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Tópico: Concurso Taverna do Roleplay - 2010

  1. #1
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    Padrão Concurso Taverna do Roleplay - 2010

    Concurso Taverna do Roleplay - 2010


    Categoria Off Tibia:
    1. Acordar - Steve do Borel
    2. Aquarela do meu Brasil - Drasty
    3. Malditos Sejam - Ldm
    4. "... Mas livrai-nos do mal, amém" - Thomazml
    5. Medo - Meltoh
    6. O Negro Destino de Marrom - Professor Girafales
    7. Os Áureos Campos de Centeio - Manteiga


    Categoria Tibia:
    1. A Batalha nos Campos da Glória - Thomazml
    2. Cerco em Carlin - Meltoh
    3. De Heróis e Vilões - Professor Girafales
    4. O Fantasma do Corsário - Drasty
    5. Sem Título - Ldm


    Categoria Poemas:
    1. Cordel - Wu Cheng
    2. Lanças - Meltoh
    3. Leviatã - Manteiga
    4. Meio Púrpura - Steve do Borel
    5. Poesia - Lucius Cath
    6. Quatro Gotas de Sangue - Drasty
    7. Roubaram minha Menina - Thomazml

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    Última edição por Wu Cheng; 21-04-2010 às 20:11.

  2. #2
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    Padrão Acordar - Steve do Borel

    Acordar
    Steve do Borel


    Naquela noite, me deu vontade de sair de casa. Assim mesmo, do nada e pra lugar nenhum, sozinho no Rio de Janeiro. Não foi uma daquelas vontades de ir pra alguma festa, chamar amigos e essas coisas. Foi uma vontade espontânea e misteriosa, de sair por aí caminhando acompanhado apenas de seus próprios pensamentos, que na verdade eram tão ou mais misteriosos que a própria vontade.

    Não que isso seja estranho, apenas parece estranho. No fundo no fundo, ninguém sabe exatamente no que está pensando ou no que quer, nós só estamos na vida pra caminhar mesmo.

    E foi assim, nesse espírito, que eu cheguei na praia. Não posso saber se era aquele mesmo o meu objetivo, porque, como eu já disse, a gente nunca sabe. Joguei a havaiana no calçadão e desci descalço, sentindo a areia fofa, a brisa marítima, o sereno daquela noite estranha e ouvindo o mar sussurrar palavras que não existem. No dia seguinte, já fora daquele transe, eu me arrependi de ter desperdiçado um chinelo assim, sem objetivo. Mas enquanto “aquilo” durou, eu não conseguia pensar em nada, decidir nada por mim mesmo. Era apenas o meu corpo tomando decisões e agindo por si próprio.

    Cheguei bem perto do mar, onde eu pudesse sentir aquelas ondas quebrando na areia, e lá na frente o mar se misturando ao céu, de modo que os dois parecessem uma única coisa. Aquela era a magia da praia à noite.

    Tudo estava tão perfeito, tão harmônico, até que o som do mar começou a se misturar com o riff inicial de Shiny Happy People. Será que eu estava mesmo ficando tão maluco assim? Fiquei um tempo acompanhando a melodia com a cabeça, até que finalmente acordei.

    - Alô?

    - Não tô conseguindo falar com o Marquinhos, tu tem o telefone do buffet aí?

    - Quê?

    - Tu tem o telefone do buffet aí, cara?

    - Como?

    - O evento cara! Trabalho! Tu tem o telefone da porra do buffet?

    - Ah, trabalho... não tenho não. Liga pro Felipe.

    O evento, trabalho... eu quase tinha me esquecido. Fui até o mar, peguei um punhado de água com a mão e joguei na cabeça. Depois, voltei pra casa, tomei banho, fiz umas ligações e dormi. E a realidade, sempre nos acordando.

  3. #3
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    Padrão Aquarela do meu Brasil - Drasty

    Aquarela do meu Brasil
    Drasty


    – A branca serve pra que?

    – Confia em mim, moleque, tu nunca vai usa a branca.

    – Fala de novo então, pra eu tê certeza.

    – Presta atenção, não vou repeti de novo essa porra. A vermelha é pra quando os alemão tá subindo. A preta é pra avisa que o morro tá em guerra. A azul é pra anuncia pros boy que a mercadoria chego.

    E em seguida o Negão batia o revólver na coxa para ter certeza que tinha dito tudo. Depois caminhava pela laje, encostava o corpanzil na sacada e olhava o sol bater no morro. As dezenas de casas emaranhadas na encosta com mais cores que o arco-íris. Quando chovia forte ele achava que a montanha viria abaixo, lavando todas as casinhas e engolindo todas as pessoas. Afinal, aquelas construções não eram fortes – feitas de tijolo e cimento – e haviam sido feitas sem sequer um engenheiro para projetá-las. Foram montadas do suor daquela gente humilde esquecida no pôr-do-sol do bairro nobre que lá embaixo – na civilização – jazia.

    “Bando de filhos-da-puta” pensava. “Fingem que se importam com agente, mas tão é cagando se agente vive igual bicho”.

    O menino respirou fundo e recolheu as cinco pipas deitadas no chão. Seguindo o outro, vagou pelas passarelas arquitetadas pelo acaso da favela em que cresceu. Conhecia cada esquina, cada dobra, assim como sabia o nome de todos que ali moravam. Para ele, gente de bem, trabalhadora e esforçada. Sabia quem eram as “ervas”, como chamavam aqueles que optavam por seguir caminhos mais sombrios. Embora soubesse que o Negão fazia parte desse grupo, tinha para si que se tratava de um bom amigo e entendia os motivos que o levaram a se juntar ao Napoleão.

    Napoleão era o dono do morro, se é que o morro podia ter um dono. Não era o tipo de pessoa com quem se tem um vinculo de amizade, nunca se podia esperar muita coisa vindo dele. Seu reinado tinha trazido a favela uma paz momentânea. Ele causava tanto medo à polícia que as investidas destes tornaram-se escassas até que quase não aconteciam mais. Há duas semanas, um grupo de quatro PM’s subira o morro para cobrar dinheiro do Zé, dono do bar. Nunca mais se ouviu falar desses quatro coitados, o Napoleão mandou matá-los e jogar seus corpos no rio que corria do outro lado da encosta. A delegacia só viria a encontrar os cadáveres meses depois.

    Dessa forma a vida na favela ia sendo levada. O povo fingindo ter paz e a polícia fingindo não ter nada de errado lá.

    Napoleão possuía diversos homens de confiança, entre eles o Negão, seu braço-direito. Ele buscava a mercadoria toda sexta-feira à noite e, também era quem cuidava de todo problema que os clientes pudessem criar. Com seu compadre achando solução para tudo, o Napoleão dormia tranqüilo enquanto enchia os bolsos.

    O moleque sentia o Negão mais nervoso nos últimos dias, desde que ouvira na televisão a notícia da força especial, cuja polícia montava para subir o morro. A coisa estava ficando feia, tinha gente comentando até da possível presença do exército na missão. Ele sabia que se houvesse um confronto desse tamanho, seu amigo talvez não sobrevivesse. Seu coração doía em se conformar, afinal a paz do Napoleão não podia durar para sempre.

    – Agora que cê trabalha pra nós tu vai ter que arranjar um apelido – disse.

    – Pode se qualquer merda mesmo? – perguntou o moleque.

    – Qualquer merda que tu quiser, moleque.

    – Xuazinégue pode? Sempre quis ter esse nome.

    – Essa porra é foda de fala, pensa em algo mais fácil, moleque.

    Com um peso estranho nos olhos o garoto respondeu triste:

    – Vai ser Moleque, cês só me chama assim mesmo.

    O Negão riu calorosamente.

    Empinar pipas não era difícil para o Moleque, brincava disso sempre, a diferença era que agora se tratava do seu ganha pão. Praticamente só a pipa azul subia até os céus. Quando o brinquedo surgia no topo da montanha dançando nos ventos demorava poucas horas para os clientes surgirem em massa. Pode acreditar, havia artistas de TV, filhinhos de papai e meninas vestidas como bonecas. De cima da loja do Napoleão, o Moleque trazia todo tipo de gente, parecia mágica.

    Pouco a pouco ele foi ficando mais entendido dos assuntos da boca e se não fosse pelo zelo do Negão, o garoto embocaria nos mesmo caminhos tomados por tantos. Mal sabia ele, que isso viria a salvar a vida do menino das pipas.

    Na tarde de uma quinta-feira cinzenta, o Moleque chegara à loja e notara a ausência de todos os vendedores. Napoleão e Negão também não estavam. Atônito com a incomum falta de estardalhaço no local, subiu a ladeira que dava para seu observatório e contemplou a enorme encosta se afogar em sombras. Na rua avistou uma movimentação estranha, havia carros de polícia e muitas luzes iluminando a cidade. Num susto, ele pegou a pipa vermelha e a lançou contra o ar. Seu corpo se encheu de pavor, não ventava. Nem uma brisa se quer ousava cortar o ar.

    Esforçou-se para por a pipa nos céus, mas era impossível. Então decidiu buscar outro lugar para empiná-la. Tomou todas nas mãos e disparou morro a baixo. Enquanto descia pelas muitas vielas e esquinas, começou a ouvir barulhos repetidos estourando contra as paredes e carros. Decidiu sair da rua principal da favela, ali estava perigoso demais para se locomover, por isso adentrou uma estreita passagem que desembocava no bar do Zé. Totalmente camuflado pelas sombras, o Moleque avançava no seu trajeto. De repente, parou. Alguns metros a sua frente havia um corpo estirado contra a mureta de tijolos. Para sua surpresa, morto na sua frente, estava o Napoleão. Três balas penetraram seu peito, uma delas bem no local do coração.

    O Moleque sentiu uma mistura de satisfação com pesar e por hora não lamentou ou comemorou a morte do seu chefe. Simplesmente continuou a correr, dessa vez ainda mais rápido. Seguiu assim até tropeçar em algo grande e cair.

    – Ai porra.

    Era o Negão. Deitado de bruços como uma jaca que acabara de cair de uma árvore.

    – Moleque, é tu ai?

    – Sô eu Negão. Tu tá bem, irmão?

    – To todo fudido, moleque. Os alemão me acertaram.

    – Cê vai morrer? – perguntou, embora conhecesse a resposta.

    – Num sei. To me sentindo fraco e ta tudo meio frio e meio escuro – o Negão estava morrendo, tinha sido acertado por mais tiros que o dono do morro. Cinco nas costas e mais dois no peito. Só estava curtindo seus suspiros finais, como quem fuma o último cigarro antes de largar o vício.

    – Moleque, cuida da tua vida, tá bom? Não faz merda como eu fiz não – disse tossindo.

    – Tá bom, Negão.

    Depois disso, um silêncio se estabeleceu. Um vento começou a soprar forte contra o rosto do menino. Ele escalou um compensado de uma casa daquele beco com as pipas de baixo do braço. Tomou uma nas mãos e arremessou contra o vento. A rabiola se desdobrou aos poucos e o brinquedo foi subindo. No céu da favela sem dono a pipa branca reinava, enfim sozinha.
    Última edição por Wu Cheng; 21-04-2010 às 20:11.

  4. #4
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    Padrão Malditos Sejam - Ldm

    Malditos Sejam
    Ldm



    “Deus os entregou a paixões vergonhosas: as suas mulheres mudaram as relações naturais em relações contra a natureza. Do mesmo modo também os homens, deixando o uso natural da mulher, arderam em desejos uns para com os outros, cometendo homens com homens a torpeza, e recebendo em seus corpos a paga devida ao seu desvario. Como se não se preocupassem em adquirir o conhecimento de Deus, Deus entregou-os aos sentimentos depravados, e daí o seu procedimento indigno. São repletos de toda a espécie de malícia, perversidade, cobiça, maldade; cheios de inveja, homicídio, contenda, engano, malignidade. São difamadores, caluniadores, inimigos de Deus, insolentes, soberbos, altivos, inventores de maldades, rebeldes contra os pais. São insensatos, desleais, sem coração, sem misericórdia.”

    “É com esta mensagem que nos despedimos. Que Deus esteja convosco.”

    Fervilhando de humanos sedentos de fé, o encontro dominical encerrou-se. Ao menos para os fiéis.

    O homem de meia-idade atravessou a rua em direção a uma casa; decente, nada mais. O cenário, mais do que previsível: igreja; ruas; veículos; casas; árvores, umas poucas; humanos; mendigos: estes, como se não fizessem parte do grupo anterior.

    O homem adentra no recinto familiar. Cena corriqueira: a filha, terminando de comer; a mulher, quem saberá?

    — Vá se deitar, filha. Já vou dar-lhe a bênção.

    E ela foi. Seus passos, grosseiros e leves, como se já suportassem o peso da responsabilidade; seus olhos, inexpressivos, tão mortos quanto os de um idoso; os cabelos, lindos: não fossem os piolhos.

    Do outro lado da rua, o padre retirava de um armário de madeira uma caixa de sapatos. Dentro dela, a inevitável hipocrisia.

    Hipocrisia essa que já se tornou um chavão moderno, destes que estampam capas de revistas ditas informativas. Seu verdadeiro significado, quase esquecido; ou seria convenientemente oculto?

    Tanto faz como tanto fez.

    Deitada sobre um colchão mofado, no escuro, a garotinha esperava, ansiosa, pelo pai. Nem tão ansiosa; o que viria a seguir ela já conhecia.

    Embrenhadas nos densos matagais da memória, cenas da pré-concebida felicidade eram reconhecidas.

    “Mãe, o que é aquilo?”
    “É um arco-íris, filha.”
    “E por que ele tem essas cores?”
    “Porque são essas cores que dão vida ao mundo.”

    Ao ranger da porta, a garota encolheu-se. E, ainda que timidamente, indagou:

    — Vai doer?
    — Menos, espero eu.

    Ao som de roncos ensurdecedores, em um quarto de motel, uma moça admira-se no espelho; lamenta-se, seria o correto.

    A imagem idealizada por ela era o perfeito estereótipo da perfeição: uma criança loura, sorridente; os dentes, ainda por nascer; a roupinha rosa, estampada com flores multicoloridas; e os olhos, ah, os olhos, azuis, cintilavam a tradução de sua felicidade imensurável. A imagem refletida era o oposto: uma jovem, suja, com os poucos dentes que lhe sobram há mais de semana sem ver uma escova dental; os cabelos, outrora loiros, estão cá desbotados e empastados; o corpo, mutilado: não no sentido literal, mas, mutilado.

    O choro já secara; nem lágrimas eram mais produzidas. Que sentimento poderiam elas traduzir? A humanidade já se perdera há muito. Dignidade, palavra desconhecida: tanto moral quanto gramaticalmente.

    E os olhos: roxos, inchados; azuis, qual fosse o caso. A dita porta da alma já fechada e trancada; e a chave, perdida.

    Não dormiu; não conseguiria. Namorou a noite. À noite toda.

    Já em um jardim, a ambição humana alcançara, literalmente, outros patamares. Honra-se a expressão “nuvens de algodão”. Quem dera fosse eu a flutuar nestas nuvens de amor; ou de algodão.

    Jaqueiras; céus de goiabada. “Jurema no céu com pedregulhos.”

    E o idealizador ouvindo sua música preferida; ó, doce música. Aquela que nos traz as mais diversas sensações.

    O dito idealizador, membro célebre de um hospício à beira de uma favela, contemplava a mesma. O olhar vago; vivendo o irreal, naquele paraíso utópico, sob uma salva de tiros mais do que melódicos.

    A dita loucura do sonhador, desconhecida. Fosse doença mesmo ou vontade própria, sorte tinha o louco; o que poucos conseguiam sequer imaginar, ele via todo dia. Vivia naquele paraíso.

    Sobre a cama de um hospital, um jovem debruça-se sobre uma figura: feminina, imagina-se.

    — Mãe?
    — Diga.
    — Me perdoa?

    Um sorriso brotou de seus lábios. O sorriso do mais ácido sentimento.

    — Vá se foder.

    E com uma pontada no que já foi meu coração que vos digo, amargurado: já fui o padre; o pai; o desalmado; o louco; e o jovem. Fases diferentes de minha (antiga) vida.

    E depois de tantos personagens, em que me tornei?

    Malditos são aqueles que vivem no mundo real; e fortes são aqueles que assimilam o mundo real e ainda querem viver.

    Depois de ter vivido tudo o que vivi, despeço-me da vida. Nada mais me prende a ela. Que Deus abençoe o editor da minha revista favorita; que minha filha apague-me de suas memórias e consiga ser o que não fui; que a moça a quem não tive coragem de abusar recupere o antigo brilho de seus lindos olhos azuis; que a idosa jamais abandone sua forte personalidade; e que o louco, a quem tudo foi negado, consiga, enfim, morrer em paz.

  5. #5
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    Padrão "... Mas livrai-nos do mal, amém." - Thomazml

    "... Mas livrai-nos do mal, amém."
    Thomazml



    - É John, você ta fodido – sibilou uma voz maligna, ecoando pelo pequeno cárcere. O ar estava frio, e não havia nenhuma fonte de luz para iluminar o local. John levantou a cabeça, assustado. Estivera deitado num amontoado de palha, que ele chamava de cama. Não dormia direito desde a semana anterior, o que provocara profundas olheiras em sua face magra e pálida.

    - Quem está ai? – perguntou, num sussurro rouco. Sua voz, muito pouco utilizada nos últimos dias, saiu arrastada e pesada. Estava ofegante, com medo. Olhou para os lados, tentando ver a origem da voz grave. – É mais um guarda? – lamuriou-se – Já disse tudo o que eu sabia! Não sei mais nada! Por favor, não façam isso comigo!

    O homem esquálido começou a soluçar, tremendo o maxilar e deixando escapar um filete de baba sobre o queixo peludo.

    - Não John, não sou um guarda. Sou um... conselheiro. Um... amigo dos loucos. – respondeu a voz, pronunciando as palavras num tom intensamente zombeteiro.

    - Mas eu não estou louco – murmurou o homem, arregalando os olhos, pensando na tenebrosa possibilidade. Será mesmo que não estava louco? Não era esse o veredicto do rei? Sua cabeça tremeu, e seus olhos cansados se encheram d’água.

    - Claro, afinal, falar com uma voz imaginária é uma prova de que a pessoa é sã – ironizou a voz. John deixou uma lágrima rolar pelo rosto sujo. Então era verdade, ele era um louco.

    - Você não existe? – perguntou, trêmulo, o homem. A voz soltou uma gargalhada fria, como uma criança maligna que consegue seu intento torpe. – Se existo? Não estou falando contigo neste exato momento? – respondeu a voz, com uma entonação jocosa.

    - A pergunta, John, não é se eu existo. A pergunta é: até quando você vai existir? – a voz declarou a pergunta e soltou risadinhas mal abafadas. O homem abriu a boca ressecada, sem conseguir dizer a resposta. Outra lágrima escorreu pelo rosto magro.

    – O que houve? O grande pensador não tem resposta? Deixa eu te ajudar: HOJE! – berrou a voz, no ouvido do prisioneiro, que soltou um gemido e se encolheu.

    - Isso mesmo John, hoje você vai morrer. Sabe, é interessante isso! Porque, se você fosse religioso, estaria feliz por morrer e ir aos céus. Mas, não! O senhor perfeição, que clama ter a sabedoria da ciência lógica, nega Deus. E, pelo mesmo motivo que é levado a morte, não encontra consolo nela. Ironia, não? – a voz continuava, impiedosa.

    - Não tenho medo de morrer – o homem respondeu, olhando para o chão. A voz riu, desdenhando da resposta. Até mesmo ele, John, duvidava do que acabara de dizer. Engoliu em seco e mordeu os lábios, impotente.

    - Não tem medo, John? Realmente não tem medo de morrer? Não tem medo do que pode... vir? – insinuou, maliciosamente, a voz. O prisioneiro virou a cara como se tivesse levado um tapa. Não tinha certeza de nada, sentia-se abandonado por tudo, seu intelecto, sua convicção e seu brilhantismo.

    - Vou te dizer uma coisa, John, é melhor você estar certo. Afinal, se existir um inferno, é muito provável que você vá para lá – falou a voz, num tom de um amigo que confessa uma coisa íntima. Mas esse clima confissão foi logo quebrado com um risinho malévolo da voz. O prisioneiro gemeu, sofrendo em suas terríveis dúvidas.

    - Realmente, morrer por besteiras... se ainda fosse morrer por verdades! – suspirou a voz. O homem sentiu o desespero aumentar, agarrando a cabeça e arregalando os olhos. A voz riu de novo.

    - Não... não! Eu não vou morrer por mentiras! Tudo o que eu disse é verdade! Tudo! – gritou o homem, mais para se convencer do que para qualquer outra coisa. Suas certezas, seus princípios, tudo, tudo se desvanecendo ante a cruel verdade da voz.

    - Verdade? Qual verdade que disse? Que Deus não existe? Que o.... povo, é governado por um Rei que não dá a mínima para eles? – perguntou a voz, fingindo interesse.

    - Sim! São verdades, inquestionáveis! – bradou o prisioneiro, pela primeira vez conseguindo ver um ponto lúcido em sua mente. Uma ponta de esperança, na qual ele agora estava agarrado firmemente.

    - Inquestionáveis? São mentiras, são falácias! Quem é você para dizer que Deus não existe? Se ele não existisse, porque você, herege, será morto? Se o rei não dá a mínima para o povo, porque ele vai os presentear com um espetáculo hoje? – vociferou a voz, destruindo de vez a esperança do homem, que desatou a soluçar, balançando a cabeça, entregue ao desespero.

    - O papo até que está bom, mas... ouça! Passos no corredor! – de fato, um barulho crescente de passos chegava da porta. Esta foi bruscamente aberta, deixando entrar um resquício de luminosidade. Porém, dois soldados logo encapuzaram o prisioneiro com um pano preto fedido, amordaçando-o.

    - São seus últimos passos, John. Qual é sensação? – perguntou a voz, num tom falsamente curioso. – Ah! Esqueci, você está amordaçado. Sabe porque, não é? Porque você é um herege, e pode dizer coisas ruins para o povo. E sabe o porquê de estar encapuzado? Para não fitarem seus olhos esbugalhados, quando pender na corda - O homem, que cambaleava, sendo empurrado rispidamente pelos soldados, tentou falar uma coisa. Foi calado com um forte sono na sua costela.

    -Shhh! Quietinho, John! Não precisa falar, eu sei o que você iria dizer. Iria dizer que o que você está fazendo é para o povo. – a voz soltou outro risinho de desprezo. A claridade ofuscou os olhos derrotados de John, mesmo encapuzado. Deviam ter saído para o pátio externo da prisão. O coração do condenado batia forte no peito magro. De repente, ouviu um rugido. O povo estava lá, gritando obscenidades parar ele, xingando-o.

    - Vê o que o povo quer de você, John? Eles estão pouco se fodendo para suas teorias mirabolantes. Não dão a mínima para suas conspirações e falácias. Eles querem ver você pendurado, se mijando, enquanto morre, balançando na corda. – a voz continuava, acima dos ruídos intermináveis da massa, ao redor. John começou a chorar, embora não pudesse ver o povo. Sua respiração era rápida, entrecortada por soluços. Seus músculos tremiam e sua boca estava seca.

    - Como você é tão detestável, John, nem vão ler sua sentença, vão direto para o enforcamento. Pena você não ter nenhum amigo para segurar teus calcanhares enquanto balança na corda. Sabe, o corpo humano agüenta diversos minutos, até horas, pendendo na corda. Isso se o laço não for tão eficiente. Dará tempo para você fazer todas as dancinhas que souber.

    O carrasco colocou a corda, e firmou o laço. John chorou e olhou para os céus, levando logo um soco na cabeça, para ficar parado. Fechou os olhos, começando a rezar o pai nosso. O povo se calou, na expectativa.

    - ... seja a feita a vossa vontade ...-

    - Adeus, John – cortou a voz. O chão desapareceu, um corpo tombou e a multidão urrou.




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    Padrão Medo - Meltoh

    Medo
    Meltoh



    Pela trilha de gramíneas, caminhava o velho Castor. Na sua mão esquerda trazia o seu velho lampião, cujo fogo crepitante iluminava tudo à sua volta. Era tão tarde que não havia sinal de estrelas no céu escuro, deixando a terra imersa num profundo breu.

    Era meia-noite quando Castor havia se aprontado para começar a sua busca no matagal de Riacho das Três Pedras. Entre outros motivos, queria acabar com a superstição que havia tomado conta da comunidade. Diziam que o fantasma do coronel Jerônimo estava assombrando a cabana que ficava no meio do matagal.

    Até então toda essa conversa pouco importava para Castor Gonçalves, fazendeiro aposentado de quarenta e três anos, que sempre foi de ficar na dele, cuidando de sua pequena propriedade em Riacho das Três Pedras. Mas um dia antes de sua empreitada pelo matagal, seu compadre Jucelino apareceu para lançar um desafio.

    - Ocê num vai cumpadre, causa que cê é muito medroso. Eu duvido que ocê vá lá na cabana e traga o pijama do coroné Jerônimo - disse Jucelino Feitosa, um homem corpulento que lembrava muito uma morsa.

    - E por causa de quê que eu ia me dá o trabaio de sair da minha confortável rede e embrenhar nesse mato véio cheio de inseto?

    - Uai, se ocê trouxer as roupa do homi, vai provar pra toda essa gente que ocê é corajoso e num acredita em fantasma coisa nenhuma. E eu conheço umas cumadre que gosta de homi corajoso. Ocê sabe a Gina? Aquela que era casada com o cumpadre Ernesto?

    - Ora se sei - disse Castor abrindo um sorriso largo - E tá sorteira é?

    - Pois é.

    Castor bateu com tanta força na mesinha que suas pernas acabaram cedendo, fazendo desabar o móvel ao chão. Ele fingiu não prestar atenção e levantou-se tão rapidamente que chegou a espantar Jucelino - Então tá certo, amanha cedinho eu vou bater na sua casa com as roupa do homem.

    - E num tente me enrolar não. Que eu trabaiava pro coroné e lembro muito bem do pijama que ele usava toda santa noite.

    - E eu lá sô homi de ficar enrolando os outro? - Castor coçou a barriga e foi levar Jucelino até a porta. Mas ainda tinha uma pergunta engasgada na garganta - E por causa de quê ocê quer logo o pijama do homi?

    - Homi, cê tá criando causo? Tá cum medinho, é?

    - Não. Dexa pra lá. Ocê me responde amanha quando eu trouxer as ropa.

    Castor passou o resto daquele dia se preparando. Foi em tudo quanto era loja comprar alho e algumas outras coisas que, acreditava ele, afastariam os maus elementos. A noite chegou rápido. Apanhou um casaco surrado e sua espingarda do século dezenove. Na cozinha pegou o velho lampião e guardou alguns lanches na mochila de couro. Estava pronto para sair à caça do pijama do coronel Jerônimo.

    A trilha de gramíneas era sinuosa e acabava aos pés de uma enorme rocha que mostrava a entrada do matagal. Castor suspirou e adentrou a mata. A vegetação, antes rasteira, agora batia-lhe nos joelhos, causando incômodo e coceira. Pensou em voltar para pegar calças mais grossas e confortáveis, logo desistiu da idéia, queria pegar o pijama e sair dali o mais rápido possível.

    Castor sabia que teria que andar mais alguns metros até chegar à cabana. Começou a se perguntar o porquê de alguém tão rico e poderoso como o coronel Jerônimo ter uma casa tão simples num lugar abandonado, já que já havia estado na cabana uma vez, e na época era bem diferente do casebre abandonado que agora estava diante dos seus olhos.

    Engoliu em seco ao ver a degradação do lugar. Duas janelas pendiam soltas, presas à uma dobradiça enferrujada, balançando e emitindo um rangido desconfortável, que cortava a noite junto com o som do vento vindo da calha. As paredes estavam cobertas de musgo verde, e algumas partes continham grandes sulcos. A única porta, ainda estava intacta, alheia à destruição do lugar. Era a mesma porta, o mesmo cedro, a mesma maçaneta de ferro. Era um contraste perturbador, mas Castor não sabia o motivo.

    Deu mais alguns passos, até que algum temor desconhecido o fez retirar a espingarda da bolsa. Seus olhos percorreram toda a fachada da casa. Mais detalhes do abandono ficavam visíveis, à medida que se aproximava, iluminados pela chama do lampião. Os restos do que foi uma cadeira de balanço, agora jaziam abandonados sobre uma varanda fria, como a noite. E o outrora luxuoso tapete, que servia para intimidar os visitantes por causa do incomum desenho, agora se encontrava preso a um prego de uma viga da varanda, não passava de um pedaço de pano sujo, que dançava ao vento, feito uma bandeira.

    Castor pousou o lampião no chão e girou a maçaneta de ferro, que não estava enferrujada, ao contrário das dobradiças das janelas. O interior da casa estava devastado. Logo na sala uma mesa, de uma perna só, caída ao chão, bloqueava a passagem a um quarto. Um pano branco e empoeirado, mal cobria o armário desgastado, cujas portas escancaradas, revelavam um interior coberto de teias de aranha e corroído por cupins. Na cozinha, pratos e talheres misturados à panelas sujas de barro e dejetos de animais.

    Castor afastou a mesa e, segurando o lampião na mão esquerda e a espingarda na direita, adentrou o quarto.
    Parecia ser mais escuro que o resto da casa. Os lençóis da cama estavam desarrumados e sujos de terra, assim como várias roupas que estavam caídas do lado de um espelho. Enquanto vasculhava o monte de roupas à procura do pijama, Castor escutou um baque surdo do lado de fora da casa. Correu imediatamente até a porta e analisou a escura sala. Nada estava fora do lugar.
    Ao ver o tapete balançando ao vento, em devaneio, tentou distinguir alguma coisa daqueles desenhos misteriosos.

    Despertou, num susto, ao presenciar a queda da janela, que antes mantivera-se erguida por causa de uma dobradiça enferrujada. Depois voltou-se para o quarto de modo a achar o pijama e sair logo dali. Primeiro procurou na cama, depois na cômoda perto do espelho, sob o colchão, atrás do armário...
    Nada.

    Quando estava para desistir, ouviu um barulho atrás de si. Ao tentar se virar, sentiu algo o empurrando pelas costas, derrubando-o. Garras cravaram-se no seu ombro, fazendo-o berrar de dor. Enquanto lutava para se soltar, olhou pelo canto dos olhos, e conseguiu ver que era um animal que estava o atacando.

    Uma cotovelada certeira no focinho do bicho o fez recuar, dando espaço para tatear a procura da arma, perdida durante a queda. Na sua frente, uma onça, de mais ou menos um metro, preparava um novo ataque, obrigando Castor a agir rapidamente. Rolou até a saída do quarto, e tentou se levantar. A porta que levava para fora da cabana estava fechada.

    Enquanto corria pela sala, procurou desesperadamente algum outro lugar para se esconder. Foi então que lembrou da cozinha. Entrou e tentou fechar a porta, não conseguindo, pois estava emperrada devido à ferrugem. Procurou alguma faca, ou coisa semelhante. Só achou uma panela de ferro, a qual apanhou e virando-se para a onça, começou a encará-la, tentando deixar de lado o medo.

    - Calma bichano, num quero te machucar. Vai embora.

    O animal pareceu vacilar por um instante. Abriu a boca arreganhando seus enormes dentes. Castor começou a jogar colheres para perto da onça. Esta recuou e pulou pela janela aberta.

    Castor respirou aliviado e olhando ao redor, viu que a cozinha estava iluminada por uma fonte de luz que vinha de outra porta à esquerda. Caminhou lentamente e entrou no que parecia ser um porão. Havia caixas e mais caixas estocadas uma em cima da outra, mas o que chamou a atenção foi uma grande rachadura na parede. Castor se aproximou, e espiando pelo vão, enxergou um corredor iluminado por uma luz opaca.

    - Num to ligando pra isso não. Vou pegar o pijama e cair fora daqui – sussurrou ele, indo novamente para o quarto.

    O lampião estava caído ao chão, mas por sorte não havia quebrado, e sua chama crepitante ainda iluminava o quarto. Castor apanhou a arma, que havia caído do lado do espelho, e depois recomeçou a busca pela peça de roupa. Após mais alguns minutos, um pensamento absurdo tomou conta de sua cabeça.

    “E se o pijama tiver lá no porão? Ah... besteira... Mas num faz mal nenhum dar uma olhada, vai que eu encontre alguma coisa boa...”

    Em poucos segundos, Castor viu-se novamente diante do vão na parede, só que desta vez carregava consigo o lampião e a espingarda. Tentou alargar a rachadura batendo com um pedaço de pedra encontrado no porão. Não demorou a abrir uma passagem grande o suficiente para que um homem do seu tamanho pudesse passar.

    O longo corredor possuía várias janelas minúsculas que se projetavam em cada parede, de onde saíam pequenos raios de luz que iluminavam todo o caminho. Parecia que havia algum rio, ou algo semelhante por perto, pois Castor conseguia ouvir claramente o som de água em movimento.

    Não foram necessários muitos passos até chegar a uma sala pequena, onde se encontravam uma escrivaninha e uma única poltrona de couro. Havia também um cabide, e pendurado nele, um pijama prateado feito de seda.

    Boquiaberto, Castor se aproximou da roupa. Entusiasmado pegou-a e a guardou na bolsa, para depois examinar o lugar. Na escrivaninha, dois livros chamaram sua atenção, estavam cheios de mapas e anotações.

    Castor abriu a única gaveta da escrivaninha e tirou de dentro um retrato empoeirado. Nele, dois homens sorridentes estavam lado a lado. Castor conhecia muito bem um deles, e o outro possuía um rosto bem familiar. Imediatamente, largou o item e continuou a mexer na gaveta. Encontrou um pequeno álbum de fotografias datado de 1979. Viu os mesmos dois homens em várias páginas, pareciam ser grandes amigos. Encontrou também uma anotação que lhe chamou muito a atenção. Mas o objeto mais intrigante veio a seguir.

    Um papel envelhecido e bem fino mostrava um outro desenho, igualmente estranho ao presenciado por Castor do lado de fora da cabana. Eram diferentes, mas de certa forma eram muito semelhantes.
    Sem pensar duas vezes, Castor guardou tudo e saiu triunfante da pequena câmara. Do lado de fora da cabana, tomando cuidado para não ser surpreendido por nenhum animal selvagem, despregou o tapete e também o guardou na bolsa. Estava voltando para casa e trazia consigo um grande presente.


    -Jucelino, vai ver quem é homi – gritou uma voz esganiçada.

    - Calma muié – bradou um sonolento Jucelino - mas quem será as seis da matina?

    As batidas fortes na porta pareciam ter acordado o cachorro do vizinho que agora latia incessantemente. Jucelino vestiu o seu roupão e coçando a cabeça foi abrir a porta.

    Encontrou Castor Gonçalves, seu velho amigo.

    - Ora, tinha esquecido de ocê, vamo sair daqui que a muié ta brava – Jucelino colocou a cabeça para dentro de casa – Joana, eu volto já, vou ali com o Castor.

    O amanhecer trazia um cheiro agradável da chuva fina que caía no povoado. Castor e Jucelino agora procuravam um lugar para conversarem sossegados. Encontraram o refúgio na soleira da propriedade dos Gonçalves.

    - Ocê duvidava de mim, mas mesmo assim eu trouxe seu pijama – disse Castor, tirando de dentro da bolsa a requintada peça de roupa.

    - E num é que ocê foi mesmo? Essa lenda do fantasma num ta com nada. Ocê viu o fantasma?

    - Vi foi uma danada de uma onça. Mas também vi outras coisas bem mais interessantes.
    Castor mostrou as fotografias do álbum, e com um sorriso perguntou:

    - Reconhece o homi da foto? Esse da esquerda?

    - Ora, é ocê! E do lado do coroné Jerônimo.

    - Não. É o meu pai, João Gonçalves.

    - O que que o seu pai ta fazendo junto do coroné?

    - Eu andei olhando essas anotações aqui – Castor pegou um dos papéis que havia trazido da cabana – e vi que meu pai trabalhava para o coroné Jerônimo. Ele era o braço direito do homi, e depositava muita confiança nele.

    Jucelino caiu na gargalhada – Uai, eu trabaiava pro coroné e nunca que havia visto ele lá.

    - Sabe que o coroné era rico, e que possuía muitas terras depois do rio né? Meu pai administrava a terra mais produtiva enquanto o coroné tratava dos negócios dele aqui em Riacho das Três Pedras.

    - Não to entendendo aonde ocê quer chegar – comentou Jerônimo.

    - O coroné morreu e ninguém soube na verdade com quem ficou as terras não foi?

    - Foi. E o que isso tem a ver com o falecido seu pai?

    - Aí vem a parte mais interessante – Castor esfregou as mãos de prazer - Encontrei essa cópia do testamento, que deixava metade dos bens do coroné para João Gonçalves, o meu pai.

    - Isso quer dizer... – Jucelino se levantou num salto – Ocê ta rico!

    Castor riu – Calma, essa ainda não é a melhor parte. Ocê viu a data do álbum? 1979. E quem que aparece nas foto? Meu pai.

    - E o que que tem?

    - Meu pai só tinha morrido em 77.

    Jucelino fechou a cara – Então isso aí na foto é um fantasma?

    - Claro que não. Significa que meu pai ainda tava vivo quando tirou esta foto.

    - Ainda num to entendendo essa história. Ocê andou bebendo Castor? Se ele ta vivo, aonde é que ele ta então?

    - Num tenho certeza, mas talvez saiba por onde começar a procurar – E finalmente
    Castor tirou da bolsa, o tapete e a outra folha fina. Colocou esta por cima do primeiro. As figuras formaram um confuso mapa.

    - Esse num é o mapa da capital? – perguntou Jucelino.
    - É. Tentei relacionar os desenhos durante boa parte da noite inteira. – Castor olhou para Jerônimo com os olhos molhados de lágrimas – Jucelino, meu pai pode estar vivinho da silva. E vou procurar por ele. Na capital.
    As vozes cessaram, deixando o tranquilo som da chuva preencher completamente o ar. Jucelino batendo as mãos subitamente, disse:

    - Então ocê num quer saber da cumadre Gina?

    Castor riu e pondo-se de pé deu uma batida amigável no ombro de Jucelino – Só descobri essas coisas por causa de que ocê me ajudou. Só então pude superar o medo. E por causa disso encontrei essa grande surpresa – Castor suspirou - Quero que cuide da minha propriedade enquanto estiver fora.

    - Ocê é esperto né? Só olho sua casa se me trouxer da capital, aqueles doces enlatados que eles fazem lá.

    Os dois se abraçaram repetindo o gesto feito pelo pai na última fotografia do álbum.

    Pela estrada de gramíneas caminhava o velho Castor. Trazia na mão esquerda a coragem para expulsar os medos, e na direita a determinação para encontrar o pai.
    Enfrentou os temores e descobriu tesouros que jamais poderia imaginar. Agora Castor segue para a capital e sabe que irá enfrentar outros medos para só assim encontrar por trás deles a verdade e a grande recompensa que o espera. Seu pai.

  7. #7
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    Padrão O Negro Destino de Marrom - Professor Girafales

    O Negro Destino de Marrom
    Professor Girafales


    Marrom, o pangaré, caminhava tranquilo pelo pasto, após os longos goles d'água que tomou no bebedouro. A grama estava verde, bem viva, após as chuvas da semana anterior. Foi de repente que Marrom se levantou sobre as patas anteriores, guinchando assustado. A cobra causadora do susto logo recuou, também assustada.

    ― Eita Marrom, não viu que sou eu? ― Disse a cobra.

    ― Ai Nádia, assim me mata do coração! Achei que era cobra malvada e não cobra amiga.

    ― Sabe que eu nem sou venenosa, e mesmo que fosse não iria nunca machucar um amigo.

    Suspirando aliviado, Marrom perguntou:

    ― Mas então Nádia, o que tá fazendo aqui?

    ― Sabe como é né Marrom. Vim aqui visitar o gramado. Tá bonito, a chuva e o esterco de você e das vacas teve bom efeito.

    ― Pois é ... Eu vim aqui relaxar também, daqui a pouco vou levar o patrão lá no curral.

    Algumas vezes por semana Marrom ia ao curral com seu patrão, para que este e os peões pudessem fazer os serviços da roça, como ordenhar o rebanho bovino. E lá vinha o patrão, nos seus quarenta e poucos anos parecia mais velho por causa da exposição as intempéries. Como sempre estava com a barba mal feita, fios grisalhos misturados aos fios negros. Usava um boné surrado com a propaganda de algum candidato a vereador, uma camisa xadrez e uma botina meio enlameada.

    ― Até mais Nádia, vou lá botar a cela e levar o patrão ao curral.

    O patrão estendeu a mão e acariciou levemente seu cavalo predileto. Colocou nele o freio e com a corda o guiou até o barraco, onde o celou e terminou os preparativos para o passeio. Depois do córrego onde tinha sombra e água fresca, o curral era o local predileto de Marrom. Não pelo que podia fazer no curral em si, mas pelo caminho, no qual sempre via as bonitas éguas do fazendeiro vizinho.

    Os dois, cavalo e cavaleiro então puseram-se a caminhar até o curral. Este não ficava muito longe. Havia somente dois pegadores no caminho, e entre eles o pasto no qual as vacas costumavam ficar se alimentando. Já afastados do barracão onde o cavalo foi celado, e da casa-sede do terreno, eles chegaram à primeira porteira. O cavaleiro não precisava descer para abri-la ou fecha-la. Bastava que o cavalo se posicionasse lateralmente para que ele fizesse o trabalho.

    Os dois estavam agora no pasto estavam lá também todas as vacas. Surpreso, Marrom falou com uma delas, ainda com um pedaço de grama pendurado na boca:

    ― Ei Jurema, num era pra vocês estarem no curral?

    ― Nenhum peão veio buscar a gente, Marrom, hoje não é dia de tirar leite.

    ― Mas então porque eu estou indo lá com o patrão?

    ― Sei não Marrom... Quem tá lá é aquele peão novo, foi lá de trator...

    ― Eu hein...

    E continuaram andando. Ao longe Marrom viu o motivo que lhe fazia ficar feliz sempre que precisava ir ao curral. Estavam ao lado da cerca, em outro terreno, 3 éguas:

    ― Oi Marrom, indo ao curral?

    ― Sim Amazona, é pra lá que vou. Estranho que as vacas não estão lá...

    ― Não?

    Marrom sentiu uma leve chibatada no lombo. Era o patrão lhe apressando:

    ― Desculpa Amazona, tenho que ir.

    Mais alguns minutos e eles estavam na porteira para o curral. Novamente o patrão a abriu e fechou de cima do cavalo, sem necessidade de descer.

    Marrom viu o curral vazio, o chão sujo de bosta, e o trator parado no gramado ao lado de uma pequena goiabeira. "Porque o peão não veio no cavalo Damião?", "Porque só estou eu aqui?". As dúvidas povoavam a cabeça de Marrom, intrigado com tudo que estava acontecendo. Já dentro do curral, o seu dono desceu e o amarrou no cercado. Marrom continuava sem entender nada, quando viu o peão vindo em sua direção, um facão na mão. O dono e o peão começaram a conversar, enquanto o primeiro pegava uma garrafa com um líquido azul, que jogou em cima do facão. Com um pano que estava no bolso de sua jaqueta, o peão tirou o excesso de líquido do facão... E começou um momento inenarrável, o qual Marrom preferiria esquecer, mas do qual sempre se lembraria ao ver as éguas do vizinho. Ao olhar para elas novamente, nunca mais sentiria as emoções que antes sentida. Por mais que tentasse, não conseguia deixar de ficar indiferente.

  8. #8
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    Padrão Os Áureos Campos de Centeio - Manteiga

    Os Áureos Campos de Centeio
    Manteiga


    - Está quase pronto. – Observou em distração o velho e rabugento Lenhard. Sua pele banhada em tonalidades de um ocre fosco e com total enrugamento suava rios salgados por todos os poros possíveis de se imaginar. O calor de quase quarenta graus, de um bizarro modo antitético, não era empecilho para a tarefa desempenhada por aqueles homens velhos de quem ninguém se lembraria na hora da morte.
    - Tenho de concordar. – Falou uma outra voz mais atrás, e o velho constatou que era Gertrude. Sua melodiosa voz rouca de quem estava na casa dos sessenta anos não era ouvida por ele já há algum tempo, o que de certa forma fez aquele encontro valer a pena.
    - Eu só queria estar em casa, cuidando dos meus filhos. Queria estar longe disso tudo... Mas este maldito espantalho tinha que nos reunir mais uma vez! – Acentuou Lenhard enquanto coçava com seus longos e sujos dedos o cavanhaque branco desgastado que possuía. Pequenas unidades de uma terra nociva ficaram impregnadas entre os fios curtos, provavelmente saídas das unhas do próprio.
    - Não tente nos enganar Lenhard. Todos sabemos que você nunca criou ninguém. – Soou novamente a voz da mulher, desta vez muito mais áspera do que o velho se lembrava. – Minto... Talvez tenha criado alguma aberração.
    Ela e os outros presentes mergulharam em gargalhadas fúnebres esmagadoras de ossos enquanto o velho bufava, passando suas nodosas mãos pelo objeto de trabalho do pequeno grupo. O altíssimo espantalho estava pregado em uma tora de madeira que fora cravada ali, no meio do campo.
    - Isso deverá manter os corvos afastados por um bom tempo. – Disse ele finalmente afastando-se do boneco a fim de o observar melhor. Estava envolto em um sobretudo azulado que tapava-lhe quase todo o corpo, menos as pernas, que vestiam calças negras, e a cabeça, que estava escondida sob um chapéu roxo medonho. – Fizemos um ótimo trabalho com este, dessa vez. Ficou mais natural. – Ele deu um risinho debochado e se juntou aos demais: Gertrude e mais três homens.
    - Acho que o modo com que foi concebido lhe dá esse tom sinistro tão apropriado. – Comentou um dos outros três velhos. Era obeso, usava roupas elegantes e tinha um monóculo no olho esquerdo. Seu cabelo lambido fazia um contraste estranho com os bigodes acentuados. – Não podíamos ter feito um trabalho melhor, imagino eu.
    - Uma lástima que o inverno já esteja aí, não é? Tanto trabalho por tão pouco tempo... – Dessa vez quem falou foi um outro, baixo, calvo, com olhinhos miúdos e feios. – Mas lamento mais que esse trabalho não possa esperar. Confeccionar espantalhos é muito mais desafiador do que muita gente imagina.
    - Você se faz de bobo, não é McLean?– Resmungou Gertrude chegando perto do espantalho e batendo um pouco de pó da manga que cobria o braço esquerdo. Examinou bem o boneco crucificado e abriu um largo sorriso desdentado. Os fios soltos de seu cabelo grisalho rodopiaram com o vento. Ela passou suas mãos pelos cereais ali plantados, que reluziam de um modo esplêndido perante o sol amarelado. – Nosso tesouro está aqui... Está nesses grãos. Não podemos deixar que os corvos consumam tudo pelo que lutamos para cultivar. Sabe bem disso. E é temporário.
    - Você diz isso há vinte e dois anos, Gertrude. Fica difícil acreditar que um dia essa situação mudará.

    - Devemos esperar. Muito se especula sobre nosso trabalho. As cicatrizes do que fizemos ainda estão abertas nessa cidade... – Ela fez uma pausa enquanto arrancava alguns grãos dourados e os deixava cair – O centeio ainda não está bom o suficiente. E este campo fica em minha propriedade. Eu devido quando fazermos a colheita.
    - Eu sempre disse o que deveríamos ter feito. – Sibilou a voz cortante e áspera de Daurgh, o quinto e último integrante do cortejo. Ele era o mais alto dos cinco, o mais mal-vestido e o mais fedorento. Aproximou-se calmamente da lívida Gertrude, que parecia um vulcão em erupção. – Deveríamos ter entregue o Clark e ficado com o dinheiro. Te-lo gasto de começo, quando ainda valia a pena. Agora não está tão bom. É por isso que ainda guardamos tudo aqui.
    - Fique calado! – Xingou a anciã enquanto olhava nervosamente para os lados, deixando os outros três homens trocarem idéias entre si. – O campo é denso o suficiente para que alguém esteja nos ouvindo. Quer nos condenar?
    - Há! Que hilariante! Estamos colocando um espantalho em um campo de centeio! Aonde já se viu isso? Podíamos pelo menos ter usado um trigal! – Ele estava berrando. – Quem foi o imbecil que sugeriu essa palhaçada?
    - Se me lembro bem – Interveio McLean, apaziguador como sempre. – Você não teve objeção alguma na época.
    - Eu era um idiota. Todos éramos. – Acrescentou rapidamente enquanto passava os olhos pelos quatro companheiros. – Já era velho o suficiente para saber das coisas, mas eu era burro demais. Acho que a conseqüência do ato me fez amadurecer. Mas sempre achei que devíamos ter nos afastado dele e de tudo que ele fazia.
    - Você tinha é medo de arriscar, infeliz. – Censurou-o Gertrude, ensandecida. – Sempre foi um medroso. Estava com medinho de ser descoberto não é? Suas putas não teriam gostado se soubessem que você era um ladrão, não é mesmo?
    - Cale a boca sua mal-comida! – Berrou Daurgh, erguendo a mão para a velha. Parou-a de imediato, bufando e passando por ela, que o amaldiçoava com todas as palavras chulas que conhecia. Daurgh deu um empurrão no homem gordo e em Lenhard, aproximando-se do espantalho e erguendo sua face branca. Estava com os olhos verdes escancarados e a boca formava um arrepiante sorriso forçado por pregos. – Tanto trabalho por essa porcaria. Está até fedendo! Ah! Fedendo à morte! Eu disse que devíamos ter o perfumado, esfregado os grãos nele! Os corvos vão é voar em cima dessa porra! E me refiro aos corvos reais!
    - Pois é melhor que seja assim. – Gertrude ressurgiu, mais ácida do que nunca. Os outros três já estavam longe, falando animadamente sobre qualquer coisa. – Se os corvos estiverem em cima, ninguém vai querer mesmo chegar perto. Você sabe como são esses caipiras supersticiosos.
    - Somos todos tolos. – Disse McLean por fim, chegando perto dos dois velhos, com os outros integrantes do grupo seguindo-o de modo vagaroso. – O espantalho, o centeio, o roubo... Devíamos ter ouvido Daurgh... Clarck era um maldito, e por culpa dele estamos até hoje esperando. Quanto tempo faz que ele sumiu? O dinheiro nunca vai cair em nossas mãos! Vamos acabar com esse teatro ridículo e pegar as coisas que enterramos. Vamos entregar o Clark e esperar a recompensa. Não há mais o que fazer.
    - Vai ficar bundão que nem esse maldito aqui? – Gertrude agora indicava Daurgh, que a fuzilava com os olhos quase escondido pelas pelancas.
    - E o que você sugere então, senhora sabe-tudo? – Lenhard falou pela primeira vez após incontáveis minutos de discussão.
    - Vamos esperar o inverno. E faremos a colheita. Não haverá nenhum metido para furtar centeio desta vez, garanto. – Ela olhou sombriamente para o espantalho sorridente, que fedia agora mais do que nunca. Ela teve a nítida impressão de ver um filete de sangue curto saindo de seu olho esquerdo. – Ele disse que escreveria no inverno... Sim... E então vamos vender o que roubamos. Repartimos o dinheiro e nunca mais vamos nos ver.

    - Gertrude... Você nunca foi tola. Está esperando demais daquele desgraçado! Ele nos traiu! Nunca vai escrever! Ele levou o dinheiro, levou toda nossa esperança. Vinte e dois anos já se passaram. Esqueça-o. Vamos salvar as nossas peles.
    - Desista Lenhard. – Rugiu Daurgh enquanto roia as unhas da mão direita. Ele olhou para o espantalho, assim como McLean e o gordo o faziam. – Ela está cega. Deixou a família toda morrer pra ficar com o Clarck. Mas ele a abandonou depois que roubamos aquela maldita vila. E Como você disse, ele nos traiu. Bem quanto íamos fazê-lo, mas contra o próprio.
    - Feche-se seu imbecil! – Sibilou a velha com a expressão facial de uma naja. – Clarck fugiu para se salvar da polícia. Ele foi o único reconhecido... Mas ele vai voltar. Sabe que estamos com boa parte dos móveis daquele casarão, e que só vamos vender quando ele voltar.
    - Sua velha burra. Vai esperar sentada. Achei que fosse a mais esperta de nós seis, mas parece que me enganei.
    - Não há honra entre os ladrões... – Disse o gordo olhando para o solo. Era o mais calado de todos. Jamais se esquecera aquele outono vinte e dois anos atrás quando ele e os outros cinco roubaram a incendiaram uma pequena vila. Sempre fora da opinião de Daurgh, de que deviam ter entregue Clarck e fugir com o dinheiro, mas era covarde demais para admitir.
    - Não... Clarck vai voltar. Embora realmente já faça muito tempo... – A voz viperina de Gertrude era agora um murmúrio introspectivo.

    - Então reconhece que já esperamos demais. Não podemos ficar fazendo espantalhos para cada um que incursa aqui. Só estamos nos sujando mais e mais. E já deveríamos estar limpos. – Disse Lenhard, fitando o campo à sua esquerda pelo canto do olho.
    Ouviu-se então o som característico do centeio sendo esmagado. Os cinco viraram-se na mesma direção, o nordeste. Houve uma movimentação no lugar aonde todos olhavam e então teve-se a certeza do que era. Gertrude simplesmente pegou um pequeno revólver do cinto de Lenhard e apontou na direção de onde viera o ruído, disparando. O som do tiro ecoou levemente, e os ruídos produzidos no campo cessaram. Os cinco se aproximaram e viram ali, caído no meio do campo, um garoto de aproximadamente doze anos, com um furo nas costas. Remexia-se fracamente, com o sangue manchando suas vestes e os olhos castanhos outrora cheios de esperança agora vazios de descaso.
    - Vamos ter de fazer outro espantalho. – Observou a anciã. Lenhard a encarou perplexo com tamanha frieza. Baixou a cabeça e encarou a criança, imaginando-a pregada no meio da imensidão dourada. As palavras de Gertrude ecoaram em sua mente.

    E faziam um mórbido sentido.

  9. #9
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    Padrão A Batalha dos Campos da Glória - Thomazml

    A Batalha dos Campos da Glória
    Thomazml



    “Essa porcaria de chuva não para” pensou Harter True-Blue, olhando para o céu tenebroso. O aguaceiro tinha começado no início da semana e não dava trégua. O tenente olhou para trás, tentando ver os homens do outro batalhão. Conseguiu divisar um ou outro escudo vermelho entre a água que caía. Suspirou, com a água entrando pela abertura do elmo, relembrando os últimos acontecimentos.

    A marcha estava se tornando desesperadora. Não era só a chuva que os importunavam. A batalha contra os orcs na Rocha de Ulderek fora longa e cansativa. A fortaleza estava com uma guarnição estranhamente pequena, mas isso não impediu aos orcs de fazerem uma ferrenha resistência. Ulderek, entretanto, caiu sob as pesadas botas da Legião Vermelha, que massacraram todos os orcs que ali estavam.

    “Uma lição bem dada. Os animais verdes agora vão pensar duas vezes antes de roubarem nossos suprimentos e atacarem a cidade” pensou Harter, enquanto chapinhava na estrada de terra. Sua capa vermelha estava toda suja de lama, assim como suas botas e até mesmo sua camisa. As solas de couro estavam começando a se desfazer, causando ocasionais escorregões que levavam a quedas repletas de palavrões.

    Além do mais, eles não estavam sozinhos na estrada. As Montanhas Fêmur, sempre perto da tosca estrada, estavam num rebuliço só. As vezes, no meio da marcha, uma chuva de pedras caiam em cima de um desafortunado. As pedras vinham acompanhadas com gritos estridentes e risos zombeteiros dos pequenos seres que habitavam as Montanhas: goblins.

    “Era só o que faltava, soldados da Legião Vermelha morrendo para míseros goblins, como se não bastasse essa estranha doença!” se lamentou True-Blue. Para o terror dos legionários, uma estranha doença os assolava desde que massacraram os orcs. Ela era rápida e mortal, transformando em menos de duas horas um guerreiro numa massa fria de carne. Quase um terço do exército tinha perecido desta forma horrível, para o desespero dos impotentes curandeiros que os acompanhavam.

    O tenente olhou para o que restava da sua companhia, arfando. Não pareciam nada com os gloriosos e temíveis guerreiros que deixaram Thais sob o olhar severo do rei. Não era só a exaustão da marcha e da batalha. Toda a campanha estava sendo um fiasco. Os trabalhadores revoltosos de Carlin tinham de ser mantidos a ferro e fogo. Harter presenciara execuções pavorosas, torturas aplicadas por obedientes membros da Legião nos esquálidos e acabados trabalhadores.

    O tenente franziu o cenho, tentando encontrar uma razão para aquele inferno. Talvez os rumores estivessem certos. Talvez Tibianus I, o rei da lendária Thais, estivesse mesmo enlouquecendo com seu poder imensurável. Era certo mandar homens, mesmo que criminosos, para um destino de trabalhos forçados aterradores, somente para edificar uma cidade imponente, no meio das planícies desertas ao norte de Thais? Aquele lugar era amaldiçoado, como bem lembrava a cada hora seu segundo em comando, Geryr. Foi despertado dos seus devaneios justamente pelo subtenente.

    - Senhor, vida longa ao rei, senhor! – saudou Geryr, batendo continência, era muito dado a formalidades o subtenente. Dentre os soldados, era o único que parecia limpo. Harter se surpreendia com a capacidade do subtenente em sujar só as solas da bota. Pena que não fosse tão eficaz assim em batalha, ascendendo ao posto devido ao um tio influente na corte.

    - Vida longa ao Rei! – falou com a voz cansada True-Blue, respeitando o protocolo. – O que aconteceu, Geryr?

    - O general Bistur Kahs quer falar com o senhor, senhor. – respondeu o subtenente. Harter meditou por um segundo. Estavam a menos de dois dias de Carlin e as Montanhas Fêmur já estavam ficando para trás, porque diabos o general queria conversar com ele? Bem, não era seu dever adivinhar, por isso suspirou mais uma vez e respondeu:

    - Está bem, você está no comando até eu voltar. Ligur, comigo. – falou, numa voz possante. Normalmente, seu subtenente o acompanharia, mas Harter não gostava do sujeitinho. Ligur, um legionário duas cabeças maior que a média, assentiu devagar e se postou atrás do tenente. True-Blue gostava dele, assim como a maioria dos legionários. O gigante era um eximo guerreiro, e, embora usualmente calado, tinha um respeito enorme entre todos.

    Avançaram por entre os legionários que paravam a marcha. Os sóis já tinham ido embora, e o acampamento já estava sendo construído. A exaustão e a infelicidade estavam estampadas no rosto de cada legionário que cruzava o caminho deles. Pelas regras do exército, as tropas só podiam dormir quando a cerca protetora e as barracas estivessem armadas. Ninguém dormiria em paz, sabendo que a qualquer momento uma sanguinária horda de orcs poderia atacar.

    Harter avistou o general, cercado dos demais oficiais. Todos estavam com expressões preocupadas, em círculo, discutindo em voz baixa. O tenente se aproximou de Kahs, que estava calado e com a mão no cabo da longa espada. Ligur ficou mais afastado, ao lado dos outros legionários que olhavam os oficiais discutirem. A chuva começou a cair mais forte, encharcando qualquer coisa que já não estivesse encharcada.

    - Já disse, e vou repetir: temos homens suficientes para esmagar esses rebeldes insolentes! Eles não são páreos para nossas lâminas! Covardes são aqueles que se negarem a fazer isso! Covardes e traidores! – vociferou o major Darotlim. O resto do conselho começou a discutir, em tons mais altos

    - Basta – falou calmamente Kahs, calando todo mundo. – Basta de discussão. Vamos nos ater aos fatos. Recebi notícias que os rebeldes estão cada vez mais fortes, receberam suprimentos e armamentos. Sim, se lutássemos contra eles agora, iríamos ganhar. Mas, temos que pensar um pouco no futuro. Se ganharmos dos rebeldes, teríamos forças para rechaçar um ataque órquico?

    A pergunta pairou no ar, e quando um tenente abriu a boca para falar, Bistur pigarreou, indicando que era uma pergunta que ele mesmo iria responder.

    - Não, irmãos, não iríamos agüentar. Fiquei surpreso com a pouca quantidade desse seres nojentos em Ulderek. Não acho que os parentes daqueles que massacramos vão aceitar essa humilhação em silêncio. Não percebem que algo estranho está acontecendo? Essa chuva que não para, até mesmo essa... doença – o general terminou a resposta num sussurro. De repente, a noite começou a ficar muito mais sinistra que Harter pensava.

    O tenente olhou ao redor. As Montanhas Fêmur estavam perto ainda, visíveis ao horizonte. Pareciam ameaçadoras. True-Blue pensou ter visto algumas luzes cintilarem em meio as cordilheiras das montanhas. Estremeceu e olhou para a chuva que caia, lembrando dos amigos mortos pela estranha doença. Realmente, não era natural. Até a lua parecia emitir um brilho tosco, malévolo, por entre o aguaceiro.

    - Meu plano é o seguinte: iremos até Carlin, nos fortificaremos no castelo. Mandaremos mensageiros para o Rei, pedindo que ele traga Os Cães de Guerra e mais suprimentos. Com Os Cães lidando com os orcs, poderíamos garantir a construção da cidade. – explicou rapidamente o general.

    Os oficiais ponderaram um pouco. Harter concluiu que era uma boa idéia. Os Cães de Guerra, como era chamado o grosso do exército thaiense, não eram tão mortíferos quanto a Legião, mas eles cobriam essa falta de habilidade com números gigantescos. Haveria alguns problemas, contudo. Precisariam de muito mais suprimentos, e a falta de disciplina dos Cães poderia ocasionar dificuldades.

    Estava olhando para o céu tempestuoso quando houve um rebuliço perto dos oficiais. Um jovem legionário, com a cara apavorada, arfava. Ele estava todo enlameado, sua capa estava rasgada e sua armadura apresentava bossas em vários lugares. Perdera o elmo e o arco, símbolo da sua posição como batedor, estava quebrado.

    - Senhor, eles estão vindo. E são milhares, senhor, orcs, ciclopes e até mesmo minotauros – balbuciou o aterrado batedor. Os oficiais começaram a falar alto de novo. Kahs abaixou a cabeça, franzindo a cara numa expressão desolada.

    - Então eles vieram mais rápido que eu pensei – murmurou Bistur, de forma melancólica. Quando ergueu o rosto, contudo, sua face estava irada. – Se tem de ser assim, assim seja! Somos a Legião Vermelha! Vamos mostrar à eles nossas lâminas! Vamos adubar os campos de Carlin de corpos verdes! Vamos enfeitar a muralha do castelo com crânios rebeldes!

    Todos os oficiais retiraram rapidamente as espadas de suas respectivas bainhas. Apontaram para o céu tempestuoso e berraram, loucamente. Harter os acompanhou. Era assim que a Legião saudava a batalha, com gritos e com uma vontade insana de guerrear. Faziam parte de um exército impiedoso, mortal e renomado. Não iriam recuar, não enquanto Bistur, o general, não o ordenasse.




    A chuva ainda caia quando a claridade aumentou. Os campos estavam completamente enlameados. O céu estava cinza claro, mais claro que qualquer outro dia desde o ataque fático a Rocha de Ulderek. O vento vindo do leste estava mais forte e mais frio, castigando os legionários, acampados perto de uma floresta.

    - Não gosto desse vento – confessou Harter para seus homens, que estavam a sua volta. Ele estava afiando a longa espada. Todos os legionários estavam se preparando para a batalha que viria. O tenente estava ansioso para a luta. Fazia duas noites desde que o batedor reportara o ataque. Bistur movera o exército para o norte de Carlin, que, por relatos dos poucos sobreviventes da Legião que tinham escapado, tinha caído na mão dos rebeldes. – Ele carrega um cheiro.. ruim -

    De fato, um odor fétido chegava com o vento. Um odor de suor misturado com sangue velho. Um fedor de orcs. Eles estavam vindo, e andavam rápido. Os legionários estavam debatendo como seria a batalha quando um mensageiro chegou a eles, correndo.

    - Senhor! Vida longa ao rei, senhor! O general Kahs ordenou que prepare o seus homens, pois a batalha começará daqui a pouco. Ele quer seus homens a esquerda dele.

    O tenente sacudiu a cabeça, num gesto afirmativo. Sua boca estava azeda e tinha um ligeiro tremor no braço direito. Colocou o elmo e fez um gesto, chamando os homens. Não disse uma palavra, mas se encaminhou para a esquerda do batalhão do seu comandante, o maior. Sabia que era uma honra dada por Kahs, pedir que lutasse ao seu lado, mas lutar perto dos porta-estandartes trazia um contra: era onde o ataque inimigo ia bater com mais força. O general já estava na frente dos seus homens, olhando para a floresta do outro lado da grande campina.

    Os homens começaram a cantar a canção de Banor, para fortalecer o espírito. Eram implacáveis, os melhores guerreiros de todo o Tibia. Não fugiriam, não se acovardariam. Estavam fazendo o que tinham nascido para fazer. O que tinha sido marretado em suas cabeças duras de legionários. Lutavam pela sede de sangue, pela fome de glória e por amor a Bistur, o general.

    Foi quando um grande barulho ecoou pela campina. Parecia que centenas de trombetas, acompanhadas por imensos tambores, começaram a zurrar. Um grande grito, de muitas vozes, começou a aumentar de volume. Os legionários, impassíveis, continuaram a cantar, batendo suas armas contra os escudos vermelhos, tentando abafar a barulheira dos orcs.

    Finalmente, o inimigo apareceu. Eram milhares. Desde imensos orcs, maiores que humanos, trajando equipamento completo de guerra, passando por minotauros silenciosos, portando machados de lâminas afiadas, grandes cicloples – gigantes com um só olho – que usavam malha metálica e enormes martelos de guerra e chegando em trolls e pequenos goblins.

    Os legionários pararam de cantar, olhando estarrecidos para a enorme quantidade de inimigos, avançando pela campina. Foi quando Bistur, trajando sua armadura negra com detalhes em vermelho, começou a avançar, desembainhando a espada, com um sorriso no rosto. Os homens viram o seu comandante avançar, rindo da morte, rindo dos seus inimigos. E foram a trás. A Legião Vermelha ia para a batalha.

    Se eu fosse transpor todo o horror, toda a glória, todo o sangue e todas as mortes que aconteceram naquele dia, não haveria pergaminho suficiente para escrever. Por isso, não vou me aprofundar na luta intensa de Kondax, o mago mais poderoso da Legião que, cercado de xamãs inimigos, invocou todo o seu poder, se explodindo para matar os mágicos adversários.

    Nem vou falar do valente Arthurio, guerreiro renomado, que caiu sob as pesadas marretas dos Ciclopes, quando seu batalhão inteiro já tinha perecido. O que dizer de Darkus, o arqueiro, que após acabarem suas flechas acabou morto por machadadas dos impiedosos minotauros? O que falar de Bendor, o curandeiro, que pereceu transmitindo sua energia vital para os companheiros de batalhão?

    Lágrimas chegariam aos olhos, se eu relatasse como Ligur, o legionário, morreu, defendendo o centro da Legião, sozinho, contra os mestres do Mooh’Tah. Quando conseguiu mata-los, foi morto por uma saraivada de setas, disparadas pelos besteiros dos minotauros. Até mesmo Geryr, o subtenente, lutou como um guerreiro ensandecido, matando uma grande quantidade de orcs até morrer devido aos seus múltiplos ferimentos

    Mas a mais épica batalha foi a de Bistur, o general, contra o Rei Orc. O rei era um orc imenso, do mesmo tamanho do general. Os dois mataram um ao outro, tornando a batalha mais confusa ainda. Logo, não restava muitos legionários, suplantados pelo número esmagador dos inimigos. Mesmo assim, nenhum deles fugiu, nenhum deles pediu misericórdia, pois sabiam que ela não seria dada. Todos sucumbiram como guerreiros.

    Harter True-Blue, o tenente mais leal de toda a Legião, morreu na batalha também. Morreu devido a um golpe de machado no peito. O golpe era destinado ao seu general, que estava batalhando com o rei, mas True-Blue usou seu próprio corpo como escudo, fincando sua espada no minotauro monstruoso e logo depois tombando, para nunca mais se levantar.

    Os campos estavam abarrotados de corpos, e o inimigo não vibrava, mesmo tendo obtido a vitória. Seus mortos eram incontáveis. Nunca mais tal poderio em homens armados iria se levantar no continente, porque a Legião fora dizimada . Os bardos cantariam a glória do dia, porque ali, ao norte de Carlin, a cidade rebelada, a Legião tinha lutado até seu último homem. Lutado e morrido, com um sorriso na cara, enfrentando a batalha e a morte com a felicidade insana de Bistur Kahs, o último general da Legião Vermelha.

  10. #10
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    Cerco em Carlin
    Meltoh



    Os aríetes continuavam a martelar incessantemente os portões da cidade. Chuvas de flechas vindas do alto das torres cravavam-se na horda que se amontoava aos pés dos muros e uivava incitando inspiração nos companheiros. De longe, criaturas verdes vestidas em armaduras de ferro conspiravam e guiavam seus compatriotas nessa empreitada ousada. O cerco de Carlin.

    Reunidos em volta de uma mesa retangular e coberta por um manto azul, estavam sentadas cerca de vinte mulheres, todas vestidas em elegantes armaduras de metal. Na ponta da mesa estava outra mulher, diferente das demais.
    -...E por esse motivo que digo que devemos cerca-los pelos flancos. Eles estão acampados há dias e provavelmente já estão fracos de fome o bastante.
    - Isabelle, eles são muitos – falou calmamente uma das mulheres. Longos cabelos vermelhos e um rosto meigo marcavam a sua aparência física – Não tem como embosca-los. O melhor a se fazer é continuar a evacuação e permanecer dentro dos muros.
    - Mas, Thamira, nossos alimentos estão se esgotando. Os soldados estão começando a morrer de fome, e os orcs já dão indícios de que não cessarão o cerco – disse a primeira mulher – E eles estão se alimentando dos rebanhos de ovelhas que encontraram no oeste, e muito provavelmente dos lobos no norte. Se não atacarmos eles, eles apenas invadirão a cidade para encontrá-la vazia e cheia de mortos.
    A mulher na ponta da mesa estava com a cabeça apoiada sobre o seu braço direito e, com os olhos fechados, parecia estar num profundo sono.
    - Entretanto – declarou uma terceira mulher que havia se levando – A evacuação ainda não terminou e se arriscarmos um ataque à essa altura colocaria em perigo a vida dos cidadãos – ela pigarreou – os navios já estão terminando com as pessoas.
    - Quanto tempo isso vai levar? – perguntou subitamente a mulher que estava de olhos fechados.
    - Cerca de dez horas, Majestade Eloise, é o tempo em que os últimos navios vindos de Thais devem chegar na nossa costa.
    Eloise abriu os olhos e fitou calmamente à Isabelle.
    - Está disposta a conduzir um ataque ao acampamento orc, mesmo sabendo que isso poderia ser suicídio?
    - Mas Majestade... – interrompeu Thamira. Foi interrompida por um gesto de mão da rainha Eloise.
    Isabelle engoliu em seco e escondeu seus braços sobre as pernas para que as outras não percebessem como ela estava tremendo – Não haverá problemas majestade...
    - Ótimo, venha comigo, por favor. Thamira continue a evacuar os aldeiões e você Jiane veja como estão os arqueiros. Troque o turno deles e renove o estoque de setas.

    Eloise e Isabelle seguiram por um corredor que levava ao quarto pessoal da rainha. Ao chegarem lá, ela pediu para que as guardas prostradas, cada uma de um lado da porta, saíssem.
    Isabelle se certificou que as outras não estavam mais por perto e voltou-se para Eloise, seus olhos estavam levemente úmidos e suava muito.
    - Você deverá reunir o quinto esquadrão de infantaria e começará o ataque dentro de uma hora.
    Isabelle assentiu.
    - Vejo medo nos seus olhos. Se não puder cumprir com sua missão, poderemos pensar em algo melhor – disse Eloise serenamente – Levante a cabeça e enxugue os olhos. Você é a nossa mais nova e talvez mais inteligente comandante – Eloise destrancou o quarto e dirigiu-se à um pequeno baú, tirou de dentro dele um bracelete prateado ornado de 4 grandes safiras no centro, que formavam juntas o desenho de um círculo – Entregue isso à Karl, nos esgotos.
    Isabelle se assustou – Mas... Karl? Ele não é o taverneiro que...
    - Não é hora para essas discordâncias. Sei que Karl estava montando seu exército particular. Precisaremos de toda ajuda possível para combater os orcs quando eles passarem daquela muralha.
    Isabelle pegou o bracelete e guardou por dentro da roupa.
    - Ainda na taverna – continuou Eloise – Procure por Drulak, e diga para ele sobre Asas.
    - Asas? – perguntou Isabelle.
    - Ele saberá o que fazer. Agora vá. Saia pelo leste e embosque-os pelos flancos. Enviarei assim que puder outro batalhão comandado por Thamira.
    - Mas Thamira... Ela era contra esse ataque.
    Eloise fitou-a impaciente. Isabelle entendeu e se retirou.

    Na taverna encontrou-se com Karl e lhe mostrou o bracelete. Karl ordenou aos seus homens que se juntassem e fossem para os quartéis de Carlin. Apenas um homem havia restado, estava sentado à uma mesa num canto bebendo de um copo feito de madeira. Seus longos cabelos negros cobriam-lhe parte do rosto, o qual era coberto por um fino bigode e uma barba mal-feita.
    Isabelle se aproximou da mesa e se sentou na cadeira vaga.
    - Veja só aonde fomos parar... Karl ajudando vocês...
    - Ele não está nos ajudando – protestou Isabelle – Está ajudando a cidade.
    - Dá na mesma. E agora quem vai me servir meu quarto copo?
    Isabelle resmungou em sinal de desaprovação.
    - Qual é o seu nome?
    - Lady, não é educado perguntar o nome de alguém sem antes se apresentar.
    - Isabelle – disse ela furiosa.
    - Drulak, filho de Torark. O que quer com o meu nome?
    - A rainha Eloise pediu para que lhe falasse sobre as Asas.
    Drulak arregalou os olhos, e coçando a cabeça deu mais um gole no copo – E o que ela tem com isso?
    Isabelle ficou sem saber o que responder, se levantou e fez menção de sair.
    - Espere... – disse Drulak – Você não sabe de nada sobre Asas não é?
    - Veja só, ela só me pediu para que lhe disesse sobre isso. Agora tenho tarefas importantes a cumprir.
    - Não... Você não vai a lugar nenhum – Drulak estralou os dedos e várias tochas ao redor da taverna foram acesas.
    - Você... Você é um mago? – perguntou Isabelle horrizada.
    - Talvez sim... Talvez não... – Drulak bebericou mais um gole do seu copo e enxugando a boca se levantou rapidamente – Venha comigo.
    - Não! – disse Isabelle.
    Drulak riu e pegou uma das tochas que estava na parede - Vai desobedecer a sua rainha?
    - Ela ordenou que...
    Foi interrompida por um rangido vindo de trás do balcão de Karl. Um armário de bebidas acabava de ser afastado para o lado.
    - Gosto dessa tecnologia dos anões – disse Drulak – Me traz recordações.
    - Quem é você?
    - Já disse... Meu nome é Drulak, filho de Torark.
    - Você vai me desculpar... Mas não posso perder meu tempo com você – disse Isabelle.
    - Certamente que não. Porque uma Lady como você perderia seu tempo com um vagabundo como eu? Por favor, me acompanhe.
    Isabelle tentou resistir, mas algo em seu subconsciente dizia para ela que deveria saber quem era aquele homem. Seria atração? Curiosidade? Medo? Esse turbilhão de emoções mexia com a cabeça de Isabelle e ela se sentia cada vez mais confusa. Até que então ela resolveu seguir Drulak e entrar na câmara que havia se aberto.

    Era um longo corredor apenas iluminado pela luz do sol que entrava acima vinda dos bueiros. Eles andaram silenciosamente pelo lugar até que Isabelle resolveu falar:
    - O que é a Asa?
    Drulak riu - Você não quis saber antes, vai ter que esperar agora.
    O corredor virava para a esquerda duas vezes, até que depois de virar pela terceira vez, para a direita eles chegaram à uma escadaria feita de madeira. Drulak encostou os ouvidos na porta, que havia no topo da escadaria, e puxou uma adaga afiada de uma pequena bolsa. Com a mão esquerda apertou uma pedra que estava solta na parede. A porta rangeu e se abriu para fora.
    - Merda – gritou Drulak – Se afaste Isabelle.
    Drulak foi empurrado, rolando escadaria abaixo. Várias criaturas verdes começaram a adentrar o corredor apertado. Isabelle puxou sua espada curta, e olhou preocupada para Drulak que se contorcia de dor à um canto.
    Eram cerca de cinco orcs. Eles avançaram para cima de Isabelle com machados erguidos e dentes arreganhados.
    Drulak gritou palavras desconhecidas e dois dos orcs saíram voando e ficaram grudados ao teto. Isabelle entrou em combate com o primeiro orc que havia desferido um ataque avassalador com o seu machado de guerra. Isabelle esquivou e girando serenamente estocou a espada contra o peito da criatura. Drulak se levantou e lutou contra um segundo orc, enfiando a adaga no pescoço dele. O terceiro orc puxou um sabre e conseguiu desarmar Isabelle. Ele a empurrou, fazendo com que ela caísse no chão. Estava prestes a atacar quando, caiu de joelhos, com uma adaga cravada no lado de trás do pescoço.

    Os outros orcs que estavam grudados no teto observavam em silêncio a morte dos outros guerreiros.
    - O que foi isso? Está querendo me matar Drulak? – perguntou Isabelle.
    - Respondendo as perguntas. Orcs e não – disse ele arrancando sua adaga do pescoço do orc inerte e limpando-a nas vestes do mesmo.
    - O que eles estavam fazendo lá fora?
    - Descobriram a entrada da câmera. Mas só eram esses, não consigo mais detectar nenhum orc por perto, com exceção desses dois.
    - Então você é um mago?
    Drulak riu – Prefiro que me chame de Guardião.
    Isabelle soltou uma exclamação abafada. Os dois subiram a escada e se viram fora dos muros de Carlin.
    - O que estamos fazendo aqui? – perguntou Isabelle.
    Drulak olhou para os céus e assobiou.
    Isabelle viu um pássaro se aproximando à distância. À medida que foi chegando mais perto, Isabelle viu que não era uma mistura de pássaro e cavalo.
    - Isto é Asa – disse Drulak.
    O grifo pousou e foi para perto de Drulak. Ele o acariciou e tirou de dentro das vestes uma cenoura. O grifo fez um barulho que lembrava um agradecimento.
    - Suba – disse Drulak.
    - Quem você pensa que é?
    Drulak a pegou pelos braços e colocou-a em cima do grifo. Isabelle gritou, mas Drulak havia sussurrado no seu ouvido palavras que pareciam ter feito Isabelle ficar em choque.
    O grifo, batendo suas asas emplumadas, levantou vôo e seguiu para o sul.

    Do alto da torre mais alta do castelo, a rainha Eloise apreciava o vôo do grifo, até que foi interrompida por uma de suas comandantes, Thamira.
    - Senhora, o portão norte está rompendo. Não demorará até que os orcs invadam Carlin. Onde está Isabelle? Ela precisa retornar antes que seja tarde.
    Eloise baixou a cabeça e lágrimas escorreram por seus olhos – Acho que não voltaremos a ver Isabelle – disse ela tristemente, torcendo para que o que acabara de dizer não fosse verdade. Pois queria, ainda, um dia se encontrar novamente com sua querida filha.

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