Não sou de universidade federal, sou de instituto federal. Mas enfim, o corte veio pra todo mundo do âmbito federal.
O que dá pra dizer dessa situação? Acho que a maior falha de todas é a que esse governo comete desde antes de ser governo: comunicação. Quando o corte nas 3 UF's foram anunciados, foi em tom de retaliação ideológica. A narrativa da "balbúrdia", de "gente pelada" e "esquerdismo" foi o tom dado ao corte. Logo em seguida, isso mostrou-se um blefe. O corte veio para todas as IFE's (Instituições Federais de Ensino), inclusive para os Institutos Federais, que não tem gente pelada e nem é bem uma universidade (aliás, fazemos o que o governo disse que iria investir quando em campanha: ensino técnico e voltado ao mercado de trabalho).
Aí a narrativa mudou, foi para a questão de "estamos cumprindo a promessa de campanha de tirar do Ensino Superior e colocar no Ensino Básico". Só que, anteontem, veio o corte também no Ensino Básico, provando que foi mais um blefe ou erro de comunicação entre governo e militância de internet.
Resumo da história: o que temos como fato são cortes em todos os Ministérios, que foram feitos com base na complicada situação econômica do país. Não tem dinheiro, isso é outro fato. O corte também tem um caráter de estratégia política: ele condiciona a volta dos recursos à aprovação da Reforma da Previdência. É uma boa jogada mas pode ter um efeito colateral complicado que é jogar parte dos cidadãos afetados contra o governo. Afinal, nas classes universitárias, esse governo tem um maior apoio, como as pesquisas tinham demonstrado durante eleições. Se a reforma não sair antes das IFE's pararem por falta de verba de custeio, a situação fica complexa.
Nos IFE's a sensação é de desespero, claro. São milhões de alunos que não terão mais aulas a partir de setembro, quando o custeio acaba. E não adianta a narrativa de que "é só administrar melhor, seus esquerdalhas!". Educação tem demandas periódicas e previamente acertadas, não se faz corte de custeio no meio do semestre sem qualquer tipo de planejamento ou redimensionamento de oferta. Também não cabe aqui o discurso ideológico liberal de privatizar o ensino, visto que não existe nenhuma empresa privada com capacidade de substituir em tão pouco tempo o que os IFE são e fazem.
Vamos esperar, isso ainda vai render. Esse tipo de medida de austeridade sem comunicação é o que fortalece o pensamento de esquerda, porque tira o chão de quem mais se apoia no Estado e está mais vulnerável. Um estudante pobre que vai perder bolsa de manutenção ou de transporte por causa disso é isca fácil para a narrativa de luta de classes. Principalmente quando esses cortes e sacrifícios não resvalam em outras áreas da administração pública, em especial, nos políticos, juízes, promotores e outras figuras da elite do funcionalismo público. Ou quando a carga de impostos ainda é alta e justificada por um Estado que oferece serviços públicos.
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Se o Congresso não aprovar a Previdência ou gastos extras a tempo, acredito na possibilidade real de um shutdown. Servidores federais sem salários é um quadro que particularmente me perturba.