Chave 6
Sir Winterfell x Matheus Bernardino x Secret Facts
Tema: A Hydra Solitária de Tiquanda
Apenas o Sir Winterfell mandou o texto!
Ele está automaticamente classificado! Segue o texto dele!
Spoiler: TextoTrês Dedos
Parte I
A chama da tocha tremeluzia entre as paredes rochosas. A crepitação do fogo parecia amenizar a ausência de um silêncio agonizante.
Para os dois aventureiros, aquele estalar seguido de uma sensação de calor reconfortante era o que bastava para fazê-los seguir em frente.
Um deles era um típico explorador e floriculturista. Enquanto o outro, bem... não se pode dizer exatamente que se encaixava em algum padrão de normalidade. Muito pelo contrário. Chamavam-lhe de Lionel, o Errado.
Lionel não teve muita sorte na vida, pois nada (ou quase nada) combinava em sua aparência. Seu cabelo era um moicano, mas não porque desejava ou cultivava aquilo, e sim porque era daquele jeito que simplesmente crescia. Não havia modo de abaixá-lo ou penteá-lo. Lionel já tentara de tudo. Água, tapa, cabeçada. Nem ao menos cortar o coitado conseguia, era duro como pedra.
No entanto, as coisas ainda podiam piorar. Imaginemos um moicano normal sendo visto de frente: sua direção será vertical à cabeça. O dele era um pouquinho diferente. Se visto de frente era horizontal, ou seja, ia de orelha a orelha. Dividia a cabeça em dois hemisférios: norte e sul.
Há outros inúmeros pequenos detalhes. Por exemplo, cada um de seus olhos apresentava uma cor característica: um verde musgo e outro amarelo pus. E, tudo isso, unido a uma das mãos que tinha apenas três dedos.
Voltemos então aos dois aventureiros adentrando a caverna.
— Lionel, foi aqui mesmo que viu ele? — Cochichou Pablo, olhando com desconfiança para o outro. — Já estou cansado de me envolver nessas situações um tanto estranhas. Você vive perseguindo esse Pé-grande. Volto a dizer, Pé-grande não existe! Só estou aqui pra te mostrar que isso é uma besteira das grandes. — Pablo adorava tagarelar, e a maior parte do tempo era uma vã tentativa de enfiar um pouco de sensatez naquela cabeça.
— Já disse! Ele estava exatamente aqui! Quando me viu correu lá pra dentro! — Gritou Lionel, esquecendo-se que estava adentrando numa caverna desconhecida, e que qualquer som poderia atrair todo tipo de criatura perigosa. — E outra coisa, você sabe muito bem que odeio que me chamem de Lionel. Kátia, esse nome sim é bonito. A partir de agora só me chame assim, pois, caso contrário, fingirei que não escutei.
Pablo, que já estava acostumado com aquele comportamento um tanto excêntrico, decidiu ficar quieto e concentrar-se em ir apenas andando.
Finalmente chegaram ao fim daquele caminho pedregoso, e se encontraram em um local com muitas estalagmites nas periferias que dificultavam a passagem. Do teto, por incrível que pareça, havia milhares de pequenos furinhos que permitiam a passagem de raios luminosos. No entanto, a erosão em um determinado ponto foi tamanha, que uma parte havia desabado. Entrava luz em alta escala por ali, atingindo uma grande área do chão áspero.
— Lionel, que plantas são aquelas? — Apontou Pablo para a região clara. — Acho que a luz possibilitou que elas crescessem. Mas é estranho. Eu nunca as vi.
Lionel naturalmente ignorou. É de Kátia que você deve me chamar, pensou, ranzinza.
No entanto, Pablo aproximou-se da região e tirou uma amostra, para analisá-la melhor depois. Enquanto remexia naquele pequeno amontoado multicolorido, um objeto oval roçou-lhe a mão. Era um ovo. Um enorme ovo verde.
Num ato impensado pegou o ovo. Só após alguns instantes raciocinou. Onde tem filhote tem mãe, foi a brilhante conclusão a que chegou.
No mesmo instante em que Pablo finalizou essa lógica aconteceram duas coisas. Uma enorme criatura verde de três cabeças saiu de trás de um caminho oculto sob as estalagmites, correndo para proteger sua prole, enquanto Lionel estava agachado com o olhar fixo no chão, de costas para a criatura, procurando pegadas de Pé-grande.
— Corre Lionel! Pelo amor de Fardos! Corre! — Implorou Pablo, correndo, desesperado, misturando lágrimas de medo com suor.
— De novo esse idiota me chamando de Lionel. Não aguento mais. — Resmungou, não percebendo nem escutando o tremor dos passos que vinham em sua direção. E mais que tudo, era a vontade de contrariar qualquer um que o chamasse daquele nome nojento.
Foi então que Pablo teve uma ideia genial.
— Corre Kátia! Corre! – Gritou a plenos pulmões, abraçado com o ovo, esquecendo de jogá-lo fora, por culpa do medo.
E então Kátia correu mais que nunca.
Parte II
De acordo com Pablo, o próximo passo seria vender o ovo. Tinha certeza que seria por um bom preço, afinal de contas, era de uma criatura rara e desconhecida. Muitos estudiosos deveriam querer aquele artefato. E o que era muito disputado, era caro.
No entanto, um empecilho havia surgido. Enquanto caminhavam pela longa distância entre a gruta escondida e seus chalezinhos no meio da floresta de Porto da Esperança, Kátia cismou que aquilo era um filhote de Pé-grande. Apelidou o ovo de Pé-pequeno.
— Que diabos é isso de Pé-pequeno? — Perguntou Pablo, já sabendo qual seria a resposta, porém perguntou mesmo assim como um desencargo de consciência.
— Meu fiotinho de Pé-grande! — Respondeu, observando o ovo com um ar paternal e fazendo uma vozinha um tanto estranha. — Papai vai cuidar de você bem direitinho. — Falou, abraçando o ovo.
Eles haviam encontrado aquela gruta numa excursão de negócios que ambos haviam feito, próximo ao deserto de Ankrahmun, ao tentar negociar flores raras com nômades que estavam por ali. Foi nesse instante que Lionel havia jurado ter visto um Pé-grande.
Portanto, a viagem de volta durou dias. E todas as noites Lionel (ou Kátia) dormia abraçado com o ovo bem próximo à fogueira. Vez por outra ouvia-se um estalar de beijos e Pablo já sabia que tratava-se do novo amigo sentimental.
Talvez tenha sido aqueles estalos que fizeram Pablo perceber, enquanto estava deitado, que aquele objeto significava muito mais que um mero ovo para seu amigo.
— Ele sente naquilo um calor e uma compreensão reconfortante. — Pensou. — Até porque o ovo não é capaz de discutir nem muito menos julgar sobre as coisas que fala.
— É o amigo que nunca teve. — Foi o último pensamento, antes de cair nos sonhos.
Parte III
Antes de finalmente chegarem em suas respectivas chacarazinhas, que ficavam numa área pantanosa isolada ao leste de Porto da Esperança, Pablo já havia se decidido. Esperaria para ver se aquele momento pegajoso entre o ovo e Lionel passaria.
Imaginou que aquele objeto verde nunca fosse eclodir, pois não se encontrava em um ambiente propício para isso.
Estava absolutamente errado.
Alguns meses passaram, e a vida dos dois não tinha nada de especial, a não ser o ovo, que sempre vinha acompanhado de Lionel como se fosse uma enorme segunda cabeça mutante.
Um belo dia, quando ambos descansavam sob a sombra das antigas árvores e o vento acariciava seus ouvidos com um doce som de melodia, houve um Crac que fez o moicano de Lionel arrepiar-se ainda mais.
Uma fenda surgiu na estrutura esverdeada como um terremoto faria na crosta terrestre.
Lionel pulou de medo. Logo depois olhou para Pé-pequeno. Ele estava morrendo, estava ferido! Não pode ser! Não se vá!
Pablo também havia visto o fenômeno e ficou em alerta. Nenhuma palavra foi entoada naquele instante. Era um momento de apreensão. O que viria a seguir era desconhecido.
— Ele está morrendo! — Gritou Lionel, e lágrimas jorraram de seus olhos, ouvidos e nariz, afinal de contas ele era errado, e todo o imaginável e inimaginável era passível de acontecer-lhe.
— Não, ele está nascendo. — Foi o que Pablo conseguiu dizer, diante do horror, lembrando-se da mãe daquela criatura.
Uma cabeça saiu.
Duas cabeças saíram.
Três cabeças!
Quando a criaturinha finalmente conseguiu sair. Lionel aproximou-se e a primeira característica que notou naquele ser fantástico foi:
— Cada patinha tem apenas três dedos! — Entoou, olhando para sua própria mão, emocionado, que também tinha três dedos. — É o destino, só pode ser! — Foi paixão à primeira vista.
Parte IV
Anos foram passando, mas o amor surreal de Lionel por aquela criatura manteve-se o mesmo. Só não aumentou ainda mais porque era impossível. Caso contrário, explodiria por aquele sentimento tão inflamado.
Enquanto o amor de Lionel permanecia-se inalterado, a criatura, ao contrário, era cada vez maior. Mas isso de forma alguma imporia medo nele. Ambos tinham três dedos, e essa era a verdade maior que Lionel enxergava.
E para falar a verdade, eles se davam muito bem. Podia-se sentir uma amizade realmente verdadeira pairando no ar. Até Pablo, apesar de sempre manter uma grande distância daquela criatura, um dia teve que assumir aquilo para Lionel. Ou melhor, Kátia.
Apenas alguns dias após o nascimento de Pé-pequeno, Lionel resolver dar-lhe um novo nome. Na verdade, nada mais justo que três novos nomes. Eram três cabeças! Cada uma deveria ter um.
Polegar.
Médio.
Indicador.
Esse era o nome de cada um deles. E, por incrível que pareça, cada cabeça tinha sua própria característica que, por coincidência ou não, seguia o padrão de cada uma de suas denominações.
Polegar, por exemplo, era a cabeça da extrema esquerda e a mais carinhosa de todas. Era a mais gordinha, e seu formato lembrava exatamente a de um dedo polegar com olhos e boca. Sempre que tinha chance encostava-se ao ombro de Lionel e pedia-lhe carícias.
Indicador, ao contrário, encontrava-se a extrema direita e parecia estar continuamente de mau humor. Mordiscadas e movimentos bruscos eram suas marcas mais fortes. Parecia sempre indicar um problema, apontando-o com seu longo pescoço. Problemas e brigas era do que mais gostava, porém, de uma forma ou de outra, amava Lionel de sua própria maneira.
Médio era exatamente o que dizia ser. Uma cabeça mediana. Ponderava com cautela, pensava antes de agir e se mantinha afastada de encrenca. Tinha a consciência limpa, pois qualquer confusão que as cabeças irmãs se metessem, sabia que, ou tinha sido Polegar, com sua doçura exagerada ou então Indicador, sempre brigão. Pode-se concluir, então, que não havia localização melhor para ele do que no meio de ambos.
Porém, os ventos arrastaram consigo palavras. E as palavras transformaram-se em boatos. Diziam na cidade que havia uma criatura perambulando pela mata. Caçadores foram chamados a pedido de Vossa Majestade.
Estradas perigosas
São como rosas
Arranquem-lhe os espinhos
E liberem o caminho.
Era o que costumava cantarolar o Rei, aos ouvidos do filho.
Parte V
— As últimas informações indicam essa região. — disse Rock, circundando uma área do mapa com o dedo. — Comerciantes relataram ouvir sons e até vislumbres da criatura, mas poucos tiveram coragem de aprofundar-se na mata. Os que o fizeram dizem ter visto um monstro de três cabeças acompanhado de um homem. — Comentou, um pouco constrangido com o absurdo. — Fiz perguntas na cidade, e os moradores disseram que nessa área vive um ermitão doido chamado Lionel, que raras vezes sai da mata.
Essas explicações eram dadas à Krael, um mercenário que nunca falhara e que era o favorito do Rei. Isto se devia a sua principal característica, a praticidade. Era um homem de poucas palavras. Chegava, matava e saía.
Após Rock, o mensageiro, passar-lhe as informações, Krael pegou a aljava, poliu a besta, arrumou alguns mantimentos e partiu, pronto para mais uma missão.
Parte VI
Lionel, o Errado, estava mais uma vez caminhando com sua amiga de três cabeças ao lado. Procuravam alimento. Polegar gostava de plantas, e quanto mais venenosas fossem, melhor era o gosto que tinham em sua boca. O veneno não lhe surtia efeito. Médio apreciava peixes, e talvez fosse o mais privilegiado, pois o rio corria por perto. Indicador era o mais radical, gostava de carnes e do sabor quente do sangue escorrendo-lhe por entre os dentes.
Estavam a algumas léguas do chalé. Na verdade, eles passavam a maior parte do tempo andando e explorando novos lugares, pois Polegar-Médio-Indicador não conseguiam permanecer no mesmo local por muito tempo, porque talvez, no fundo, sua natureza lhes diziam que não estavam entre os seres de sua espécie, apesar de amarem incrivelmente Lionel.
Flecha. Coração. Grito.
Precisa-se dizer mais?
Um homem ensanguentado no chão com uma flecha envenenada no peito. Gritos desesperados não do homem, mas da criatura. Até Indicador, comumente ranzinza, fazia parte do coro.
Após um momento de enérgica perplexidade, a criatura, até então comedora principalmente de vegetais e peixes, puxou de algum lugar uma ira selvagem. Queria matar. Os três pares de olhos varreram por entre as árvores.
Um homem com uma besta, já armando o lançamento da segunda, foi o que Polegar avistou. Sua calma desfez-se em migalhas. Puxou com toda a raiva os irmãos para a direção do covarde.
A segunda flecha zumbiu enquanto ainda corria. Acertou Polegar em cheio. Também estava envenenada. Mas nada o deteria naquele momento. Se pudesse dizer, seria:
— Veneno é meu alimento, maldito.
Quando estavam a poucos metros de distância, uma enorme onda sonora saiu das três cabeças. Era selvagem e antiga. Foi tão alta que pareceu ecoar e dar a volta ao mundo. Foi mandada diretamente ao homem, e este estava tão próximo que seus tímpanos explodiram.
Morreu instantaneamente. Como um homem tão fraco poderia ter derrubado Lionel de uma única vez?
A noite terminou com o choro da criatura ao lado de Lionel.
Não. Melhor chamá-lo de Kátia. Era o que preferiria.
Parte VII
Pablo, em seu chalé repleto de flores, escutou ao longe os gritos. Identificou no mesmo instante. Lionel estava em apuros.
Correu o mais rápido que pôde, levando sua bolsa de ervas medicinais, que sempre mantivera separada caso houvesse alguma urgência.
Seguiu a trilha e os rastros evidentes da enorme criatura que a todo lugar acompanhava Lionel. Pisava e tropeçava nos galhos de forma desengonçada. Chegou a cair quatro ou cinco vezes. Mas finalmente chegara. Demorou quase uma hora.
E lá estava a cena, pai e filho. O pai estava barbudo, caído no chão, uma flecha cravada. O filho tinha três cabeças. Qualquer um diria que era uma anomalia da natureza. Mas não aqui. Não para Lionel. E agora não para Pablo. Os dois eram sua única família. Por que só agora fui perceber isso? Pensou.
Checou o coração. Não batia.
Retirou a flecha. Polegar afagou-se no corpo de Lionel. Acabou lhe virando de bruços, involuntariamente.
Um pequeno movimento emanava da nádega direita de Lionel, o Errado. Parecia haver algo ali dentro. Pablo observou e apalpou. Era muito semelhante a um batimento cardíaco.
Foi então que uma incrível ideia perpassou-lhe. Pela primeira vez em toda a vida uma deformação poderia ter sido útil a Lionel! Seu coração não estava armazenado em seu tórax, mas sim em sua bunda! Pensou, aplicando-lhe rapidamente a erva.
Lionel então voltou à vida. Abriu os olhos. Renasceu. Devido ao veneno sua pele assumiu uma coloração amarronzada, confundindo-se com a mata.
Muitos acham que a Hydra caminha solitária. Poucos têm o conhecimento que Lionel está sempre ao seu lado, camuflado, protegendo sua família.
Edit: Recebi o texto do Matheus Bernardino com mais de dois dias de atraso (já sem chances de disputa), mas de toda forma, estou postando ele aqui em baixo para os que quiserem avaliar!
Spoiler: TextoBenvindos à Selva
O tempo é a magia mais poderosa já vista, ela é capaz de esculpir o mundo à sua maneira e modificar os seres que nele vivem da forma que mais lhe convincer. E foi com esse poder incomensurável que ele alterou o destino de um jovem mago nascido em Port Hope. Esse mago, meus amigos, é uma versão minha alguns anos mais nova e muitos anos menos experiente, nascida em uma tal época onde guerras eram comuns e a colonização de Port Hope estava em seu início. Tiquanda era uma selva inóspita e pouco explorada, guardava uma grande quantidade de lendas, as quais hoje não mais passam de histórias que as mães contam às crianças para que se comportem como pequenos nobres.
Era naquele quando, onde a cidade à leste de Liberty Bay não passava de algumas casas-na-árvore controladas por tribos gentis de nativos, cujo desenvolvimento era trazido e adaptado pelo povo de Thais, que eu havia nascido e crescido. Pelo fato de Thais estar testando um novo tipo de colonização na área, a colonização de exploração do conhecimento local, havia uma forte presença da Academia de Edron na vila, por esta razão eu estive em contato com magia desde o início e logo cedo mostrei-me talentoso no assunto. Quando criança, meu maior sonho era entrar para a Academia e ser reconhecido como um mago poderoso, entretanto esse sonho se tornou uma necessidade depois que meus pais morreram em uma missão de exploração da selva. Naquela época ninguém se importaria com um órfão nativo, então eu comecei a treinar árduamente com o simples objetivo de sobreviver. Foi nesse contexto que conheci um garoto, cujos pais também morreram em uma missão e cujo objetivo era o mesmo que o meu, o que gerou um apoio mútuo e um treinamento muito mais rígido. Hugh era seu nome, cabelos e olhos negros, tão habilidoso quanto eu. Nosso tempo de treino nos tornou mais que amigos, nos tornou irmãos.
Soou um tanto quanto fácil se juntar à ordem dos mais poderosos e complacentes magos que caminham pelo mundo, certo amigos? Desculpem-me se instiguei vossa inocência, não havia mencionado anteriormente, mas existia um desafio a ser cumprido por magos da colônia (aqueles que não possuíam um treinamento formal acompanhado por especialistas). No caso dos magos de Port Hope, Thais instituiu uma única tarefa, esta testaria as habilidades dos magos e, ao mesmo tempo, traria algum tipo de benefício à exploração que estava sendo feita. O desafio era simplesmente traçar uma rota até Ankrahmun, atravessando a desconhecida selva de Tiquanda, desbravando as montanhas à oeste da cidade dos faraós e derrotando a guardiã do caminho.
— Matar uma hydra, irmão... — Ponderou Hugh. — Acho que podemos fazer isso!
— Podemos! — Concordei. — Mas não será fácil, irmão. Pelos registros da Academia, essa selva é imensa e ela nunca dorme.
— Como sabes dos registros da Academia, irmão? — Perguntou Hugh em um tom que misturava riso e espanto. — É algo muito sigiloso, não é?
Os registros que os colonizadores colhem são guardados com muito sigilo e estudados minuciosamente por experientes alquimistas, um desses era meu pai. — Devemos nos preparar, Hugh, a companhia vai partir em três dias, seremos quatro magos ao todo.
— Esta mais do que na hora de conhecerem os magos mais fortes de Port Hope! — Declamou confiante. Hugh se especializou em magia de fogo, suas chamas mais escuras eram peculiares. Eu me especializei no domínio da energia em forma de ondas, luz e elétrons livres. Quatro magos partiriam de Port Hope em três dias, o conselho da equipe de exploração era muito claro: “Não se separem, caso o façam, é muito provável que morram.”, para Hugh tudo se baseava em uma questão de estratégia e trabalho de equipe, porém para mim tudo se resumia em fé e coragem. Mal sabíamos nós que apenas a união desses valores poderia nos levar ao outro lado.
Ao fim de três dias, assim como os outros magos, tínhamos tudo preparado para a partida. Apesar de não possuirmos dinheiro, Hugh e eu éramos exímios pescadores, vivíamos da pesca e alimentávamos o comércio de peixe da região, desta prática tirávamos nossas poções e runas e dela também pudemos obter nossos primeiros cajados. Antes de entrarmos na densa selva, recebemos os últimos avisos dos representantes da Academia e algumas palavras doces das pessoas que nos viram crescer nas ruas de Port Hope. Deixamos a cidade seguindo à leste pelo rio, a equipe era composta por dois magos e duas druídas: Hugh e eu éramos os magos, Lyanna e Luvyth eram as druídas, tínhamos a mesma idade com exceção de Luv, que era pouco tempo mais jovem. Nosso primeiro destino era uma torre de vigia à nordeste da vila o ponto mais distante já explorado, distando apenas de algumas milhas da cidade. O caminho até a torre foi tranquilo, a criatura mais temível que enfrentamos foi um crocodilo, o que rendeu carne em abundância para o jantar. Nossa primeira noite na selva foi agradável, acampamos no alto daquela base de vigia e podíamos ver grande parte da infinidade viva que era Tiquanda em sua imponente densidade. Quando a noite chegou e eu preparava a carne do não muito sortudo crocodilo que entrou em nosso caminho, as histórias começaram.
— Err.. Eu sei que não é a melhor hora, mas vocês já ouviram histórias de Tiquanda? — Perguntou Luv insegura. O medo já era visível na garota, embora eu tenha interpretado como um sentimento normal, uma ansiedade perante ao desconhecido.
— Eu ouvi falar de um deus macaco, que é considerado o guardião da floresta! — Disse Lyanna de forma descontraída.
— Dizem que também existe uma cidade perdida em meio à selva! — Completei. — Ruínas de povos antigos! Com certeza exploraremos esse lugar quando formos magos renomados! — Falei confiante. De fato eu estava transbordando confiança mesmo sentindo a insegurança de Nörr e a ingenuidade das garotas, porém toda minha confiança foi por água abaixo no momento que meus olhos encontraram os de Hugh. Não havia vida naquele olhar.
— Existiam hydras em Tiquanda. — Todos o fitaram assustados. Hugh continuou. — Será que quatro magos passariam por elas?
— O que você está dizendo? — Indagou Luvyth apavorada. A jovem agora transbordava em terror e eu não a culpo. A maneira como Hugh falou foi demasiada fria e contradizia aquele Hugh otimista de Port Hope.
— Todos sabem que as hydras habitam as montanhas a leste daqui! — Contestou Lyanna. — A Sociedade Exploradora já comprovou isso! Não faz sentido surgirem hydras aqui.
— O que houve com aquela confiança toda que carregavas há alguns dias? — Perguntei. Entretanto já sabia a resposta antes mesmo que Hugh pudesse me fitar com aqueles olhos.
— Eu li os registros, irmão. Ela vive aqui, ela foi expulsa e está zangada. O tempo e o destino destruiram seu habitat.
Usando todo o meu talento para modificar o assunto de uma conversa, eu consegui desviar totalmente o foco do grupo, terminamos a noite conversando e relembrando os épicos feitos dos cavaleiros andarilhos de sonhos. Mas obviamente eu não pude apagar a tensão que ficou no ar, muito menos a dúvida sobre a existência daquelas feras que foi originada nessa conversa. Nosso segundo dia dentro da floresta foi muito mais silencioso, as atenções estavam redobradas e o sexto sentido do grupo para qualquer barulho estranho proveniente de uma criatura potencialmente perigosa estava demasiado alarmado. Continuamos à leste após sairmos da torre de vigilância até encontrarmos o rio novamente, a ideia era simplesmente seguirmos o rio a norte e contornarmos este ou atravessá-lo assim que possível. Tudo estava de acordo com o nosso plano, íamos caminhando pela mata em fila, Hugh iluminava o caminho com seu cajado, uma vez que a copa das árvores muitas vezes impedia a passagem da luz dos sóis.
— Escutaram algo? — Perguntou Hugh, parando o grupo. — Tenho quase certeza que ouvi alguma coisa.
— A mata está ficando mais densa, deve ser o som de insetos ou alguma ave. — Ponderou Luvyth. Ela estava logo atrás de Hugh enquanto eu, por minha vez, estava logo atrás dela, seguido por Lyanna. Avançavamos rapidamente, porém com cautela. Cerca de uma milha a frende de onde paramos, Hugh nos parou novamente.
— Tem algo aqui! Vocês escutaram agora, certo!? ¬— Perguntou subitamente levantando o cajado. — Certo?
— Espero que não seja a tal hydra... — Lyanna tentou argumentar, quando eu a interrompi de prontidão.
— Não, realmente há algo rastejando ao nosso redor! Hugh, ilumine a nossa volta! —
— Utevo Gran Lux! — Bradou Hugh com uma clareza excepcional. E um raio de três metros em volta do grupo estava perfeitamente visível. A mata se contorcia e vinha em nossa direção, como se a própria Tiquanda estivesse prestes a nos devorar.
— São carniphilas! São muitas e já nos perceberam! — Gritei. — Não podemos continuar por esse caminho, vamos voltar! Hugh, é sua hora de brilhar!
Hugh deu meia volta e, virado para o caminho do qual viemos e gritou em alto e bom tom.
— Exevo Flam Hur! — As chamas cortaram a floresta abrindo caminho em meio às criaturas. Corremos em direção ao sul, eu fiquei para trás e usei runas de energia para impedir a passagem daquelas coisas, garantindo que pudéssemos nos reagrupar em segurança o que, desta vez, foi possível. Rumamos ao sul, ainda seguindo o rio, até chegarmos a uma pequena ponte, a qual atravessamos. Foi ao sudeste desse pontilhão que o nosso segundo dia chegou ao fim, nesta noite fizemos vigia, não mais tínhamos a segurança que a torre nos proporcionara, os turnos começaram com Hugh e terminaram comigo. Acordei o grupo antes dos primeiros raios de luz cruzarem o horizonte, começava a parte mais turbulenta da nossa aventura.
Continuamos seguindo à leste pelo rio, acredito que tenha sido à essa altura da nossa jornada que o tempo, aquela força poderosíssima que eu havia mencionado no início, começou a mostrar sua face tortuosa. Com o passar das primaveras, certas mudanças climáticas e físicas ocorreram no continente, mas precisamente no extremo leste de Trapwood, gerando um ambiente extremamente propício para o abrigo de uma raça há muito expulsa de seu lugar de origem. Nesse contexto nós conhecemos os lagartos de Tiquanda, cuja hospitalidade deixou muito a desejar, uma vez que eles nos emboscaram em uma clareira.
— Gosssto do cheiro do sssangue dessssassss criaturasss — Disse o líder. — Matem todosss!!!
Dessa vez foi a minha hora de brilhar, mostrando que eu também tinha um certo conhecimendo de magias pirotécnicas.
— Exori Flam! — Gritei acompanhado por Hugh. Em pouco tempo conseguimos afugentar o grupo de lagartos. Contudo era quase certo que eles voltariam em um número maior, então corremos o mais rápido possível para longe deles avançando de uma forma descuidada. Esse descuido quase custou muito caro.
Ao seguirmos em frente, a mata foi ficando menos densa, o que possibilitou avistarmos as montanhas que separavam as terras de Tiquanda das terras de Ankrahmun. Nossos corações se encheram de esperança. Não durou mais alguns passos. Um barulho ensurdecedor ecoou na selva.
— FCHHHHHHHHHHHHH!!! — O grupo paralizou como se o adentrar do som aos ouvidos houvesse surtido o mesmo efeito do olhar da própria Medusa. — HISSSSSSSSSS!!!
— Tinhas razão. — Fitei Hugh ao abaixarme para ouvir as vibrações do solo — A má notícia é que a criatura é bem grande, a boa notícia é que é apenas uma.
A criatura estava perto e se aproximando cada vez mais, em um instante que pareceu durar horas pude vislumbrar a criatura. Aquela hydra era imensa, suas duas cabeças eram assustadoras e elas estavam determinadas a matar.
— CORRAM!!! — Gritei. Mas a única coisa que tive tempo de fazer foi abraçar Luvyth que, paralizada em seu medo infinito, certamente iria morrer e me lançar no rio. Não havia visto se Hugh e Lyanna puderam escapar. Já na outra margem do rio Luv jazia desacordada enquanto eu rapidamente voltava na esperança de salvar meus companheiros, onde estaria Hugh?
Quando cheguei no ponto de partida, a fera já me aguardava e eu estava prestes a iniciar o que eu pensava ser a primeira e última batalha de minha vida. Não perdi tempo e comecei o ataque com fortes golpes de eletrecidade e já estava pegando confiança no combate quando uma de suas cabeças me arremessou a cerca de cinco metros em direção a uma árvore, antes mesmo de eu cair no chão a segunda cabeça já vinha em minha direção sedenta de sangue. Era o fim, pensei.
— Exori Frigo!!! — Lyanna gritou. Foi pouco efetivo, mas foi o suficiente para desviar a trajetória da cabeça, salvando minha vida. Entretanto a segunda cabeça estava à caminho, defendi-me com meu cajado evitando o contato e...
— Exevo Vis Hur!!! — Bradei. A criatura recuou e eu aproveitei a oportunidade e parti pra cima de uma de suas cabeças, furando seus olhos. Pensei que teria tempo de pular para o chão, mas a segunda cabeça pegou meu ombro antes que eu pudesse tocá-lo e me jogou em direção a beira do rio. Agora sim, eu estava perdido, pude ver meu sangue se misturar à agua do rio e pude ver a cabeça da hydra se aproximando, sentia minha própria pulsação diminuir, ela iria me pegar.
— Exori Max Flam!!! — Gritou Hugh vindo em minha direção. Naquela hora eu comecei a ver meu sangue na água fluir no sentido oposto e voltar para o meu corpo, ao mesmo tempo minhas feridas começaram a fechar e meu fôlego foi restaurado, pude avistar Luv no outro lado do rio, eu estava recebendo cuidados daquela druída. Aquele ato me inspirou de tal forma que talvez só a juventude pudesse explicar.
— Todos para o rio agora!!! — Gritei. Ao ver que meus companheiros já estavam a uma distância segura, corri em direção à hydra. Desviei do ataque da cabeça cega e projetei meu cajado contra a cabeça sã, tirando-a do meu caminho, agarrei-me ao peito da fera e gritei com todas as forças dos meus pulmões. — EXEVO GRAN MAS VIS!!!
Hugh foi o primeiro a voltar e avistou-me caído, ao meu lado jazia a hydra sem vida. Luv e Lya usaram suas energias naturais para restaurar um pouco da minha força. Acampamos ali mesmo, aproveitando o fato de que o odor do sangue fresco de uma hydra afastava qualquer criatura selvagem que ousasse se aproximar. Dois dias foi o tempo que levamos para cruzar as montanhas Kha’zeel e chegar à Ankrahmun, o resto do caminho foi tranquilo e alegre, a tempestade passara. Fomos recebidos por uma comitiva da Academia e encaminhados para Edron, onde nos tornamos magos oficiais. Vocês devem estar se perguntando onde o tempo e o seu poder se encaixou nessa aventura, certo meus caros? Hydras são criaturas peculiares e muito temidas por sua força e também pelo seu hábito de viver em grupos, a famosa Hydra Solitária de Tiquanda foi um caso à parte. Os mesmos terremotos e mudanças climáticas que possibilitaram a proliferação da raça de lagartos na região resultaram no deslizamento de uma parte da montanha, liberando a ilustre hydra em Tiquanda. A morte dessa mesma hydra, séculos depois, transportou quatro jovens magos da vida para a história, dando a eles o título de magos mais jovens a derrotarem uma hydra na Segunda Era.
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Responder com Citação
. Daí sei onde melhorar nas próximas.
) foi muito bem bolado, e fez-me dar boas risadas. O texto seguiu bom até o fim e, quando menos esperava, conseguiu por uma ótima cena de humor, com a última deformidade.

