar as batatas e comê-las de maneira mais adequada.
Minha frustração só aumentava; eram criaturas resistentes, cujos esconderijos eram difíceis de correr e percorrer, com corpos difíceis de ferir e ímpeto quase irrefreável! Frequentemente, quando eu voltava para a taverna de Ankrahmun, uma cidade cheia de pirâmides e gente reclusa com hábitos esquisitos, sentia o cansaço tomar conta. Será que eu havia me acostumado com o fácil? Será que eu passei tanto tempo caçando coisas triviais, que não conseguiu enxergar o que era realmente difícil?
Se Audrey estivesse ali… O que ela faria?
Peguei-me várias vezes pensando no que aquela paladina tão poderosa faria em meu lugar… Para ela, nada parecia ser difícil! Ela já caçava Cães Infernais, e eu nem fazia ideia de como eles deveriam ser! Do jeito que Adams falava dela e com ela… Certamente Audrey saberia o que fazer nessa situação. Ou em qualquer situação.
Só de pensar em como seria a postura dela de combate, suas táticas para cercar e abater suas presas, meus olhos já brilhavam e meu rosto se abria em um sorriso contente e fascinado… Eu esperava, não, eu queria e rezava para que ela pudesse me ensinar seus segredos para caçadas mais perigosas e lucrativas!
Distraída, fiquei olhando para meu copo de cerveja, com os olhos semiabertos, pensando em como seriam esses dias de treinamento. Estava tão fora de eixo que, quando senti o empurrão que me fez derrubar o copo, não soube ao certo como reagir.
— Ei! — Protestei ao ver meu copo cair no chão.
— Deveria ter mais cuidado. — Uma voz masculina, arrogante e azeda, retrucou.
— Eu que estava sentada! — Retruquei, olhando em direção à voz com o cenho franzido e bem irritada. — Você que não tomou cuidado algum!
Arregalei meus olhos e engoli em seco. Era um homem alto, loiro, forte, com pinturas faciais e roupas curtas e feitas de couro, pele e pelos de maneira similar às vestes de Audrey. Sua barba era espessa, mas rente ao rosto e mais escura que seus cabelos, que eram bem dourados. Seus olhos deviam ser claros, mas a penumbra em seu rosto impedia-me de ver a cor, e intensificavam a expressão de poucos amigos que ele tinha. Em resposta à minha réplica, ele cruzou os braços, descontente.
— Impressionante o quão mal frequentado está esse bar. — Sua voz azeda novamente soou, e eu fui ficando ainda mais incomodada. — Ankrahmun recebe a mestiçagem toda agora?
Se antes meu semblante estava tomado pela irritação, agora era um misto de choque e nojo. Cerrei meus dentes, meus punhos e dei uma pancada de mão fechada na mesa, a fim de desconcertar sua nojenta expressão de desprezo.
— Tenho tanto dinheiro e direito de estar aqui quanto você! — Sibilei. — E você vai pagar a cerveja que derrubou.
— Se tivesse tanto dinheiro quanto eu, esse copo de cerveja sequer seria problema. — Replicou o homem com um sorrisinho de canto, inclinando-se em minha direção. — Quanto a direito, bem… Isso é muito relativo.
Sentindo a adrenalina tomar conta de meu sangue, levantei de sopetão, pronta para resolver aquele dilema nos punhos se fosse necessário. Aquele homem, para irritar-me ainda mais, deu um riso baixinho e zombeteiro.
— Uma mestiça entre Anão e Humano. Que coisa exótica. — Falou o homem. — Você tem sorte, garota, que estou aqui para encontrar minha esposa. Do contrário, já daria cabo de você, como um bom Norsir faria.
— Que azar sua mulher tem. — Repliquei, soltando o ar de meus pulmões em um suspiro de desprezo. — Estar casada com um covarde de nome pomposo como você deve ser um puta castigo.
— Ora, sua… — O homem rugiu, fechando os punhos e erguendo um deles contra minha direção, prestes a me socar.
— Szczeisny, pare! — Uma voz feminina protestou, fazendo-o frear seu movimento.
Olhando em direção à voz, que vinha da entrada da taverna de Arito, eu vi Audrey com uma expressão de choque e confusão.
— Oh, Audrey! — O homem, cujo nome agora eu sabia, olhou para ela, abaixando os punhos e praticamente esquecendo de minha presença. — Você se adiantou.
— Bradana?! — Ela indagou, colocando as mãos na cintura. — Por acaso vocês podem me explicar o que estava acontecendo aqui?!
— Um mal entendido, mulher… Nada mais. — Replicou Szczeisny, sorrindo de canto para mim, o que me deixou ainda mais furiosa do que eu já estava.
— Mal entendido?! Esse brutamontes derrubou minha cerveja no chão e se recusa a pagar! — Esbravejei, consternada que aquele cara conhecesse justo a Audrey.
— Isso é verdade? — Ela olhou o homem loiro com reprovação.
Ele resmungou em retorno antes de responder.
— Eu não a havia visto, oras. — Replicou o bruto Norsir, cruzando os braços.
— Pois bem, marido, você vai pagá-la e pedir desculpas. — Audrey falou, com naturalidade.
— Quê?! — Para a minha surpresa, tanto eu quanto Szczeisny falamos a mesma palavra, mas por motivos diferentes.
Ele, incrédulo que sua esposa tomara meu partido, entregou-me um saco de moedas a plenos resmungos, e eu aceitei de forma automática, sem pensar, pois, em minha mente, essa simples frase de Audrey estava tomando proporções gigantescas, e eu não entendia ao certo o que estava pensando.
Como assim ela era casada? Como com aquele cara? E como ela nunca me havia falado sobre isso?
Como assim Audrey Raines tinha um marido?!
Continua…
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Glossário:
(*): A bebida aqui referida é o Daiquiri, um coquetel de origem cubana à base de rum, água, açúcar (ou outro agente adocicante), limão e licor de fruta.
(**): Tradução livre para Stone Golems.
(***): Tradução livre para Terramites.
(****): Tradução livre para Hellhounds.
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Szczeisny é um dos personagens de @Joe Dee, que era casado com Audrey Raines. Ambos são da guilda Bora Beneva, no servidor Beneva. Eis as informações dele abaixo:
Name: Szczeisny
Sex: male
Vocation: Elder Druid
Level: 610
Achievement Points: 278
World: Beneva
Residence: Roshamuul
House: Mill Avenue 5 (Thais) is paid until Feb 20 2018
Guild Membership: Leader of the Bora Beneva
Last Login: Feb 15 2018, 12:41:04 CET
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Bem, pessoal, esse foi o capítulo de hoje! Espero que tenham gostado!
Aguardo os feedbacks! :tchau:
Abraço,
Iridium.
Kkk que pedaço de cavalo heim ia bater em brandana na cara dura? Nem da pra imaginar ate onde bradana pode chegar! Espero continuar a acompanhar a filha do raio! Show de bola iri!
já quero o divórcio
:mandy:
Nossa, que transição maravilhosa entre os arcos. O primeiro capitulo deste arco já começou massa. Sempre fico impressionado com a riqueza de detalhes e na sua escrita. Gostei muito da forma como Bradana iniciou sua primeira viagem, e gostei ainda mais quando ela começou suas aventuras em Port Hope. A introdução de Audrey foi ótima e já demonstra a grande amizade que está para começar.
Já no segundo capitulo eu gostei ainda mais que o primeiro. É clara a admiração que Bradana tem por Audrey, e a sensação de que Bradana quer chegar onde a poderosa paladina está, em relação ao nivel de força. Outra coisa legal foi a surpresa de que Szczeisny (Sim, tava no ctrl+c), um ser tão arrogante, é casado com uma pessoa tão legal, que Bradana tanto admira. Mas no final das contas, fiquei curioso pra saber como se pronuncia "Szczeisny".
Obrigado pela ótima leitura, e tenho certeza que você manterá a qualidade nos próximos capítulos. Estou ansioso para vê-los.
Te falar, que capítulo bom de se ler, acho que tive que puxar essa musica das arábias umas 3 x até o final de leitura. (me lembrou do Clone) os mais velhinhos entenderão kkkkkkk
De se pensar sobre batatas é bem estranho serem loots dos gárgulas mesmo, até olhei o wiki e vi que quem dropa: Crypt Defiler, Gargoyle, Grave Robber, Nomad, Nomad Blue, único que não é humano, mas voltando para a história, sempre é bom ter um ídolo (ou ídola como no caso) para a pessoa ter aquele foco, ou caminho para se seguir, parabéns pela história e vou acompanhar na medida do possível.
PS: tomara que venham umas aulinhas depois do ocorrido.
Saudações!
Spoiler: Respostas aos Comentários
Sem mais delongas, o Capítulo de Hoje!
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Spoiler: Bônus Musical
Capítulo Três — Escamas
Certas caçadas são inesquecíveis.
(Narrado por Audrey Raines)
Inacreditável, senhoras e senhores! Inacreditável! Bastava eu virar as costas por alguns segundos e Szczeisny bagunçava tudo! Tudo, eu digo! Pobre Bradana, parecia muito, muito chocada! Bom, em defesa de meu marido, ele nem sempre foi assim. Sim, meu marido é um Norsir, ele é esquentado por natureza (mesmo sendo um druida, e muito bom no que faz, por sinal), briguento (talvez um pouco birrento), mas não era assim. Irascível. Estourado. Intolerante. Não…
O Szczeisny que eu conheci anos atrás era diferente. Era outro homem. Quando nos conhecemos, nosso relacionamento foi construído com base em respeito, admiração e afeto mútuos. Entretanto, hoje… Alguma coisa mudou radicalmente tudo o que outrora tivemos.
Meu casamento já fora mais feliz… E eu não sei, exatamente, onde foi que tudo foi por água abaixo...
E Bradana me lembrava, em alguns aspectos, o Szczeisny que eu conheci tanto tempo atrás.
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O clima no bar pareceu tão estático quanto o choque manifestado por Bradana; graças à estatura de Szczeisny, nenhuma alma presente, por mais forte ou destemida que fosse, teria coragem de interceder pela mestiça. Entretanto, havia alguns Anões que estavam sendo contidos pelos seus semelhantes a fim de evitar uma briga. Mestiça ou não, Bradana já havia sido reconhecida como membro pleno da sociedade dos anões e merecia o apoio deles como uma igual.
De todos os presentes, apenas Audrey parecia estar tranquila e serena como era costumeiro.
— Você me ouviu. — Replicou Audrey calmamente. — Peça desculpas à Bradana e pague a cerveja que você a forçou a desperdiçar.
A ruiva mestiça observava a situação ainda em choque. O Norsir loiro resmungou alguns pares de palavras antes de abrir a mochila e tirar dela algumas moedas, estendendo-as para o taverneiro e comprando o triplo da cerveja que havia sido derramada. Em seguida, entregou um deles a Audrey e, segurando os outros dois enormes copos, pigarreou.
— Desculpe-me pela cerveja, mocinha. — Replicou o Norsir, claramente a contragosto, estendendo a bebida para Bradana.
Bradana Vigiawyrm Barbarruna ficou olhando Szczeisny por tempo indeterminado, ponderando. Seus olhos percorreram a sala, procurando por algo que não necessariamente tinha o porquê de ser encontrado. Na medida em que movia vagarosamente seus olhos, a mestiça ruiva chegara à conclusão de que ainda estava com muita raiva do tratamento que recebera anteriormente por parte do troglodita de cabelos e olhos claros.
Ela inspirou lentamente e expirou na mesma velocidade. “Se eu recusar, posso começar uma briga sem precedentes.”. Pensou, contrariada. “Por mais que ele mereça, eu posso acabar decepcionando Audrey e… Eu não quero isso.”. Ela engoliu em seco e piscou devagar.
— Desculpas aceitas. — Replicou a mestiça, pegando o largo caneco com um sorriso leve.
Audrey sorriu e bateu as palmas das mãos, contente.
— Bom, meu querido, por que não no sentamos? — Falou a paladina dos olhos de opala, sorrindo.
— Err…
— Bradana, você está esperando alguém? — Indagou a simpática paladina, fazendo a Comedora de Dragões arregalar os olhos e sentir as faces queimando.
— N-não, n-não! — Gaguejou Bradana timidamente, escondendo os lábios com o caneco de cerveja. — E-eu tô… Sozinha aqui. É. Não estava esperando… Ninguém… — A voz da moça foi abaixando aos poucos junto à sua timidez, especialmente quando o sorriso de Audrey ficou ainda mais bonito.
— Bom… Poderíamos nos sentar com você? — Indagou Audrey Raines com voz suave e seu mais simpático sorriso, apoiando o lado direito do rosto nas costas da mão esquerda, a qual ainda estava unida à mão direita.
Bradana timidamente fez um aceno positivo com a cabeça e deixou o casal sentar-se à mesa com ela, ainda que mexida pelos ocorridos anteriores. Audrey pediu um pouco mais de alimento para a mesa, bem como mais cerveja e, juntos, os três passaram o resto da tarde até umas duas ou três horas após o anoitecer.
Na estalagem da taverna, uma inconformada Bradana, após as horas longas que ficaram mais calorosas, mas ainda com o clima de estranheza, estava deitada na cama sem conseguir pregar o olho; com as mãos atrás de sua cabeça, contemplando o teto acima de sua cabeça, a mestiça Comedora de Dragões estava ainda inquieta.
“Por que ela é casada com um sujeito desses?”. Indagava Bradana silenciosamente para si, com o semblante neutro e o olhar inquieto. “Logo ela, tão positiva, alegre… Civilizada.”.
Ao pensar a última palavra, torceu seu nariz; ‘civilizado’ era um termo relativamente pejorativo, usado por Elfos e Humanos para designar tribos e sociedades inferiores às suas, como se elas fossem e valessem menos por terem identidade própria do que seguir um establishment que certamente não as agradaria enquanto povo e enquanto indivíduos com credos, cores e cultura próprias. Ela suspirou pesadamente enquanto tentava afastar de sua mente as memórias da briga de bar que quase acontecera.
“Ainda tenho a sensação de que aquele homem vai aprontar alguma…”. Pensou, rancorosa, sobre o Norsir loiro de nome Szczeisny, franzindo o cenho antes de permitir que as pálpebras pesadas enfim se fechassem.
*****
(Narrado por Bradana)
Acordei melhor; talvez eu tenha exagerado quanto a Szczeisny e a situação como um todo. Digo, por que Audrey não seria casada? Às vezes, é como aquele antigo ditado: os opostos se atraem. De toda a forma, arrumei minhas coisas e paguei ao estalajadeiro o que devia. Apesar da confusão toda de ontem, a cerveja estava maravilhosa e a comida também.
Com isso, meu ânimo para caçar havia sido renovado; os sois já estavam a plena atividade sob o céus de Ankrahmun, a ‘Cidade Eterna’, como chamavam alguns. Bufando de calor, a ruiva baixinha e invocada encheu a mochila com garrafas de água doce, além de encher até o tampo o seu odre, a fim de evitar a desidratação. Apesar da secura, havia vento no deserto, o que tornava o clima um pouco mais suportável.
Ela conferiu seus suprimentos: suas lanças de arremesso, um arco sobressalente, cerca de duzentas a trezentas flechas, algumas poções sortidas, cogumelos e as garrafas de água. Com um sorriso, ela colocou sua mochila nas costas, ajeitou o arco, pegou lanças e escudo e saiu rumo a uma das rampas que separava a muralha de Ankrahmun do restante do deserto de Darama.
— Nossa, que calor! — Reclamou Bradana, incapaz de se abanar. — Hoje vai ser sofrido…
Caminhando pelas dunas, sentindo o vento ao menos refrescar-lhe parte do corpo, a ruiva Comedora de Dragões seguiu adiante pela tapete quase infinito de areia em busca do ninho de Terracupins. Levou cerca de meia hora para que Bradana encontrasse a pilha de pedras que ocultava o enorme sistema de túneis dos grandes insetos e afastasse as pedras para adentrar e botar seus recursos em pleno uso.
*****
Na escuridão dos túneis, a luz só podia ser obtida por vias mágicas. O ar era quente e difícil de respirar, denso a cada passada rápida e pesada que Bradana estava sendo forçada a fazer. Três horas depois de iniciar sua caçada, duas de suas garrafas de água já haviam sido esvaziadas até a última gota, e a terceira não estava longe de conhecer o mesmo fim.
A respiração pesada e ofegante de Bradana era complementada pelos gritos agudos de dor de cada Terracupim atingido por suas certeiras lanças. Certamente, trezentos já teriam caído pela letal mira de Bradana, que estava cada vez mais cansada e suada.
Com um resmungo, arrancou sua lança do corpo de um dos Terracupins, tirando dele uma parte de sua carapaça, que parecia brilhar fracamente em um tom furta cor. A moça guardou o grande pedaço de quitina em sua mochila e alcançou sua corda para poder sair do ninho antes de ver-se sem recursos e emboscada.
Quando saiu, sentiu uma lufada de vento mais ameno bater em seu rosto e mexer seus cachos; seus olhos claros perceberam os sois mais baixos no horizonte, com a temperatura ficando mais suportável. Ela respirou fundo e apoiou os pés na areia, espanando parte da poeira de suas vestes, já manchadas com os fluidos corporais dos insetos gigantes que destruíra. Pegou suas lanças e o escudo, pronta para voltar para a cidade e contar seus lucros, quando algo chamou sua atenção.
— Mas o que….
Um cheiro sutil pairava no ar; um cheiro distinto, de algo fresco e talvez mais forte do que Bradana enfrentara e conhecera até então. Atraída pelo rastro olfativo que havia no ar, a mestiça inclinou sua cabeça, apontando o nariz mais para o alto, a fim de identificar a direção de onde vinha aquele cheiro.
Suas narinas começaram a guiá-la até um o sopé de Kha’zeel, em direção a um lance de escadas que ela outrora não havia reparado; subindo pelas pedras que ladeavam o sopé da enorme muralha natural, o cheiro ficava cada vez mais forte e mais fácil de distinguir.
Era um misto de carne podre com restos queimados; era um local com mais areia, que tinha algumas lascas de algo parecido com vidro, brilhando em tons furta cor na medida em que ela lentamente movia o estranho objeto.
— GROOOARRRR!
Um rugido estrondoso cortou o silêncio, o ar e a percepção de Bradana, que instintivamente correu para perto de um cacto a fim de se esconder. O chão vibrava leve e ritmicamente, no ritmo de passos. O ar ficou mais quente e os olhos de Bradana se arregalaram.
— Um… É um…
Alguns metros à frente de Bradana, um animal de quatro patas de coloração verde, com escamas fortes, longo pescoço com um focinho de narinas poderosas que sopravam fogo, olhos de coloração vermelha e sem pálpebras, mas com membranas que faziam o movimento de piscada no sentido vertical, patas poderosas, com três dedos e garras que certamente seriam do tamanho do antebraço de Bradana, uma cauda forte e um par de asas coberto por escamas e com uma membrana delicada, porém forte. Havia chifres saindo da lateral de sua cabeça, e de tempos em tempos a criatura soltava sua larga e grande língua bifurcada para sentir o cheiro do ar.
A Comedora de Dragões mal respirava, de tão fascinada que estava com aquela criatura; aquele porte, aquela forma… Bradana conhecia aquela criatura!
— Um Dragão… — Sussurrou a moça, impressionada.
A criatura subitamente parou, e Bradana prendeu a respiração por trás dos cactos. Ela percebeu um movimento das narinas do animal, que se alargaram e franziram o rosto do enorme réptil. Em seguida, ele colocou sua grande língua para fora e Bradana entendeu o que estava acontecendo.
Ela havia sido detectada. E, diante desse fato, sorriu.
— Hoje tem! — Disse, carregando sua besta com um virote mais poderoso que os que usava regularmente.
Continua….
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Demorou mas chegou! Agooora sim, Bradaninha fazendo valer seu título de Comedora de Dragões HSAUSHAUSHAUHSUAHS
O vídeo já havia sido gravado um tempo atrás e eu estava DOIDA para colocá-lo nessa Estação, eu só não sabia em qual capítulo eu o faria HSAUSHAUSHAUH
Aguardo ansiosamente o feedback de todos e todas! Forte abraço e até o próximo capítulo de Behogár Bradana!
Abraço,
Iridium.
Grande iri tive o prazer de velo em seu canal e ate compartilhei um desejo de ver um crossover de sua história com a do neal rs so acompanho voces aqui na seção e admiro as obras de ambos rs emfim continuamos em bradana por hora pelo jeito não ha pedaço de cavolo q uma mulher nao dome rs Audrey de presença forte heim e esse primeiro dragon quem se esquece ? Rs o meu eu tava free no ringo lvl 30+ sumonei um monk tinha ss so que nao a achei pra posta, naquele pequeno respaw entre kaz e amazon camp murri bonito na prineira wave #monodedo rs... Ansioso pra ver bradana matar o dela! Parabéns.
Olár!
Adorei o capitulo, principalmente pela adição do vídeo para complementar o texto. Eu voto por mais capítulos assim \õ
Até o próximo <3
Céus. Retornando após um longo e doloroso inverno. É necessário tecer considerações.
De prima, confesso que há uma certa restrição da minha parte com a ambientação partindo de Kazordoon. A razão é muito simples: odeio Kazordoon. Tudo muito confuso, não se sabe onde se faz o quê, e, sinceramente, exceto caso seja estritamente necessário, procuro evitar o local de qualquer forma. Bradana continua sendo uma personagem enigmática, mas que tem um carisma razoável. Gosto de pensar que você imprime nela características que são totalmente suas, o que é mais ou menos o que fiz com Jason Walker. No mais, às vezes, o personagem se torna tão grande que acaba fugindo do nosso controle. Bradana é um desses personagens.
Esse é, contudo, um elogio. Veja: em Jason Walker, Randal é um personagem que fugiu do meu controle. Comentei sobre isso recentemente com o Carlos, que contestou de sobremaneira o fato de ele ser inspirado em Ruby e no personagem homônimo de Monstros S.A. O fato é que nós criamos determinados enredos, ensejamos a participação de determinados personagens e, num dado momento, eles criam vida própria. De forma até mesmo fantasiosa, o personagem acaba por trilhar seu caminho sozinho. É o que ocorreu com Bradana no terceiro capítulo do Outono.
Oportunamente: tenho gostado da participação de Audrey. Guardadas as devidas proporções, lembra-me a personagem homônima da série Scream, original do Netflix.
O desenlace a história é interessante até aqui. Confesso que fiquei ligeiramente encabulado até perceber que as epístolas eram divididas por estações, e isso me gerou uma surpresa agradável. Afinal, foge do usual, e tudo que foge do usual acaba por se tornar ainda melhor do que o habitual. Parabéns, Fer, pela ideia fabulosa.
Finalmente: quão audiovisual pode ser um capítulo? Você demonstrou que um escritor pode transcender as próprias habilidades. Impressiona que você tenha tido essa ideia; afinal, Bradana parece ser especialista no trato com dragões (a exemplo de Carlinhos Weasley), e tombar o seu primeiro (ou os seus primeiros, por que não?) acrescentou de forma absoluta na história.
Perdoe-me, no mais, pela ausência. Tu conheces a minha agenda. Farei o possível para voltar a ser religioso no seu tópico, Fer.
Oi! Li agora os dois capítulos que deixei acumular e gostei bastante de ambos, como de costume. A forma como a narração da história varia, passando do ponto de vista da Bradana pra outros personagens e até pra 3a pessoa deixa a leitura bem leve e divertida pra mim, sem contar como você consegue passar a personalidade de cada personagem que tá narrando de uma forma natural e marcante ao longo do texto, excelente. Sigo sendo um fã declarado da sua escrita, é impossível pra mim não ficar inspirado a voltar a escrever quando leio suas histórias. Espero que você consiga seguir com a história da Bradana da forma como planeja, ela tem tudo pra crescer e melhorar ainda mais com o tempo!
Não vou comentar muito sobre as últimas aventuras da Bradana porque minha memória é péssima e eu lembro muito pouco dos capítulos passados...
Mas eu vou tirar um tempinho quando der pra reler desde o começo, com certeza valerá a pena.
Obrigado pelo capítulo, aguardo aqui pelo próximo. Abraços!
Enquanto meus alunos estavam escrevendo, eu tava aqui lendo :vtlol:
Deixa eu comentar enquanto o que eu li está fresco na memória - e enquanto tenho tempo.
Prólogo e capítulo 1:
Um prólogo e um primeiro capítulo que seguem a mesma personagem e não são completamente desconectados!? Loucura pra mim kkk.
Enfim, o primeiro comentário a fazer, de maneira geral, é em relação à qualidade da escrita. A Voz do Vento é uma história icônica aqui, muito mais longa, e por isso mesmo possivelmente mais significativa aqui na seção. No entanto, eu posso dizer que a escrita e a narrativa dessa pequena história está bastante superior ao que eu me lembro d'A Voz do Vento - pelo menos no início e meio. Não sei quanto tempo depois de terminar A Voz do Vento você começou a escrever essa história, mas sua evolução como escritora é notável. Não tenho reclamações a fazer sobre a escrita em si, ou problemas a comentar. A única coisa notável, talvez, tenha sido o primeiro capítulo ter se dividido em três PoVs diferentes, passando de terceira pessoa, para uma carta em primeira, e posteriormente a narrativa novamente em primeira. Mas tudo bem também; eu não imagino que todos os capítulos terão mudanças de PoV assim.
Achei que o início do primeiro capítulo me lembrou O Hobbit (em um buraco no chão vivia um Hobbit), hehehe. O que, por sinal, é um elogio. Bastante influência dos anões de Tolkien também, - o que é inescapável no Tibia, e, de qualquer forma os anões são a melhor raça. Eu ADOREI o fato de que essa história fala sobre anões, ainda que indiretamente. Sempre foram a minha raça preferida, e espero vê-los sendo mais explorados ao longo da história. A utilização dos Comedores de Dragão (adoro quanto autores utilizam elementos menos explorados da lore do Tibia e os expandem), a menção engraçada às mulheres anãs também terem barbas, e até mesmo descrições aqui e ali que elegantemente faziam remeter ao que normalmente pensamos quando pensamos em anões (o uso da expressão ferro e fogo na carta); incrível!
E eu sabia que tinha reconhecido aquele sol e estrelas de algum lugar, heheh.
Gostei da personagem principal. Apesar de pouco da sua personalidade ter sido demonstrada nesse início, já pude ver o suficiente pra curtir ela, e também a sua origem inusitada. Eu acho que os personagens e as suas relações, bem como a capacidade de evocar emoções, sempre foram o seu forte, e pode ser que isso se repita nessa história.
No geral, curti bastante esse início, e logo estarei lendo mais caps! Eu teria emendado a leitura de mais alguns já, mas tenho que voltar pra aula. :D
Gabriel
Saudações!!!
Eu fico muito feliz que tenha gostado hahahahaha
Sim, eu me inspirei pesadamente n'O Hobbit para muitas partes, especialmente esse primeiro arco, que é o Verão - sim, é dividido por estações do ano kkkk
Eu tenho q dar uma relida no que eu tinha preparado pra essa história, pq eu me comprometi a fazê-la com 20 capítulos na época, 5 para cada arco - eu vou retomar, e espero q vc goste do q eu tenho a apresentar!
Forte abraço,
Iridium.
Capítulo 2:
Lol, Isaak e Asimov.
Enfim, eu fico muito contente que a história realmente parece estar seguindo o rumo de explorar mais os anões e a sua sociedade (pelo menos por enquanto). Continuo amando as referências tolkenianas. Eu sou muito suspeito pra falar, porque realmente adoro esses carinhas, então qualquer coisa que os envolva tem grandes chances de ter minha simpatia. De qualquer forma, a sua escrita realmente conseguiu me envolver no clima da sociedade deles por dentro do Grande Velho (aliás, eu debati comigo mesmo como deveria traduzir The Great Old One pra minha história uns dias atrás, e não pensei nisso; só consegui pensar em "Grande Montanha". Pelo menos não foi O Grande Velho Um :vtlol:)
Estou gostando muito dos personagens, principalmente do Mikhail (talvez não coincidentemente, ele pareça ser o mais dwarfesco). Enfim, anões tem uma energia única, que eu gostaria que fosse mais explorada. Se eu tiver que ler mais uma história sobre elfos, terei um troço huehue.
Enfim, algumas falas de personagens por vezes me soam um tanto "atuais", se é que me entende, o que causa uma leve sensação de estranheza dado o ambiente. Além disso, a mudança de PoVs no mesmo cap também acho um pouco desorientadora. É uma prova da qualidade da sua escrita que, apesar disso, você conseguiu ambientar o cenário tão bem e me transportar pras situações que estavam acontecendo, pois a cada mudança de PoV, havia uma leve quebra de imersão.
Enfim, você escreveu isso em 2017, e de qualquer forma, eu to procurando sarna pra me coçar :vtlol:
No geral, foi um ótimo capítulo. Logo apareço de novo!
Gabriel
Saudações!
Nossa, quantos anos que não escrevo, de fato, por aqui! Na época em que parei com a história, eu estava passando por um período complicado da minha vida leia-se, eu tinha terminado com o namorado que tive por quase cinco anos e tava UMA MERDA fazer QUALQUER COISA e eu me afundei no jogo, junto a um bloqueio artístico que demorei a quebrar. Acabou juntando outros problemas, pandemia, as pessoas deixando de estar aqui... Enfim.
Assim como o @Gabriellk~, que já me acompanha a alguns anos, e a @Marjyh, que foi uma grata surpresa (e ainda me pergunto como não nos conhecemos nos idos de 2011 aqui no Fórum), decidi completar Behogár Bradana... Pelo prazer de completar. Em meu site, eu farei a versão em quadrinhos dessa história, sim, com algumas modificações para deixar ainda mais pertencente a mime sem o risco da Cipsoft me processar, e espero que gostem.
Eu alterei o post inicial com informações relevantes, como os títulos desse capítulo e o próximo (que já estavam planejados desde 2018, faltava só postar mesmo) e os títulos dos dois últimos arcos. O meu planejamento original para a história segue firme e forte e eu espero que gostem!
Spoiler: Respostas
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Spoiler: Bônus Musical
Capítulo Quatro — Admirável Caçada Nova
A caçada pode ser algo mais subjetivo e introspectivo do que aparenta.
Um estrondoso rugido irrompeu no ar uma última vez antes de ser silenciado por completo; escamas jaziam no chão em meio ao sangue e os estilhaços de madeira. Só havia o barulho da respiração pesada, o chiar da carne que deixava de queimar e dos pingos de suor contra o couro e a areia no chão.
Da pilha de carne queimada, cujo peso equivaleria a pelo menos três a cinco toneladas, ergue-se uma figura bípede, de pernas fortes, ruiva e com sua besta erguida acima de sua cabeça. Seus olhos claros ainda percorriam a caverna, buscando sobreviventes.
Não havia mais nada ali senão os cadáveres dos dragões que a desafiaram. Não havia mais nada além da areia, do sangue, das pedras que compunham as paredes, do silêncio e Bradana.
Ela vivia. Ela respirava. Ela bradava de alegria, orgulhosa de si, ao ver que o desafio havia sido vencido.
*****
(Narrado por Bradana)
Eu mal conseguia acreditar em meus olhos; meu corpo, minhas pálpebras, minha respiração… Tudo pesava. Eu estava exausta e ferida; aqueles dragões vieram com fogo e fúria para cima de mim, quebrando o chão com suas passadas fortes e suas garras afiadas.
O chão estava esfacelado, com o sangue misturado às escamas e pedregulhos que foram levantados pela batalha. Dos animais mortos, cada um medindo cerca de cinco vezes o meu tamanho em altura e sete vezes em comprimento, consegui obter parte de suas escamas fortes como recompensa.
Minhas mãos tremiam; tentei alcançar a faca de obsidiana que eu tinha em meio aos meus pertences, mas senti tudo girar. Minha cabeça estava leve e minha visão foi ficando mais e mais turva; comecei a ouvir passos, leves e delicados, ecoando em meio àquele recinto. Ergui meus olhos em direção àquele som, agarrando minha besta com o que restava de minhas forças, mas tudo que pude ver foi uma silhueta antes de perder a consciência.
*****
— Acorda! Por favor…
Meu corpo parecia leve, como se eu flutuasse, simplesmente, no vazio. Eu simplesmente não conseguia abrir meus olhos, e sentia meu coração falhar. Algo pressionava meu peito, rápido, uma, duas, três, quatro, cinco, seis, sete vezes… Mas eu não parecia capaz de sair daquele vazio. E aquela voz, que poderia mudar meu destino, parecia longe, tão longe…
— Bradana, não… Respira..!
Respirar? Como? Se meu nariz parecia… Horrível. Eu não conseguia fazer algo tão simples, o que um bebê costumava fazer. Respirar. Estava doendo. Meu corpo parecia… Ir embora. Seria esse o fim da minha história? Derrotada por… Fumaça? Depois de matar cinco dragões sozinha? E aquela voz, para onde estava indo? O dono dela ainda estaria por ali, pronto para me ajudar… Ou terminar aquilo que os dragões começaram e não puderam finalizar?
— Fica comigo, por favor…
E foi aí que eu senti um toque macio, um sopro delicado e forte, me trazendo de volta à vida. Antes, minha mente, que parecia tão leve e flutuar rumo ao desconhecido, foi jogada de volta ao meu corpo com a velocidade de uma âncora em direção ao fundo do oceano. Meus pulmões, que pareciam indiferentes às minhas tentativas fúteis de enchê-los com ar, pareciam receber o ar de um tufão, e meus olhos, tão machucados pelo ar tóxico, pareciam renovados ao ponto que foi fácil abri-los.
E dar de cara com ela. Colada no meu rosto. Seus lábios colados nos meus, soprando ar de volta aos meus pulmões, me impedindo de conhecer os deuses antes da hora. A única pessoa possível.
Audrey Raines.
****
(Narrado por Audrey Raines)
Naquele momento, eu não era mais a dona de meu corpo. Eu não era mais dona de mim mesma.
—Hm…!
Não tenho certeza ao certo o que me levou a Ankrahmun, semanas atrás, e me fez permanecer; não gosto de lidar com a necrocracia daquela cidade-estado, que ofende os ensinamentos da luz que carrego comigo. Os mortos devem permanecer mortos, sempre pensei assim. Fui ensinada a pensar assim. Independente de tudo isso, contra meu melhor senso, eu estava lá. Eu pude estar lá, na hora certa e no momento certo, e tudo porque ela estava próxima de uma tumba que eu queria investigar.
— Audrey…?
Ela. Tinha que ser ela, mesmo. Atrapalhada, estabanada, falando alto para todos ouvirem… Desafiando meu marido. Marido esse que, bem… Não é o que eu gostaria. Ao menos não para mim. É um bom homem, mas… Não é para mim. O que era uma expedição para investigar a tumba abandonada daquele que chamavam Horestis, tornou-se uma missão de resgate.
— Bradana… — Balbuciei, olhando atentamente para o rosto ferido da garota que tinha pouco mais da metade de minha altura, mas cinco vezes a minha coragem.
— O que…? Como…? — Ela começou a articular, desorientada, a voz trêmula em meio à dor e ao choque de ter quase morrido.
— Sshh. Está tudo bem. —Falei, ajudando a anã a sentar-se com alguma postura, amparando seu corpo em um abraço que eu não queria soltar. — Foram eles, os dragões… E a fumaça de seus corpos.
— Você… Você me salvou. — Ela falou, ofegante, com seu par de piscinas fitando-me em um misto de susto e admiração. Ah, como a luz dos sóis faz um lindo reflexo neles…
— E eu faria de novo. Quantas vezes fossem necessárias, eu faria… — ‘Tudo por você. Eu faria tudo por você’, eu pensei, mas não consegui dizer. Não ousei dizer, apenas pensar.
— Você… Me beijou? — A ruiva me perguntou, piscando devagar e com os lábios entreabertos. Era um convite? E se fosse, eu deveria aceitar?
— Eu… Err… É uma manobra…! Isso, uma manobra! — Respondi, acuada, pela primeira vez em muito tempo. — Então, os xamãs de Nibelor me ensinaram, é algo bem interessante, e útil, pelo visto, dá para salvar a vida de muita gente enquanto um Druida não aparece e… — Comecei a tagarelar, com a voz tremendo. Céus, Audrey, por que?! Por que falar assim com ela? De todas as pessoas, justo com ela?!
— Oh… Entendi. — Eu consegui sentir a decepção na voz dela, talvez de uma maneira que nem mesmo ela pudesse compreender. Será que ela entendeu o que acabou de acontecer, ou sentiu, apenas, que foi ‘nada demais para mim’, como se fosse corriqueiro eu salvar outros novatos como ela?
— Olha… Melhor eu te levar de volta para a cidade. — Falei, tentando remediar uma situação possivelmente irrecuperável. — Você não está em condições de fazer mais nada por hoje.
— Mas… — Ela tentou protestar, afastando-se dos meus braços. Do meu abraço — E-eu consigo… Argh!
O grito de dor da brava combatente revelou um motivo ainda maior para preocupação: de fato, um dos dragões não faleceu sem oferecer resistência, e havia um corte enorme na perna direita de Bradana, e ela sangrava profusamente através do ferimento.
— Rápido, tome essa decocção! — Oferecia a Bradana um frasco arredondado, com um líquido vermelho; em seguida, peguei meu cantil e joguei um pouco da água no ferimento a fim de limpá-lo e rasguei parte de minhas vestes para criar ataduras, as quais amarrei ao redor da perna da moça.
— Não precisava… — Ela sussurrou timidamente, em um tom que nunca pensei que ouviria dela.
— Lógico que precisa. — Repliquei, talvez um pouco mais fria do que gostaria. — Se eu tivesse demorado a chegar… — Engasguei. Eu não poderia sequer imaginar. Não, eu não queria imaginar o que teria acontecido se eu tivesse demorado um segundo a mais.
Em silêncio, ajudei Bradana a subir em meu cavalo; juntas, galopamos de volta para Ankrahmun, e meu coração acelerou, de maneira indecorosa e inapropriada, quando senti a garota se aproximar mais, deixando o peso de seu corpo apoiado em minhas costas, seus braços descansados em minhas coxas e seu rosto repousando em meu ombro.
Que droga. Estou gostando disso muito mais do que deveria; muito mais do que eu de fato posso.
***
(Narrado por Szczeisny)
— Alguém viu minha esposa?! AUDREY?!
Que. Inferno.
Somos explosivos, nós Norsir. Sim, somos! Vivemos pelos nossos impulsos, nossa inteligência impulsionada pelo fogo das nossas emoções! Razão e emoção caminham lado a lado, e somos a tempestade quando contrariados! Ainda assim, quando estou perto dela, eu costumo ser mais calmo. Até a hora que ela resolve fazer uma das “saidinhas” dela.
E hoje, ela resolveu fazer isso. Justo no nosso aniversário.
— Não, senhor, não a vi hoje. — Feizuhl, em sua calma habitual, replicou. — Paladinos não costumam gostar da cidade… E, cá entre nós, eu compreendo. — Ele completou, encolhendo seus ombros na medida em que eu me aproximava.
— Beleza, mas que beleza! — Grunhi, irritado e mais sarcástico do que de costume. — E isso porque a mulher “sempre” lembra daquilo que é importante e…
— AJUDA! EU PRECISO DE AJUDA!
Em um impulso, empunhei meu machado e saí do edifício; dele, emanava veios de energia gélida, prontos para atender a quaisquer comandos meus. Entretanto, o pedido de socorro, vindo da minha esposa, não exigia o uso de lâmina ou magia. Ela vinha dos muros da cidade, já com os sóis escondidos além do horizonte, com o corpo coberto de fuligem, cheirando a fumaça e carcaça de dragão morto. Além disso, ela não estava desacompanhada.
— Audrey?! — Indaguei, preocupado, guardando meu machado nos ferrolhos atrás de minhas costas. — O que aconteceu?!
— A Bradana! — A voz da minha querida esposa tremia, de forma familiar e dolorosa. — Ela… Ela foi sozinha… Cinco dragões… O corte…! Ajuda, por favor!
Claro, a mestiça. Tinha que ser a… Bendita mestiça. Suspirei em meio a um resmungo, ajudando Audrey a colocá-la no chão.
— Não temos que levar ela…
— Não precisa. — Repliquei entre meus dentes, segurando um sentimento que eu não sabia definir ainda, ao certo. — Amor, por favor, pegue ataduras limpas, uma garrafa de rum e duas tigelas. Eu cuido do restante.
— Tá, tá… — Ela respondeu, nervosa, esquecendo até de amarrar o cavalo no poste do estábulo. — Ataduras, rum, tigelas… ataduras, rum, tigelas…
Ergui meus olhos em direção a Audrey, ignorando, por alguns instantes, a respiração pesada e difícil de Bradana, que sofria em meio aos danos e às feridas de sua caça, ao meu ver, mal sucedida; poucas foram as vezes que a vi nervosa assim, alterada de forma desproporcional em frente ao perigo. No entanto, esse nervosismo me parecia diferente; e eu não queria entreter a possibilidade de ser alguma outra coisa.
— Cof! Cof! Argh…!
O arfar pesado e urgente da mestiça trouxe-me de volta à realidade; agora, a ruiva tinha a minha indivisa atenção. Peguei meu cantil, o qual estava atado à minha cintura, e abri, despejando um pouco da água na palma de minha mão esquerda e o restante sobre as feridas de Bradana.
— Ao Pai Chyll, retorno a água da vida e ofereço essa prece — Entoei, vertendo a água de minha mão em direção à carne viva da anã — Para Freydís em sua barcaça eterna, peço que carrega o mal, a dor, a chaga e a pestilência para longe, que abrace essa guerreira… — A água começou a brilhar em um tom azul e gélido que muito me era familiar, e os ferimentos foram, aos poucos, ficando mais limpos e o sangramento, controlado. — …E permita que ela lute um dia mais. Exura Gran Sio.
A água rapidamente converteu-se em flocos de neve e gelo, e da minha vontade fez-se o vento, soprando para longe as dores e feridas de Bradana; o frio estancou o sangramento, e o ferimento foi se fechando aos poucos. A ruiva arfou, respirando de uma só vez, renovada, os ventos de cura; seu olhar voltou-se para mim, espantada, enquanto eu decidi encará-la, medindo sua estatura uma vez mais.
—V-você… — Ela começou, surpresa. — Você é…
— Seithmadur*? Sim. — Repliquei, franzindo o cenho para ela. — Isso seria… Um xamã para vocês, eu acho.
— Geomantes podem nos curar, em Kazordoon. — Falou Bradana, olhando para mim com outros olhos, eu acho. — Mas, não com água. Isso é coisa de druida, né?
— Sim, sim. Sou um Druida. — Repliquei em meio a um resmungo, cruzando os braços e desviando o olhar. — Mas, não gosto do termo. É o termo deles, não o da minha gente.
Os passos apressados de Audrey logo interromperam a conversa; ela voltou com tudo o que pedi, ajoelhando-se ao meu lado e com o semblante aliviado.
— Pela Luz de Uman, como é bom vê-la a salvo! — Exclamou a paladina, abraçando-me com força. — Obrigada, obrigada, marido meu! Desculpe ter saído sem te avisar, desculpe…!
— Não precisa disso, está tudo bem. — Repliquei, em um tom que não parecia meu, com uma convicção que definitivamente não era minha. — Não precisa se desculpar… — Menti, enquanto meu olhar lentamente se voltava para o motivo da estranha ausência de Audrey, que me olhava como se soubesse a resposta para a pergunta que estava em minha mente. — Foi por uma boa causa.
A anã engoliu em seco. Bingo. Alguma coisa aconteceu, eu tinha certeza absoluta disso; Audrey é uma pessoa altruísta, sim. Uma mulher incrível em muitos aspectos e generosa até quando isso coloca sua autopreservação em risco. Mas… Havia algo mais ali. Esperei Audrey se afastar do meu abraço, e voltei ao meu trabalho.
— Venha cá… Bradana, certo? — Falei em um tom mais afável, mas ainda com o semblante fechado. — Vai arder, mas, vai melhorar.
Sem dar espaço para perguntas, derramei parte do rum diretamente na ferida da moça e ao redor da pele maltratada, fazendo-a urrar de dor. Em seguida, coloquei um pouco da bebida em uma das tigelas e água na outra. De um pequeno saquinho, tirei algumas ervas, as quais amassei junto ao líquido dourado vindo de canaviais muito distantes dali, e mergulhei algumas das ataduras nele; para a tigela com água, separei outras ervas e repeti o procedimento.
— Isso dói! — Gritou a moça, e tive que segurar meu riso. — Por que fez isso?!
— Se reclamar vai doer mais. — Respondi, segurando a vontade de rir que queria se apossar de mim. Peguei uma das ataduras mergulhadas na mistura de rum e ervas e gentilmente enfaixei seu ferimento, cobrindo-o por completo — Isso que fiz serve para manter suas feridas limpas e fortalecer meu feitiço de cura. Sua carne e sua pele já estão se renovando, e sua noite de sono será desconfortável. Mas, pela manhã, você estará nova em folha.
— E a outra mistura, é para que? — Perguntou a moça, desconfiada, em meio a teimosas lágrimas que ela insistia em segurar.
— É para eu limpar a sua pele. — Respondi, tirando as ataduras da mistura de ervas e água. — E vai te fazer dormir bem; essas ervas são boas para o sono. — Completei, segurando o braço dela de forma firme, porém com delicadeza — Você não sentirá dor enquanto dorme.
Naquele momento, Audrey, que estava quieta em palavras, mas não em atitudes, aproximou-se de mim, e senti-a tirar meu machado e a bainha de minhas costas a fim de ter onde apoiar seu corpo, envolvendo-me em um abraço aliviado. Seu rosto estava aninhado em meu pescoço, e aquela pele macia roçava carinhosamente a região, fazendo com que eu quase esquecesse, por um instante, de que estávamos em um ambiente público e com uma companhia que era indesejada, de minha parte. Porém, havia algo em meu âmago querendo tomar posse de mim; um sentimento que eu era incapaz de dar a ele nome e sentido. E isso estava me incomodando profundamente.
— Preciso te pagar algo…? — Ela indagou, timidamente.
— Não. — Respondi, olhando-a no fundo dos olhos. — Apenas fique bem, sim? Você deu um belo susto em minha mulher. E eu não lido muito bem com isso.
O recado foi dado. E eu não acho que essa mestiça seja burra a ponto de não entender minha mensagem.
Continua…
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(*) Seithmadur: Do Nórdico antigo, Seiðmaðr, que significa “homem que pratica magia”. É o equivalente, em uma lógica Norsir/Viking, ao xamã/druida no universo tibiano. A contraparte feminina de um Seiðmaðr é uma "Seiðkona".
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Depois de uns... 6 anos(?) eu finalmente retorno! O objetivo é terminar Behogár Bradana ainda esse ano kkkkk
Será que eu consigo?
Aguardo os feedbacks, independente de qualquer coisa!
Forte abraço,
Iridium.
Capítulos três e quatro:
Os melhores capítulos até agora, em minha opinião!
Estou ficando convencido que cerveja é um nutriente básico do qual os anões precisam para sobreviverem, assim como água para nós.
Enfim, os dois caps foram cheios de pontos altos: começar pela conversa íntima no início do capítulo três, que culminou com Bradana se sentindo infeliz antes a possibilidade da morte futura do pai. A mortalidade e como os personagens lidam com ela é um tema que sempre achei legal de explorar, e também serviu para expor um pouco mais da psique da personagem e me tornar mais íntimo dela. Também gostei do subsequente encontro dela com Rauta; achei bastante natural e agradável a forma como eles se conheceram e a conversa seguinte. Sem contar o cliffhanger com o qual esse cap terminou!
Eu achava que o basilisco, nesse momento, seria somente um alarme falso, e que não seria de fato a criatura. Mas não, o maldito realmente apareceu e petrificou uns caras! Não preciso dizer, o basilisco é uma das minhas criaturas preferidas, tanto na lore do Tibia quanto no geral, então foi bom vê-lo em evidência. Eu fiquei um pouco preocupado que ele seria usado apenas como um motivo meio barato de tensão e logo seria despachado. Sem contar que a reta final do cap me deixou preocupado, pois eu achei que a Bradana se acharia a tal e já iria querer ir atrás dele, mas no final das contas, ela entendeu que vai precisar de muito mais se quiser dar conta da criatura. Esse final serviu pra aumentar o meu respeito pela personagem, e também como um puta motivo pra ficar investido na história: ver a Bradana crescer para atingir esse objetivo. Não importa muito se no final das contas ela de fato venha a matar o basilisco, mas foi um fator motivacional forte pra ela - e também pra eu continuar a ler a história.
Estou dentro, e logo volto com mais um comentário.
Gabriel
Muito bom! :D
Capítulo cinco (Fim da estação):
Último cap dessa primeira etapa da história, e pra mim, até agora, o melhor, apesar de basicamente ter consistido de uma conversa entre pai e filha. Gostei da forma como a conversa foi conduzida, a maneira pela qual Mikhail explicou as irmandades dos anões. Interessante também a educação positiva direcionada à própria filha (a qual das irmandades você quer pertencer?). A possibilidade de ela não querer pertencer a nenhuma irmandade não foi sequer cogitada :lol:.
Enfim, sempre irei curtir qualquer capítulo ou trecho que aprofunde a lore dos anões. Não tenho nenhuma crítica a fazer, o capítulo foi muito bem escrito - exceto por dois pequenos trechos onde do nada foi usado o presente, apesar de todo o resto da história até então ser contada no passado:
O Anão tira de dentro de suas vestes; Bradana toca o amuleto de seu pai.
Um ótimo início de história, e estou empolgado para continuar!
Dependendo do andar das coisas, pode ser que daqui pra frente eu comente apenas a estação inteira, mas vamos ver. Talvez faça uns dois comentários por fase também.
Até!
Gabriel
Saudações!
Demorei um pouco mais do que eu gostaria com esse capítulo, mas, cheguei! Estou feliz de retomar essa história e estou determinada a completá-la. Pretendo postar o prólogo da próxima estação daqui uns dias, e aí responderei os comentários q eu deixei para trás junto com o prólogo da próxima estação, só para manter o ritmo!
Vamos às respostas!
Spoiler: Respostas aos Comentários
Sem maiores delongas, vamos ao capítulo de hoje, que é o final da Estação do Outono!
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Spoiler: Bônus Musical
Capítulo Cinco — Nó na Garganta, Peso no Coração
Uma estação acaba, outra começa… E um sentimento nasce.
(Narrado por Bradana)
O restante da minha estada em Ankrahmun foi, no mínimo, estranha; uma tempestade de areia arrebatou a cidade, forçando o encerramento das atividades do porto por um tempo. Dessa forma, eu não podia entrar ou sair da cidade, e isso me forçou a… Pensar. Refletir.
A Cidade Eterna não era lá conhecida por sua hospitalidade, com pouquíssimos quartos comunitários entre as pirâmides, as quais eram dedicadas a governantes anteriores, pelo que Tesha e outros habitantes da cidade me contaram. Fiquei em um alojamento próximo à Torre Serpentina, abrigada da areia e do calor e cercada por nada além do tédio e dos meus pensamentos. Justo quando eu recebi não apenas uma, mas duas cartas vindas de Kazordoon.
A primeira foi de meu pai. A segunda, para minha surpresa, fez meu coração disparar. Rauta. Abri, com as mãos um pouco trêmulas, o envelope da carta de meu pai. O papel da carta cheirava carinhosamente a trigo, e havia três moedas dentro do pacote: uma de latão, outra de cobre e uma de bronze.
“Querida e Amada Bradana Vigiawyrm,
Vigiawyrm. Que lindo sobrenome você escolheu. Combina tanto com você e eu ainda estou sem acreditar; você cresceu demais. Já é uma moça tão grande e eu… Estou ficando velho, e os anos estão sendo pouco gentis comigo.
Filha, eu não tenho recebido notícias suas em uns meses, desde que você partiu para Porto Esperança; apesar de tenso, confio na caçadora que criei, e espero que não tenha dificuldades com seus caminhos e com seus alvos. No entanto, eu não venho falar com você apenas como pai, mas, também como companheiro de irmandade.”
Nesse momento, ergui minha sobrancelha, estranhando a súbita mudança de tom de meu pai. Parecia algo sério. E grave. Infelizmente, eu estava certa em ambos os casos.
“Ele apareceu de novo. O Basilisco. Agora, é grave; como você sabe, o Imperador Kruzak teve muita dificuldade em ter filhos, desde que assumiu o trono de seu pai. Os mais velhos, Boris e Medvedev, eu os conheci, mas morreram em combate anos atrás. As filhas foram prometidas a outros nobres anos antes e não podem suceder. O filho mais novo de Kruzak, Ardabag, desapareceu após o Basilisco ter vagado pelas partes mais profundas da cidade, e há quem diga que o viu subir até o Quarteirão dos Nobres.
Isso é sério, Bradana. Os Comedores de Dragões não foram criados apenas para financiar as expedições mais ousadas de nossa gente: nossa Irmandade foi criada junto com a primeira aparição do Basilisco, quando quase fomos extintos por ele. Jamais fomos capazes de derrotá-lo ou de entender seus motivos, mas, somos responsáveis por mantê-lo longe de nossas ruas e linhas de vagão. E o nosso Grão-Mestre, a mando do Imperador, convocou um Concílio Dracônico. Isso significa que todos os membros vivos da Irmandade precisam comparecer, e isso inclui você. Eu te ensinarei agora, Comedora Vigiawyrm, o básico de um Concílio Dracônico. Decore as instruções dessa carta e queime-a antes de chegar em Kazordoon - os nossos ensinamentos não podem ser de conhecimento estrangeiro, especialmente se o estranho for um Elfo.
O Concílio é aberto pelo Grão-Mestre, que abre e media as discussões e decisões do Concílio, e ele tem que ceder a palavra para quem quiser se manifestar. Cada membro da Irmandade tem direito a opinar, vetar ou votar nos assuntos discutidos em cada Concílio. Opinar aqui, Vigiawyrm, é propor uma solução para as discussões levantadas pelo Grão-Mestre, e você precisa erguer a moeda de latão para ser notada e ter sua opinião reconhecida pelo Grão-Mestre. Como é seu primeiro concílio, eu te aconselho a não opinar; você não conhece seus irmãos ainda, e é bom prestar atenção no ambiente antes de falar.
Votar é concordar, cara Irmã em Escamas, e isso não deve ser feito de forma leviana. Para votar na opinião de um irmão ou irmã, é necessário erguer a moeda de bronze e falar seu nome completo, enquanto Comedora de Dragões. Uma vez que você faça isso, não haverá volta. Você não pode voltar atrás no seu voto, na sua palavra. A mesma coisa é o veto.
Vetar, jovem Irmã em Escamas, é discordar. Ponto. A moeda de cobre está aí para isso. Assim como o voto, prepare-se para lidar com a consequência de uma recusa; alguns irmãos podem ser rancorosos e estender essa desfeita a um próximo Concílio. E não existe isenção: ou é um claro e orgulhoso ‘sim’ para uma opinião, ou é um alto e sonoro ‘não’. Ou você Vota, ou você Veta. E ponto final.
A opinião com a maior quantidade de Votos será o nosso caminho de ação, aprovado pelo Grão-Mestre Josiah, para lidar com o Basilisco, e todos terão que fazer sua parte, inclusive os que Vetarem. Preste atenção, escute e só dê sua palavra se for capaz de cumpri-la. Boa sorte, Irmã em Escamas, e esperamos você em Kazordoon no prazo de uma semana.
Atenciosamente,
Mikhail Barbarruna, Filho do Fogo*, humilde membro da Irmandade dos Comedores de Dragões.”
— Uma semana?! Uma semana?! — Gritei, em pânico. — Como vou chegar em Kazordoon em uma semana?! Quanto tempo fiquei sem receber essas cartas?! Essa tempestade de areia não acaba nunca, como eu vou sair daqui?! Grr…!
— Faça silêncio! — Uma voz abafada gritou para mim, vinda de um dos outros quartos. — Os mortos…
— Estão tentando dormir, eu sei! — Respondi, ríspida, abaixando o tom de voz. — Desculpe, desculpe…
Guardei as três moedas em minha mochila, em um bolso à parte, para não perdê-las em meio aos meus suprimentos ou o dinheiro corrente. Em seguida, respirei fundo e abri a carta de Rauta; essa estava um pouco mais pesada e, quando rompi o lacre de cera, vi cair em minhas mãos uma pequena chave de ouro com veios de cores lilás e azul-claro. Meu coração disparou de novo, e comecei a ler.
“Cara Bradana,
Senti falta de suas cartas! Espero que tenha chegado sã e salva em Ankrahmun. Escrevi certo? Ah, sei lá, nome difícil, lugar estranho… De lá, só ouvi histórias; gente enfaixada, areia para tudo que é lugar, pirâmides ao sol… E o mar. Olha, sou um cara simples, mas, eu adoraria ver o mar de verdade, sabe? Assumi esse negócio muito jovem, depois que minha velha se foi, e não pude ver muito do mundo.
Acho que é isso o que mais gosto em você, a sua paixão pelo diferente, pelo horizonte. Você é uma mulher sensacional, é uma ótima companhia e eu tenho certeza que será a exploradora mais celebrada de nosso povo ainda em vida, e que escreverão muitas canções sobre você.
Sobre isso… Espero não estar me precipitando, mas eu vou direto ao ponto. Eu sou um ótimo ferreiro, modéstia à parte, um bom cervejeiro e, ouso dizer, uma excelente companhia para todos os momentos. Eu me encantei com você desde que te vi, e eu adoraria estar ao seu lado em todas as aventuras que você viver. Seria o maior orgulho da minha vida… Não, meu maior privilégio e minha maior honra ser seu marido. Estou enviando a Chave da Promessa como ditam nossos costumes, com as cores do Raio que você é e com o brilho dos seus lindos olhos também.
Esperarei sua resposta pessoalmente, seja qual for. Mas, já adianto o pedido aqui: Bradana Vigiawyrm, quer se casar comigo?”
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(Narrado por Audrey Raines)
Vasos quebrados. Cama revirada. Lençois amarrotados no chão. Armas? Perto do batente da porta, longe de nós dois. Ainda bem que as paredes das edificações em Ankrahmun são feitas de pedra, pois somente assim para nossa discussão ficar privada.
— Até quando, Audrey, até quando?! — Bradava meu marido, furioso. — Até quando você vai me provocar?!
— Não foi uma provocação! — Repliquei, igualmente nervosa e ofendida. — A garota ia morrer, era isso que você queria?!
— Não foi o que pareceu! — Bradou Szczeisny, mais e mais furioso. — E eu acreditaria nessa sua conversa mole se não fosse a primeira com que você se envolveu! Já se esqueceu da Berenice?! Ou da Gail?! Céus, até com a Aruda de Thais você se engraçou! — Completou, descontando sua fúria em mais uma inocente almofada, arremessando-a em direção à parede.
— Engraçado você citar isso! — O sarcasmo em meu tom, aliado ao insulto, era palpável — Eu não me lembro de você ficar bravo assim quando estava com a Isolda em cima de você!
— Você também estava lá! — Ele esbravejou, aproximando-se de mim. — Em um tempo que você também me incluía nesse seu lado! E não me lembro de você achar ruim, muito pelo contrário!
Eu travei, hesitante em continuar. O Norsir estava à minha frente, olhando-me do alto, apenas à mera distância de um abraço.
— Eu sempre soube das suas… Preferências. — Meu marido adotou um tom mais contido, ainda que magoado. — Eu lembro perfeitamente de quando eu tive certeza.
— Não foi minha intenção te machucar. — Falei, vidrada nos olhos dele, triste. — Mas, eu nunca quis esconder quem eu sou.
— Tínhamos um acordo. — Disse Szczeisny, mais próximo. — Eu aceitaria suas conquistas contanto que eu também fosse parte delas. Por mais que eu não goste.
— Que homem não gosta da ideia de ter duas mulheres toda noite? — Indaguei, com um sorriso de canto, talvez um pouco mais venenosa do que gostaria.
— Um cuja esposa está dividida. — Ele proclamou, quase ao toque da minha pele. — Diversão é uma coisa, ameaça é outra.
— Ciúme não combina com você. — Falei, estranhamente hesitante. Ele tinha esse efeito sobre mim; ele sempre teve esse efeito sobre mim.
— Se você pudesse… Casar com outra mulher… — A voz dele traía todas as feridas abertas em seu coração. E eu conhecia aquele coração como ninguém. — Você faria?
— Szczeisny… — Desviei o olhar, magoada pela pergunta, ainda que ele tivesse todas as razões do mundo para fazê-la.
— Sim ou não, Audrey. — Ele replicou, ainda muito bravo. — É fácil responder.
— Não. — Repliquei, abraçando ele. — Eu casaria com você de novo, mesmo se eu fosse livre para amar mulheres.
— Então, por que? — Ele indagou, retribuindo meu abraço. — Por que você continua indo atrás dela? O que a Bradana tem que eu não tenho, além do óbvio?
— Eu não sei. — Respondi, apertando mais o abraço. — Eu não sei, mas, eu sei que é mais forte do que eu. Mais forte do que eu pensava.
— Eu não gosto dela. — Replicou o Norsir, levando uma de suas mãos ao meu queixo para elevar meu rosto, fazendo-me olhar para ele. — Eu não gosto dessa distância, Audrey. O que eu fiz de errado, meu amor? Não é de hoje, e muito menos por causa dela.
— Eu estou inquieta. — Repliquei, vulnerável, perdendo-me naquele abraço. — Eu estou com medo. Eu não queria viver nas sombras desse jeito; eu queria…
— Por que você não se entrega por inteiro para mim? — Ele sussurrou ao pé do meu ouvido; ele sabia como fazer com que eu pedisse rendição em um contra argumento. — Você é inquieta, isso é seu. Você quer outras mulheres? Tudo bem, contanto que eu seja parte. Mas, fique longe da Anã, Audrey. É só o que eu peço.
O abraço? Virou um beijo, que levou a mais coisas. Ainda que eu prefira a companhia de mulheres, Szczeisny é um homem para o qual eu nunca fui capaz de dizer ‘não’, e jamais pensei em negá-lo de qualquer forma.
A mobília? Danificada. Nossos corpos? Por toda a parte, conforme a nossa vontade e necessidade. Roupas? Não sei para onde foram.
Já você, leitor? Fecharei a porta agora. Eu e meu marido queremos privacidade.
Fim da Estação.
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(*): Filho do Fogo - Comedores de Dragões que escolheram o ovo preto/vermelho, recebendo a marcação dos Lordes de Dragões/ Dragon Lords.
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E fecho, finalmente, essa Estação! Esse Outono durou quase sete anos hein KKKKKKKK
Aguardo os feedbacks, e pretendo postar o Prólogo do Inverno em alguns dias!
Forte abraço,
Iridium.
Saudações!
Já se passaram alguns dias, e eu vou abrir a penúltima Estação de Behogár Bradana; uma das maiores vantagens, quando eu imaginei a história em primeira mão. Como eu farei uma outra versão dessa história em quadrinhos, para postar em meu site e outras mídias para monetização, eu modificarei e incluirei mais material autoral em relação a essa versão, para ser algo mais "meu" do que tibiano em si hahahaha
Vamos aos Comentários:
Spoiler: Respostas aos Comentários
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Citação:
Prólogo
Por fim, a tempestade de areia de Ankrahmun cedeu; com a ajuda de Ishebad, o Grão-Vizir de Ankrahmun, consegui a abertura de um portal para me transportar até Kazordoon, bem a tempo do Concílio Dracônico. Estava com tanta pressa que sequer tive a oportunidade de reencontrar Audrey e conversar sobre tudo que aconteceu. Enviei uma carta para ela assim que cheguei em Kazordoon e não obtive nenhuma resposta até agora.
E talvez até seja melhor assim; Audrey é casada, e não acho que ela goste de mim da mesma forma que eu gosto dela. E eu não quero problemas com o Szczeisny, independente do que eu penso sobre ele; se eu estivesse em seu lugar, não gostaria que alguém tentasse romper meu casamento.
Por falar em casamentos, acabei aceitando a proposta do Rauta; dois Comedores de Dragões juntos é um bom sinal para o futuro, segundo meu pai, cuja saúde parece ter melhorado bastante desde o outono. Ainda assim, decidimos nos casar depois do Concílio e de lidar com a situação do Basilisco, pois a cidade estaria mais calma.
No entanto, mal sabia eu que aquele inverno que se aproximava seria bem mais intenso e perigoso do que o normal. A terra tremia… O que acontecerá conosco?
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O Inverno chegou em Behogár Bradana; corram para suas casas, peguem seus casacos de pele e sentem-se ao redor da fogueira para comer o ensopado mais quente que encontrarem. Esse será rigoroso. Muito, muito rigoroso.
Forte abraço,
Iridium.
Iridiummmm
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Vem ca
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Serio que a Behogar quer colar velcro com a muie do Norsir????
Eh serio isso???
:reactionface:
Outono - Prólogo, Capítulos um e dois
Spoiler: Comentários
Outono - Capítulos três e quatro
Spoiler: Comentários
Saudações!
Peço desculpas pela demora - esses Capítulos estão mais complexos do que imaginei, por causa do tom que essa Estação precisa ter. Além disso, tive uns problemas com o PC que atrasaram as coisas, MAAASSS estamos aqui! Dividirei os comentários do @Gabriellk~ novamente, para eu ter um respiro para o Capítulo 2 (que farei o melhor para postar logo hahaha)
Agora, aos Comentários:
Spoiler: Respostas aos Comentários
Sem maiores delongas, vamos ao Capítulo de hoje!
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Spoiler: Bônus Musical
Capítulo Um — Nevasca
A Montanha sempre será o melhor abrigo contra o frio.
Os passos pareciam pesados contra o solo castigado pela neve e geada; o caminho até o cume do Grande Ancião era íngreme, especialmente quando acessado de fora da Fortaleza-Império de Kazordoon. Caminhar pelos caminhos abandonados pelos Anões significava apenas uma coisa: o viajante ou não queria chamar a atenção para uma morte possivelmente dolorosa ou já não era mais bem-vindo nos limites governados pelo Imperador Kruzak.
As mãos guiavam, com dificuldade, o caminho pela lateral da montanha; as poucas partes do relevo em que se podia apoiar eram as falhas e os buracos em meio à rocha sólida, os quais tremiam à mínima provocação de picaretas de apoio ou até mesmo sob a pressão e o peso de um corpo humano que, de tão leve, poderia ser soprado facilmente contra a inexorável muralha de pedra — e retalhado no mesmo processo.
No entanto, fosse pela determinação irrefreável do viajante ou a clemência dos deuses diante daquela situação em específico, aquele corpo solitário e estranhamente motivado conseguiu, após semanas de esforço, chegar ao cume do Grande Ancião. Coberto por uma grande túnica de tecido grosso e áspero, forrado com peles de esquilos e lobos costurados de forma improvisada e tosca, era impiedosamente surrado pelas lufadas de ar gélido, que cantava um lindo lamento ao encontrar as bocas das cavernas, ecoando, talvez, o sentimento carregado pelo estranho que havia chegado ali.
— Eu tenho que estar errada. Eu estou errada.
A voz era feminina, engasgada e rouca com o choro de dias; seu rosto pálido já estava completamente manchado pelo caminho de lágrimas vertidas, cuja umidade acabou por queimar seu rosto ao estar exposta a baixíssimas temperaturas dias a fio. Sua respiração estava ofegante, e cada passo parecia ser o último, tal era a dificuldade de seguir adiante.
— Eu estou errada. Eu tenho que estar. É mentira, só pode ser mentira.
A estranha entoava o mantra da negação; de alguma forma, aquilo parecia mantê-la motivada a chegar onde precisava chegar. O cume do Velho Ancião era recôncavo, cujas paredes de pedra formavam uma tigela, cujo fundo abrigava as grandes plantações de trigo e sorgo, as poucas plantas capazes de aguentar os rigores daquele inverno atípico. Acima da plantação, um aqueduto trazia água vinda do grande lago que havia ali, o qual era reposto pelas chuvas e pela magia dos Geomantes daquelas terras. As paredes abrigavam casas esculpidas nas rochas, bem como sistemas cavernosos cujos caminhos eram desconhecidos para a maioria dos forasteiros. As mãos feridas pelos ventos de inverno seguravam sua túnica improvisada com a pouca força que ainda restava naquele corpo castigado, o qual se arrastava, a passos lentos, a nordeste, em direção a uma caverna onde o vento era incapaz de cantar.
—É mentira… — Arfava a estranha no limite de sua força e razão. — É mentira…. Eu… Estou… Errada…
Era uma caverna fria, mesmo iluminada pelos cristais de cor âmbar e escarlate; a pouca luz e o pouco calor emitidos por eles eram indiferentes para aquela estranha, que arrastava os pés como se seu corpo pesasse o mesmo que três elefantes. O caminho era sinuoso, levando a uma parte da montanha reservada apenas para convidados - e os residentes daquela parte. Aos poucos, o ar tornou-se mais agradável, ainda que frio, e os pés cansados daquela viajante a levaram até seu destino.
— Por favor… Que eu esteja errada.
À sua frente, lápides respeitosamente enfileiradas, iluminadas levemente pelos mágicos cristais — as únicas companhias constantes dos caídos. Reunindo o que restava de suas forças, a viajante conseguiu caminhar mais rápido, seus olhos furiosamente atravessando nomes, datas e memórias daqueles que já não caminhavam mais entre os vivos.
— Não… não… não…
Seus olhos, esbranquiçados e que reluziam pequenos pontos de várias cores, arregalaram-se ao encontrar o que não queria. A viajante tirou o capuz que cobria seus ruivos cabelos, desalinhados, sujos e queimados pela exposição às geadas. Lágrimas inconformadas, aliadas à respiração ansiosa, formavam-se nos olhos derrotados de uma mulher sem esperanças.
— Não, não, não, não! — O murmúrio ganhava mais corpo, a voz rouca cada vez mais alta e desesperada a cada vez que o advérbio de negação era entoado. — Não! Não! NÃO! POR FAVOR! NÃO!
O último “não” saiu como o rugido de um animal ferido, clamando por misericórdia diante da possibilidade da morte; seu corpo curvou-se à terra e à lápide à sua frente. Seu choro desesperado ecoava pelas paredes do cemitério, sua voz assumindo outros tons e ritmos, como se outros acompanhassem seu pesar. Entretanto, por infelicidade ou misericórdia, talvez, ela estava sozinha ali, ensimesmada em seu pranto e seu luto.
— NÃO! — Urrava a moça, desesperada, fincando as unhas em meio à terra dura, arrastando-os até puxar algo. — POR FAVOR, NÃO! É MENTIRA, SÓ PODE SER MENTIRA! — Ela fechou seus punhos e bateu as mãos cerradas contra o chão, louca de tristeza — NÃO! NÃO! NÃO! POR FAVOR…! VOLTA, POR FAVOR! VOLTA PRA MIM!
A lápide à sua frente declarava a sentença, destino esse que ela não queria. Para seu desespero e dor, o que havia entalhado naquela pedra estava longe de ser mentira. Pelo contrário: era a mais pura, dolorosa e irreversível verdade.
“Behogár Bradana Vigiawyrm. Comedora de Dragões, Filha do Raio.
Sangue de Anã de seu pai, Mikhail Barbarruna, Comedor de Dragões, Filho do Fogo.
Sangue de Humana de sua mãe, Eleonor de Porto Norte.
Esposa de Rauta Cobresangue, Comedor de Dragões, Filho da Terra*,
Honorável Escudeira e Amiga de Audrey Raines, Patrulheira-Tenente** das Irmãs da Jarreteira da Rainha Eloise I de Carlin***,
Trilhou seu caminho, Combateu o Bom Combate, Morreu em Batalha. Viveu por 25 Passagens Solares****.
Seu Sacrifício será Sempre Lembrado.”
Naquele momento, a existência daquela viajante, ninguém menos que a Patrulheira-Tenente Audrey Raines, era apenas dor e sofrimento. Meses de silêncio e cartas sem resposta estavam ali, diante dela, de forma definitiva e irreversível.
Bradana estava morta. E não havia como remediar isso.
***
Meses antes, no interior da Fortaleza-Império de Kazordoon, começara o Concílio Dracônico, o quinquagésimo sétimo de sua edição. E foi esse Concílio o primeiro que Bradana Vigiawyrm participou enquanto Comedora de Dragões e, efetivamente, mulher em plena idade. O Grão Vizir Ishebad despediu-se da anã com carinho, suas ataduras roçando as mãos da viajante como uma última lembrança do calor escaldante da cidade eterna em meio ao deserto. O calor seco de Ankrahmun, no entanto, foi rapidamente substituído pelo calor da lava e da forja, com a umidade das cavernas demonstrando para Bradana que, enfim, ela estava em casa novamente.
(Narrado por Bradana)
Pela primeira vez na minha vida, me senti estranha em minha própria terra. Devo admitir, sempre soube que não era igual às outras de minha espécie. Fiquei um pouco mais alta que a maioria de minhas amigas; não ganhei tanto corpo, em termos de músculo e gordura, quanto elas, as quais já estariam hoje comprometidas de diversas formas, fossem com suas famílias ou com suas ocupações, mas, provei ser tão forte e tão bonita quanto elas, especialmente aos olhos dos Anões. Ainda assim, aquilo que fazia de mim Humana, como minha pouca tolerância ao calor dos rios de lava de Kazordoon, meus pés de solado delicado e pele mais resistente aos Sois, entregavam minha herança. Mesmo assim, meu pai me fazia sentir amada; como se eu fosse realmente parte, pertencente. Como se eu fosse válida.
Quando meus pés tocaram novamente o mármore que pavimentou a via principal de Kazordoon, senti-me dividida; até aquele dia, quando eu ainda era considerada uma menina, eu me sentia parte, de forma inquestionável, dos Anões. Dessa orgulhosa raça. Raça, não. Nação. Porém, naquele momento, quando vi Rauta vir em minha direção, com sua barba trançada e adornada com aneis, que imitavam pequenos dragões, seus cabelos raspados nas laterais e o feixe de cabelo do mais belo tom de ruivo e ferrugem trançado no topo e solto abaixo da trança principal, trajando uma armadura de escamas de mithril e couro trançado, senti meu coração palpitar de emoção e insegurança de uma só vez.
— E então? — Indagou o ferreiro, com um sorriso de ponta a ponta e um brilho em seu olhar, estendendo a mão direita para mim. — É séria a sua resposta? Você me aceita como marido?
— S-sim! Sim, eu aceito! — Gaguejei em um primeiro momento, tomada por um misto de sentimentos bons e ruins, tomando sua mão junto à minha e percebendo, pela primeira vez, o quão grandes as minhas mãos eram em comparação às de Audrey, por exemplo. — Claro que aceito!
Era genuíno, sim. Sim, eu de fato queria estar com ele; Rauta era um homem sensacional, e gostei dele desde a primeira vez que nos encontramos. E eu queria ter uma família, Anões como ele e como meu pai. Amar minha mãe não foi fácil para paizinho, muito menos lidar com a morte dela. Se for para ter uma família, prefiro que meus filhos sejam Anões e que isso não seja questionado. Antes terem uma avó Humana do que um pai Humano. Ao menos, minha união com Rauta pode me dar uma família. Já Audrey… Não.
— Bradana? — Indagou Rauta, percebendo minha incerteza. — Você realmente quer isso, né? Você quer…
— Quero sim, quero sim! — Repliquei, com a voz um pouco trêmula. — Eu só… Estou com medo. Do Concílio. — Consegui admitir, por fim, um dos motivos da minha inquietude. — Não sei o que esperar.
— Nem eu, se te serve de consolo. — Falou Rauta, sua voz grave sussurrada em um tom mais suave, segurando minha mão com mais delicadeza para me passar mais segurança. — Mas, eu sei de uma coisa. Juntos, a gente dá conta do que der e vier. Confia em mim?
— Confio. Eu confio. — Falei, olhando nos olhos dele e vendo o sorriso aparecer em seu rosto. — Vamos em frente, então.
****
(Narrado por Rauta)
A história da Bradana é de conhecimento da maioria em Kazordoon; ainda tem quem trate a origem dela como rumor, enquanto outros sempre foram agressivos desde que ela nasceu, e o auge disso foi quando a mãe dela ainda vivia. Talvez por isso meu pedido tenha sido tão surpreendente; talvez ela não achasse que um Anão a teria como esposa. Na realidade, não consigo imaginar uma vida em que Bradana não fosse a minha esposa. Bonita, corajosa, habilidosa com arco e besta e ótima companheira de copo e conversa. O que posso dizer? É minha companheira ideal, sem mais!
A cada passo que dava ao seu lado, minha mão entrelaçada à dela, cujo toque delicado, porém forte, eu podia sentir, aumentava minha certeza. Pegamos o vagão rumo ao salão do Concílio, e vimos, pela primeira vez em algum tempo, os trilhos todos lotados. Tentamos, de todas as formas, rotas alternativas pelos caminhos de ferro que atravessam rapidamente a escuridão, mas, sem grande sucesso.
— Vão ter que esperar, me desculpem. — O responsável pela alavanca central do vagão nos avisou, desapontado. — Todas as vias estão cheias, até os vagões suspensos… EI! — Um vagão suspenso passou por nós, pouco acima da cabeça do nosso condutor. — CUIDADO POR ONDE PASSA! BARBEIRO!
O vagão atravessou a escuridão em um assobio, e tive a certeza de ouvir algum resmungo do condutor acima, mas, não pude distinguir o que foi falado. Entretanto, aquele momento serviu para aliviar a tensão que havia tanto em mim quanto em Bradana, e acabamos rindo da situação toda do início ao fim da nossa jornada, para a tristeza de nosso condutor, inconformado com tudo aquilo.
Nosso vagão seguiu o caminho mais extenso, passando por trilhas iluminadas por cristais de muitas cores; no caminho, percebi minha futura esposa mais e mais à vontade com a minha presença, recostando sua cabeça em meu peito, visivelmente relaxada e cansada.
— Em que está pensando? — Perguntei no tom de voz mais suave que pude.
— Nos últimos meses; em meu tempo com os Humanos. — Ela confessou, em um tom triste, eu diria. — Eu… Eu gostei de conhecer o mundo além da montanha, de viajar de barco, ver o céu e os Sois além dos nossos observatórios e de nossas portas solares, mas…
— Mas? — Indaguei, preocupado.
— Acho que eu me enganei. Sobre eles, sobre o mundo. — Sua voz soava à beira das lágrimas. — Eu me senti tratada como… — Ela grunhiu, frustrada, sem saber como explicar o sentimento com o qual ela viveu uma vida inteira. — Foi horrível. Eu vivi coisas bonitas, conheci uma pequena parte de um mundo imenso, mas… Essa parte… Eu não queria passar por isso.
— Eu sinto muito por isso. — Respondi, sentindo a raiva subir um pouco meu tom. — Você não merece passar por isso; ninguém merece passar por isso. Você tá segura aqui, seu lar será sempre essa montanha, ou onde você quiser que a gente more. Nosso refúgio será onde estiverem nossos corações e nossa vontade de vencer. Sempre.
— Rauta, me prometa uma coisa. — A ruiva me abraçou, olhando-me no fundo dos meus olhos, como se quisesse enxergar minha alma através deles. — Nossos filhos nunca passarão pelo que eu passei, e pelo que ainda passarei em vida. Eu amo minha mãe, mas sou uma Anã. No fim do dia, nasci sob essa montanha, fui criada por meu pai em fogo e terra, e fui abraçada pela Irmandade que escolhi. Prometa que nunca deixará que nossos filhos sejam tratados de forma diferente.
— Eu prometo, Bradana Vigiawyrm. — Falei, acolhendo-a em meus braços. — E te digo mais: nossas crianças correrão milhas, igual você, crescerão em meios às lendas e canções de nossa gente e serão abraçados pelas Irmandades que escolherem. Você é uma Anã, Bradana. Eu sou um Anão. E nossos filhos também serão.
Nosso abraço selou nossa promessa, e logo escutamos o som dos freios de ferro de nosso vagão, indicando que havíamos finalmente chegado ao nosso destino. Saí do vagão primeiro e estendi a mão para Bradana, ajudando-a a sair do veículo. Estávamos diante de um grande portão azul cobalto, com cristais luminosos incrustados. Dois Anões bem corpulentos e protegidos dos pés à cabeça impediam nossa passagem, machados cruzados à frente da porta.
— Boa noite. — Um deles falou, olhando fixamente para mim. — Irmãos em Escamas?
— Sim. — Falei, removendo minha barba do caminho de minha tatuagem, que estava no lado direito do meu pescoço. — Rauta Cobresangue e minha noiva Bradana Vigiawyrm. — Bradana exibiu orgulhosamente a tatuagem em seu ombro, para a satisfação dos dois vigias.
— Excelente. — O segundo falou, com a voz mais esganiçada, descruzando o machado. — Bem vindos ao Concílio. Que o Grande Ancião esteja com vocês, irmãos em escamas.
Os vigias abriram os portões, e nos despedimos deles com uma reverência. Quando entramos, vimos cerca de trezentos Anões e Anãs de tamanhos e idades diversas, divididos em três andares de arquibancadas; éramos os últimos a chegar, e nos apressamos para encontrar um local para sentarmos. No centro do salão, estava o Imperador Kruzak. Seus olhos verdes eram imponentes na mesma medida em que exibiam o cansaço da incerteza; seus cabelos já eram prateados, prova das décadas que já vivera e que ainda teria por viver. Entretanto, seu corpo ainda era forte, cujo porte era admirado até por homens mais jovens, como eu. Havia força em Kruzak, e contávamos com ela para seguirmos firmes sob a montanha; mas, naquela hora de necessidade, nosso Imperador contava conosco para lidar com seu pior pesadelo: o sumiço do príncipe herdeiro Ardabag.
— Estou cansado desses rodeios! — Esbravejou o Imperador, claramente descontente. — O que vocês são, afinal? Elfos baixinhos?! Só se for!
— Mas, Alteza… — Um de seus atendentes começou, receoso.
— Silêncio! — Bradou Kruzak, impaciente. — As Opiniões! Eu quero ouvir! E dessa vez, quero algo coerente, e não fantasias de Pixies sussurradas em seus ouvidos! Cinco Opiniões já foram recusadas, tamanho o absurdo que propuseram! Preciso de ações! PARA ONTEM!
— Sendo assim… — A voz do Grão-Mestre, um homem de cabelos negros, pele retinta e olhos dourados, fez-se ouvir e ecoar pelo salão, seu olhar buscando pelo inconfundível brilho de moedas de latão, até encontrar uma em específico. — Mikhail Barbarruna, você tem a palavra!
Vi meu futuro sogro levantar-se de seu assento com orgulho; ele estava com uma armadura de escamas em tons vermelho e preto, como se estivesse pronto para entrar em combate ali mesmo. Seu olhar encontrou tanto o meu quanto o de Bradana, e ele nos cumprimentou com um discreto aceno de cabeça antes de fazer sua proposta.
— Minha Opinião é simples, senhores: precisamos conter as áreas de acesso do Basilisco! — Bradou Barbarruna, em um tom firme. — Podemos levar cinquenta, cem, duzentos dos nossos melhores homens até ele, mas, se não descobrirmos quantos túneis a fera abriu e quantos deles podemos fechar, nenhum homem retornará para contar a história! Para termos êxito no resgate ao Príncipe Ardabag, precisamos fazer essa missão em etapas! — Mikhail limpou sua garganta, tomando um gole de água antes de continuar. — Primeiro, precisamos de dez batedores, dentre eles dois Geomantes, para estudar os últimos locais por onde o Basilisco foi visto; esses mesmos batedores estudarão quais os túneis mais frágeis: esses serão derrubados e selados por meios mágicos, com nossos Geomantes! Em seguida, levaremos uma comissão dos cinquenta Comedores de Dragões mais habilidosos, todos carregando escudos de bronze escovado, e isso é importante.
Mikhail Barbarruna interrompeu brevemente seu discurso ao ver outra moeda de latão levantada; o honrado pai de Bradana voltou seu olhar para o Grão-Mestre, que autorizou a fala da mulher que levantou sua moeda.
— Isolda Quebraossos, fale. — Pediu o Grão-Mestre.
— Primeiramente, excelente plano. — Falou a mulher trajando armadura de escamas em tons roxo e azul, com o cabelo e barba loiras em tom de palha queimada já sendo atravessado por mechas prateadas, denunciando sua chegada à meia idade. — Pergunto-me para a necessidade de bronze escovado, já que isso enfraquece os escudos. Qual o motivo?
— A ideia é usar a maior arma do Basilisco contra ele mesmo. — Replicou Mikhail sabiamente. — Antes de nos devorar ou envenenar com o mínimo rasgo de suas presas, o Basilisco transforma em pedra todo aquele que olha diretamente em seus olhos. O bronze escovado nada mais é que um espelho; se forçarmos o Basilisco a ver sua própria imagem, temos a chance de pará-lo em definitivo.
— Chance, você diz. Não é uma certeza. — Comentou Isolda em um tom severo.
— Eu não posso dar certeza de algo que não foi feito ainda. — Respondeu Mikhail com cautela. — É um plano arriscado; eu posso estar errado, por exemplo, e selar os túneis inapropriados, tornando a nossa movimentação impossível. Talvez os espelhos não funcionem: ninguém que se aventurou perto do Basilisco voltou para contar a história. — Ele pigarreou, tomando novamente outro gole de água para recuperar o fôlego. — No entanto, estou confiante que é nossa melhor alternativa. Por muito tempo, nossos ancestrais ignoraram o Basilisco, buscando construir nossas ruas e nossos trilhos o mais distante de seus caminhos. Eu estou propondo algo ainda mais impensado: eliminar o que nossos ancestrais tiveram de mais próximo de um deus. Entende o peso disso, irmã em escamas? — Ele voltou seu olhar para todos na sala, elevando seu tom de voz. — Todos vocês entendem o peso disso? Estamos discutindo matar um deus nesse salão!
— Um deus que segura a próxima geração em suas presas. — A voz trovejante do Imperador fez-se ouvir. Para minha surpresa, sua voz soava mais jovem que seu corpo, mais grave que a minha própria, porém com a maturidade de um homem que já vivera cento e cinquenta anos. — Alguns diriam que é um mau presságio.
— E é por isso, Imperador, que devemos tratar com o máximo de cuidado. — Replicou Mikhail, confiante. — Se minha Opinião for Votada, teremos um plano seguro e preciso; os acessos imediatos à cidade serão fechados, e o Basilisco será confinado à sua caverna principal, onde poderemos abatê-lo e resgatar o príncipe ainda com vida! Cada segundo conta!
— Algo a acrescentar, irmão em escamas? — O Grão-Mestre indagou, percebendo a pausa nas palavras do Anão.
— Não. — Replicou Mikhail, com a cabeça erguida. — Estou confiante em minha Opinião. Cabe aos meus irmãos e minhas irmãs em escamas expressar suas vozes, e espero tê-los convencido.
— Cinco opiniões… — Murmurou Bradana, preocupada, ao pé do meu ouvido. — Chegamos muito atrasados!
— Talvez tenha sido melhor assim, querida. — Murmurei de volta, segurando sua mão. — Não conhecemos todos, e darmos nossa palavra sem saber, bom… Poderia ser ruim.
— Irmãos em Escamas! — A voz do Grão-Mestre ecoou novamente, suas mãos erguidas acima de sua cabeça em um pedido de atenção. — Pela autoridade que tenho, eu, Grão-Mestre Turov Espinhoscama, autorizo suas vozes! Quero ouvir os Vetos!
— Os Vetos? — Indagou Bradana, em voz baixa, assustada. — Ele quer as negativas primeiro?!
— É o costume. — Repliquei em voz baixa, indicando algumas pessoas na multidão. — O “não” é, infelizmente, mais fácil e verdadeiro que o “sim”. Dependendo da quantidade, talvez nem seja necessário ouvir os Votos.
— Ah não… — Murmurou a ruiva, preocupada.
As moedas de cobre logo surgiram na penumbra, totalizando vinte das trezentas possíveis; Mikhail sorriu ao ver que Isolda não estava entre tais vozes, mas sim entre aqueles que urraram de alegria diante da possibilidade de obter glória, renome e reconhecimento aos olhos de seu Imperador.
— Com essa quantidade, não será necessário ouvir os Votos: a Opinião de Mikhail Barbarruna é o Voto dos Comedores de Dragões, e será a nossa voz! Daremos um breve recesso para escolher os valentes homens e mulheres de Durin***** que levarão essa missão até o fim!
Continua…
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(*)Filho da Terra: Comedores de Dragão que escolheram o ovo verde, que representa Dragões Comuns e Hidras.
(**)Patrulheira-Tenente: Terceira maior patente da Ordem das Irmãs da Jarreteira da Rainha; posto concedido apenas pelas Rainhas Reinantes de Carlin.
(***)Irmãs da Jarreteira da Rainha: alusão à Ordem da Jarreteira da Inglaterra da vida real, trata-se de uma ordem bélica e religiosa de cavalaria. No caso, os títulos e as obrigações de guerra são dadas às mulheres de Carlin, enquanto os títulos humanitários e diplomáticos são dados aos homens.
(****)Passagem Solar: a forma dos Anões de contabilizar aniversários. Dessa forma, fica estabelecido que Bradana morreu com 25 anos.
(*****) Homens e Mulheres de Durin: Os Anões em Tibia são uma homenagem direta ao Povo de Durin do Legendarium de Tolkien; portanto, nesse universo, Durin também existiu como o primeiro Anão e responsável pela criação e nascimento dos demais Anões, e é reverenciado como uma figura mítica.
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O Inverno chegou, e eu prometi machucar KKKKKKKKK daqui pra frente é só pra baixo, família!
E aí... O que acham que aconteceu? Quem foi responsável por isso?
Aguardo o feedback!
Forte abraço,
Iridium.
Saudações!
Espero pegar mais ritmo agora, para poder seguir com o arco mais pesado e intenso da narrativa; confesso que eu estou surpresa que a história está caminhando para o fim, tantos anos após abandoná-la. A quem possa interessar, eu farei, sim, uma versão em quadrinhos de Behogár Bradana para postar online, tanto em meu site oficial quanto outros locais web afora kkkkk
Alguns eventos serão alterados, principalmente levando em consideração todos os feedbacks que recebi até hoje (e os que receberei até o final da história), bem como outras questões do worldbuilding. Mas, sem maiores delongas, vamos às Respostas aos Comentários!
Spoiler: Respostas aos Comentários
Sem maiores delongas, o Capítulo de Hoje!
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Spoiler: Bônus Musical
Capítulo Dois — Quem foi?
Quem, ou quê, matou Behogár Bradana Vigiawyrm?
Tempo presente.
Audrey jogou sua cabeça para trás, seus olhos semicerrados por fim aceitando a realidade.
— Quem foi? — Indagou ela, com a voz vazia, receosa de voltar seus olhares para a lápide, tão definitiva em seu testamento. — Quem fez isso?
— É o que eu gostaria de saber, também. É tudo o que eu queria saber.
A paladina ruiva virou lentamente seu rosto em direção à voz, encontrando um Anão robusto, cuja barba negra já estava atravessada por muitas mechas grisalhas. Seu nariz era grande, típico da estrutura facial dos anões, com dorso e narinas largas, como se ocupasse quase um terço do rosto do homem. Seus olhos eram azuis, brilhantes como água das nascentes montanhesas. “Do mesmíssimo tom dos olhos dela”, Audrey pensou, “mas, não possuem o mesmo carinho.” O homem trajava uma armadura que, a despeito de bem cuidada, entregava os sinais de uso em muitas, muitas batalhas; uma armadura de escamas em tons vermelho e preto, feita em metal e couro trançado, tal qual um dragão em menor escala. Seu corpo estava protegido do frio por uma capa carmesim com pele de logo cinzenta ao redor de seus ombros, deixando-o ainda mais imponente do que se apresentava. Apesar da velhice, Audrey Raines sabia que estava diante de um veterano de sua espécie, e que deveria tratá-lo como tal.
— Você é…? — Indagou Audrey, com a pouca força que ainda tinha para trivialidades.
— Mikhail Barbarruna. Comedor de Dragões, Filho do Fogo. — Replicou o homem, cortês, porém áspero pelo pesar que partilhava com a estranha. — Pai de Bradana. E você é? — Discretamente, a mão do Anão já estava posicionada próximo ao cabo de seu machado de arremesso, oculto pela capa que usava.
— Raines. Audrey Raines. — Respondeu a moça, o luto sugando a pouca convicção que ainda tinha.
— Ah. — Replicou Mikhail em um tom seco de desaprovação. — A Humana. Melhor dizendo, Patrulheira-Tenente das Irmãs da Jarreteira. — Sua postura relaxou discretamente, ainda que seu semblante traísse o quão indesejada era a presença de Raines por ali. — O que veio fazer aqui?
— Eu… — Audrey gaguejou, lábios tremendo em meio à dor que sentia. — Eu vim… Por ela… — O engasgo em sua voz veio seguido do choro. — Eu não sabia… Eu achei que… Esperava que fosse mentira. Tinha que ser mentira, mas não é, não é! —Suas mãos passaram por seus cabelos em meio a um suspiro tremido, buscando uma calma que era incapaz de ter naquele momento. — Eu a amava, eu a amei, eu a amo ainda assim! O que aconteceu?! Como isso pode acontecer?!
Mikhail, deixando suas ações falarem mais alto que suas palavras, acolheu a Humana em um paternal e triste abraço. Em meio aos solavancos enlutados do corpo de Audrey, o Anão ajudou-a a se levantar e, passo a passo, levou-a em direção à cidade, a fim de contar à Patrulheira-Tenente os sombrios acontecimentos que levaram à perda de sua única e tão amada filha.
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(Narrado por Mikhail Barbarruna)
A taverna de Tezilla, assim como eu, vira dias melhores; poucos eram os Anões e Anãs a frequentar o estabelecimento naquele inverno, mais rigoroso que o esperado… Rigoroso como naquele dia, naquele tempo, naquele maldito Concílio… E em tudo que veio depois. A garota, cuja altura passava de uns quinze centímetros da minha, parecia miúda em meio à sua dor. Porém, se era questão de confessar, eu não era capaz de ter muita empatia para com ela. Até porque…
— Você tem culpa nisso. — Falei, sem rodeios, segurando meu copo de cerveja com mais firmeza do que gostaria, com o olhar fixo em Raines.
— Que?! — Indagou a garota, cuja ofensa parecia estar trazendo-a de volta aos vivos. Ótimo. — Como que eu tenho culpa disso?!
— Seis anos. — Respondi após dar um gole na cerveja, o líquido descendo, pela primeira vez em muito tempo, amargo em minha garganta. — Seis anos desde que vocês se conheceram. Três meses desde que você sumiu do mapa. — A última frase saiu com mais raiva do que eu queria transparecer.
— “Sumiu do mapa”?! — A garota começou a esbravejar, ultrajada. — Eu não sumi do mapa!
— Não, não mesmo. — Respondi, ríspido, aproveitando a oportunidade que esperei por anos. — Você voltou para o seu lugar, não é? Para o seu casamento. Para o seu marido.
— Eu… — A moça arregalou os olhos, seu gaguejar soando como se tivesse levado uma facada nas costas. Quem me dera ter feito isso, de verdade.
— Sabe, minha filha, que é… Era o raio de luz da minha vida, tinha muita coisa pela frente ainda, entende? — A cerveja desceu insípida pela minha garganta, o que piorava ainda mais o meu sentimento. — Ela também tinha o casamento dela, o marido dela, o amor dela. A família dela. E eu me pergunto, até hoje, o porquê de vocês quererem destruir isso. O que vocês ganhariam com isso?
— Eu não queria… Nunca quis… Eu não quis destruir nada! — Bradou a moça após finalmente beber da cerveja que paguei. — Foi um acidente… Eu não escolhi isso!
— Ninguém escolhe nascer como nasce. — Repliquei, austero. — Mas, você escolhe, sim, como agir diante disso. — Minha segunda frase calou a moça, cujos ombros eu vi cair em derrota. — Você já tinha o seu caminho. A sua família. O seu marido. Por que diabos você foi atrás dela? Por que tentou arruinar o casamento da minha filha? Você sabe o quão difícil foi para ela? Nem Humana, nem Anã, sempre no meio do caminho, sempre incerta… Sempre insegura.
— Sua filha, Bradana, era muito valente… — Moça balbuciou, em um misto de tristeza e doce lembrança do amor que um dia vivera.
— Valente ela era, e valente ela morreu. — Respondi, bebendo o último gole da minha cerveja.
— Acho que foi isso o que mais me atraiu nela. A valentia que ela tinha. — Confessou Audrey, com um sorriso triste e um semicerrar de olhos, viajando em suas lembranças — Eu sempre soube que gostava de mulheres desde nova, mas, eu tinha aceitado que nunca poderia estar com uma. Eu tinha feito as pazes com isso, inclusive. — Ela soltou uma risada baixa, leve, ao ser carregada por suas lembranças. — Conheci Szczeisny quando eu era apenas uma Batedora, bem antes da faixa das Irmãs da Jarreteira ser uma realidade para mim. Quando isso era ainda um sonho distante. Eu estava no vilarejo dele, a mando de Sua Majestade, Rainha Eloise, para garantir a segurança dos Norsir.
— Para reprimir uma rebelião, eu suponho. — Repliquei, totalmente familiarizado com esse discurso. — Todo mundo sabe o que vocês fazem com as suas… “Colônias”.
— Sim. — Pigarreou a moça, com um sorriso breve de quem percebeu que poderia falar livremente. — O irmão dele, Piotr, foi pego junto a um carregamento de Hidromel. Bebidas são proibidas pela lei Carliana, e todas as… Colônias devem obedecer. — A palavra “colônia” saiu, talvez, com um tom mais debochado do que deveria, dadas as circunstâncias. — O rapazinho teria que ser punido, entenda.
— E qual era a punição? — Indaguei, curioso, pedindo mais uma rodada para nós dois.
— Açoite. — A Paladina respondeu, de forma quase casual, com uma pontada de tristeza e remorso. — Trinta açoites para contrabando, e mais vinte por ser Hidromel.
— Por ser a bebida dos Norsir, feita bem antes de vocês chegarem e dizerem que mandam. — Comentei, com um corte rápido no assunto.
— É. Sim, é certo. — Respondeu a moça, depois de uma pausa, levemente ofendida e começando a sentir os efeitos do álcool em seu corpo. — Mas, imagine que era um rapazinho que, se tivesse oito anos, era muito. E aí, foi quando eu o vi. Szczeisny. Tínhamos dezessete anos, nós dois, e ele estava começando a ter mais carne nos ossos. — Ela mexeu o copo de cerveja delicadamente, em movimento circular, perdida em suas memórias. — Ele se ofereceu para ser açoitado no lugar do irmão, e minha superior aceitou, na época. Eu tive que segurar o irmão dele enquanto minhas superioras o açoitaram e depois queimaram o carregamento todo da bebida doce.
— Queimaram mesmo? — Arregalei os olhos, surpreso. — Eu achava que vocês…
— Revendiam o produto? Não. — Replicou Audrey depois de um grande gole. — Nossa Rainha é bem literal com seus decretos. Se não é para ser feito, é para ser destruído, simples assim. Mas, voltando ao açoite… Minha superiora, na verdade, aplicou o triplo da punição para ele, pois meu futuro marido se recusava a gritar ou até mesmo gemer de dor, e isso foi uma humilhação para ela. Ora, uma oficial de Carlin não ser capaz de quebrar o espírito de um Norsir, fazê-lo temer e obedecer? — Um risinho debochado veio da ruiva. — Não, isso não podia…
— Deixa eu adivinhar: ela duplicou a punição? — Indaguei, nada surpreso em confirmar os rumores sobre a brutalidade carliana em seu trato colonial.
— Triplicou. Lógico. Malvera Rosaespinho, a Capitã de Patrulha* de Hrodmir, recuar? Jamais. Ela queria ver o olhar do meu futuro marido, tão desafiador, voltado ao chão em submissão. — Replicou Audrey, para meu espanto e nojo. — Cento e cinquenta açoites no total, e ele aguentou bravamente… E desmaiou na última. — Seus olhos marejaram, e eu não soube dizer se eram de tristeza ou nostalgia. — Depois que a comitiva da Malvera saiu, bem, eu esperei um pouco e tirei o Szczeisny e o irmão dele de lá, e o levei até um dos casebres dos seithmadur locais. O resto, bom… É história para outra ocasião. Mas, basta dizer que foi naquele momento que eu me apaixonei por ele, pela bravura e valentia dele. Pela proteção que ele deu ao irmão. E por tudo que veio depois.
Uma das atendentes da taverna nos entregou nossa refeição: pães, queijos, fatias generosas de carne e mais cerveja. Provavelmente, seria nossa hora de deixar o estabelecimento, algo que eu preferiria momentos atrás, não fosse o fato de me sentir cada vez mais interessado em conhecer a moça que, por tanto tempo, foi parte do coração e da vida de minha finada filha.
— Entendo… — Murmurei, rasgando um pedaço do pão em meu prato e colocando alguns dos recheios nele. — Como você soube da… Morte da minha filha?
— Eu estava em uma expedição em Darashia quando… Recebi a carta. — Replicou Audrey, com uma lágrima tímida escorrendo por seu rosto. — Depois de meses sem notícias.
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Cinco anos antes.
(Narrado por Bradana Vigiawyrm)
A marcha apressada de meus irmãos de Irmandade ecoaram pelos salões reservados aos Comedores de Dragões; a trombeta de combate ecoou pelos corredores de pedra, o som emanado do chifre oco do que outrora fora um grande carneiro acelerando nosso passo em direção aos arsenais. Ali, os veteranos Isaac e Asimov atendiam todos os bravos homens e mulheres que estavam escalados para dar suas vidas para a primeira etapa da derrota do Basilisco.
“Estamos discutindo como matar um deus nessa sala”, foram as palavras de meu destemido pai, o qual eu via, pela primeira vez desde que conseguia me lembrar, com o corpo completamente coberto por sua armadura. Naquele momento, eu não via mais meu gentil pai, cuja risada era capaz de mover seu corpo inteiro, cujo abraço era capaz de curar todas as dores de meu coração ou cujas histórias me levavam ao Reino dos Sonhos de forma rápida e segura, fazendo do meu sono tão tranquilo. Não; ali, eu vi um marceneiro trocar suas ferramentas por armas; ele trocou sua mesa de trabalho por um enorme escudo de bronze escovado, por uma armadura de couro trançado e correntes de mithril. Sua cabeça agora estava protegida por um elmo de mithril e ferro, suas mãos estavam vestidas por uma manopla de escamas de ferro cobreado, e seu martelo e cinzel foram trocados por um machado de batalha pesado e muito afiado.
Asimov e Dragomira, sua filha, me ajudaram a vestir minha nova armadura: uma peça de couro trançado em tom púrpura e com correntes de ferro negro para meu tronco, calças de couro com caneleiras e joelheiras de mithril, luvas de couro para aguentar a tração das cordas dos arcos, um elmo de ferro negro e mithril para proteger minha cabeça, um broquel com uma adaga oculta e um arco feito de bétula com roldanas, para aumentar a tração das cordas** e uma aljava com dez setas explosivas, dez setas farpadas e cinquenta comuns, com as pontas feitas em diamante maciço e afiado.
Na medida em que os demais recebiam seus equipamentos e eram atendidos de forma eficiente e diligente pelos responsáveis pelo arsenal, o Imperador Kruzak designava o destacamento de patrulheiros a dedo.
— Meus Geomantes de maior confiança, Karpov do Rochedo Escuro e Karachev Brilharruna, serão representantes de minha voz e vontade, para que essa missão aconteça como planejado. — A voz do Imperador retumbava pelo salão. — Infelizmente, disseram que estou muito velho para o combate direto, então devo permanecer aqui. — Sua voz traía a decepção, típica de um homem idoso que recusa-se a aceitar o fardo e a bênção de envelhecer. — Com eles, eu quero Isolda Quebraossos, Rauta Cobressangue, Outoja, Morpheus Marteloverde, Sombra, Tura Tezilla, Marcus Mais-Veloz-que-a Morte e… Bradana Vigiawyrm.
Senti meu coração acelerar e um grande sorriso se formar em meu rosto; eu e meu noivo teríamos, juntos, a chance de provar nosso valor diante do Imperador! Ah, se Audrey pudesse ver isso… Ela ficaria orgulhosa de mim. O novo soar de trombetas, confirmando a decisão do imperador, ecoou pelos corredores de pedra uma vez mais, e nosso destacamento partiu, deixando a segurança das paredes e da alvenaria de Kazordoon rumo em direção aos túneis ao redor da cidade, buscando rastros do Basilisco.
Dos salões da Irmandade dos Comedores de Dragões, fomos à estação principal dos vagões da cidade, a fim de investigarmos o rastejar mais recente do Basilisco. Um dos condutores, um jovem rapaz loiro de olhos dourados, separou nossa comitiva em duplas e guiou os vagões túnel adentro em direção à área externa à cidade-fortaleza.
O caminho foi estranhamente silencioso, com exceção dos momentos em que Karpov e Karachev entoavam encantamentos para as pedras e a terra ao nosso redor; nessas ocasiões, era possível ver veios brilhantes em meio à rocha, e podíamos, de forma constante e baixa, o pulsar dos veios, como se fosse o coração do Grande Ancião batendo em uma frequência que apenas Anões conseguem ouvir. Durante as pausas de tal ritual, Karpov e Karachev cochichavam algo entre si e instruíam o condutor a seguir pelo caminho sussurrado pelas pedras.
Aquela área era estranhamente fria e seca, o que tornava a respiração áspera e difícil; percebi, pela primeira vez em anos, o quão calorosa era Kazordoon, com seus rios e aquedutos de lava fornecendo energia e conforto para todos nós. Entendi, então, o porquê de meu pai não deixar que eu me aventurasse para longe dos muros da cidade e pude encarar a realidade do perigo em que eu estava — ao mesmo tempo que estava exultante com a possibilidade de começar minha lenda enfrentando o Basilisco. Era tudo o que eu queria, talvez fosse meu maior sonho. Eu deveria ter tido mais cuidado com o que eu desejei para mim mesma.
— Bom… É o máximo que consigo levá-los, senhores e senhoras. — Falou o condutor, com a voz jovem e trêmula — Meu nome é Anatoly, foi um prazer guiá-los. — O rapaz fazia o seu melhor para conter uma leve gagueira, bem como o tremor em suas mãos. — A Irmandade já cuidou de meu pagamento, então, em nome de Kazordoon… Boa sorte. Que o Fogo e a Terra lhes tragam proteção e vitória! Eu… Eu vou voltar, sim?
O condutor nos deixou no final do trilho que levava ao Navio à Vapor, onde encontramos, assim que nossos pés tocaram a terra, o rastro de escamas e pele ressecada. Naquele momento, olhei para trás, e ouvi o som dos vagões refazendo seu caminho pelos trilhos, e senti meu coração bater mais forte em meu peito; não havia mais volta, pelo menos não naquele instante.
— Tadinho do rapaz… — Murmurou Isolda, estalando a língua. — Mais nervoso que ratazana em um bueiro, heh…
— Sim, bem nervoso… — Comentei, com um riso que disfarçava meu nervosismo. Minha atenção logo voltou-se para os dois Geomantes, entretidos em uma aparente discussão.
Engoli em seco; Karpov abaixou, tocando o solo com suas mãos nuas e calejadas, recitando um encantamento em uma versão tão antiga de nossa língua que eu era incapaz de compreender. Karachev, o outro Geomante, abaixou-se perto de seu colega, usando seu cajado de apoio.
— Tem certeza disso? — Indagou Karachev, olhando ao redor. — Podem ser escamas de outras criaturas; dizem que há Perfuradores*** por essas partes, talvez…
E então, a terra tremeu; os olhos verdes de Karpov se arregalaram quando as escamas ressecadas tremularam com seu feitiço, ganhando nova vida e assumindo a forma etérea de uma serpente, a qual lançou-se furiosamente contra o chão aos nossos pés, rompendo, para nosso horror, a camada de terra que nos mantinha firmes e seguros, revelando um vão de escuridão e incerteza logo abaixo. Nossa vozes ecoaram em involuntários gritos de horror, nossos corpos em queda livre rumo ao desconhecido; entretanto, logo fomos amparados pelo chão de pedra lisa, escorregadia e com mais escamas. Ao invés de estarmos em queda livre, estávamos deslizando por um sistema de túneis completamente desconhecido, os quais não haviam sido feitos pelas mãos dos filhos de Durin— mas sim pelo rastejar do corpo do Basilisco.
— AAAAAAAHHHH!!! — Gritaram Morpheus, Tura, Outoja e Sombra, deslizando túnel abaixo sem muito controle.
— OS ESCUDOS! — Bradou Isolda, jogando seu corpo por cima do bronze escovado, tirando seu braço dos ferrolhos. — USEM OS ESCUDOS!
— E QUEM NÃO TEM ESCUDO?! — Gritei, percebendo o quão pequeno era o broquel.
— BRADANA! SEGURA MINHA MÃO! — Rauta esticou seu braço o máximo que pôde, tentando me alcançar.
Karpov e Karachev também deslizavam sem muito controle, tentando, em vão, encostar os cajados no chão para seus encantamentos surtirem algum efeito. Os que possuíam escudos grandes conseguiram, com algum esforço, apoiar seus corpos neles, apenas para deslizarem com maior velocidade rumo às aberturas ao final do túnel, cada um encontrando uma direção diferente.
— EU NÃO CONSIGO… AAAAAAAAH!!!
Tentei, bravamente, encontrar as mãos de meu marido, apenas para ouvir a voz de algum dos Geomantes entoar algum feitiço e bater o cajado contra o solo. Infelizmente para mim, o resultado foi eu ser arremessada para longe do destacamento, para um túnel cujo destino parecia ser apenas meu para enfrentar.
— BRADANA! NÃÃÃÃÃÃÃOOOOO!!! BRADANAAAAAA!!! — A voz de meu noivo soava mais e mais distante, em uma velocidade rápida demais para mim.
— GEOMANTES! VOLTEM! AJUDEM! — Ouvi, ao longe, a voz exasperada de Isolda, até não ouvir mais nada.
— Agora, será você e ele. Boa sorte. — Eu reconheci, para o meu horror, essa voz, antes de tudo ao meu redor ficar escuro e frio.
Eu estava em um túnel escorregadio, frio e com algum muco recobrindo suas paredes; o final daquele túnel me levou a cair em algo semelhante a um monte de ossos e palhas secas e com sujeira petrificada. Em minha queda, acabei por gritar de dor… E me calei no instante em que percebi ter caído em cima de um cemitério esquecido — e petrificado.
— Ah, não. — Murmurei o mais baixo que pude, paralisada pelo medo ao perceber as órbitas vazias da caveira centenária de um anão olhando-me no fundo dos meus olhos, como se me convidasse a passar pelo mesmo tormento que ele. — Não, não, não, não, não, não…
Eu estava diante da consequência do meu maior sonho, do meu desejo prestes a ser atendido; eu estava no covil do Basilisco, não havia dúvidas quanto a isso. Porém, eu não tinha um escudo de bronze escovado comigo, metade das minhas flechas quebraram antes mesmo de eu poder usá-las e eu ainda precisava armar a corda em meu arco.
Eu estava prestes a enfrentar o Basilisco. Eu estava a um passo da glória.
Porém, eu estava sozinha.
Eu estava desorientada.
Despreparada.
Sozinha.
A um passo da minha morte.
Continua…
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(*) Capitã da Patrulha: Patente intermediária no oficialato militar do Reino de Carlin.
(**) Descrição de um Arco Composto moderno adaptado para fantasia.
(***) Perfuradores: Drillworms.
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A coisa ficou feia pro lado dos Anões, principalmente da menina Bradana. Infelizmente, sabemos o endgame de Behogár Bradana Vigiawyrm, mas, a pergunta que não quer calar e que é o título do Capítulo: Quem, ou o quê, matou Bradana Vigiawyrm?
Aguardo os palpites :D :D :D :D
Até o próximo capítulo, a Estação está chegando na metade!
Forte abraço,
Iridium.
Outono - capítulo cinco e Inverno - prólogo
Spoiler: Comentários
Saudações!
Olha... Nem sei o que dizer. Estou de cara que, não apenas eu retomei essa história, como estou prestes a terminar o arco do Inverno aqui hahahaha
Estou feliz demais em estar de volta, e mais feliz ainda pela possibilidade de completar essa história! Queria agradecer, novamente, a todos que já comentaram aqui algum dia, e àqueles que voltaram para o fórum para comentar e dar mais uma chance a essa narrativa!
Bom, antes de mais nada, vamos às Respostas aos Comentários:
Spoiler: Respostas aos Comentários
Sem maiores delongas, vamos ao Capítulo de hoje!
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Spoiler: Bônus Musical
Capítulo Três — Triste Espelho Meu
Velejando nos Confins do Mundo, se a Eternidade falhar…
Tempo presente.
Longe de Kazordoon, do diálogo e do luto compartilhado entre Audrey e Mikhail, outro sofria do mesmo mal da dupla desafortunada, e quiçá sofresse mais que ambos juntos. Seu luto e sua raiva o levaram a uma jornada diferente, entretanto, afastando-o de sua terra natal e da segurança das montanhas. Sua morada não era mais sob a terra, longe do calor dos sois e do brilho das estrelas; agora, ele estava constantemente exposto ao brilho das estrelas, ainda que isso não mais o fascinasse. O chão ao seus pés não era mais o mesmo, outrora feito de terra e mármore; agora, ele caminhava por tábuas de madeira, em uma superfície que se movia à vontade e ao sabor do vento e das ondas. O Anão trocara sua bigorna e seu martelo por cordas, dobrões, uma bússola e a vida no mar. Entretanto, aquilo tudo tinha uma razão de ser, a qual estava em sua mente, gravada em ferro e lava, há cinco anos, ainda que isso o forçasse a dividir espaço com uma tripulação diversa, contando com humanos… E elfos.
O homem olhava para a bússola em suas mãos; a direção sudoeste era o que buscavam, e era nela que estavam. Ele guardou o objeto de latão escovado em um bolso interno de seu sobretudo; agora, usava um sobretudo por cima dos trajes, a fim de aguentar as intempéries causadas pelas eternas lágrimas de Bastesh, A Que Chorava nas Profundezas*. Trocou a bússola pelo sextante, a fim de avaliar se ainda estavam em rota. Os cliques do mecanismo eram audíveis apenas para ele, a ponto de que aquela tarefa já lhe era tão natural quanto a forja um dia fora.
— Cobresangue! — A voz retumbante e grave do contramestre ecoou pelo navio, sendo ele, curiosamente, um elfo de pele cor de granito, mais corpulento e musculoso que o esperado para a espécie, olhos da cor e do brilho do mais puro cobalto, cabelos brancos como a neve que começava a cair dos céus, com vestes mais folgadas para facilitar seus movimentos, prezando muito mais pelo conforto e praticidade do que a aparência que sua gente tanto valorizava. — Ajeite as cordas e desça para os canhões! Aqueles cães Thaianos ainda estão ao alcance! Mexa-se!
O contramestre forçou, com sua voz, o retorno de Rauta Cobresangue à realidade; o Anão rapidamente guardou seu sextante e pôs-se a trabalhar; amarrou as caixas e caixotes aos mastros e nos ganchos de segurança, executando, com rapidez, os melhores nós de marinheiro que poderia. Desceu as escadarias com o máximo de agilidade que dispunha, seus companheiros Humanos passando por ele com a mesma destreza, alguns já com garruchas e espadas em mãos, prontos para um possível combate se os canhões falhassem. O Anão ruivo parou próximo ao primeiro dos canhões daquele navio, logo abaixo do convés, que dispunha de um total de doze peças de artilharia. Ao seu lado, havia um ser ainda mais baixinho e determinado que ele: um Gnomo, que mal deveria ser um adulto para os seus iguais. Seu nome? Gnomaresia, cujos olhos eram da cor da espuma do mar quando encontrava a areia em terra firme, com a pele já bronzeada pelo tempo de serviço no mar, sendo um rapaz bem sardento e muito, muito sorridente.
— É hoje, né?! — Indagou Gnomaresia, tentando manter o equilíbrio enquanto preparava seu canhão. — É hoje que você se vinga?
— Não, ainda não. — Replicou Rauta, arrumando sua artilharia com a calma e precisão de alguém já habituado àquele serviço. — Mas, eu estou perto. Muito perto.
— Você acha mesmo que eles deram abrigo a ele? — Indagou o jovem Gnomo, forrando o canhão com o tecido e a pólvora antes de colocar a munição.
— Não só deram abrigo, como acreditaram nas mentiras dele. — Replicou Rauta, sentindo o amargor e a fúria acelerando seu coração. — O pior de tudo foi saber que ele estava planejando aquilo a muito tempo, e que minha esposa… Qualquer um teria morrido no lugar dela. Poderia ter sido qualquer outro, mas ela… Ela foi mais valente que todos. Inclusive eu.
****
Cinco anos atrás.
(Narrado por Bradana)
Meu coração batia tão forte que ouvia o som ecoando pelas paredes de pedra do túnel desconhecido e abandonado. Arrastei-me para longe da pilha de ossos, horrorizada; eu estava só, e sem a possibilidade de voltar por onde eu havia chegado; aquele túnel era liso demais e, sem as ferramentas certas para escalar, não havia possibilidade nenhuma de galgar as paredes e refazer meu caminho.
Minha respiração estava pesada, tamanho era meu pavor; o chão estava coberto com pedaços de escamas e peles, ossadas limpas e equipamentos abandonados. Acendi uma tocha, a fim de enxergar meu caminho à frente, e dei de cara com duas entradas para novos túneis. Meu arco ainda estava inteiro e as roldanas, funcionais; eu poderia, assim que precisasse, armar a corda; meu broquel estava arranhado, mas, nada que impedisse seu funcionamento, e a adaga ainda estava dentro dele.
— Então… Estou no começo da caverna. — Murmurei para mim mesma, tentando acalmar o arfar de meus pulmões. — Estou no começo da caverna…
Coloquei a tocha no chão por uns instantes, apenas para puxar a adaga e usá-la para fazer um corte na parede da caverna, identificando o caminho para o qual eu poderia retornar, no pior dos possíveis casos. Reposicionei a adaga em sua bainha oculta novamente, e peguei a tocha, parando em frente a um dos túneis. Inspirei lentamente, e o túnel da direita pareceu mais agradável, com pouco ou nenhum odor e nele adentrei, com a esperança de estar certa de minha escolha.
Minha única companhia, naquele momento, era a água que pingava do topo do túnel, em um ritmo lento e compassado; as paredes eram limosas, iguais à do túnel em que cheguei, mas, essas exibiam mais marcas, mais rugas… O desenho de escamas. Intrigada, aproximei minha mão livre da parede, e pela primeira vez pude ter uma noção do tamanho da fera que espreitava por ali: cada escama media um palmo meu, e deviam ser tão espessas que o desenho de seus padrões ficaram estampados na parede de pedra. Meu coração acelerou de novo; eu estava em perigo e em total desvantagem, mas, ainda assim… Eu estava fascinada. Estava diante de um túnel construído pelo Basilisco, contando apenas com a força de seu corpo e nada mais.
— É lindo… — Murmurei para mim mesma, encantada com o padrão das escamas, distribuídas como as de uma serpente comum, mas, com pequenos entalhes e curvas que criavam um mosaico em baixo relevo único. Meu comentário ecoou pelo túnel, mas foi respondido pelo silêncio. Fiquei algum tempo ali, parada, esperando por algum som ou sinal de que estaria acompanhada. Para meu alívio aparente, nada. Eu estava só naquela área.
Respirei fundo e segui túnel adentro, minha mão livre deslizando pelo mosaico de escamas; a tocha iluminava alguns passos à minha frente, sem grandes mudanças no cenário ao meu redor, até o momento em que percebi que havia outra divisão de caminhos: um túnel serpenteando para baixo, e outro indo para cima. A escolha, para mim, era óbvia: o túnel de cima. E assim segui, pé ante pé, contando com nada além da minha tocha… E minha sorte.
— Ssss….
Meu coração deu um salto, e senti o suor em meus dedos, deixando úmidas as minhas manoplas; encurtei a respiração, paralisada onde estava, com os olhos arregalados. O som não vinha de cima; para o meu pavor, ele vinha de baixo.
— Ssss….
Lentamente, virei meu corpo em direção ao som, e percebi, para meu horror, que eu estava, sim, sendo seguida. Ele estava longe o suficiente para eu não ver o lendário brilho de seus olhos, mas, eu consegui distinguir o corpo deslizante e gigantesco aproximando-se lentamente de mim. Era ele, o Basilisco, sem sombra de dúvidas. E eu senti meu instinto tomar conta; olhei rapidamente para os lados, e percebi que havia outra abertura à minha esquerda. Apaguei a minha tocha e corri em direção ao túnel, minha armadura fazendo mais barulho do que eu gostaria.
— Sssss!!!! — O sibilar aumentou de altura, para o meu desespero. — Esssspeeereeee…!
Meu coração batia tão forte que o som ecoava em meus ouvidos; entrei no túnel mais rápido que imaginei, escorregando ao fazer a curva, mas, sem cair; segui em frente, em meio à escuridão, com o silvar cada vez mais alto ecoando túnel adentro.
— Essspeeeereeee… — Escorreguei no meio do meu caminho, caindo em um outro túnel menor, que levava a uma outra sala. — Vooolteee….
O Basilisco falava; o Basilisco não apenas falava, mas era perfeitamente capaz de se comunicar em minha língua natal. Encurtei minha respiração, esperando a criatura ir embora; o cheiro de seu couro era fortíssimo, com a umidade e o limo das cavernas perfazendo o odor do corpo da criatura, cujo deslizar era audível, tamanho o comprimento do seu corpo.
— Sssss…. — O sibilar parecia cada vez distante, e manter minha respiração baixa estava próximo de algo impossível de ser feito. — Vooolteee aquiiii… Sssssiiintooo seeeeu cheeeiroooo…
Esperei até não ouvir mais o deslize do corpo do Basilisco e não sentir mais seu cheiro para poder respirar mais profundamente, a ponto de começar a chorar nervosamente. Eu tive sorte, muita, muita sorte. Estivesse ele mais perto, eu teria virado uma estátua de pedra imediatamente, era o que diziam as lendas, ou teria sido devorada sem chances de reagir. Chorei, desamparada, diante da possibilidade de morrer sozinha ali. Eu não tinha um escudo para refletir o olhar da criatura, e o brilho da tocha denunciaria minha posição, bem como minha armadura, da qual eu não poderia me desfazer se eu quisesse ter chance de sobreviver em combate.
— Pensa, Bradana, pensa! — Resmunguei, tentando engolir o choro teimoso que saía de meus olhos. — Tem que ter um jeito de sair daqui…
Arregalei meus olhos e acendi minha tocha uma vez mais, arriscando atrair para mim a atenção do grande Basilisco; eu estava em uma sala, aparentemente, com outras ossadas. Dessa vez, no entanto, eu parecia estar em um local inacessível para a criatura, pois meus companheiros não pereceram de veneno ou petrificação; aproximei-me das ossadas, vendo que a forma como morreram, encostados nas paredes, indicava fome ou sede.
— Aqui ele não chega. — Sussurrei, procurando por alguma provisão ou qualquer coisa que fosse minimamente útil em meio aos corpos. — Bom saber…
Um dos Anões mortos tinha um escudo de cobre; não era escovado, mas, eu era capaz de ver meu reflexo, ainda que borrado. Esperava que aquilo fosse o suficiente para me proteger do Basilisco, e quem sabe causar sua ruína de uma vez por todas.
— Com licença, amigo. Fogo e Terra proteja sua alma. — Sussurrei respeitosamente, antes de pegar seu escudo. — Eu darei um uso a esse escudo… E vingarei sua morte, se estiver ao meu alcance.
Troquei meu broquel pelo escudo, e improvisei uma bainha para minha adaga em meu cinturão; com a tocha ainda em mãos, segui meu caminho depois dos corpos de meus conterrâneos, por meio de um túnel mais estreito, mas pelo qual eu conseguia passar. Mantive a tocha próxima de mim, tentando, de alguma forma, minimizar sua área a fim de me manter o mais oculta possível; naquele momento, quisera eu ser uma toupeira ou um verme carniceiro**, para que a escuridão não fosse um problema. Feliz ou infelizmente, eu dependia de meus olhos tanto quanto meus ouvidos ou meu nariz para me orientar, e não poderia descartar a luz e o calor daquela tocha, ao menos não por enquanto.
“O Basilisco fala.” Pensei, caminhando lenta e cuidadosamente pelo estreito caminho do túnel, o qual parecia ter sido escavado pelas mãos de Anões, e não pelo corpo da mítica criatura. “Ele fala? Como é possível? Será que…” Um tropeço desviou meus pensamentos, e eu bati com meu ombro contra a parede de pedra, e firmei minha base para não cair e perder a tocha, sentindo meu tornozelo torcer-se um pouco ao recuperar meu equilíbrio. Com grande dificuldade, espremi meus lábios para não fazer som que pudesse ser minha ruína; a tocha caiu no chão e rolou alguns centímetros para longe, e eu pude pegá-la novamente, apenas para perceber que o túnel à minha frente abria-se em uma enorme sala… Com cristais.
— Essa não… — Murmurei para mim mesma, engolindo em seco. — Os cristais.
Caso eu estivesse certa, esses cristais agiriam da mesma forma que os de Kazordoon: iluminariam o ambiente mediante a presença de alguém… E de uma canção que o acompanhasse. Novamente, senti o pânico querendo dominar meu corpo e minha mente, com minha respiração acelerando junto às batidas do meu coração. Trêmula, levei a tocha um pouco à frente do meu corpo, a fim de descobrir alguma outra passagem longe dos cristais. Para minha sorte, havia, sim, outro caminho, à direita de onde eu estava, mas parecia mais largo. Provavelmente, feito pelo corpo do Basilisco — e certamente ao seu alcance.
“Não tenho outra escolha.” Pensei, respirando de forma acelerada, com a mente fervilhando em ideias pouco produtivas. “Se eu passar pelos cristais… Ele ouvirá a canção, e será meu fim. Espero que esse túnel me leve à saída…”. Respirei fundo, tentando me acalmar, e caminhei, rente à parede, em direção ao túnel sem cristais; meu tornozelo doía, e estava inchado dentro de minha bota, e com isso, estava mancando. Péssimo sinal. Meu coração martelava em meu peito, o silêncio daquele túnel sendo o indício que ou eu estava prestes a encontrar minha liberdade, ou eu havia caído na armadilha de um predador muito mais antigo e experiente que eu. E todas as fibras de meu ser rezavam e imploraram para ser a primeira opção, para que eu pudesse viver mais um dia e lutar novamente em outra oportunidade, acompanhada e melhor preparada para tal.
Passei a tocha perto da parede do novo túnel, as marcas de escamas já aparentando ser mais lisas e pouco perceptíveis; decerto, um túnel mais antigo e talvez pouco utilizado pelo Basilisco, que representaria, talvez, minha chance de escapar. O ambiente era muito silencioso, com nenhuma corrente de vento perceptível. De repente, ouvi o estalar de galhos vindos de meu pé: pisei em algo que não devia, provavelmente. Levei a tocha em direção ao barulho, para constatar, para meu horror, que eu havia pisado no que parecia ser parte de um grande ninho.
— Ssss…. Vocêêêê voooltooou….
Arregalei meus olhos, sem coragem de voltar meu olhar para trás; a voz ecoou pela aquela área do túnel, e era impossível ser de outro ser que não o Basilisco. Senti minha boca secar, e meu coração bater tão alto que o som ecoava em meus ouvidos, quase impossibilitando escutar a voz sibilante da fera que certamente estava atrás de mim.
— Olheeee pra miiimmm…. Vamossss conversssssssarr…. — A voz sibiliante estava cada vez mais próxima e, dessa vez, eu era perfeitamente capaz de escutar o rastejar de seu corpo.
Apavorada, apaguei a tocha, sufocando o fogo rapidamente; sequer considerei a possibilidade de testar escudo, tamanho meu pavor; agora, estávamos ambos no escuro e, ainda assim, eu me sentia em completa desvantagem. Afinal, o Basilisco era capaz de enxergar no escuro, mas eu não era.
— Sssseu nome, criança? — O Basilisco indagou em um tom que eu não sabia diferenciar de deboche ou curiosidade genuína.
— B-Bradana V-Vigiawyrm. — Respondi, tentando controlar meu pânico. Como eu me recusaria a responder?
— Belo nome. — Elogiou o Basilisco, para a minha surpresa. — Presunçossso, talvezzzz, massss…. Bonito. — Senti, de repente, algo pegajoso batendo em minha nuca em golpes rápidos, como um chicote, porém, mais macio. Devia ser a língua da criatura. —Sssseu cheiro é… Diferente. — A criatura sibilou depois de um tempo. — É de Anão com… Algo a maisssss.
— E-eu sou parte Humana. — Respondi, incapaz de mentir para aquele ser, e com muito medo de mover qualquer centímetro de meu corpo em qualquer direção ou com qualquer intensidade mínima. — Meu pai é um Anão e minha mãe era… Humana.
— Hmmm… — Comentou o Basilisco, com um rápido expirar, fazendo meus cabelos se moverem para frente com o vento provocado, e senti meu corpo todo tremer em um calafrio. — Eu não vou devorar você… Ainda não. — Ouvi outro sibilar, tão próximo que a sensação era de estar prestes a ser devorada pela fera que, de fato, estava se divertindo com a minha agonia e meu medo. Eu era a presa e ele era o caçador, simples assim. — Como chegou aqui, menina?
— E-eu… Vim em uma missão. — Respondi, mantendo meus olhos fechados, tateando meu corpo lentamente em busca de minha adaga, em uma vã tentativa de me defender, caso chegasse a esse ponto. — E não vim sozinha; mas eu me separei do meu grupo.
— Vieram me matar? — O Basilisco perguntou em um tom triste e, ousava dizer, desapontado.
— S-sim. — Engoli em seco, a manopla encontrando o cabo de minha adaga. — A ideia é essa.
— Por que? — Indagou a criatura, movendo-se lentamente pela sala, o som de suas escamas roendo o chão de pedra, moldando-o com o peso de seu corpo e sua aparente curiosidade.
— Porque… — Comecei, incerta do discurso que estava prestes a dizer. — Porque o Príncipe Ardabag sumiu… E disseram que você foi o responsável por isso. Nossas ordens são de encontrar o príncipe e… Te matar. — A última frase saiu dolorida de minha garganta.
— Mas… O Príncipe já morreu. — Sibilou a criatura, passando a língua pelo meu ombro e, pela distância e movimento, eu percebi que ele estava à minha frente. — Eu já o encontrei morto.
— Morto? Como?! — Indaguei, mantendo meus olhos cerrados, chocada com a informação. — Não pode ser…
— Esssstou trissste… Massss não essstou surpresa… — Replicou o Basilisco, revelando ser fêmea. — Vocêssss sssão muito ingratossss…. — A criatura aproximou seu focinho gelado de meu rosto, e o cheiro de seu couro estava cada vez mais insuportável; ainda assim, estava fazendo o impossível para não abrir meus olhos. — Eu conssstruí esssssse lar para vocêssss…. Eu deixei vocêsssss usssssarem meusssss túneissss… Fazer sssssseu lar nesssasssss montanhassssss…. Eu desssviei osssss riossss de lava… E é assim que querem me agradecer? Tentando… me matar? — Ela tinha um ponto; era muita ingratidão nossa.
— “Estamos discutindo como matar um deus nessa sala”… Foi o que meu pai disse. — Repliquei, a respiração ainda agitada e esforçando-me ao máximo para não abrir meus olhos. — Ele estava certo em dizer isso, não?
— Não sssssou um deusss. Nem ssssou uma deusssa. — Sibilou o Basilisco em um tom frustrado, talvez exasperado. — Masssss… Se ele entende dessssssa forma, talvezzzzz ssssseja alguém maisssss grato por tudo que eu dei a vocêssssss, filhos de Durin.
— Sim…. — Repliquei, engolindo em seco. — Na verdade, a primeira sugestão dele foi selar os túneis seus que levassem à cidade, para evitar acidentes ali. — Respirei fundo, e senti o focinho do Basilisco bater contra meu peito, como se quisesse brincar comigo ao invés de me agredir, mas, acabei caindo no chão com o impacto.
— Dessssculpe. — Replicou a criatura, em um tom perigosamente brincalhão. — Massss…. Eu sssssei que você quer me perguntar algo. Ssssó vou ressssponder se você olhar para mim.
Seria esse meu fim, então? Virar pedra ou ser devorada pela senhora sob a montanha? Talvez a petrificação fosse mais rápida e indolor do que ser devorada, e eu preferiria isso; talvez cantassem canções sobre mim, sobre a minha tentativa, por mais falha que tivesse sido, de matar o Basilisco, que descobri ser “a” Basilisco. Ou Basilisca? Será que isso era importante? Respirei fundo e abri meus olhos, encontrando, na escuridão, os olhos dela. As órbitas eram amareladas, e as íris eram de um tom âmbar belíssimo, brilhando em meio às sombras que nos cercavam. Entretanto, não senti nada, muito pelo contrário: eu ainda era capaz de mover meu corpo, e respirava normalmente.
— Mas…? Eu não…? — Balbuciei, intrigada.
— Virar pedra é uma essssscolha minha. —Respondeu a Basilisco, entretida com o meu pavor. — Não quero que você vire pedra ainda, e responderei o que você perguntar.
— Você disse que o Príncipe está morto e que você o encontrou. — Comentei, trêmula. — Onde… Onde ele está? E… Sabe dizer… Como ele morreu?
— Eu o encontrei no túnel de cima… Onde eu te encontrei da primeira vezzzzzzz. — Sibilou a grande serpente, olhando fixamente para mim. — Ele já estava morto. Ele foi morto por alguém. Alguém que não quer que a linhagem de Kruzzzzzzzak continue…
Meus olhos se arregalaram com essa informação; então, a missão toda era fútil se o Príncipe já estava morto! Continuei a encarar a Basilisco, meus olhos acostumando-se à escuridão, e pude notar, pela primeira vez, a coloração de suas escamas, ao menos de sua face: eram de um degradê de índigo e verde-musgo, com os entalhes em âmbar. Belíssima. E era perigosa, também. Muito perigosa. Eu estava à mercê da generosidade dela, e ela sabia disso.
— Eu te levo até ele. — Sibilou a serpente, afastando-se um pouco. — Você, até agora, falou a verdade. Merece, então, que eu te mosssstre a verdade.
Assenti, e a serpente fez um movimento de mergulho com a cabeça, levantando-me com seu enorme focinho e posicionando meu corpo no topo de seu crânio sem esforço algum; ela rastejou mais próxima ao chão, a fim de não me esmagar contra o teto de seus túneis, e eu me segurei às escamas, incrédula. A Basilisco deslizou pelos túneis, passando por outros caminhos; em um deles, havia fileiras de cristais, os quais começaram a brilhar e cantar com a nossa presença, iluminando o caminho com luzes tímidas e em tons diversos, e foi nesse momento que pude realmente observar o corpo da grandiosa serpente, dando-me conta que estava montada em uma criatura com pelo menos trinta metros de comprimento.
— Ssssssim, eu esssstava ao ssssseu redor. — A Basilisco sibilou calmamente, como se pudesse ler minha mente. — Eu poderia ter te essssssmagado, independente da essssscuridão. Eu não te matei porque não quissssssss. E ainda não quero.
— Q-que bom… — Gaguejei, estranhamente aliviada.
— Você é uma boa menina. — Elogiou a serpente, descendo um pouco mais pelos túneis, em direção a uma área extremamente aberta e com o teto altíssimo, parecendo, estranhamente, um salão de Anões. — Ssssendo uma boa menina… Talvezzzzz consssssiga me explicar o por quê dessssa traição.
A serpente me depositou no meio da sala, próximo a algo que parecia um trono; para meu horror, havia um jovem Anão sentado nele, com a pele pálida e em decomposição — certamente, estava morto a semanas, talvez meses. Seus cabelos eram castanhos com mechas ruivas, já acinzentados pela falta de vida de seu corpo, outrora forte. Os traços de seu rosto eram inconfundíveis: aquele era Ardabag, filho do Imperador Kruzak. E ele estava morto, e o pior: ele foi assassinado, pois seu pescoço estava com marcas de estrangulamento e, a julgar pelo ângulo estranho em que repousava sua cabeça, seu pescoço fora quebrado ao ponto de quase ser decapitado.
— Ele foi morto… De forma extremamente violenta. — Falei, aproximando-me do corpo. — E eu… Eu não… O que eu faço agora?!
— Você descobre quem matou ele. — Replicou a serpente, em um tom triste. — Quem matou ele, matou meussssss filhossssss também.
— O quê?! — Indaguei, virando-me de volta para a serpente. — Então você…
— O ninho. — Ela respondeu, sua cabeça próxima de mim. — Você deve ter visto. Meus filhos… Ou o que sobrou deles.
— Eu… — Engoli em seco, triste por ela. — Sinto muito. De verdade.
— Lamente pela pesssoa que osss matou; para esssa não haverá perdão. E você vai me ajudar.
— Como?! — Indaguei, movida pela determinação da Basilisco.
— Você vai voltar para Kazzzzordoon. — A serpente começou a desenhar seu plano. — Todos terão a prova de que você me matou, e vão te tratar como heroína, certo?
— S-sim, eu acho que sim, mas… Vão desconfiar, não? Digo… — Gaguejei, estupefata. — Olhe para você e olhe para mim, digo…
— Sssss! — Ela ergueu seu corpo, e pela primeira vez pude notar o quão mais assustadora ela era quando ereta. — Eu vou te ajudar; você vai levar conssssigo minhasss escamassss e meu ssssssangue. Eu vi a ssssua adaga; não sssse preocupe, minha pele ssssse recupera rápido, e, desssse jeito… Você vai atrair a atenção de quem cometeu esssses crimesssss. E vai fazzzzer esssssa pesssoa pagar.
— Mas… E você? — Indaguei, preocupada. — Para onde vai?
— Para um túnel que nenhum de vocêsssss conhecem. — Respondeu a serpente, aproximando sua cabeça de mim novamente. — Quando chegar a hora, e ela vai chegar… Eu esssstarei com você, Bradana. E vamosss vingar as mortessss dessssses inocentessss: ossss meussss filhosssss… E o Príncipe. O que me diz?
Engoli em seco; será que eu estava sonhando? Eu não apenas sobrevivi à Basilisco, como também estava diante da possibilidade de me aliar com ela; por muito tempo, pensei que afugentá-la, caçá-la ou até mesmo matá-la traria para mim a glória eterna entre os meus. Entretanto, o Príncipe estava morto e, sem ele, a missão original não fazia sentido. A bem da verdade, eu estava muito mais fascinada e impressionada com o poder da grande serpente à minha frente: apesar de ela ter humildemente negado, a Basilisco era, sim, uma deusa aos meus olhos, e nós devíamos a ela o lar que tínhamos em Kazordoon. E eu estava diante da possibilidade de pagar parte de nossa eterna dívida para ela, e isso… Isso fez meus olhos brilharem diante do novo propósito que ganhei naquele instante. E se eu fosse mais que uma Comedora de Dragões? E se eu fosse… A Canção da Basilisco?
— Eu digo que sim, Basilisco. — Repliquei, confiante, com a minha adaga em mãos. — Eu te ajudarei; vou desmascarar o assassino, e farei com que o Imperador entenda a sua real importância e tudo que você tem feito por nós. Eu prometo: justiça será feita em seu nome, ou eu morrerei tentando.
Ela aproximou o focinho de meu corpo novamente, com um toque mais delicado, como se estivesse feliz com a minha resposta.
— Obrigada, doce menina. — Sibilou a serpente, fazendo um carinho em mim. — Eu vou te ajudar a levar o rapaz para cima, para um dos túneis.
— Vamos com cuidado, então. — Falei, aflita. — Como eu tinha dito antes, eu não vim sozinha… Não sei se eles…
— Eles não vão me encontrar. — Replicou a serpente, amparando o corpo sem vida de Ardabag da mesma forma que fizera comigo momentos antes. — Os túneis que pegaram eram os que eu usava quando pequenina. Já devem ter voltado para a segurança dos seus muros a essa altura. Agora, venha fazer sua parte do acordo. — Ela olhou para mim com um brilho diferente em seus olhos, e tive receio de ser petrificada de fato. — Faça bom uso dessa lâmina, e eu farei com que pareça que eu e você… Lutamos.
****
Com muito esforço, eu consegui chegar em Kazordoon; meu corpo ainda sangrava, a ferida em meu braço ainda aberta; meus cabelos estavam bagunçados com uma mistura desagradável de terra e sangue, e eu carregava as escamas da Basilisco como um sombrio e macabro troféu; quando cheguei na entrada da cidade, estava assistindo o que parecia ser meu funeral, feito de forma representativa por não terem encontrado meu corpo. Quando Kawill, o Grande Geomante e sacerdote me viu surgir em meio à multidão, um grito de surpresa e alegria logo foi substituído por um urro de horror e desespero ao ver que eu trazia comigo não apenas provas da morte do Basilisco, como também a inexorável e inegável verdade de que a linhagem masculina de Kruzak havia chegado ao fim.
Meu pai e meu noivo me receberam como heroina, e o funeral que era para mim tornou-se a cerimônia de despedida de Ardabag Carvalhoscudo***, filho de Kruzak Barbapoeira****, neto de Gramlok Barbaprata*****. As escamas do Basilisco foram o atestado de minha coragem, cujo combate pediram que eu contasse e contasse à exaustão. Asimov tratou minhas feridas, e eu fui ovacionada por todos, incluindo o Imperador enlutado que, diante da prova inegável de minha coragem e valor, deu-me o título concedido a poucos, por mérito e serviço máximo de proteção a Kazordoon: Behogár, ou Grande Protetora, em nossa língua natal. Inclusive, o Imperador fez questão de consagrar meu casamento com Rauta, tendo sido diretamente responsável pelo enlaçar de nossas mãos e toda a ritualística digna de casamentos da nobreza de Kazordoon.
Agora, eu era Behogár Bradana Vigiawyrm… E o assassino do príncipe estava à solta. Mal sabia eu que, quase cinco anos depois, eu o encontraria em um derradeiro e fatal combate…
Continua…
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(*) Bastesh, A Que Chora nas Profundezas: Deusa dos Oceanos, a qual chora em meio a feridas que nunca cicatrizaram. Suas lágrimas deram origem a todos os mares e corpos de água salgada de Tibia.
(**) Verme Carniceiro: Rotworm ou Carrion Worm, a tradução aplica-se para ambos.
(***) Ardabag Oakenshield, em homenagem a Thorin Oakenshield de O Hobbit.
(****) Kruzak Barbapoeira: tradução do sobrenome de Kruzak Dustbeard, o atual Imperador de Kazordoon.
(*****) Gramlok Barbaprata: Gramlok Silverbeard, canonicamente o primeiro Imperador de Kazordoon e pai de Kruzak Dustbeard.
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E O ENCONTRO COM A BASILISCO FINALMENTE ACONTECEU!!! E AÍ, O QUE ACHARAM????
E QUEM É QUE MATOU O PRÍNCIPE??? E AS CRIAS DA BASILISCO????
Aguardo vocês no próximo!!!
Forte abraço!
Inverno - Capítulo 1
Decidi que a partir de agora comentarei um capítulo por vez, por motivos de: eles estão ficando maiores (o que, no ritmo que segue a história, é uma boa coisa!), e também estou quase alcançando o seu ritmo de postagem.
Enfim, primeiro capítulo excelente.
Como já mencionei para você anteriormente, a prosa está sensacional neste capítulo - em particular, na cena introdutória, onde vemos Audrey subindo a montanha. As descrições naquela cena em particular, mas também ao longo do capítulo, estão muito boas de se ler. Deu para ver a paixão contida por trás de cada palavra. Não vou fazer muitos comentários em relação à cena em si, um, para evitar dar possíveis spoilers para leitores que possam ler o comentário antes do capítulo (parece burrice, mas eu mesmo fazia isso muitas vezes, não conseguia me conter, lol), mas também porque para mim aquilo pode dar em qualquer lugar. O caminho da história agora até aquele momento parece muito nebuloso; nunca se sabe o que pode acontecer, ou se aquilo é verdade mesmo.
Falemos de anões! Eu acho muito bonito a forma como tanto Mikhail quanto Rauta buscam fazer com que Bradana se sinta perfeitamente à vontade e em casa em meio aos anões. Fiquei surpreso (mais uma vez) com a atitude da Bradana neste cap em relação ao Rauta. Pelo jeito, ela tem sim sentimentos pelo anão! O prólogo me havia levado a pensar que ela nutria exatamente zero feelings a respeito dele :lol:. Ainda assim, pequenos detalhes ao longo do cap me fizeram suspeitar de que o coração dela não está 100% nessa. A conversa sobre "gerar filhos anões", principalmente, me leva a crer que a veia utilitária talvez ainda seja mesmo o que a está compelindo principalmente.
Tem também um pouco de humano ruim, raça X boa (no caso, anões) nesta história, e particularmente, na visão de mundo da Bradana, eu creio. É um trope que pode ser enfadonho quando não é bem executado, porque existem tantas histórias com esse elemento por aí. No caso de Behogár Bradana, isso parece vir de experiências ruins que Bradana teve quando em contato com humanos. Resta ver se ela seria capaz de se abrir novamente para experiências no mundo afora (e principalmente, com humanos).
Gostei do Kruzak. O Concílio e o plano de Mikhail também foram legais. Acho interessante a questão de lidar com uma criatura lendária que ninguém sabe exatamente o que faz, ou cujos poderes tem uma extensão desconhecida. Eu tenho a sensação de que o plano dos escudos não vai dar certo kkk. Só senti falta de um pouco mais de politicagem anã! (Isso pode parecer meio estranho de se falar, mas eu gosto de politicagens em histórias :lol:). Mas entendo a decisão de ter narrado o Concílio já em seu final, para agilizar a história.
Enfim, um ótimo primeiro capítulo de estação. Creio que sua escrita tenha evoluído ainda mais em relação a quando começou esta história, há alguns anos, e eu fico muito feliz em poder acompanhar mais uma narrativa sua sendo concluída. Um grande privilégio. :)
Gabriel
Saudações!
Com o período de estiagem finalmente acabando em Brasília, chega o momento de nos despedirmos do arco de Inverno; mantendo a tradição dos demais arcos, esse é o penúltimo capítulo da Estação, e devo dizer que eu finalmente o escrevi da forma que gostaria! Para aqueles que estão em dúvida sobre alguns plots que ainda não foram finalizados, não se preocupem: o Arco da Primavera, que será o último, está destinado ao encerramento desses e outros plots hahahaha
Agora, vamos aos Comentários:
Spoiler: Respostas aos Comentários
Sem maiores delongas, o Capítulo de hoje!
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Spoiler: Bônus Musical
Capítulo Quatro — Coração Partido
Quantos sonhos morreram por vocês, eu me pergunto?
Tempo presente.
Audrey e Mikhail se separaram após um tempo naquela taverna; Tezilla, já marcada pela passagem do tempo e anos de trabalho duro, observou a interação com tristeza, a nostalgia tomando conta do olhar e das ações da velha Anã. A moça ruiva aproximou-se dela, com a sua parte para pagamento.
— Obrigada, criança. — Aceitou Tezilla, visivelmente cansada e triste.
— Ela era querida por muitos, não é? — Comentou Audrey em um tom de lamento.
— Ela era, sim… — Tezilla estava novamente perdida em suas memórias, com um sorriso triste enquanto contava as moedas. — Eu a vi crescer; Eleanor, a mãe dela, era minha amiga. Não foi fácil para ela viver entre nós, mas, depois que chegou Bradana… Ela estava em casa, sabe?
— Como era a mãe dela? — Indagou a Paladina, curiosa, animando-se um pouco.
— Ela era uma moça cheinha, com muitas sardas e bastante volume no cabelo! — Respondeu Tezilla com um riso triste e saudoso. — Ela sempre vinha para cá conversar comigo, às vezes ela trabalhava aqui na Taverna. Os doces que eu ainda sirvo são receitas dela, que foram passadas pela avó dela.
— Ela era de uma família de padeiros, então? — Indagou Audrey, surpresa com a humildade da origem humana de Bradana.
— Sim, eles tinham o próprio negócio em Porto Norte, foi o que ela me disse anos atrás… — Tezilla comentou em meio à distração de seus pensamentos, guardando suas louças embaixo do balcão. — E eles cortaram todo o contato com ela depois que ela veio morar em Kazordoon. Ela tinha um casamento arranjado, sabe? Mikhail salvou Eleanor… Uma pena que a febre a levou tão cedo.
— Sinto muito. — Lamentou Audrey, compadecida.
— Ah, não lamente… — Replicou Tezilla com um sorriso triste. — Mãe e filha estão juntas novamente; agora, elas esperarão pelo fim dos dias de Mikhail, para os três voltarem ao fogo e à terra. E ela deve estar muito orgulhosa de tudo que viu a filha conquistar em tão pouco tempo… Behogár de nossa gente, e foi sua Escudeira e nossa representante nesses últimos anos, não?
— Foi, foi. — Respondeu a ruiva, com um sorriso triste e saudoso. — E foram anos de expedições maravilhosas…
— Nem todos gostavam deles. — Tezilla comentou, encerrando seu dia no bar, fitando Audrey com um olhar mais sério. — Achei curioso você perguntar se Bradana era querida por muitos, e não por todos.
— Eu tenho para mim que ela foi assassinada. — Para a surpresa de Tezilla, Audrey expôs seu ponto sem rodeios. — E estou tentando descobrir quem foi.
— Bom… Você já começou alguns meses atrasada. — Respondeu a taberneira, trancando os balcões. — Mikhail já tentou sozinho, mas, sem sucesso.
— E o marido dela? — Indagou a Thaiana, franzindo levemente o cenho. — Ele não tentou? Não foi atrás de nada? Ninguém? Nenhuma pista?!
— De todos os lugares do mundo, esse era o único em que eu não esperava reencontrar você.
Audrey Raines virou rapidamente para trás, encarando o dono da voz; um Anão forte, ruivo, com a pele bronzeada e sardenta pelo tempo nos mares. Trajava um grosso sobretudo e carregava consigo uma garrucha e um sabre. Seus cabelos ruivos estavam raspados nas laterais, e o restante do volumoso cabelo estava atado em uma longa trança. Seu corpo tinha tatuagens e cicatrizes, algumas de sua antiga profissão, outras originárias de sua nova ocupação. Entretanto, seu olhar para Audrey era o mesmo que Mikhail lhe dera horas antes: desaprovação e descontentamento.
— Rauta?! — Audrey arregalou os olhos, estupefata. — É você mesmo?
— Sim e não. — Replicou o Anão, dando de ombros. —Eu mudei bastante desde a última vez que nos vimos, Raines. Se você está aqui, eu suponho que descobriu o que aconteceu, então. — Seu tom era pesaroso e um tanto amargo.
— Sim. — Os ombros da moça caíram com o peso da realidade uma vez mais. — Eu estava em Darashia quando soube… E vim o mais depressa que pude.
— Ótimo. — Respondeu Rauta em um tom seco. — Você vai ser de alguma ajuda.
— “Alguma” ajuda? — Devolveu Audrey em um tom ofendido.
— Nem ouse se sentir ofendida. Nem ouse. — O Anão replicou de forma ríspida e quase cruel. — Primeiro de tudo, vocês eram amantes; por mais feliz que eu tenha ficado em desposar Bradana, e por mais felizes que tenhamos sido. — Ele se aproximou de Audrey, cerrando os punhos, mas sem extrapolar. — E sim, nós fomos felizes por muito tempo, não foi fácil para mim lidar com o fato de que havia algo estranho no meu casamento. Bradana não queria apenas livrar-se do preconceito de uma vida como mestiça: ela queria apagar o amor que sentia por você!
—Eu… — Audrey recuou, abatida.
— Aquele convívio, aqueles anos todos de convívio que vocês tiveram enquanto ela foi sua Escudeira… — A voz de Rauta fervilhava de ódio, e o Anão estava usando todo o autocontrole que tinha para não agredir a mulher à sua frente. — O pior de tudo foi saber que seu marido sabia. E que ele estava, de alguma forma, que não consigo entender, de acordo.
— Não envolva Szczeisny nisso! — A paladina elevou a voz e recuperou a postura, enfurecida. — Seu problema é comigo e com sua ex-esposa!
— Esposa! — Bradou o Anão, pronto para partir para cima de Audrey. — Bradana ainda é minha esposa, mesmo morta! E sua morte também não anulou o fato de ser mãe dos meus filhos! Minha família está quebrada, e você acha que tem direito de querer proteger a sua?!
— Certo, certo! — Audrey ergueu os braços, exasperada e furiosa. — A sua dor é maior! A dor de Mikhail é maior, eu já entendi isso! Sim, fomos amantes! Mas, isso é passado! Não tem como mudar ou desfazer nada, então ou você parte pra cima de mim e resolvemos nossas diferenças em combate, ou faça que nem eu: engula o luto e diga em que posso ser de “alguma” ajuda.
Naquele momento, Rauta recuou diante da ferocidade de Audrey Raines; ela decidira responder em igual medida à provocação do viúvo, que engoliu em seco e fechou o semblante novamente.
— Bom — Começou Rauta, recompondo-se —, eu me tornei um corsário, depois da morte dela. Eu precisei fazer isso. Eu precisava que ele acreditasse que eu estava morto.
— O assassino de Bradana? — Indagou Audrey. — Então, você sabe quem é?
— Sim, eu sei. — Respondeu o Anão, com os olhos ardendo em determinação. — E ele está de volta à cidade, mas, dessa vez, temos a vantagem: ele está louco, sozinho e isolado. É a oportunidade perfeita de fazermos com que ele pague.
— Qual o plano? — Indagou Audrey, inteiramente entregue à ideia de vingar o assassinato de sua amada.
— Seu marido veio? — Indagou Rauta, a mente fervilhando em ideias. — Meu sogro já não é mais o guerreiro que foi anos atrás, e deixei as crianças com ele, por garantia.
— Szczeisny não veio junto comigo — Replicou Audrey, para o que Rauta ergueu uma de suas sobrancelhas. —, ele pegou outra rota, junto aos Gnomos. Disse que queria estudar mais sobre as Canções dos Cristais* e que me encontraria em Kazordoon assim que possível.
****
Três meses antes.
(Narrado por Bradana Vigiawyrm)
O Navio a Vapor seguia seu ritmo, sendo as estrelas nossos guias, brilhando de forma imponente no céu noturno. Minha pele estava mais bronzeada e sardenta, e havia algumas cicatrizes em meu corpo, como se imitasse uma tigresa que não teve tempo de pintar de preto suas listras; eu estava mais forte, com mais músculos do que quando era jovem, e, para a surpresa de todos, minha barba começou a crescer timidamente em meu rosto: só era possível notá-la se tocasse meu rosto, e decidi deixá-la crescer a fim de ver como ficaria dali alguns anos. Meus cabelos ficaram ainda maiores, cacheados e mais selvagens, e eu me sentia forte e bonita como nunca antes.Acho que tudo isso deveu-se às minhas expedições após os eventos da Basilisco e à maternidade.
Depois de ter sido aclamada como Behogár, obtive do Imperador a permissão para atuar na superfície em seu nome e assim fiz, explorando o mundo lado a lado com meu marido, após conseguir um cargo como Escudeira… Por intervenção de Audrey Raines. Isso é história para outro momento, entretanto, mas, sim, eu me tornei mãe nesse meio tempo.
O leve balanço do mar, o qual a meses nos levava de Cormaya até Kazordoon, fez dormir meus dois filhos: Perttu e Kimmo. Perttu, o mais velho, tinha três anos e parecia muito com o avô Mikhail, com os mesmos olhos azuis e personalidade alegre e forte; era ruivo como seu pai, em um tom acobreado mais aberto que o meu, e seu cabelo era um misto entre as texturas minhas e de Rauta. Ele era, também, um mocinho robusto e com um grande apetite, e meu companheirinho de todas as aventuras. Certamente, cresceria para ser um grande explorador, e nunca teve problemas com a nossa rotina itinerante.
Já Kimmo, meu caçulinha que eu finalmente consegui desmamar, tinha um ano e três meses, e tinha o rosto do pai, os olhos cor de cobre e os aneis dos meus cabelos, incluindo o mesmo tom acobreado que eu tinha. Era mais sardento e também um pouco tímido perto de estranhos. Entretanto, por estarmos a tanto tempo no mar, ele já havia se acostumado com os tripulantes da embarcação, frequentemente cambaleando em direção a qualquer um deles e estendendo suas mãozinhas gorduchas em busca de atenção ou colo, retribuindo o afeto com beijos desajeitados ou gritinhos agudos de alegria e empolgação, típicas de um serzinho que está descobrindo o mundo ao seu redor sem nenhum julgamento ou malícia.
— Amor — A voz de meu marido surgiu no ambiente, atrás de mim, sussurrando para que nossos filhos não acordassem. — O capitão avisou que nós estaremos em Kazordoon em sete horas.
— Ótimo! — Retribui o recado com um selinho, sorrindo para meu marido. — Em breve, nossos pequenos conhecerão o avô… E eu descobrirei o que o Imperador quer comigo.
— O que dizia a carta, meu anjo? — Indagou Rauta, sentando na cama para tirar as botas e preparar-se para dormir.
— “Cara Behogár Bradana Vigiawyrm, retorne a Kazordoon o quanto antes; preciso tratar de um assunto urgente com você, e apenas você.” — Recitei, imitando o mesmo ritual de meu marido. — Apenas isso. Não faço ideia do que poderia ser, mas, deve ser algo muito grave para ele não querer expressar em tinta e papel.
— Bom…. Amanhã você descobrirá. — Afirmou meu marido, encostando suas costas na parede de nossa cabine, dando-me espaço para deitar-me junto com ele. O ruivo envolveu-me com seus braços e, com minhas costas pressionadas contra seu peito, adormeci aquele que seria meu último sono tranquilo.
*****
Assim que os sois despontaram no horizonte, cuja luz nos alcançava em um filete distorcido pelas ondas, entramos na caverna que levava ao porto sob a montanha, onde atracamos em Kazordoon sem grandes dificuldades. Depois de meia década, eu estava novamente em casa, e meu pai, já com a barba mais grisalha que negra, abriu os braços e o semblante em uma grande e gostosa gargalhada.
— Vovô!!!! — Gritaram os meninos, correndo em direção ao abraço que me acolhera tantas vezes.
— Meus menininhos! —Exclamou meu pai, exultante. — Oh, como estão grandes! — Falou, erguendo os dois do chão, as perninhas de meus filhos balançando alegremente no ar. Ele depositou gentilmente os netos no chão e abriu seus braços novamente, dessa vez para nos cumprimentar. — Meu raio de sol, venha aqui dar um abraço no seu velho!
— Sua bênção, paizinho? — Indaguei, retribuindo o forte abraço de Mikhail Barbarruna.
— Durin te abençoe, meu amor! — Abençoou meu pai, beijando minha testa. — Rauta! Venha cá rapaz! —Os dois se cumprimentaram com um bater de mãos e um abraço breve e forte, típico das amizades entre homens. — Tá magro hein?! No barco não tinha comida não?!
— Ha,ha,ha,ha,ha! — Riu meu marido, feliz em rever o sogro. — Tinha, mas eles deram um nome engraçado: ração.
— HA, HA, HA, HA, HA! Boa, meu rapaz! — Era impressionante o quanto meu pai e meu marido se davam bem, como se Rauta Cobresangue sempre fosse da família. Talvez fosse, de fato, destino. — Vamos, vamos! Levarei as coisas de vocês para sua casa e de lá vamos para a taverna, para vocês matarem a saudade da terrinha!
Assentimos e seguimos meu pai; nós, os adultos, pegamos nossos baús e pertences e caminhamos em direção às fazendas de cogumelos, onde eu e Rauta tínhamos nosso quartel de moradia; era uma casa retangular de dois andares, com as latrinas posicionadas do lado de fora, em direção ao oeste, onde o vento soprava longe, aliviando o cheiro. A cozinha, a mesa comunal e o quarto de hóspedes ficavam no térreo, enquanto o meu quarto e os dos meninos ficavam no andar superior. Tínhamos, no lado oposto às latrinas, um pequeno canteiro onde cultivamos nossa variedade de cogumelos e nossa criação de abelhas, das quais podíamos obter mel para fermentar — por incrível que possa parecer, esse conhecimento foi um presente dado pelo Seithmadur Szczeisny, cujo povo era conhecido por fabricar uma bebida à base de mel fermentado, o Hidromel, o que nos permitia uma renda extra. A pequena forja de Rauta ficava nos fundos da casa, o cadinho nos aquecendo durante o inverno. Ali era nosso santuário, nosso refúgio do mundo externo. Ali era o melhor lugar para se estar, e quem me dera ter tido mais tempo com eles, naquela paz, naquela calmaria… Naquela perfeição.
Deixamos nossos pertences em casa e seguimos para a taverna; Kimmo ainda estava um pouco manhoso e, pela primeira vez em dias, roçava suas mãos impacientes contra meus seios, com o semblante birrento.
— Kimmo, meu filho? O que foi?! — Indaguei, intrigada com a súbita desobediência de meu menino caçula. — Ai, ai! Sem arranhar a mamãe! — Ralhei com ele, ajeitando-o em meu colo para amamentá-lo; não era fome o que movia meu caçula, senão uma estranha inquietude. — Pronto, pronto… — Abaixei a parte de minha blusa que cobria meu seio direito e deixei meu filho sugar meu mamilo e acalmar a pequena grande fúria que ali havia.
— O que ele tem, coração? — Indagou Rauta, preocupado. — Ele não desmamou?
— Deve ter ficado assustado. — Repliquei, embalando o pequeno Kimmo, que respirava rápido enquanto se concentrava na tarefa de se alimentar de meu corpo. — É a primeira vez dele em Kazordoon, ele estava acostumado a ver o céu e as estrelas diretamente, sem falar que nossos portos subterrâneos são bem diferentes de outras enseadas… — Acariciei as bochechas de meu caçula, que piscava devagarinho seus grandes olhos acobreados,sua mãozinha repousando em meio seio confortavelmente. — Logo ele se acostuma. Ele deve dormir até chegarmos na taverna.
Dito e feito; Kimmo repousou em meus braços pouco antes de chegarmos ao batente da taverna principal de Kazordoon; Tezilla nos recebeu de forma alegre e calorosa como sempre, e logo nos acomodou em uma de suas melhores mesas e nos preparou um banquete todo especial. Comemos, deixando as crianças explorarem nossas refeições mais tradicionais e, com os cântaros de cerveja, bebemos e compartilhamos histórias: as minhas e de Rauta fora da montanha e as de meu pai sob a cidade-império de Kazordoon.
Porém, logo tive que deixá-los para atender à convocação do Imperador Kruzak; abracei meus filhos, sem saber que seria pela última vez, beijei meu marido com o máximo carinho — ele foi o amor para a minha vida. E, por fim, abracei meu pai com mais força do que imaginei que faria.
— Boa sorte, filha! — Falou meu pai, determinado. — Estaremos esperando por você em sua casa; conte tudo que puder, sim? E mande um abraço àquele velho rabugento, ha, ha, ha, ha!
— Pode deixar, paizinho! — Falei, orgulhosa. — Contarei os segundos para voltar até vocês!
De fato, eu estava contando os segundos, mas, mal sabia eu que outra pessoa também estava fazendo essa conta por mim.
****
Utilizei um dos vagões suspensos para chegar ao Quartel dos Nobres**, onde o alto escalão de senhores-anões e senhoras-anãs vivia, o que incluía a Casa Imperial e todos a sua progênie; apesar de já ter o título de Behogár a tanto tempo, transitar pelos corredores da elite de minha gente ainda era algo estranho para mim. Era uma área da cidade feita para os abastados, os quais comercializavam seus objetos de interesse com joias e pedras preciosas de muitas cores, assim como frutas exóticas, as quais nunca vi pelos andares inferiores da cidade, nem mesmo aqueles alimentados por portões solares***.
Meu encantamento sonhador e infantil acabou quando fui abordada pela Guarda Imperial, um total de dez homens e mulheres, a qual gentil e respeitosamente me escoltou para a presença imperial. Uma vez na presença imperial, ajoelhei-me, tocando o solo com a minha testa, e levantando-me uma vez que minha presença foi notada e reconhecida por Kruzak Barbapoeira.
— Deixe-nos a sós. — Pediu o Imperador, sua voz poderosa ecoando pelo salão de pedra de seu palácio. — Preciso falar com a Behogár.
Os guardas assentiram, curvaram-se diante do imperador, deram três passos para trás sem dar-lhes as costas e, no quarto passo, viraram-se em perfeita sincronia e saíram pelos portões de entrada. Dois deles ficaram do lado de fora dos portões, montando guarda, enquanto os demais ficaram patrulhando as ruas e corredores do Quartel. Assim que os passos tornaram-se distantes, o Imperador pigarreou, e eu me aproximei dele.
— A situação é grave, Behogár. Muito, muito grave. — A voz poderosa soava triste, como um cristal rachado que não mais poderia cantar.
— Qual situação, meu senhor? — Indaguei, preocupada.
— Como você sabe e se lembra… Ardabag morreu. — Os ombros de Kruzak caíram com o peso de suas palavras, e seu semblante foi tomado por dor e saudade. — Era o último dos meus meninos; o último que poderia tornar-se imperador diretamente. Ele tinha muito tempo de vida pela frente… — O imperador levantou-se de seu trono e começou a caminhar pela sala — E por isso, acabei arranjando casamentos para minhas sete filhas, uma para cada família proeminente da nobreza. Entretanto, a condição para cada casamento era o deserdar de minhas meninas, para que seus descendentes não desafiassem a linhagem contínua pelo trono.
— Um plano sábio, majestade. — Comentei com um leve tremor em minha voz.
— De fato, não fosse a morte de meus meninos, um a um. — Replicou Kruzak, caminhando ao meu lado. — Quando os mais velhos eram herdeiros, a maioria de suas irmãs eram meninas, apenas prometidas para se casar. Uma a uma, elas foram desposando seus respectivos maridos. Exceto uma, mais nova que Ardabag: Siobhan Líriolua. Ela já se tornou adulta, mas ainda não oficializei sua união.
— Qual a proposta, torná-la Imperatriz Reinante? — Deduzi, curiosa.
— Sim, exatamente. — Concordou Kruzak, feliz com meu raciocínio. — Ela seria a primeira Imperatriz Reinante, e minha linhagem poderia continuar por mais uma geração. E também tenho outro motivo para querer impedir esse casamento.
— E qual seria? — Indaguei, preocupada, notando o olhar do Imperador assumindo um tom sinistro.
— A família para qual prometi minha caçula pertence a um nobre que me era de confiança. — Falou Kruzak, pensativo. — Era um dos meus melhores Geomantes, inclusive.
— E o que aconteceu? — Indaguei, sentindo um calafrio subir pela minha espinha.
— Ele levantou uma acusação grave contra a estabilidade desse Império. — O Imperador estava com os braços atrás de suas costas, fuzilando-me com o olhar. — Ele levantou sérias acusações contra você. Contra o seu feito, o que lhe rendeu o título de Behogár.
Arregalei meus olhos; seria possível? Alguém reencontrou a Basilisco? Ou, pior ainda, descobriu meu acordo com ela? Eu não podia acreditar no que estava ouvindo, mas precisava estar segura de cada palavra que estava por proferir durante essa conversa.
— Como assim? — Indaguei, tentando disfarçar minha apreensão.
— Você está sendo acusada de duas coisas. — Falou o Imperador, sério e decepcionado. — A primeira é de ter matado meu filho, Ardabag Carvalhoscudo. Afinal de contas, você foi a única pessoa de sua expedição a reaparecer com ele, e a única que foi vista com ele!
— Imperador, por favor! — Ajoelhei, em tom de súplica, levando minha cabeça ao chão em subserviência e respeito máximos. — Eu juro pela memória de Durin que o Príncipe estava sem vida quando o encontrei, e que o trouxe de volta pra que pudesse ter um funeral digno e ser honrado pelo senhor e por nosso povo!
— A segunda acusação… — O Imperador continuou, e eu voltei meu olhar para ele, encarando-o com temor pela minha vida.
— Socorro! — Uma voz abafada soou de um dos baús da sala, e constatei, para o meu horror, que era igual a do Imperador Kruzak, que estava à minha frente com um sorriso sinistro — e o brilho de olhos muito verdes.
— …Você não matou o Basilisco, matou? — O falso imperador falou, com um sorriso cruel, sem mudar sua postura, lançando apenas um olhar de soslaio indiferente. — Fale a verdade.
— Eu… Você… — Arregalei meus olhos, gaguejando, apenas para engolir em seco e recuperar minha postura. — Você não é o Imperador. — Discretamente, levei minha mão esquerda para dentro de minha capa, a fim de pegar minha besta ou qualquer arma que eu conseguisse alcançar. — Quem é você?! Liberte o Imperador!
— Quem sou eu? He,he,he,he… — O falso imperador riu, e eu vi, para meu choque e incompreensão, a mudança completa de suas roupas e feições, o brilho terrível daqueles olhos verdes me perseguindo. — Ora, Bradana, você sabe quem sou eu.
— Você… — Não era possível. Não poderia ser. Não, dentre todas as pessoas possíveis, ele? Por que? Qual o motivo daquela traição?
— Sua história acaba aqui, Behogár Bradana Vigiawyrm… — Declarou meu adversário. — E a minha começa… Argh!
Aproveitei sua distração para disparar o virote de minha besta, a qual consegui engatar rapidamente; furioso, meu adversário avançou com seu cajado, tentando furiosamente golpear-me de todas as maneiras. Assustada com a primeira investida, usei minha besta para aparar o golpe, mas ela foi arremessada para longe com o impacto surpreendentemente forte; girei meu corpo e usei minha capa de distração, soltando-a de meu corpo e enrolando-a no rosto de meu adversário, que debateu-se contra o tecido por tempo o suficiente para eu sacar minha espada curta.
— Maldição! — Bradou meu inimigo, arrancando a capa de seu rosto e batendo o cajado furiosamente contra o chão.
E então, a terra tremeu aos meus pés; o chão de mármore abriu-se em um estranho portal, e fui sugada para dentro dele, meu adversário pulando em minha direção. Antes do portal se fechar, pude ver a guarda entrando no salão, apenas para o mundo fechar acima da minha cabeça e eu ser arremessada em outro túnel, distante da cidade.
— RAAAARRRGHH!!! — Meu adversário lançou-se com fúria em minha direção, determinado a me acertar com aquele cajado.
Com um movimento preciso, consegui acertar o flanco de meu inimigo, fazendo-o sangrar; no entanto, a ferida rapidamente fechou assim que ele passou a mão por ela: naquele momento, entendi o que era, de fato, o meu adversário.
— ERA PARA VOCÊ TER MORRIDO AQUELE DIA! — Esbravejou meu oponente, avançando com o cajado uma vez mais; saquei minha adaga, a fim de usá-la como arma defensiva. — VOCÊ NUNCA DEVERIA TER ENCONTRADO O CORPO DELE! VOCÊ ESTRAGOU TODOS OS MEUS PLANOS, MALDITA!
Consegui estocá-lo com a ponta de minha espada e ele urrou de dor e ódio, mas fiquei vulnerável a um golpe direto, e ele desceu a ponta de seu cajado com tudo em direção à minha cabeça, o impacto da pancada fazendo meu nariz sangrar e me desorientar.
— Urgh… — Gemi, levando minha mão cerrada à cabeça. — Você… Matou…
— SIM! — Exclamou meu inimigo, batendo-me novamente com o cajado em minhas costelas, com força sobrenatural a ponto de quebrá-las e tirar o ar de meus pulmões. Para o meu horror, ele arrancou a espada de seu abdome e eu vi a ferida cicatrizar como se jamais tivesse existido. — EU MATEI ARDABAG! EU DESCOBRI SEU ARDIL! O BASILISCO ESTÁ SOLTO NA CIDADE, E DESSA VEZ… — Ele ergueu seu cajado no ar, e tentei alcançar alguma de minhas armas antes de tomar outra paulada. — Você não vai me impedir.
— Não…! — Arremessei minha adaga, a qual acertou seu alvo e o fez urrar de dor, mas o golpe derradeiro foi desferido por ele. O cajado encontrou o chão, e dele saíram diversas raízes, as quais se apossaram das minhas pernas, dos meus braços, do meu tronco, do meu rosto, do meu ar…Da minha vida.
Minha vida começou a passar diante dos meus olhos; eu me debati, tentando arrancar as raízes, mas, era inútil, pois mais e mais delas apinhavam-se contra meu corpo. Então, tudo ficou escuro e frio, o ar em meus pulmões sendo extinto, meu corpo cessando os movimentos, meu coração desacelerando para enfim parar… E o brilho de meus olhos indo embora.
E assim, acabou minha história. Assassinada covardemente por um dos meus, que agora soltara a Basilisco a fim de aterrorizar e destruir tudo o que eu amava. E eu não poderia impedir. Não mais.
Acabou para mim. E nunca pude dizer adeus a ninguém que eu amava.
Mikhail…
Eleanor…
Rauta…
Perttu…
Kimmo…
…Audrey.
Continua…
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(*): Refere-se aos Singing Crystals, que são parte da missão de acesso às Warzones Clássicas (I,II e III, também conhecida como Bigfoot’s Burden Quest).
(**): Nobility Quarter de Kazordoon.
(***) Portões Solares: aberturas na Montanha Grande Ancião cuja a função é permitir a entrada de raios solares no interior da montanha, sendo os fachos direcionados por grandes espelhos para as áreas desejadas. Inspirado nos Portões Solares demonstrados em “Senhor dos Aneis: Aneis de Poder”.
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É, a Bradana foi de Vasco mesmo, para quem tinha dúvidas ainda... Mas, e agora? Quem matou? Já conseguem deduzir?
E o que aconteceu nesses cinco anos de ausência da meia-Anã? Para onde ela foi, quantas milhas ela percorreu?
Aguardo o feedback de todos. O próximo capítulo encerra a Estação de Inverno... E talvez responda algumas de suas perguntas, hehehehe
Forte abraço e até o próximo,
Iridium.
Inverno - Capítulos 2, 3 e 4
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