Oi gente, talvez ninguem se lembre de mim, mas eu fui moderador da seção roleplay por quase 3 anos, enfim! Trouxe aqui um conto que eu criei a um tempo atrás. Não tem nada a ver com Tibia. Espero que alguns de vocês entendam o conto em si, espero que consigam ver que não é apenas 1 historinha :rolleyes:
Abraços.
Evolução
"Era uma tarde comum, quase igual a todas as outras, na qual Jonas, um jornalista mal-sucedido procurava na Internet alguma nova fonte de fofocas. Jonas havia se formado jornalista fazia dois anos, e atualmente trabalhava para uma coluna de fofocas em um desconhecido jornal on-line que temos na atualidade. Não era o trabalho dos sonhos de qualquer recém-formando, embora isso lhe pagava as dívidas, e Jonas, rapaz que nunca tinha sido ambicioso o suficiente, não pretendia achar um novo emprego, apenas seguiria com o seu atual até algo melhor bater à porta.
Estava a navegar pelos sites mais conhecidos de “pseudo-artistas”, ou melhor, pessoas que não têm talento algum e que não têm nada a acrescentar, que ficam famosas às custas da ignorância dos brasileiros por terem participado de algum reality-show ou algo do gênero, quando se deparou com uma notícia interessante que lhe chamou a atenção: “Porco falante é atração na Alemanha”. Clicou no link e começou a ler a notícia na qual falava que um porco havia aprendido a reproduzir algumas palavras em alemão e o que os cientistas estavam estudando era se o animal também entendia o significado semântico.
Jonas bateu os olhos no relógio da barra de ferramentas do computador e viu que já estava na hora de ir pra casa. Desligou o computador, arrumou sua mesa, recolheu seus pertences em sua pasta e se dirigiu à porta do edifício. Estava um fim de tarde agradável, não fazia muito calor, embora a Avenida Paulista estivesse abafada em razão da fumaça dos carros. Jonas andou alguns metros até o ponto de ônibus ao lado da entrada do metrô Consolação. Ficou parado por alguns minutos no ponto enquanto seu ônibus não chegava, e observava as pombas urbanas ciscarem a calçada bicando o concreto caçando algo para comer. Havia um grupo de cinco ou seis pombas próximas umas as outras, e andavam de um lado pro outro com seus pescoços balançando para frente e para trás, como os egípcios faziam com seus braços enquanto dançavam na antiguidade.
Ele riu sozinho de sua comparação dos pescoços das pombas com os braços dos egípcios e fez sinal para o ônibus que estava a chegar. Embarcou no veículo, e sentou-se à janela, onde ainda podia observar as pombas esfomeadas beliscando o concreto com seus bicos, embora uma delas não fazia esforço algum em encontrar alimento, mas estava, na verdade, encarando Jonas. Aquela pomba o encarava tão brutalmente que os olhos de Jonas viraram-se para outra direção para evitar o contato visual, mesmo que por alguns segundos, quando recobrara a consciência de que ele era um ser humano, e não havia por que não encarar uma mera praga urbana como aquela. Fitaram-se por mais alguns segundos, e Jonas observou-a atentamente. Era igual a qualquer outra pomba que vemos na cidade. Acinzentada, com as asas mais claras que o peito e a cabeça, cauda riscada de negro e pescoço esverdeado, aquele verde metálico incomum que pombas possuem na penugem do pescoço. O bico era curto, vermelho e afinado, e um de seus olhos era leitoso, como se fosse cega da visão esquerda. O ônibus começou a andar, e Jonas acabou adormecendo no banco.
Acordou quando o ônibus estava a dois quarteirões do ponto onde desceria. Levantou-se, esbarrando nas pessoas em pé, e deu sinal para descer. A tortura que o levava do trabalho até sua casa parou, e Jonas desceu. Já era noite, e o céu estava escuro. As ruas mal iluminadas faziam com que Jonas apertasse o passo para chegar mais rapidamente, embora o barulho que os saltos de seus sapatos faziam era algo que atrairia qualquer ladrão nas redondezas. Procurou as chaves em seu bolso a alguns metros de seu apartamento, quando sentiu algo estranho e molhado cair-lhe aos ombros e nuca. Como por reflexo usou a mão para verificar o que era e sua visão não foi das mais atraentes. Era uma substância branca, com partes estranhas esverdeadas, o tão conhecido cocô de pomba. Jonas olhou para cima para achar o artista que fizera a pintura abstrata em seu paletó e encontrou cerca de cinqüenta pombos pairados aos fios de iluminação acima de sua cabeça. Todos o encaravam como o pombo do ponto de ônibus, brutalmente. Soltou um palavrão, e continuou a caminhar em direção à porta de seu edifício, quando outro míssil de bosta o atingiu na cabeça.
- Só pode ser brincadeira... – Disse desacreditado.
- O que? – Respondeu uma voz desengonçada.
Jonas olhou para trás à procura do dono da voz, e não encontrou alma viva na rua. Eram apenas Jonas e as pombas. Olhou incrédulo para os fios, e viu que as pombas se entreolhavam.
- Oi? – Perguntou o fracassado jornalista.
- Oi o que, mermão?! – Bradou uma pomba particularmente agressiva.
O homem fechou e abriu os olhos fortemente algumas vezes em tentativa de acordar do possível transe causado pelo cansaço, mas nada aconteceu, a pomba ainda continuava a gritar:
- Cê cheirou? Cê fumou, foi?
- Bem que eu gostaria! – Respondeu-a Jonas, e houve uma agitação repentina nas pombas pairadas aos fios. Ficaram inquietas e começaram a endireitar-se, se agrupando para escutar a conversa.
Jonas fitou as dezenas de pombas que o observavam e resolveu entrar de vez naquele diálogo. Talvez aquilo ainda fosse obra do pó que o jornalista cheirara quando era mais novo e ia pros clubes noturnos da cidade, ou então da erva que ele fumara.
- Maconheiro safado! – Gritou com incontrolável fúria a pomba descontrolada, as órbitas de seus pequeninos olhos saltavam ainda mais de sua cabeça desproporcional ao corpo.
- Não fumo mais. – Replicou o jornalista – Agora eu sou um homem sério. – Continuou.
As pombas riram.
- Não, é sério! – Completou ele – Não fumo e não pretendo mais.
- Mas sente vontade, Jão! – Disse a pomba marginalizada.
O jornalista não respondeu.
- Nóia sem vergonha! – Gritou a pomba da favela mais uma vez, fitando o céu escuro da noite.
- Quieto. Aqui quem faz a falação sou eu. – Disse outra pomba. Essa tinha um ar mais intelectual. Pelo menos, seu tom de voz era mais sensato, e as palavras, apesar de saírem atropeladas umas às outras, eram mais identificáveis. Era atarracada e desproporcional. Era uma pomba gorda, e Jonas se perguntou como um animal daqueles conseguia voar.
- Mas você também fala? – Arriscou.
- Na verdade, não. Na verdade somos marionetes de um ventríloquo escondido atrás da lata de lixo. E isso é tudo uma câmera escondida do programa idiota que você passa a tarde toda assistindo durante o domingo. – Ironizou a pomba.
As pombas riram de novo. Jonas não se importou com a alfinetada, na verdade, quase nada estava sendo absorvido por ele durante a conversa. Estava perplexo demais por pombas poderem falar.
- Mas se vocês falam, qual o outro som que vocês fazem? Quero dizer, cachorros latem, cavalos relincham, vacas mugem, e pombas? Pombas fazem o que? – A pergunta fútil escapou dos lábios do jornalista.
- Arrolar, arrular, arrulhar, gemer, rular, rulhar, suspirar, turturilhar, turturinar. Esses são os verbos usados. Mas, em que isso é relevante aqui? – Respondeu o pombo intelectual.
- Nada, nada. – Disse – Apenas curiosidade inútil.
- FUMA MACONHA, CARAIO! – Berrou a ave favelizada.
Um silêncio desagradável tomou conta da rua por alguns instantes, quando o homem finalmente recobrara o juízo.
- Mas vocês não deveriam falar! São animais! – Concluiu.
- Vocês, homens, nascem humanos e tornam-se animais durante o decorrer de suas medíocres vidas. A partir do momento que crescem e se tornam independentes, vocês abandonam os pais que dedicaram mais da metade de suas vidas para cuidar e proteger a vocês. Vocês, que se julgam tão superiores a nós, acabam uns com os outros em frações de segundo por pura irracionalidade. E o que dizer sobre como tratam suas fêmeas? As abandonam por qualquer outra parceira que seja sexualmente melhor para carregar os seus genes. E eu poderia ficar a noite toda aqui dando razões para a sua animalidade. Vocês são como nós. Irracionais. O homem pensa que pensa, e essa é a verdade.
Jonas escutava o pombo como escutou a primeira aula que teve na faculdade. Absorveu cada palavra proferida. Só não tomou notas sobre o que o pombo falara, pois estava sem papel e caneta em mãos.
- E por que apenas os homens, animais tão irracionais quanto todos os outros, são providos de fala? Nós também somos, apenas pensamos duas vezes antes de falar. – Continuou – Nós também evoluímos, vocês não foram os únicos no planeta. Cada espécie do seu jeito, cada espécie em seu próprio tempo, mas no final, todos evoluem.
- Ou não... – Concluiu o jornalista. Balançou a cabeça, limpou a cagada de seu terno, e continuou o caminho em direção à sua casa, perdido em devaneios sobre a raça humana e a evolução que a mesma teve desde a época que a linguagem foi criada.
Jonas chegaria em casa, abriria a gaveta de seu criado-mudo e acenderia o cigarro solitário, forte, e ilícito que o faria repensar o diálogo que tivera com as pombas. E riria muito. Realmente as pombas eram mais inteligentes que os ratos. Ele não gostava dos ratos. O criticavam muito mais pela maconha do que as pombas o fizeram. As pombas eram mais filosóficas, os ratos eram apenas ratos..."
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