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Resultados da Enquete: Escolha para os Finalistas de Mumbai:

Votantes
18. Você não pode votar nesta enquete
  • Meia-noite

    2 11,11%
  • Encontros

    4 22,22%
  • Paladinos

    1 5,56%
  • Memória Pilchada

    2 11,11%
  • Sobre Tiaras e Joaninhas

    4 22,22%
  • Açougueiros

    5 27,78%
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Resultados 1 a 10 de 23

Tópico: Concurso Melhor Conto 2008 - Eliminatórias Mumbai

  1. #1
    Avatar de Dark Psycho
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    Padrão Concurso Melhor Conto 2008 - Eliminatórias Mumbai



    Concurso de Melhor Conto 2008 - Eliminatórias Mumbai

    Bom, aqui estamos com as aliminatórias do Concurso de Melhor Conto do ano de 2008. Infelizmente nem todos os inscritos realmente vão participar, mas contamos com grandes contos para podermos votar. Lembrem-se as regras para podr validar seu voto! O período de votação será até a virada do ano, então, vamos votar! x]

    Boa sorte a todos, e desculpem a demora. Mas alguns contos precisavam serem mais organixados. Agora eu percebi uma coisa, a organização deve contar para a escolha dos leitores também. Então postarei os contos como eles vieram até mim, e não farei mudança alguma. QUem enviou bunitinho deu sorte, quem não... :S

    As enquetes serão fechadas automaticamente em 15 dias. Então, quem vai votar deve ler logo e participar, pois desta vez não haverá adiamentos.

    Espero que todos leiam e votem.

    Obrigado por participar,
    Dark Psycho. x]


    Votos Inválidos:

    Senhor Seixas.

    Publicidade:


    Jogue Tibia sem mensalidades!
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  2. #2
    Avatar de Dark Psycho
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    Padrão Meia-noite

    ...
    Citação Postado originalmente por Meia-noite
    - Kenius.
    - Sim?
    - É aquele homem – Afirmou o velho barbudo e careca que estava ao meu lado.
    - Entendido, velho. Encontraremos-nos na taverna em uma hora, agora me deixe sozinho aqui para observar o alvo.

    Desceu. O tempo era meu. Um cavaleiro cinqüentão descansava junto aos outros convidados daquela decadente festa. Aliás, tudo ali era decadente; não só os convidados como o local também. Eu mesmo estava receoso de estar pendurado naquelas paredes podres. Pior, estar sendo segurado por uma merda de corda arranjada pelo velho e esta, amarrada nas velhas armações protegidas pelas telhas igualmente antiquadas. Mas de que me interessava o lugar, afinal? O que realmente me trouxe para aquele casarão discreto era o peculiar evento que lá dentro ocorria, e um convidado em particular.

    - Mas já vai?

    Assim que percebi o movimento do faceiro cavaleiro antes apontado, pus-me a subir pela corda até alcançar o telhado. Saída. Pela trajetória que o vi fazendo, concluí que se dirigia para a porta dos fundos. Tomando cuidado para não quebrar as frágeis telhas por onde andava, consegui chegar do outro lado do teto. A noite conseguiu me surpreender novamente. De onde eu estava, era possível enxergar a porta dos fundos, logo abaixo dos meus pés. Frente a ela, a surpresa: dois soldados que vestiam as roupas da guarda thailense. O que faziam os seventes de Gregor ali, esperando a porta ser aberta?

    Melhor era aguardar para ver o que os subordinados do general de Thais fariam. Não tardou e a porta foi aberta. Discretamente o faceiro apareceu, fez um cumprimento militar, e, discretamente, lhe foi entregue uma caixa. Logo após, o tal fechou a porta voltando para o interior do casarão, e os soldados viraram-se para ir embora. Era a hora de agir.

    - Jim, ouviu algo?
    - Não... Por quê?
    - Juro que ouvi um barulho de folhas em movimento...
    - Se está dizendo, vamos voltar e conferir.

    A certeza do sucesso veio quando os dois guardas ingênuos voltaram-se novamente para o casarão. Na busca de algo em torno do carvalho, ao lado da construção. Aproveitei a brecha para sair de meu esconderijo no alto. Um dos guardas foi o amortecedor de minha queda. Antes que o outro pudesse gritar, passei-lhe o sabre pelo pescoço, fazendo sim um ruído, um gemido, nada que me comprometesse.

    - Bingo.

    Após vestir as roupas do primeiro, pois as vestes do segundo estavam inteiras banhadas e sangue de pescoço, escondi os dois corpos atrás de um arbusto. Só para ter certeza, enfiei um punhal no peito do guarda desacordado, desencargo de consciência. Bati novamente na porta, os segundos que viriam a seguir determinariam a missão.
    Sim, o faceiro novamente abriu a porta:

    - Algum problema, soldado?
    - Você.

    Missão concluída. Aquele loiro vaidoso, com aparência divina, apensar da idade, cuspia sangue enquanto minha arma letal penetrava seu abdômen. Nem uma simples palavra soltou. Pelo cabelo, o levei para junto dos cúmplices, não podia, afinal, manchar-me com sangue de assassinato. Embora tivesse concluído o que me fora mandado, iria além. Pegaria a maldita caixa estranha, me cheirava a problema, sendo que vinha pelas mãos thailenses. Mas creio que isso não seja mais do seu interesse, Senhor Ville.

    - Kenius, não creio que esteja em condições de omitir coisas.
    - Senhor Ville, eu detesto dizer isso mas, tudo que saberá é o que eu falei, afinal de contas o tempo que perdeu me ouvindo garantiu a minha vida.
    - Do que está falando, Beson?

    Jogou seu peso para a esquerda, caindo junto à cadeira onde estava amarrado, quebrando o frágil móvel. Todo o tempo em que contava o que todos já sabiam sobre o que havia acontecido algumas horas atrás Kenius Beson aproveitou para notar as peculiaridades da sala, não só detalhes como a cadeira, mas também o lustre que enfeitava o teto acima de onde estava e a belíssima Katana que, dentro de usa bainha, adornava a parede da saleta. Assim, ao chão com a cadeira despedaçada, persistia amarrado, quando percebeu que o carrasco que o assistia segundos atrás o golpearia com a espada, rolou com o intuito de deixar as cordas à mostra, que foram cortadas, vista a impossibilidade do homem de conter a arma, uma vez impulsionada.

    Livre, mas ainda deitado, girou o corpo dando uma rasteira no interrogador, que caiu deixando a espada ao chão também. Beson levantou-se então, foi até a linda Lâmina oriental da parede, tirou-a de sua bainha harmoniosamente adornada com pedras preciosas, e jogou-a rumo à corda que segurava o lustre ao teto. O magnífico ornamento caiu parcialmente destruído sobre o homem.

    - Foi um prazer conhecê-lo, e, sobretudo enganá-lo, senhor Ville.

    Assim que saiu da bela sala, voltou ao ambiente velho e antiquado do resto do casarão, estava no segundo andar. Correu para a direita, encontrando a escada que levava ao térreo, mais ninguém estava ali. Desceu-as e rumou para a porta dos fundos, alguns metros à frente passando por outro cômodo. Respirou fundo para acalmar o corpo e saiu do local num semblante calmo, discreto. Foi andando até o destino traçado, não demorou a chegar.

    - Demorou, Kenius Beson...
    - Desculpe... Tive um pequeno problema, velho. Agora vamos ao pagamento.

  3. #3
    Avatar de Dark Psycho
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    Padrão Encontros

    ...
    Citação Postado originalmente por Encontros
    - Era um dia triste para o velho dragão, meu filho. Não tão velho assim, para falar a verdade, mas esta é uma história que contradiz muitas coisas. Bem... Deixe-me lhe contar algo: Na verdade, a idade não está no seu corpo, mas na sua mente.

    O garoto olhava o velho sentado ao seu lado na cama com bastante atenção. Seus olhos continham uma fagulha de admiração e respeito, e, conforme a voz rouca vibrava no ar, ele demonstrava uma sincera emoção.

    - E naquele dia... O dragão tinha tomado a mais difícil das decisões.

    Por um momento o homem parou. Seus olhos cansados caíram em um canto do quarto e lá ficaram. Lembranças distantes corriam pela sua mente enquanto o garoto apenas o olhava; firme na expectativa dele continuar a falar.

    - Você sabe do que estou falando, Caiman? – O homem surpreendeu a criança com a pergunta. Seus olhos pousaram nela calmamente esperando uma resposta.

    - Não, vô. – Ele finalmente falou.

    - Então, deixe-me contar a você.


    Ele caminhava triste, o dragão, porém, decidido. Seus cabelos brancos realçavam ainda mais sua pele pálida. À sua volta, um suave cheiro de chuva atingia a todos, e o orvalho era renovado com sua passagem. Mais uma vez ele parou, seus olhos levantaram-se para o céu e refletiram o azul em sua íris cristalina. Não era hesitação; ele apenas tomava fôlego. Fôlego para continuar outra vez.

    Logo continuou novamente, e não demorou muito para sentir o cheiro de batatas cozinhando. Pensou em cortar caminho, mas lembrou de sua jornada e seu objetivo, e decidiu continuar. Alguns minutos depois ele deparou-se com um homem sentado a beira da estrada, à sombra de um grande carvalho cortando verduras e fritando carne. Ao que parecia, um pequeno manjar estava sendo preparado na solidão da mata.

    Ele parou e pensou consigo mesmo como eram estranhas aquelas criaturas. Não pareciam se importar com o mundo a sua volta, apenas viviam. Para aquele homem, um galho da árvore poderia cair, e ele apenas agradeceria por não ter sido na sua sopa.

    Não demorou muito e o homem o notou. Eles entreolharam-se sérios demais. O viajante observava como o homem era interessante, enquanto o outro, como ele era clássico.

    Largando tudo o rapaz levantou-se. Ele limpou a terra das mãos nas calças de couro e abriu um grande sorriso indo calmamente até o viajante na beira da estrada. Era o típico homem daquelas terras. Barba mal feita, cabelos castanhos, olhos claros. Mas o seu sorriso era convidativo demais, simpático demais.

    - Espero que não esteja muito cansado. – Ele falou. – Tenho comida aqui para nós. Na verdade... – Hesitou olhando para trás, enquanto o viajante apenas o analisava calmamente – Eu sempre faço comida demais mesmo.

    Houve um momento de silêncio, onde o homem esperava e o viajante apenas observava, mas finalmente, o segundo falou.

    - Não se preocupe comigo, rapaz. Apenas pretendo continuar meu caminho pela estrada.

    - Mas está ficando tarde para se andar aqui sozinho! – O homem parecia surpreso. Era incomum ver um jovem andando por estas terras, ainda mais um como aquele, aparentando grande riqueza.

    O peregrino apenas observou. Seus olhos caíram sobre a comida sendo preparada e ele decidiu ceder para uma última conversa amigável com um mortal.

    Animado, quando o viajante aceitou o convite, o rapaz saltitou até a fogueira e começou a jogar mais verduras na panela. Depois ele se voltou para o jovem, já sentado, e deu-lhe a mão.

    - Meu nome é Domainy. – Disse entusiasmado.

    - Eu sou Godar. – Falou o dragão, cumprimentando o rapaz.

    - Me diga, Godar – Domainy falava com um olhar intrigado, analisando o outro como quem considera muitas possibilidades. – Você é jovem demais, então... Esses seus cabelos são um sinal?

    O dragão pareceu confuso e depois riu. “Ah... Humanos”, Ele pensou. “Apenas estas criaturas para se comportarem assim.”

    - Digamos que seja um sinal, Domainy. – Falou descontraindo-se.

    - Bom, é porque é estranho. – Ele parecia não se preocupar muito em ser discreto. Era o tipo que comentava as coisas apenas por observar, sem maldades. – Você é jovem... E seus cabelos não são brancos de verdade. Eu diria que são... – Ele parou para analisar mais um pouco, enquanto o outro se divertia com o comentário. – Um azul meio prateado?

    - É... – Godar realmente estava divertindo-se, mas em seu íntimo, pensamentos assombravam sua mente com os comentários do rapaz. Foi seu amor pela raça humana que o levou ali. Era o seu amor por eles o responsável pela preocupação e decepção sentida.

    - Mas me diga, rapaz: Para onde você vai?

    - Eu vou para muito longe daqui, homem. – Godar pareceu mais preocupado agora, deixando uma sombra cair sobre sua face. – Não é um lugar que você ou qualquer outro conheça.

    - O que eu conheço são os perigos. Você não pode andar por estas estradas a noite sozinho; mesmo acompanhado ainda não é aconselhável. Afinal, - Continuou após uma pausa. – Não somos todos que temos a leveza dos elfos de marfim.

    Godar pareceu surpreso pelo comentário. Não eram todos que conheciam tais elfos. Na verdade, eles eram apenas uma lenda de fantasmas que habitavam uma densa floresta no caminho para Baiün.

    - Mas me diga, homem: – Continuou Domainy. – De onde você vem?

    - Eu venho de Fris, passei por Ainum, e agora sigo por Hanor. – Falou despercebido, apenas pensando na longa viagem.

    - Nunca ouvi sobre a primeira, mas pelas outras cidades, posso dizer que você vem de longe, meu jovem. Espero que não seja um batedor que anda lucrando pelo mundo afora. Poucos atravessariam o mar para cruzar o continente como você fez.

    Godar apenas pensou no que o homem dizia. Realmente ele viera de longe, e isso era apenas para poder pensar mais durante a viagem. O homem tinha razão. Fris não era conhecida por ninguém senão pelos filhos de Balgon, o grande ancião de prata. Ele pensava no que aquele viajante diria caso soubesse que falava com alguém disfarçado - um dragão na forma humana que ele tanto adorava; despido de asas, escamas, e toda a graça que os humanos viam naqueles seres poderosos e desconhecidos. Poucos sabem disso, mas os dragões podem se disfarçar em tantos seres como eles conhecerem a forma. São muito cuidadosos e muito sofisticados, e não assumem qualquer aspecto, mas o que eles mais amam é o humano, mesmo com todos os defeitos da raça.

    - Tome. – Domainy tinha um prato de sopa em mãos estendido para Godar. – Espero que não tenha problemas com verduras. Alguns loucos não gostam delas. Vou pegar a carne para você em um instante.

    - Desculpe-me, Domainy, mas você parece não ter muitas coisas com o que contar. – Godar olhava para os buracos no chão de onde provavelmente saíram as batatas. – Mas ainda assim é muito feliz e animado.

    - E por que não seria? – Bateu de ombros.

    - Não sei. – Godar ficou pensativo nessa hora, olhando para os ramos farfalhantes das árvores. – Talvez pela humanidade. Pela vida em si. Ou pela sombra da morte.

    - Não seja tolo, rapaz. – Bateu de ombros outra vez. – A humanidade não mudará nunca, apenas ficará mais suja. A vida deve ser vivida como ela nos é dada. E quanto à morte, ela virá para todos. Eu apenas não tenho medo dela e não espero receber sua visita tão sedo que seja.

    - Você é um séptico, então. – Falou desanimado.

    - Claro que não. Apenas não espero as coisas ruins da vida virem me buscar. Eu as deixo atrás de mim que é melhor para elas, rapaz! Por mim, eu viveria a eternidade.

    Neste momento Godar parou de comer e olhou para Domainy. Ele riu, levantou as sobrancelhas e voltou a levar o prato de sopa à boca.

    - Você não sabe o que é a eternidade. – Godar falou desanimado, também voltando a comer.

    - Nem você.

    Houve um silêncio por um momento, quebrado logo depois por Godar.

    - Mas você não conhece nada que está por aí a fora. Você não viu reis começando guerras por tolices como meros cavalos mais bonitos que um outro reino possivelmente teria.

    - Eu vi bandidos matarem por botas e calças, rapaz! – Falou Domainy chateado. – Você é apenas um jovenzinho de estrada. Eu viveria mais... Muito mais do que me é permitido e jamais cansaria da vida que me foi dada. Tolos são os que procuram a morte! Para mim, – continuou irritado. – você é quem é fraco demais para encarar a vida como ela é de verdade.

    - Homem tolo... Pensa conhecer todas as respostas.

    - Não, meu jovem... – Ele falou calmo. – Apenas não deixarei o fracasso de um me levar junto. Se a vida é triste, que seja. Eu quero viver a eternidade em uma vida só. – completou pensativo.

    Godar parou. Ele conhecia os humanos. Conhecia as mentiras, e aquele homem falava a verdade. Logo agora que havia tomado a decisão que tomara, encontrar alguém apaixonado pela vida o fez lamentar.

    - Eu vou morrer. – Falou quase que em um sussurro. Esquecendo-se que não conhecia o homem com quem falava. Falou simplesmente por falar. Talvez, para ele mesmo acreditar na idéia.

    - Não seja tolo. – Domainy bateu de ombros.

    Godar deitou-se calmamente nas folhas que cobriam a terra.

    - Eu irei para o vale da morte, atrás das montanhas geladas. – Falou sonhador, em um tom cheio de melancolia. - Chegarei lá pelo vale dos guardas, através da floresta das almas onde as árvores ainda falam.

    Domainy olhou-o intrigado. Sua face levemente confusa com um ar de incredulidade. Não pode se conter e falou em tom de piada:

    - É, amigo, se você fizer isso realmente você vai definhar.

    Godar virou-se para ele e o olhou com calma. Um ar de riso triste pousou em sua face nesta hora e ele falou para o rapaz:

    - Você não entende, não é? – Ele disse com paciência. – Eu não sou humano, rapaz. Eu sou um dragão; e vou descansar em casa.

    Domainy ficou abismado e depois riu. Riu-se bastante até não poder mais. Depois ele olhou sério para Godar e disse:

    - Você realmente acredita nisso, rapaz?

    Godar pareceu irritado. Levantou-se serio e orgulhoso demais. Olhou para Domainy encolhido ali sentado, temendo o aspecto de poder que ele agora emanava antes mesmo de uma densa névoa cobrir o lugar onde eles estavam, ou até mesmo do suave cheiro de chuva ficar forte, e os ventos soprarem bruscos na mata.

    Domainy apavorou-se. Ele conhecia aquela estrada, e sabia como o clima ali se comportava. Ventos não mudavam rápido demais, névoas não cobriam aquela parte de terra na época em que eles estavam. Foi nessa hora que ele temeu ser tudo verdade, e decidiu acreditar em Godar.

    - Mas você tem a eternidade! – Ele gritou em meio ao vento e sombra da névoa, e tudo parou tão repentino como começara.

    - Eu não tenho nada. – Falou Godar antes de cair novamente deitado sob as árvores.

    - Não seja tolo, rapaz. – Continuou Domainy. – Você é um dragão! Você poderia viver a eternidade.

    - Nunca a eternidade. – Bateu de ombros.

    - Mas muito perto de lá.

    Godar olhou o rapaz. Ansioso, ele o observava de certa forma até animado.

    - Pense comigo...

    - Não! – interrompeu Godar. – Pense comigo você. Meu pai é o ser mais antigo em todas estas terras que a humanidade conhece e sobre ela, nas nuvens, onde você ou outro homem jamais esteve. Ele tem a graça da vida longa, do prazer em viver. – Ele pausou, melancólico. – Mas não eu.

    Um breve momento de silêncio atingiu o lugar. Godar olhando para o movimento do vento nas folhas, e Domainy encarando-o sem sequer notar.

    - Escute, amigo. – Ele falou abaixando-se até o dragão, que agora se virava para olhá-lo. – Eu viveria a eternidade com você, mas não posso lhe acompanhar. – Ele pensou por um momento e continuou a falar. – Mas fique firme como está, e eu prometo lhe acompanhar até o fim dos meus dias. Eu lhe darei uma razão para continuar a viver durante cada momento de nossas vidas. – Ele se levantou animado, enquanto Godar o olhava levemente interessado. – Eu irei lhe ensinar a viver na saúde e na desgraça! – Falou animado, pondo as mãos para cima. – Eu lhe mostrarei como passar as noites nas festas mais animadas que os reis dão para enganar o povo sem pão em casa. Serei seu amigo e guia nesta jornada.

    - Não seja tolo. – Falou o dragão rindo levemente. – Eu já fui conselheiro dos grandes reis desta terra.

    - Mas não soube aproveitar a vida! – Escarrneceu Domainy.

    Godar olhou o homem animado ao seu lado, sorrindo. Pensou em como era difícil continuar com a decisão que tomara. Por um momento ele iludiu-se mais uma vez. Pensou na vida e em tudo o que ela poderia lhe dar. Ele era tão novo, e já pensava em partir para descansar. A vontade do humano o contagiou, e ele levantou-se de seu lugar.

    - Espere aqui, homem. Não importa o quanto eu demore, irei voltar.

    Neste momento Domainy presenciou a coisa mais impressionante da sua vida. Pela primeira vez, de tantas, ele viu o dragão caminhar para o fim da estrada e mostrar suas asas. Sua forma mudou, sua pele virou prata, seu cabelo levantou-se em uma crista de pelos prateados e seu tamanho aumentou em forma e em graça extraordinárias.

    Antes do vôo, a criatura olhou para trás e falou com sua voz calma e pausada:

    - Obrigado, rapaz. – E o dragão voou.


    Domainy não soube o que fazer. Esperar, ou continuar? Mas ele esperou. A expectativa para ver o que o dragão traria o ancorou no lugar onde estava, e foi no amanhecer do outro dia, mais cedo do que imaginava, que o cheiro suave de chuva retornou, junto com um perfume selvagem, desconhecido.

    O dragão retornara em sua forma humana, e com ele caminhava um homem com vestes poderosas. Alto e magro, ele parecia um rei vestido em preto cheio de jóias raras. Seus cabelos desciam até seus ombros, negros, lisos. As peles de sua roupa ondulavam com seu andar altivo. Sua face era decidida e seu olhar aterradoramente calmo impunha um respeito mortal. Atrás do homem uma sombra negra caminhava como duas grandes asas feitas de uma leve fumaça, acompanhando seu movimento conforme ele andava.

    Ao perceber que Godar observava, o homem fez um leve movimento com a cabeça e a sombra sumiu, deixando apenas a figura altiva em frente ao rapaz, que mesmo alto como era, estava bem abaixo do seu olhar.

    - Domainy – Disse Godar animado, porém, sério. – Você disse que viveria a eternidade, então, trago-lhe um desafio. – O homem estava abismado, ainda procurando um modo de resistir ao olhar do ser que o observava. – Jonus lhe dará a eternidade, e você apenas morrerá quando desejar. Quanto a mim, comprometo-me de morrer apenas depois de você, e de levá-lo para meu lugar de descanso comigo, para lá repousarmos, onde jamais um humano repousará.

    Domainy estava perplexo. Olhava para o homem e pensava se ele era o Jonus de quem Godar falava. Olhava para o dragão e pensava se aquilo poderia ser verdade. Enfim, após algum tempo de silêncio, Godar falou:

    - Aceitas o desafio?

    Ao que Domainy apenas pode balbuciar e acenar com a cabeça. Depois, ao ver que ainda esperavam uma resposta, ele disse ainda abobalhado: - Eu não trocaria minha vida por nada... Sim. – E Godar riu.

    - Então Jonus, nosso trato está feito. – Godar virou-se para a figura altiva ao seu lado. – E o nosso também, Domainy, o amigo do dragão. – Disse divertindo-se.

    - Ainda não, criança. – Falou o homem com sua voz penetrante, olhando de Domainy para o dragão.

    Godar rapidamente tirou uma pequena peça do bolso, um pouco impaciente com o homem que aguardava. Ele olhou fixamente a pequena jóia que parecia com um diamante, porém entalhado em forma esférica. “Brilhante como uma estrela que caíra do céu.” Pensou Domainy.

    - É quase isso, mortal. – Falou o homem, olhando rapidamente para ele. – Ou melhor: imortal. – Um leve ar de riso surgiu em seu rosto antes dele virar as costas pondo a jóia cintilante no centro da ombreira de jóias negras que caia sobre seus ombros. – Godar... – Ela parou, e virou-se para falar com o dragão. – Que diria teu pai? Não terá sido o preço alto demais?

    - Doce Beron, a quem chamam de Loham nas lendas antigas, ele apenas diria para seguir meu coração, e dar mais uma chance à vida.

    O homem parou por mais um momento, intrigado, apenas tentando entender. Olhou para Domainy e disse:

    - Aproveite, homem. – E virou as costas mais uma vez.

    Neste momento, Domainy teve sua segunda visão preferida em toda vida. A sombra voltara às costas do homem e tomara forma aos poucos. Logo, duas grandes asas negras saiam de seu corpo e estendiam-se através das árvores, como se ali não houvesse nada, e abriam-se enormes e poderosas. Elas movimentaram-se para voar e o homem sumiu assim que elas bateram, iluminando aquele pedaço perdido de terra mais do que o Sol.

    - É, meu amigo... – Falou Godar. – Agora quero ver-te com o peso da imortalidade nas costas.


    Domainy, ainda bobo, começou a acordar e recuperar seu ar gracioso. Ele olhou para Godar e riu, e o mesmo riu também. O homem olhava suas mãos procurando algo diferente em si mesmo, mas nada encontrou.

    - Não fique assim. Com o tempo você vai perceber que tudo continua do mesmo jeito. Você só não vai envelhecer. – Falou o dragão divertindo-se com ele.

    - Godar... – Disse Domainy finalmente intrigado. – Você é um safado. – E o dragão se sobressaltou. – Fale a verdade comigo. Você nunca pensou em morrer! – Mas o dragão apenas riu e pensou que toda grande jornada tem um benefício.


    O velho parou por um último momento sem sequer perceber que o garoto ainda não dormia. Ele simplesmente levantou-se pensativo e começou a se afastar quando a fina voz da criança falou:

    - Vô...
    - Oi, meu filho. – Respondeu o velho um pouco cansado.

    - Isso realmente aconteceu?

    A emoção na voz do garoto era evidente. Seus olhos espreitavam a imagem esguia no escuro do velho de costas para ele, mas o homem apenas respondeu antes de continuar a andar:

    - Talvez, meu jovem. Talvez...
    Vale dizer que o autor deste conto pediu a mim para requisitar a autorização do antigo frequentador desta seção Wakka Hills para usar nele o nome de um de seus personagens em Tibia. E que o Wakka permitiu.

  4. #4
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    Padrão Paladinos

    ...

    A autora desta história desistiu de participar do concurso.

    Citação Postado originalmente por Paladinos

    Os Cavaleiros

    Em uma terra longínqua, onde criaturas rodam a espreita de suas pressas, surgi um grupo de seres humanos.
    Os humanos sofrendo nas mãos de criaturas tentam se defender de todas as formas, então surge um ser humano que se dedica sua vida na arte da batalha.
    Com muito sofrimento, treinando sua força, sua habilidade na luta corpo a corpo, este ser humano consegue elevar sua resistência em altos níveis, e consegue aumentar sua vida em proporções enormes, podendo lutar em condições onde seu corpo já machucado pelos danos.
    Eis ai, surge o cavaleiro que domina a arte no manejo de espadas, machados e bastões.
    Ele ensina novos adeptos, só que pela complexidade dos manejos, muitos opta por uma das classes de luta corpo a corpo, uns cavaleiros escolhem a arte da espada, outros a arte do machado, outro a arte dos bastões.

    Os Druidas

    Os seres humanos, agora com cavaleiros para defender sua tribo, podiam se defender de seus predadores, mas, houve uma época onde uma pequena tribo de humanos foi cercada por Orcs, eles estavam presos em uma caverna sem comida, passaram semanas de fome, muitos debilitados chegando ao auge da loucura.

    Nesse momento um garoto começou a imaginar comida em sua mente, a fome era tanta, ele pensava e pensava até que em uma palavra ele conseguiu retirar de sua mente a comida e materializar, foi nesse momento que descobriu que tinha habilidades mágicas.

    Os cavaleiros que defendia a caverna onde estavam presos, sofriam grandes danos, mas esse rapaz concentrava nos cavaleiros imaginando que eles estavam curado, e novamente conseguiu tirar de seus pensamentos e tornar a situação em realidade.
    Assim, estes bravos humanos, conseguiram eliminar os Orcs e sairam do seu cativeiro.

    Neste dia em diante, o menino começou a se concentrar e meditar, elevando sua espiritualidade em níveis elevados, porém, sua vida não se desenvolveu como de um cavaleiro.

    Os feiticeiros.

    Em pouco tempo, o jovem druida ficou mestre das magias, e resolveu ensinar novos adeptos para auxiliar os cavaleiros curando-os.
    Um jovem aprendiz, que aprendera os segredos das magias, estava caminhando, e avistou um Orc shaman inconsciente.

    Em um instante, ele resolveu a matá-lo, mas olhando para aquela pobre criatura que não pudera se defender, ele resolveu ajudá-lo, foram dias levando comida e escondendo ele dos outros seres humanos.
    Ao retomar a consciência, o Orc Shaman se sentiu muito grato, e ensinou as artes das trevas para esse garoto.

    O garoto aprendeu a invocar criaturas do nada, aprendeu a manipular elementos das trevas.
    Assim surgia o Primeiro feiticeiro.


    O Brilho no Olhar

    Foi em uma manhã chuvosa que um grupo de humanos tiveram a idéia de construir uma muralha para isola-se das criaturas.
    Pedra sobre pedras, foi ganhando forma.
    Os Orcs e Ciclops tentavam invadir a cidade, mas, cavaleiro se posicionavam nos portões, e com auxilio dos druidas e os ataques tenebrosos dos Feiticeiros, eles manteram a cidade segura.

    Uma garotinha via com um brilho no olhar os bravos guerreiros defendendo os portões.

    Com seus escudos, os cavaleiros bloqueavam a passagem para que as criaturas não passassem.
    Os druidas atrás dos cavaleiros, curavam as feridas, assim criando uma muralha humana impenetrável.
    Finalizando com ataques que causavam danos gigantescos, os feiticeiros atacavam sem piedade e as criaturas, uma a uma iam caindo ao solo.
    A garotinha era filha do chefe da aldeia, seu nome era Elane.

    Elane sempre curiosa e aventureira era muito ansiosa, e desde cedo queria ser guerreira.


    A tentativa


    Elane quando completava 14 anos, decidiu ser uma guerreira, e começou a ter aulas para se tornar uma. Aprendeu a elevar sua resistência, aprendia a se defender com escudo, sua vida desenvolvera em níveis elevado, mesmo assim, ela não conseguia tirar a cena dos druidas que ficavam atrás dos cavaleiros curando as feridas com o poder da mente. Enfim desistiu das aulas para ser uma guerreira e começou a ter aulas para ser uma druidisa.

    Com os druidas, aprendera a desenvolver seu poder espiritual em níveis altos, também aprendeu a obter comida com o poder da mente, e várias magias de cura.
    Sempre empolgada, lembrava dos grandes feiticeiro da aldeia atirando magias nas criaturas.
    Não teve outro destino, a garotinha desistiu de ser druida, e foi ter aulas para ser feiticeira.
    Com o tempo, Elaine aprendeu a utilizar magias negras, através de pedras especiais.

    Com o poder da mente, ela conseguia a criar runas que podiam explodir a terra, era a famosa fire ball.
    Com tanta informação, e pela metade, Elane conseguiu elevar sua vida e seu poder espiritual em níveis elevado, porém, menor vida que um cavaleiro e menor poder espiritual que os druidas e feiticeiro.
    Elane tinha habilidade de defesa com os grandes guerreiros.
    Surgia assim, uma nova Classe de Guerreiro.

    Aventura de Elane


    Com seu espírito aventureiro, Elane deixou a proteção das muralhas que construíram, para conhecer as terras inexploradas. Caminhava em uma trilha perto de uma montanha, onde avistou Orcs e Ciclops que iam ao seu encontro, ela defendia dos ataques, e com magias, curava suas feridas, porém, como nunca teve um treino prolongado no manejo de armas e não conseguiu completar os treinos nem dos magos nem dos druidas, era o máximo que conseguia.
    Os golpes cada vez, mas fortes, a energia espiritual ia se esgotando, suas feridas já não era mais curada, seria o seu fim?
    Quase se rendendo acreditando que sua aventura acabaria nesse momento, viu um dos Orcs caindo por terra.
    Já tonta de tanta dor, começou a ver Ciclops e Orcs um a um caindo por terra, não estava entendendo como as Criaturas estavam morrendo sem que ela fizesse nada, foi quando avistou um grupo de Elfs Scout e novamente um brilho se propagaram nos olhos da menina.

    Os elfs cuidaram de suas feridas, ensinaram a utilizar Arco e Flechas, e também como ela poderia fabricar Flechas com o poder da mente.
    Elane era muito talentosa, aprendeu rapidamente novas magias, conseguiu até criar uma flecha especial, com a habilidade para fabricar runas de fireball que aprendera com os feiticeiros e a habilidade de fabricar flecha aprendida com os elfs, ela conseguiu juntar as duas, e desenvolveu a magia para criar uma flecha que ao atingir seu alvo, explodia, ela a chamou de Burst Arrows.

    Após aprender tudo que podia com os elfs, ela partiu da cidade dos elfs, hoje conhecida com Ab’dendriel, em busca de novas aventuras.
    Ao caminhar para o sul, avistou uma criança, cercada por Orcs.
    Ela puxou seu arco e com uma velocidade quase inacreditável, extinguiu com todos os Orcs.
    Foi acudir a criança, e descobriu que não se tratava de uma criança, mas sim um anão.
    O anão contente por ela ter salvado sua vida, ele levo-a para sua cidade entre as montanhas, conhecida hoje como Kazordoon.

    Nesta cidade, os anões apresentaram a Elane uma arma mais poderosa que seu Arco e flechas, era uma Besta que atirava dardos.

    Elane não teve problema em se acostumar com a nova arma, e pode aprender a magia onde de sua mente, poderia materializar dardos instantaneamente.
    Elane, já sentindo falta de sua famila, retornou ao lar, se deparou com uma cidade já construída, hoje é conhecida com Thais, a capital tibiana.
    Elane sempre lutava em nome da justiça, defendendo aqueles que necessitava, e com essa nova vocação, ela se denominou Paladina.

    Os rebeldes

    Elaine ensinava novos adeptos a vocação, porém, começou a surgir um confronto onde mulheres não queriam que os homens aprendesse a arte de Elaine, alguns homens com mente em destruição foram banidos e se refugiaram nos mais diversos lugares, alguns se denominam de caçadores (hunter), outros utiliza a arte da distância e magias de invisibilidade com muita eficiência, são conhecido como Assassinos.

    Algumas mulheres por não aceitarem homens decidiam partir da cidade e fundaram a tribo Cobra-Crânio nos pântanos, são conhecidas como amazonas e valkirias.

    Magias Sagradas

    Elaine escreveu em seu diários como aprender magias sagradas e outras que aprendeu com os feiticeiros e druidas, esses diários estão espalhado por todo o continente, recentemente achara um diário onde Elaine revela o segredo das magias caldeira divina, divene magic missel entre outros, onde os diários estão no poder dos alquimistas de edron.
    Algumas magias caíram no esquecimento, os diários foram perdidos, tais como utilizar scroll, fabricação de runas magic missel, runas de fire boll. Outras estão para ser revelada.

    Elaine se tornou um simbolo, hoje o mais alto cargo de um paladino é o título de Elaine, e só pode ser atribuido a uma mulher.

  5. #5
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    Padrão Memória Pilchada

    ...
    Citação Postado originalmente por Memória Pilchada



    Rua cheia, céu nublado, vento frio – do tipo de brisa leve que, úmida, anuncia a proximidade da chuva...

    Um homem caminha com passos firmes e barulhentos por entre as vendas de quinquilharias e as pessoas absortas em seus próprios afazeres tediosos. Exótico e confortável em suas vestes, contrasta com a multidão de paletós, suéteres e saltos-altos: Seu poncho alegre e multicolor, uma longa manta tradicional de um algodão felpudo – herança deixada por índios peruanos ancestrais - o cobre do pescoço onde pende o lenço até as botas cobertas de lama seca.

    No meio daquele mar de desconforto, gravatas apertadas e pés espremidos em sapatos o homem parecia um bicho estranho, deslocado do seu habitat. O ritmo das suas passadas é lento, sua expressão serena.

    Tudo em volta é frenético, porém: os outros andam como se a própria calçada ou os prédios demandassem pressa, opressores.
    Ele, ao contrário, anda e observa. Nada parece escapar ao seu olhar manso, como se procurasse por algo. Mas não parece haver nada ao redor, nada de vivo para ser achado – apenas fumaça cancerosa das chaminés ambulantes, suor, concreto e ânimos de ódio.

    Enfim, algo digno captura a sua atenção: Um menino pequeno, eufórico, brinca de cavalgar em seu potro imaginário, montado em meio cabo de vassoura. O garoto passa por entre as pessoas dando ordens para seu cavalo, e parece não notar o que se passa ao seu redor – o mundo em sua cabeça é, certamente, muito mais interessante que o real.

    Essa visão o deixa admirado - ele pára de braços cruzados e apenas observa. No seu rosto marcado pelas agruras da meia-idade subitamente se nota um sorriso maroto e juvenil, daqueles que a face de um tolo não poderia exprimir – e também inconcebível para os velhos de espírito.

    Após se aproximar da criança sem tirar os olhos dela, o Xirú se agacha e diz, amigável:

    -Ei guri!

    O garotinho então vira-se para ele, puxando as “rédeas” com força para manobrar o “cavalo” bravo.

    -Mui formoso o teu cavalo, - Ele encara levemente o pequeno, esperando para ver a sua reação, mas o jovenzinho mantém-se calado. Ele era um “estranho” para o pequeno, afinal, em muitos sentidos e aspectos. Meio temerosa, a criança olha interrogativamente para um senhor muito barbudo a poucos metros de distância: Seu pai, que não percebe nada – ocupado demais a comparar os preços de uma vitrine. O olhar da criança permanece sem resposta.

    O Xirú continua a falar, insistindo na conversa:
    -Entonces, o que quieres ser quando crescer?

    O pequeno pensa por um brevíssimo momento apenas, e então olha bem nos olhos do outro como quem olha para um amigo. Resoluto e agora sem consultar ao pai, ele responde com característico entusiasmo infantil, abrindo bem a boca e os olhos – tinha a resposta na ponta da língua:

    -Quero ser um grande herói! Como os da tevê!

    O homem primeiro esboça um largo sorriso, mostrando que gostou da resposta, e em seguida ri às gargalhadas, chamando a atenção de todos ao redor - que olham desconfiados e repreensivos. Nessa cidade, nem mesmo o som da alegria é bem-vindo.

    Após um momento a risada se dissipou no ar como fumaça e, sorrindo de boca aberta de modo a mostrar bem os dentes amarelados, o homem do poncho diz:

    - Um grande herói, sim! Sabe, piá, heróis eu conheço alguns – Novamente o sorriso maroto de antes brota em sua face, tão naturalmente como a água cristalina que brota da terra nas montanhas.

    O homem do poncho, ainda sorrindo e agachado, fica pensativo por alguns segundos a olhar seu interlocutor, que agora já se prepara para puxar as rédeas e sair a galope. Por fim, dá um forte e sonoro tapa no próprio joelho, fazendo o menino pular de susto, e fala feliz:

    Ahá! Pois então, guri, que seja!

    E dizendo essas palavras, sutilmente cobre os olhos da criança com uma das mãos calejadas e ásperas.

    .......


    Por alguns instantes, tudo vira escuridão para o menino - seus olhos nada vêem. Uma emoção profunda toma conta do seu ser, e por um instante ele se torna livre e uno com o universo, enquanto é engolido por um silêncio absoluto. Logo após sente muito frio, como se a própria matéria do seu corpo perdesse quase todo o calor, e seus sentidos ameaçam falhar, indicando a proximidade da morte.

    De repente, justo quando tudo parecia chegar ao fim, ele sente seu próprio corpo novamente. Retornando à vida, respira fundo como quem emerge após um longo tempo sem respirar, desesperado.

    Algo havia mudado. De alguma forma ele percebeu que nada mais seria como era antes, e por um segundo ficou na penumbra, no limiar inalcançável do real que se situa exatamente entre o passado e o futuro. No segundo seguinte, voltou a sentir algo à sua volta, e novamente ficou preso à realidade, separando-se de todo o resto...

    Sente-se um tremor no ar, seguido do estrondoso som de um canhão fazendo fogo. Um instante após, outro som o envolve: Como se fossem o oceano, tomando conta de toda a percepção, muitas vozes masculinas em coro gritam com toda a potência de seus pulmões - era o brado furioso de muitos homens da guerra. Assustado, com o coração na boca batendo muito rápido, o garoto abre os olhos e vê novamente.

    Extasiado e sem acreditar no que seus olhos lhe mostravam, fica boquiaberto: As ruas de pedra morta e as nuvens tristonhas não estavam mais lá. Em seus lugares ficou apenas um gramado verde-acinzentado que, coberto de orvalho, dança com o vento minuano sob um céu vermelho banhado pelas primeiras luzes do sol. Olhando em volta, nota que está montado numa bela égua malhada e inquieta que, nervosa, mexe as patas e ameaça relinchar. Percebe também que é seguido de perto por canhões e homens de todas as cores de pele, entre os quais estavam centenas de outros cavaleiros empunhando lanças e armas de fogo, em formação militar.

    Ele agora já era adulto, suas feições infantis e a pele imaculada deram lugar a barba e bigode malfeitos e um rosto bem marcado, com ossos proeminentes e cicatrizes de muitas batalhas. O sabre pesado na sua cintura estava pronto para ser desembainhado, e parecia ter vida própria, desejoso de ser empunhado.

    Do outro lado do campo vinham outros gritos. Embora não se pudesse ver a sua origem, se aproximavam rápido – eram as tropas inimigas.

    Embora a situação fosse inexplicável e confusa, nada parecia estar errado. Ele tinha lembranças de uma vida inteira, campos verdes e primaveras percorridas em cima do lombo de cavalos. Aquela era a sua vida, e sempre havia sido. Nem em seu coração ou sequer em sua mente havia dúvidas.

    Sem que ele percebesse, todo resquício de memória do seu antigo e barbudo pai, do cabo de vassoura, da cidade agonizante: tudo perdia nitidez e sumia rapidamente, de volta ao pó – quando ainda era palpável aquela realidade era vazia, mas agora nem o vazio restava. Enfim, uma última memória passou pela sua mente, suave e discreta como o vôo do beija-flor: O som de uma gargalhada alegre, um olhar amável e um poncho multicolor.

    – e assim a antiga vida perdeu-se nas sombras eternas para nunca mais ser achada, nem sequer nos pesadelos de noites solitárias e frias sob a lua.

    Não havia o que temer e ir adiante era a única alternativa, afinal, pois todos ao redor esperavam suas ordens.

    – Assim a criança se perdeu, nunca existindo.
    Em seu lugar ficou o homem, o capitão:
    Aquele que - em algum momento - morreria em batalha, e teria seu nome esquecido.
    Aquele, a quem - mais tarde - alguns chamariam “herói”.




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    Padrão SOBRE TIARAS E JOANINHAS

    ...
    Citação Postado originalmente por SOBRE TIARAS E JOANINHAS


    Santoro subiu apressadamente as escadarias, tomando cuidado com as poças de água remanescentes da chuva que caíra horas antes. Cada salto necessário para escalar os degraus de pedra fazia seu chaveiro tilintar qual um guizo dependurado em um animal de pastoreio. Chegando ao final da escada repousa a mão sobre o bolso da calça, fazendo cessar o barulho. Era hora de se aprumar. Pente ao cabelo, lenço à face, bala de menta à boca. Pelo reflexo da porta de vidro se alinha, ajeita a gravata, fecha o paletó, sobe a cintura da calça. Ah, estava ali um bom partido, pensou. Não que queira se gabar, mas Santoro se sabia o tal. Entretanto, caro leitor, não havia nenhuma mulher agarrada às suas pernas, suplicando atenção. Bem, talvez porque era apenas 9:00h de uma manhã nublada de domingo.
    Deslizou em direção à entrada. Percebeu que o serviço já estava sendo proferido. Redobrou os cuidados para não se fazer notar e, esgueirando-se junto à parede caiada, postou-se entre uma pilastra e um vaso enorme com uma planta densa de folhagens. Seus olhos vasculharam o ambiente, notando os cabelos loiros, ruivos, negros; as carecas brilhosas, os meninos com seus bonés; os penteados elaborados, as permanentes com prazo vencido, as moscas sobrevoando os pouco asseados; brilhosos pelos cremes ou pela oleosidade, vastas e ralas cabeleiras formavam um mar irregular que contrastava com o teto reto daquela igreja.
    Contava já às centenas quando seu olhar repousa em uma singela mas importante tiara vermelha. Só podia ser ela. Coincidiu o momento com a ação do Pastor que conduzia o culto desde o altar. Com um gesto ergueu a todos do conforto rígido dos bancos em que se encontravam assentes, inclusive a garota de tiara vermelha.
    O que era procura virou fascinação, imersão, hipnose. Sentia-se imergindo em outro plano, abstraindo-se da realidade. As palavras professadas pelo Pastor eram como sons sem sentido que compunham o pano de fundo de um ato em que só havia dois personagens: Santoro e Ângela; sim, agora sabem o nome da garota sobre a qual nosso protagonista dirigia toda atenção.
    - Em nome do Pai, do Filho... – o costume era que levava as palavras do Pastor aos ouvidos de Santoro, pois sua concentração estava centrada naquele ponto vermelho que estava postado uma dezena de fileiras à sua frente.
    Os cabelos presos pela tiara deslizavam em direção aos ombros, onde se mostravam libertos. Originalmente negros, agora coloridos em um vermelho discreto. Compunham um contraponto à blusa de cor clara.
    - Glória à Deus acima de todas as coisas... - exalado por caixas postadas nas laterais do recinto, de uma gravidade que parecia que vinha do próprio Criador, o som trouxe nosso herói de volta à realidade.
    Como naquele dia seu espírito era mais de flores que de louvores, resolveu sair pela porta lateral. Alguns passos o levaram para o jardim paroquial. No instante em que a porta se fechou, instalou-se um silêncio feito de cricris, zumbidos e farfalhar de folhagens. Os insetos, alheios às necessidades espirituais cuidavam da sua subsistência e perpetuação. Uma joaninha que havia se instalado no ombro do paletó de Santoro foi ejetada por este com um peteleco, o que denotou sua descrença à suposta boa-venturança trazida por este inseto.
    Quem o visse de longe, logo imaginaria ali um cara discreto, equilibrado, centrado. Mas se esse observador conseguisse se aproximar até poder ouvir a respiração de Santoro, perceberia que esta estaria curta e pesada, os olhos com a retina pronunciada, os dedos nervosos. Em verdade, Santoro estava recuando. O medo de ser recusado o intimidava. Sabia que não retornaria ao ambiente onde Ângela, sem o saber, o esperava. Mais alguns minutos e fugiria covardemente rumo à mesma escadaria por onde subira confiante minutos antes.
    Lágrimas da covardia já haviam se instalado em seus olhos e os fluidos internos faziam santoro ter que engolir. Baixinho, entre soluços, seus lábios pronunciaram:
    - Eu te amo Ângela.
    Quase inaudível, a frase teve um ouvinte inesperado.
    Em coisas de amor, há um pouco de sobrenatural, senão como explicar as coisas relacionadas ao coração? E essa sobrenaturalidade havia ali sido expressa.
    Quem se postava atrás de Santoro era a dona de seus sentimentos. Contrapondo o choro de covardia de um, havia o início tímido de um choro de alegria do outro. Ambos se olharam e com um sim declarado apenas pelo olhar e pelo gesto de aceitação no movimento da cabeça, cancelaram seus choros em um abraço pleno, onde suas almas se converteram em uma só.
    Bem caros leitores, iria relatar ainda da joaninha que veio repousar sobre a tiara vermelha, mas poderiam achar a historia piegas demais. Mas posso garantir, eles viveram felizes para sempre.

  7. #7
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    Padrão Açougueiros

    ...
    Citação Postado originalmente por Açougueiros

    Chegou de ônibus naquela pequena cidade do interior, ponto final de uma linha decadente, caindo aos pedaços, disposto a tomar um café e voltar para a estrada. Veria na rodoviária qual era o próximo horário de viagem.

    Não era propriamente uma rodoviária, apenas uma placa e um sujeito sentado num caixote, fumando um cigarro fedorento.

    A cidade cresceu em volta da estrada e tinha apenas uma rua transversal. Se formava pelo posto de gasolina, um botequim para caminhoneiros e uma capela com a imagem de Santa Edwiges, trancada. Alguns barracões completavam a imagem de interior rural.

    Olhou para um lado, depois para o outro, pensando que já tinha visto todas as belezas naturais do vilarejo, ou seja, nenhuma. Agora já podia ir embora dali o mais rápido possível.

    _Uma passagem pra fora daqui, por favor_ falava com o sujeito do caixote. Era mirrado, de pés descalços, pitava seu fumo e cuspia um catarro preto de lado. Não olhou nenhuma vez na direção do viajante.

    _O último ônibus que saiu foi esse agora. Próximo só semana que vem_ Um cachorro magro estava deitado ali do lado, lambendo uma quentinha de comida vazia. Provavelmente o almoço do homem.

    _Foi nesse mesmo que eu vim. Quero saber como faço pra seguir viagem_ indagou sem muita paciência com o bilheteiro.

    O sol de meio-dia estava escaldante, nenhuma sombra por perto, nem viv'alma a vista. Parecia uma conversa entre dois loucos no meio do inferno. Aparentemente o sujeito se divertia com isso e falava cada vez mais arrastado:

    _Não tem parada aqui. A única linha que vem e volta é essa que o senhor chegou_ Roncou e cuspiu no asfalto uma bolota gosmenta, dessa vez meio verde. O cachorro se alegrou, engolindo a guloseima numa lambida.

    _Você pode ficar na beira da estrada e tentar pedir carona pra alguém. Mas normalmente ninguém pára aqui. Cidade pequena, sabe como é_ completou e não se dispôs a responder mais nada.

    _Porra, mas em que buraco eu vim me meter_ pensou o estranho em voz alta, sem se importar se o estavam escutando.

    Foi tomar um café no botequim e saber se alguém poderia lhe dar carona de volta à civilização. Porque aquilo lá era um pouco depois do fim do mundo.

    Só tinha a dona do lugar, uma gorda meio sebosa de suor, e um caipira tomando um caldo de carne ou algo do gênero. Eram uns nacos de carniça boiando em óleo, culinária local, certamente. Café horrível, mas pelo menos conseguiu alguma coisa.

    _Então você faz frete pra capital? Pode me dar uma carona até lá? Ou qualquer outro lugar, parece que estou preso aqui por uma semana_ falava com o caipira, que babava na barba tomando aquela gororoba oleosa. Camiseta suja, boné mais sujo ainda, cabelos e barba sebosos. Com certeza era caminhoneiro.

    _Não vai dar, não tenho mais caminhão. Agora tô me dedicando a criação de porcos e galinhas_ falava e olhava pra dona do balcão. _Minha melhor cliente!

    _Te mato se quiser me cobrar pelos teus porcos bexiguentos e aquelas galinhas doentes_ apontava um facão de cozinha rindo pro cara. _Vai ficar sem janta hoje.

    _Essa bela dona aí é minha esposa_ gracejou o caipira, e o viajante pensou que a beleza havia passado bem longe de toda sua família por muitas gerações. Mas estava enganado.

    A gorda senhora convidou o estranho a dormir na casa deles, por uma módica quantia, claro, apenas o necessário para pagar as suas despesas com água e comida.

    Ficou combinado que os três voltariam depois do expediente, período em que não apareceu ninguém para comprar ou mesmo perguntar qualquer coisa.

    Era uma loja às moscas, literalmente. Dezenas, centenas talvez, em todas as cores e tamanhos. A senhora se divertia jogando um pouco de cerveja no chão de terra batida, olhando uma nuvem negra de insetos se formar em cima da bebida. Em seguida, espantava os bichos e sacudia uma frigideira no ar. Um som de pipoca estourando enchia o ambiente, e dezenas de moscas jaziam no chão.

    Periodicamente a dona fazia isto, mas as moscas eram mais rápidas em se multiplicar. O caminhoneiro sem caminhão tirava uma soneca recostado na cadeira, com o boné no rosto, o barrigão saltando por baixo da camiseta manchada.

    No final do dia, voltaram para casa. Passaram pela estrada, o bilheteiro não estava mais lá, nem o cachorro, nem o caixote. Apenas aquele catarro preto no asfalto, seco do sol, revelava o local exato de onde ficava.

    O carro velho tremia e sacudia na estrada esburacada de barro. O calor acumulado da tarde fazia todos transpirarem, deixando um cheiro azedo no interior do veículo.

    _Vocês moram muito longe da cidade?_ perguntou o novo hóspede. _Penso em sair amanhã bem cedo para pedir carona aqui na rodoviária.

    _Sim, sim. É logo ali, menos de uma légua_ respondeu o motorista. _Só quando chove que não dá pra passar, porque esta estrada miserável não tem conservação nenhuma.

    _Torça para não chover, querido_ a dona gorda já estava cheia de intimidade com o viajante, o que o assustou um pouco. Talvez por isso, resolveu mudar o assunto:

    _Vocês administram sozinhos a fazenda? _falou, sem um pingo de interesse no que o casal de caipiras fazia. O carro pulou de novo.

    _Não, não, coração_ começou a mulher. _Temos nossa filhinha, que é a razão de nossa vida, não é "painho"?_ "Painho" aprovava balançando a cabeçorra e dando um sorriso.

    Como era inútil tentar uma conversa razoável com aqueles dois, desistiu e calou-se até chegarem.

    A fazenda consistia em um barracão maior e outras duas construções pequenas. Nada que lembrasse remotamente uma fazenda. Havia chegado numa espécie de campo de refugiados ou favela de um dono só.

    Os porcos chafurdavam por todo lado, e meia dúzia de galinhas já estavam recolhidas no galinheiro. O cheiro não era dos melhores, mas o viajante pensou que seu cheiro também não estava dos melhores. Conformou-se e foi descobrir onde dormiria.

    Nada funcionava naquele lugar. Maçanetas emperradas que não fechavam, as janelas não tinham vidros ou estavam quebradas, o banheiro era uma casinha nos fundos do quintal, uma fossa séptica de odor pestilento e insuportável. Por sorte à noite o barracão era trancado e tudo que havia para as necessidades noturnas era um penico embaixo da cama.

    O hóspede já pensava em agradecer amavelmente aos seus anfitriões e ir buscar um lugar ao relento para dormir, de preferência bem longe dali, quando viu a figura da menina, um anjo, uma flor que brotara no meio daquela podridão.

    Trajava um vestido puído azul, os cabelos lisos, negros, desgrenhados e os seus olhos azuis eram muito tristes. Não tinha mais do que 16 anos. Ele interessou-se por ela e apenas por este motivo ficou. Notou que mancava da perna esquerda, mas isso não tirava a beleza da moça.

    _Então você é a filha deles. Gosta daqui?_ nenhuma resposta. Tentou de novo.

    _Eu vou passar aqui esta noite, sou hóspede dos seus pais. Perdi minha condução, parto amanhã de manhã.

    _Pode me levar com você?_ esta era uma pergunta que ele não esperava ouvir, e que o fez engasgar e emudecer por algum tempo.

    _Não posso fazer isso, seria considerado seqüestro ou rapto_ respondeu. Não havia nada que pudesse fazer por ela. Além do mais, era louca como os pais, apesar de muito bonita.

    _Então qual é sua utilidade? Não é melhor do que estes porcos que vêm e chafurdam onde há lama e restos para comer.

    Esta era uma verdade incontestável, por isso não respondeu. A bela moça se virou e saiu mancando lindamente da sua perna esquerda.

    Este episódio abalou o viajante solitário. Deitado em sua cama cheia de percevejos, gordos como feijões, não conseguiu dormir pensando nos estranhos acontecimentos do dia.

    Havia movimento na cozinha. Ao que tudo indicava, a gorda senhora mantinha sua forma redonda a custas de pesadas refeições noturnas. O cheiro de banha de porco dominava todo o ambiente. Pensava que, afinal de contas, a garota não estava tão louca assim de querer fugir daquela ratoeira.

    Em seguida, ouviu ganidos e gemidos, parecia um cão tomando uma surra. Primeiro bem fracos, depois cada vez mais freqüentes e mais altos. Foi verificar, violando sua decisão de não se intrometer no cotidiano daquela pequena comunidade rural.

    Os sons vinham do quarto do casal. A dona gorda continuava na cozinha, fritando com banha de porco. Da porta reconheceu os gemidos: eram da garota, tinha certeza disto. Alguns grunhidos de homem interrompiam um soluço e choro contidos.

    _Este filho da puta estupra a própria filha! Por isso ela queria fugir_ pensou. Agora o viajante se arrependia da sua estupidez e covardia.

    Viu uma forma de se redimir: um pé solto de cadeira, que estava encostada no corredor. Retirou o pedaço de pau vagarosamente, sem fazer o menor ruído. Imaginava que salvaria sua princesa e seriam felizes para sempre, ou só queria fazer o que era certo. Sabe-se lá o que passa na cabeça de um homem nessas horas.

    Mas quando abriu a porta, o horror. O vestidinho azul puído da moça levantado até o meio das costas. Ela estava de bruços e dava para ver o enorme buraco que existia em sua nádega esquerda. Uma cicatriz tenebrosa, um sulco enorme que caberia uma laranja.

    Gemia amarrada à cama, mordendo um travesseiro. Seu pai estava com um avental de açougueiro ensangüentado, passando enorme fação em sua coxa direita. Tirava caprichosamente uma fina fatia de cada vez, o que a fazia se retorcer e saltar. O cheiro de sangue dominava o cômodo dando-lhe um aspecto de matadouro.

    Seu estômago se rebelou, regurgitando uma bile amarga que sentiu chegar à garganta. A cabeça rodava, as mãos ficaram moles como manteiga. Pensou que desmaiaria, mas conseguiu voltar para seu quarto tão silenciosamente como viera.

    _Mainha, hoje tem filé mignon_ ouvia risos e gordura fritando a carne. Não quis ouvir mais nada e dormiu.

    Havia bacon frito no café da manhã e a filha do casal não apareceu. Ele não estava com fome. Pagou o que devia e andou por meia hora até o centro da cidade. Ainda bem que não choveu no dia anterior.

    Cuspiu no chão, estava contaminado com aquele lugarejo. O cuspe saiu grosso, pendendo pra fora da boca num fio longo que não se soltava. Precisou da ajuda de uma das mãos.

    O cachorro magro lambia a gosma enquanto a figura cabisbaixa do viajante ia sumindo na estrada.

    _São 60 Km até a próxima vila_ gritou o bilheteiro, ele podia jurar que o homem estava rindo. Não acenou nem respondeu.

    Chegaria a outra cidade nem que fosse a pé.

  8. #8
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    Não é flood, apenas retirando algo que falei =)
    Última edição por Pernalonga; 19-12-2008 às 11:32.

  9. #9
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    Que indecisão maldita.
    Encontros é fenomenal, e tem um lado sábio e bonito.
    Memória Pilchada também foi muito legal.
    O Açougueiro é realmente bom pelo final e gostei bastante das descrições.
    Dentre os três, eu preferi menos Memória Pilchada, porque foi o mais inesperado.
    Meu voto vai para Encontros, apesar de ter gostado igualmente de Açougueiros.

    (PS: Serão quantas eliminatórias? 2? )
    Última edição por Scholles; 17-12-2008 às 18:08.

  10. #10
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    Citação Postado originalmente por EleMenTals Ver Post
    Que indecisão maldita.
    Encontros é fenomenal, e tem um lado sábio e bonito.
    Memória Pilchada também foi muito legal.
    O Açougueiro é realmente bom pelo final e gostei bastante das descrições.
    Dentre os três, eu preferi menos Memória Pilchada, porque foi o mais inesperado.
    Meu voto vai para Encontros, apesar de ter gostado igualmente de Açougueiros.

    (PS: Serão quantas eliminatórias? 2? )
    Engraçado, a um minuto atrás eu falei para mim mesmo:
    "E agora? Encontros, Memória Pilchada ou O Açougueiro?"

    Hahahahahaha
    Puta indecisão!
    Meu coração fala Encontros, muito legal.
    Minha cabeça fala Açougueiro... =x
    Meu gosto fala Memória Pilchada.
    Ah

    Vai ser pelo meu gosto.


    EDIT: Esqueci de comentar, mas achei o das Joaninhas tão bonito. Sério, muito legal!

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    Última edição por Pernalonga; 17-12-2008 às 18:26.



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