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Tópico: Concurso Taverna do Roleplay - 2010

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  1. #1
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    Padrão Concurso Taverna do Roleplay - 2010

    Concurso Taverna do Roleplay - 2010


    Categoria Off Tibia:
    1. Acordar - Steve do Borel
    2. Aquarela do meu Brasil - Drasty
    3. Malditos Sejam - Ldm
    4. "... Mas livrai-nos do mal, amém" - Thomazml
    5. Medo - Meltoh
    6. O Negro Destino de Marrom - Professor Girafales
    7. Os Áureos Campos de Centeio - Manteiga


    Categoria Tibia:
    1. A Batalha nos Campos da Glória - Thomazml
    2. Cerco em Carlin - Meltoh
    3. De Heróis e Vilões - Professor Girafales
    4. O Fantasma do Corsário - Drasty
    5. Sem Título - Ldm


    Categoria Poemas:
    1. Cordel - Wu Cheng
    2. Lanças - Meltoh
    3. Leviatã - Manteiga
    4. Meio Púrpura - Steve do Borel
    5. Poesia - Lucius Cath
    6. Quatro Gotas de Sangue - Drasty
    7. Roubaram minha Menina - Thomazml

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    Última edição por Wu Cheng; 21-04-2010 às 20:11.

  2. #2
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    Padrão Acordar - Steve do Borel

    Acordar
    Steve do Borel


    Naquela noite, me deu vontade de sair de casa. Assim mesmo, do nada e pra lugar nenhum, sozinho no Rio de Janeiro. Não foi uma daquelas vontades de ir pra alguma festa, chamar amigos e essas coisas. Foi uma vontade espontânea e misteriosa, de sair por aí caminhando acompanhado apenas de seus próprios pensamentos, que na verdade eram tão ou mais misteriosos que a própria vontade.

    Não que isso seja estranho, apenas parece estranho. No fundo no fundo, ninguém sabe exatamente no que está pensando ou no que quer, nós só estamos na vida pra caminhar mesmo.

    E foi assim, nesse espírito, que eu cheguei na praia. Não posso saber se era aquele mesmo o meu objetivo, porque, como eu já disse, a gente nunca sabe. Joguei a havaiana no calçadão e desci descalço, sentindo a areia fofa, a brisa marítima, o sereno daquela noite estranha e ouvindo o mar sussurrar palavras que não existem. No dia seguinte, já fora daquele transe, eu me arrependi de ter desperdiçado um chinelo assim, sem objetivo. Mas enquanto “aquilo” durou, eu não conseguia pensar em nada, decidir nada por mim mesmo. Era apenas o meu corpo tomando decisões e agindo por si próprio.

    Cheguei bem perto do mar, onde eu pudesse sentir aquelas ondas quebrando na areia, e lá na frente o mar se misturando ao céu, de modo que os dois parecessem uma única coisa. Aquela era a magia da praia à noite.

    Tudo estava tão perfeito, tão harmônico, até que o som do mar começou a se misturar com o riff inicial de Shiny Happy People. Será que eu estava mesmo ficando tão maluco assim? Fiquei um tempo acompanhando a melodia com a cabeça, até que finalmente acordei.

    - Alô?

    - Não tô conseguindo falar com o Marquinhos, tu tem o telefone do buffet aí?

    - Quê?

    - Tu tem o telefone do buffet aí, cara?

    - Como?

    - O evento cara! Trabalho! Tu tem o telefone da porra do buffet?

    - Ah, trabalho... não tenho não. Liga pro Felipe.

    O evento, trabalho... eu quase tinha me esquecido. Fui até o mar, peguei um punhado de água com a mão e joguei na cabeça. Depois, voltei pra casa, tomei banho, fiz umas ligações e dormi. E a realidade, sempre nos acordando.

  3. #3
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    Padrão Aquarela do meu Brasil - Drasty

    Aquarela do meu Brasil
    Drasty


    – A branca serve pra que?

    – Confia em mim, moleque, tu nunca vai usa a branca.

    – Fala de novo então, pra eu tê certeza.

    – Presta atenção, não vou repeti de novo essa porra. A vermelha é pra quando os alemão tá subindo. A preta é pra avisa que o morro tá em guerra. A azul é pra anuncia pros boy que a mercadoria chego.

    E em seguida o Negão batia o revólver na coxa para ter certeza que tinha dito tudo. Depois caminhava pela laje, encostava o corpanzil na sacada e olhava o sol bater no morro. As dezenas de casas emaranhadas na encosta com mais cores que o arco-íris. Quando chovia forte ele achava que a montanha viria abaixo, lavando todas as casinhas e engolindo todas as pessoas. Afinal, aquelas construções não eram fortes – feitas de tijolo e cimento – e haviam sido feitas sem sequer um engenheiro para projetá-las. Foram montadas do suor daquela gente humilde esquecida no pôr-do-sol do bairro nobre que lá embaixo – na civilização – jazia.

    “Bando de filhos-da-puta” pensava. “Fingem que se importam com agente, mas tão é cagando se agente vive igual bicho”.

    O menino respirou fundo e recolheu as cinco pipas deitadas no chão. Seguindo o outro, vagou pelas passarelas arquitetadas pelo acaso da favela em que cresceu. Conhecia cada esquina, cada dobra, assim como sabia o nome de todos que ali moravam. Para ele, gente de bem, trabalhadora e esforçada. Sabia quem eram as “ervas”, como chamavam aqueles que optavam por seguir caminhos mais sombrios. Embora soubesse que o Negão fazia parte desse grupo, tinha para si que se tratava de um bom amigo e entendia os motivos que o levaram a se juntar ao Napoleão.

    Napoleão era o dono do morro, se é que o morro podia ter um dono. Não era o tipo de pessoa com quem se tem um vinculo de amizade, nunca se podia esperar muita coisa vindo dele. Seu reinado tinha trazido a favela uma paz momentânea. Ele causava tanto medo à polícia que as investidas destes tornaram-se escassas até que quase não aconteciam mais. Há duas semanas, um grupo de quatro PM’s subira o morro para cobrar dinheiro do Zé, dono do bar. Nunca mais se ouviu falar desses quatro coitados, o Napoleão mandou matá-los e jogar seus corpos no rio que corria do outro lado da encosta. A delegacia só viria a encontrar os cadáveres meses depois.

    Dessa forma a vida na favela ia sendo levada. O povo fingindo ter paz e a polícia fingindo não ter nada de errado lá.

    Napoleão possuía diversos homens de confiança, entre eles o Negão, seu braço-direito. Ele buscava a mercadoria toda sexta-feira à noite e, também era quem cuidava de todo problema que os clientes pudessem criar. Com seu compadre achando solução para tudo, o Napoleão dormia tranqüilo enquanto enchia os bolsos.

    O moleque sentia o Negão mais nervoso nos últimos dias, desde que ouvira na televisão a notícia da força especial, cuja polícia montava para subir o morro. A coisa estava ficando feia, tinha gente comentando até da possível presença do exército na missão. Ele sabia que se houvesse um confronto desse tamanho, seu amigo talvez não sobrevivesse. Seu coração doía em se conformar, afinal a paz do Napoleão não podia durar para sempre.

    – Agora que cê trabalha pra nós tu vai ter que arranjar um apelido – disse.

    – Pode se qualquer merda mesmo? – perguntou o moleque.

    – Qualquer merda que tu quiser, moleque.

    – Xuazinégue pode? Sempre quis ter esse nome.

    – Essa porra é foda de fala, pensa em algo mais fácil, moleque.

    Com um peso estranho nos olhos o garoto respondeu triste:

    – Vai ser Moleque, cês só me chama assim mesmo.

    O Negão riu calorosamente.

    Empinar pipas não era difícil para o Moleque, brincava disso sempre, a diferença era que agora se tratava do seu ganha pão. Praticamente só a pipa azul subia até os céus. Quando o brinquedo surgia no topo da montanha dançando nos ventos demorava poucas horas para os clientes surgirem em massa. Pode acreditar, havia artistas de TV, filhinhos de papai e meninas vestidas como bonecas. De cima da loja do Napoleão, o Moleque trazia todo tipo de gente, parecia mágica.

    Pouco a pouco ele foi ficando mais entendido dos assuntos da boca e se não fosse pelo zelo do Negão, o garoto embocaria nos mesmo caminhos tomados por tantos. Mal sabia ele, que isso viria a salvar a vida do menino das pipas.

    Na tarde de uma quinta-feira cinzenta, o Moleque chegara à loja e notara a ausência de todos os vendedores. Napoleão e Negão também não estavam. Atônito com a incomum falta de estardalhaço no local, subiu a ladeira que dava para seu observatório e contemplou a enorme encosta se afogar em sombras. Na rua avistou uma movimentação estranha, havia carros de polícia e muitas luzes iluminando a cidade. Num susto, ele pegou a pipa vermelha e a lançou contra o ar. Seu corpo se encheu de pavor, não ventava. Nem uma brisa se quer ousava cortar o ar.

    Esforçou-se para por a pipa nos céus, mas era impossível. Então decidiu buscar outro lugar para empiná-la. Tomou todas nas mãos e disparou morro a baixo. Enquanto descia pelas muitas vielas e esquinas, começou a ouvir barulhos repetidos estourando contra as paredes e carros. Decidiu sair da rua principal da favela, ali estava perigoso demais para se locomover, por isso adentrou uma estreita passagem que desembocava no bar do Zé. Totalmente camuflado pelas sombras, o Moleque avançava no seu trajeto. De repente, parou. Alguns metros a sua frente havia um corpo estirado contra a mureta de tijolos. Para sua surpresa, morto na sua frente, estava o Napoleão. Três balas penetraram seu peito, uma delas bem no local do coração.

    O Moleque sentiu uma mistura de satisfação com pesar e por hora não lamentou ou comemorou a morte do seu chefe. Simplesmente continuou a correr, dessa vez ainda mais rápido. Seguiu assim até tropeçar em algo grande e cair.

    – Ai porra.

    Era o Negão. Deitado de bruços como uma jaca que acabara de cair de uma árvore.

    – Moleque, é tu ai?

    – Sô eu Negão. Tu tá bem, irmão?

    – To todo fudido, moleque. Os alemão me acertaram.

    – Cê vai morrer? – perguntou, embora conhecesse a resposta.

    – Num sei. To me sentindo fraco e ta tudo meio frio e meio escuro – o Negão estava morrendo, tinha sido acertado por mais tiros que o dono do morro. Cinco nas costas e mais dois no peito. Só estava curtindo seus suspiros finais, como quem fuma o último cigarro antes de largar o vício.

    – Moleque, cuida da tua vida, tá bom? Não faz merda como eu fiz não – disse tossindo.

    – Tá bom, Negão.

    Depois disso, um silêncio se estabeleceu. Um vento começou a soprar forte contra o rosto do menino. Ele escalou um compensado de uma casa daquele beco com as pipas de baixo do braço. Tomou uma nas mãos e arremessou contra o vento. A rabiola se desdobrou aos poucos e o brinquedo foi subindo. No céu da favela sem dono a pipa branca reinava, enfim sozinha.
    Última edição por Wu Cheng; 21-04-2010 às 20:11.

  4. #4
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    Padrão Malditos Sejam - Ldm

    Malditos Sejam
    Ldm



    “Deus os entregou a paixões vergonhosas: as suas mulheres mudaram as relações naturais em relações contra a natureza. Do mesmo modo também os homens, deixando o uso natural da mulher, arderam em desejos uns para com os outros, cometendo homens com homens a torpeza, e recebendo em seus corpos a paga devida ao seu desvario. Como se não se preocupassem em adquirir o conhecimento de Deus, Deus entregou-os aos sentimentos depravados, e daí o seu procedimento indigno. São repletos de toda a espécie de malícia, perversidade, cobiça, maldade; cheios de inveja, homicídio, contenda, engano, malignidade. São difamadores, caluniadores, inimigos de Deus, insolentes, soberbos, altivos, inventores de maldades, rebeldes contra os pais. São insensatos, desleais, sem coração, sem misericórdia.”

    “É com esta mensagem que nos despedimos. Que Deus esteja convosco.”

    Fervilhando de humanos sedentos de fé, o encontro dominical encerrou-se. Ao menos para os fiéis.

    O homem de meia-idade atravessou a rua em direção a uma casa; decente, nada mais. O cenário, mais do que previsível: igreja; ruas; veículos; casas; árvores, umas poucas; humanos; mendigos: estes, como se não fizessem parte do grupo anterior.

    O homem adentra no recinto familiar. Cena corriqueira: a filha, terminando de comer; a mulher, quem saberá?

    — Vá se deitar, filha. Já vou dar-lhe a bênção.

    E ela foi. Seus passos, grosseiros e leves, como se já suportassem o peso da responsabilidade; seus olhos, inexpressivos, tão mortos quanto os de um idoso; os cabelos, lindos: não fossem os piolhos.

    Do outro lado da rua, o padre retirava de um armário de madeira uma caixa de sapatos. Dentro dela, a inevitável hipocrisia.

    Hipocrisia essa que já se tornou um chavão moderno, destes que estampam capas de revistas ditas informativas. Seu verdadeiro significado, quase esquecido; ou seria convenientemente oculto?

    Tanto faz como tanto fez.

    Deitada sobre um colchão mofado, no escuro, a garotinha esperava, ansiosa, pelo pai. Nem tão ansiosa; o que viria a seguir ela já conhecia.

    Embrenhadas nos densos matagais da memória, cenas da pré-concebida felicidade eram reconhecidas.

    “Mãe, o que é aquilo?”
    “É um arco-íris, filha.”
    “E por que ele tem essas cores?”
    “Porque são essas cores que dão vida ao mundo.”

    Ao ranger da porta, a garota encolheu-se. E, ainda que timidamente, indagou:

    — Vai doer?
    — Menos, espero eu.

    Ao som de roncos ensurdecedores, em um quarto de motel, uma moça admira-se no espelho; lamenta-se, seria o correto.

    A imagem idealizada por ela era o perfeito estereótipo da perfeição: uma criança loura, sorridente; os dentes, ainda por nascer; a roupinha rosa, estampada com flores multicoloridas; e os olhos, ah, os olhos, azuis, cintilavam a tradução de sua felicidade imensurável. A imagem refletida era o oposto: uma jovem, suja, com os poucos dentes que lhe sobram há mais de semana sem ver uma escova dental; os cabelos, outrora loiros, estão cá desbotados e empastados; o corpo, mutilado: não no sentido literal, mas, mutilado.

    O choro já secara; nem lágrimas eram mais produzidas. Que sentimento poderiam elas traduzir? A humanidade já se perdera há muito. Dignidade, palavra desconhecida: tanto moral quanto gramaticalmente.

    E os olhos: roxos, inchados; azuis, qual fosse o caso. A dita porta da alma já fechada e trancada; e a chave, perdida.

    Não dormiu; não conseguiria. Namorou a noite. À noite toda.

    Já em um jardim, a ambição humana alcançara, literalmente, outros patamares. Honra-se a expressão “nuvens de algodão”. Quem dera fosse eu a flutuar nestas nuvens de amor; ou de algodão.

    Jaqueiras; céus de goiabada. “Jurema no céu com pedregulhos.”

    E o idealizador ouvindo sua música preferida; ó, doce música. Aquela que nos traz as mais diversas sensações.

    O dito idealizador, membro célebre de um hospício à beira de uma favela, contemplava a mesma. O olhar vago; vivendo o irreal, naquele paraíso utópico, sob uma salva de tiros mais do que melódicos.

    A dita loucura do sonhador, desconhecida. Fosse doença mesmo ou vontade própria, sorte tinha o louco; o que poucos conseguiam sequer imaginar, ele via todo dia. Vivia naquele paraíso.

    Sobre a cama de um hospital, um jovem debruça-se sobre uma figura: feminina, imagina-se.

    — Mãe?
    — Diga.
    — Me perdoa?

    Um sorriso brotou de seus lábios. O sorriso do mais ácido sentimento.

    — Vá se foder.

    E com uma pontada no que já foi meu coração que vos digo, amargurado: já fui o padre; o pai; o desalmado; o louco; e o jovem. Fases diferentes de minha (antiga) vida.

    E depois de tantos personagens, em que me tornei?

    Malditos são aqueles que vivem no mundo real; e fortes são aqueles que assimilam o mundo real e ainda querem viver.

    Depois de ter vivido tudo o que vivi, despeço-me da vida. Nada mais me prende a ela. Que Deus abençoe o editor da minha revista favorita; que minha filha apague-me de suas memórias e consiga ser o que não fui; que a moça a quem não tive coragem de abusar recupere o antigo brilho de seus lindos olhos azuis; que a idosa jamais abandone sua forte personalidade; e que o louco, a quem tudo foi negado, consiga, enfim, morrer em paz.

  5. #5
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    Padrão "... Mas livrai-nos do mal, amém." - Thomazml

    "... Mas livrai-nos do mal, amém."
    Thomazml



    - É John, você ta fodido – sibilou uma voz maligna, ecoando pelo pequeno cárcere. O ar estava frio, e não havia nenhuma fonte de luz para iluminar o local. John levantou a cabeça, assustado. Estivera deitado num amontoado de palha, que ele chamava de cama. Não dormia direito desde a semana anterior, o que provocara profundas olheiras em sua face magra e pálida.

    - Quem está ai? – perguntou, num sussurro rouco. Sua voz, muito pouco utilizada nos últimos dias, saiu arrastada e pesada. Estava ofegante, com medo. Olhou para os lados, tentando ver a origem da voz grave. – É mais um guarda? – lamuriou-se – Já disse tudo o que eu sabia! Não sei mais nada! Por favor, não façam isso comigo!

    O homem esquálido começou a soluçar, tremendo o maxilar e deixando escapar um filete de baba sobre o queixo peludo.

    - Não John, não sou um guarda. Sou um... conselheiro. Um... amigo dos loucos. – respondeu a voz, pronunciando as palavras num tom intensamente zombeteiro.

    - Mas eu não estou louco – murmurou o homem, arregalando os olhos, pensando na tenebrosa possibilidade. Será mesmo que não estava louco? Não era esse o veredicto do rei? Sua cabeça tremeu, e seus olhos cansados se encheram d’água.

    - Claro, afinal, falar com uma voz imaginária é uma prova de que a pessoa é sã – ironizou a voz. John deixou uma lágrima rolar pelo rosto sujo. Então era verdade, ele era um louco.

    - Você não existe? – perguntou, trêmulo, o homem. A voz soltou uma gargalhada fria, como uma criança maligna que consegue seu intento torpe. – Se existo? Não estou falando contigo neste exato momento? – respondeu a voz, com uma entonação jocosa.

    - A pergunta, John, não é se eu existo. A pergunta é: até quando você vai existir? – a voz declarou a pergunta e soltou risadinhas mal abafadas. O homem abriu a boca ressecada, sem conseguir dizer a resposta. Outra lágrima escorreu pelo rosto magro.

    – O que houve? O grande pensador não tem resposta? Deixa eu te ajudar: HOJE! – berrou a voz, no ouvido do prisioneiro, que soltou um gemido e se encolheu.

    - Isso mesmo John, hoje você vai morrer. Sabe, é interessante isso! Porque, se você fosse religioso, estaria feliz por morrer e ir aos céus. Mas, não! O senhor perfeição, que clama ter a sabedoria da ciência lógica, nega Deus. E, pelo mesmo motivo que é levado a morte, não encontra consolo nela. Ironia, não? – a voz continuava, impiedosa.

    - Não tenho medo de morrer – o homem respondeu, olhando para o chão. A voz riu, desdenhando da resposta. Até mesmo ele, John, duvidava do que acabara de dizer. Engoliu em seco e mordeu os lábios, impotente.

    - Não tem medo, John? Realmente não tem medo de morrer? Não tem medo do que pode... vir? – insinuou, maliciosamente, a voz. O prisioneiro virou a cara como se tivesse levado um tapa. Não tinha certeza de nada, sentia-se abandonado por tudo, seu intelecto, sua convicção e seu brilhantismo.

    - Vou te dizer uma coisa, John, é melhor você estar certo. Afinal, se existir um inferno, é muito provável que você vá para lá – falou a voz, num tom de um amigo que confessa uma coisa íntima. Mas esse clima confissão foi logo quebrado com um risinho malévolo da voz. O prisioneiro gemeu, sofrendo em suas terríveis dúvidas.

    - Realmente, morrer por besteiras... se ainda fosse morrer por verdades! – suspirou a voz. O homem sentiu o desespero aumentar, agarrando a cabeça e arregalando os olhos. A voz riu de novo.

    - Não... não! Eu não vou morrer por mentiras! Tudo o que eu disse é verdade! Tudo! – gritou o homem, mais para se convencer do que para qualquer outra coisa. Suas certezas, seus princípios, tudo, tudo se desvanecendo ante a cruel verdade da voz.

    - Verdade? Qual verdade que disse? Que Deus não existe? Que o.... povo, é governado por um Rei que não dá a mínima para eles? – perguntou a voz, fingindo interesse.

    - Sim! São verdades, inquestionáveis! – bradou o prisioneiro, pela primeira vez conseguindo ver um ponto lúcido em sua mente. Uma ponta de esperança, na qual ele agora estava agarrado firmemente.

    - Inquestionáveis? São mentiras, são falácias! Quem é você para dizer que Deus não existe? Se ele não existisse, porque você, herege, será morto? Se o rei não dá a mínima para o povo, porque ele vai os presentear com um espetáculo hoje? – vociferou a voz, destruindo de vez a esperança do homem, que desatou a soluçar, balançando a cabeça, entregue ao desespero.

    - O papo até que está bom, mas... ouça! Passos no corredor! – de fato, um barulho crescente de passos chegava da porta. Esta foi bruscamente aberta, deixando entrar um resquício de luminosidade. Porém, dois soldados logo encapuzaram o prisioneiro com um pano preto fedido, amordaçando-o.

    - São seus últimos passos, John. Qual é sensação? – perguntou a voz, num tom falsamente curioso. – Ah! Esqueci, você está amordaçado. Sabe porque, não é? Porque você é um herege, e pode dizer coisas ruins para o povo. E sabe o porquê de estar encapuzado? Para não fitarem seus olhos esbugalhados, quando pender na corda - O homem, que cambaleava, sendo empurrado rispidamente pelos soldados, tentou falar uma coisa. Foi calado com um forte sono na sua costela.

    -Shhh! Quietinho, John! Não precisa falar, eu sei o que você iria dizer. Iria dizer que o que você está fazendo é para o povo. – a voz soltou outro risinho de desprezo. A claridade ofuscou os olhos derrotados de John, mesmo encapuzado. Deviam ter saído para o pátio externo da prisão. O coração do condenado batia forte no peito magro. De repente, ouviu um rugido. O povo estava lá, gritando obscenidades parar ele, xingando-o.

    - Vê o que o povo quer de você, John? Eles estão pouco se fodendo para suas teorias mirabolantes. Não dão a mínima para suas conspirações e falácias. Eles querem ver você pendurado, se mijando, enquanto morre, balançando na corda. – a voz continuava, acima dos ruídos intermináveis da massa, ao redor. John começou a chorar, embora não pudesse ver o povo. Sua respiração era rápida, entrecortada por soluços. Seus músculos tremiam e sua boca estava seca.

    - Como você é tão detestável, John, nem vão ler sua sentença, vão direto para o enforcamento. Pena você não ter nenhum amigo para segurar teus calcanhares enquanto balança na corda. Sabe, o corpo humano agüenta diversos minutos, até horas, pendendo na corda. Isso se o laço não for tão eficiente. Dará tempo para você fazer todas as dancinhas que souber.

    O carrasco colocou a corda, e firmou o laço. John chorou e olhou para os céus, levando logo um soco na cabeça, para ficar parado. Fechou os olhos, começando a rezar o pai nosso. O povo se calou, na expectativa.

    - ... seja a feita a vossa vontade ...-

    - Adeus, John – cortou a voz. O chão desapareceu, um corpo tombou e a multidão urrou.




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    Padrão Medo - Meltoh

    Medo
    Meltoh



    Pela trilha de gramíneas, caminhava o velho Castor. Na sua mão esquerda trazia o seu velho lampião, cujo fogo crepitante iluminava tudo à sua volta. Era tão tarde que não havia sinal de estrelas no céu escuro, deixando a terra imersa num profundo breu.

    Era meia-noite quando Castor havia se aprontado para começar a sua busca no matagal de Riacho das Três Pedras. Entre outros motivos, queria acabar com a superstição que havia tomado conta da comunidade. Diziam que o fantasma do coronel Jerônimo estava assombrando a cabana que ficava no meio do matagal.

    Até então toda essa conversa pouco importava para Castor Gonçalves, fazendeiro aposentado de quarenta e três anos, que sempre foi de ficar na dele, cuidando de sua pequena propriedade em Riacho das Três Pedras. Mas um dia antes de sua empreitada pelo matagal, seu compadre Jucelino apareceu para lançar um desafio.

    - Ocê num vai cumpadre, causa que cê é muito medroso. Eu duvido que ocê vá lá na cabana e traga o pijama do coroné Jerônimo - disse Jucelino Feitosa, um homem corpulento que lembrava muito uma morsa.

    - E por causa de quê que eu ia me dá o trabaio de sair da minha confortável rede e embrenhar nesse mato véio cheio de inseto?

    - Uai, se ocê trouxer as roupa do homi, vai provar pra toda essa gente que ocê é corajoso e num acredita em fantasma coisa nenhuma. E eu conheço umas cumadre que gosta de homi corajoso. Ocê sabe a Gina? Aquela que era casada com o cumpadre Ernesto?

    - Ora se sei - disse Castor abrindo um sorriso largo - E tá sorteira é?

    - Pois é.

    Castor bateu com tanta força na mesinha que suas pernas acabaram cedendo, fazendo desabar o móvel ao chão. Ele fingiu não prestar atenção e levantou-se tão rapidamente que chegou a espantar Jucelino - Então tá certo, amanha cedinho eu vou bater na sua casa com as roupa do homem.

    - E num tente me enrolar não. Que eu trabaiava pro coroné e lembro muito bem do pijama que ele usava toda santa noite.

    - E eu lá sô homi de ficar enrolando os outro? - Castor coçou a barriga e foi levar Jucelino até a porta. Mas ainda tinha uma pergunta engasgada na garganta - E por causa de quê ocê quer logo o pijama do homi?

    - Homi, cê tá criando causo? Tá cum medinho, é?

    - Não. Dexa pra lá. Ocê me responde amanha quando eu trouxer as ropa.

    Castor passou o resto daquele dia se preparando. Foi em tudo quanto era loja comprar alho e algumas outras coisas que, acreditava ele, afastariam os maus elementos. A noite chegou rápido. Apanhou um casaco surrado e sua espingarda do século dezenove. Na cozinha pegou o velho lampião e guardou alguns lanches na mochila de couro. Estava pronto para sair à caça do pijama do coronel Jerônimo.

    A trilha de gramíneas era sinuosa e acabava aos pés de uma enorme rocha que mostrava a entrada do matagal. Castor suspirou e adentrou a mata. A vegetação, antes rasteira, agora batia-lhe nos joelhos, causando incômodo e coceira. Pensou em voltar para pegar calças mais grossas e confortáveis, logo desistiu da idéia, queria pegar o pijama e sair dali o mais rápido possível.

    Castor sabia que teria que andar mais alguns metros até chegar à cabana. Começou a se perguntar o porquê de alguém tão rico e poderoso como o coronel Jerônimo ter uma casa tão simples num lugar abandonado, já que já havia estado na cabana uma vez, e na época era bem diferente do casebre abandonado que agora estava diante dos seus olhos.

    Engoliu em seco ao ver a degradação do lugar. Duas janelas pendiam soltas, presas à uma dobradiça enferrujada, balançando e emitindo um rangido desconfortável, que cortava a noite junto com o som do vento vindo da calha. As paredes estavam cobertas de musgo verde, e algumas partes continham grandes sulcos. A única porta, ainda estava intacta, alheia à destruição do lugar. Era a mesma porta, o mesmo cedro, a mesma maçaneta de ferro. Era um contraste perturbador, mas Castor não sabia o motivo.

    Deu mais alguns passos, até que algum temor desconhecido o fez retirar a espingarda da bolsa. Seus olhos percorreram toda a fachada da casa. Mais detalhes do abandono ficavam visíveis, à medida que se aproximava, iluminados pela chama do lampião. Os restos do que foi uma cadeira de balanço, agora jaziam abandonados sobre uma varanda fria, como a noite. E o outrora luxuoso tapete, que servia para intimidar os visitantes por causa do incomum desenho, agora se encontrava preso a um prego de uma viga da varanda, não passava de um pedaço de pano sujo, que dançava ao vento, feito uma bandeira.

    Castor pousou o lampião no chão e girou a maçaneta de ferro, que não estava enferrujada, ao contrário das dobradiças das janelas. O interior da casa estava devastado. Logo na sala uma mesa, de uma perna só, caída ao chão, bloqueava a passagem a um quarto. Um pano branco e empoeirado, mal cobria o armário desgastado, cujas portas escancaradas, revelavam um interior coberto de teias de aranha e corroído por cupins. Na cozinha, pratos e talheres misturados à panelas sujas de barro e dejetos de animais.

    Castor afastou a mesa e, segurando o lampião na mão esquerda e a espingarda na direita, adentrou o quarto.
    Parecia ser mais escuro que o resto da casa. Os lençóis da cama estavam desarrumados e sujos de terra, assim como várias roupas que estavam caídas do lado de um espelho. Enquanto vasculhava o monte de roupas à procura do pijama, Castor escutou um baque surdo do lado de fora da casa. Correu imediatamente até a porta e analisou a escura sala. Nada estava fora do lugar.
    Ao ver o tapete balançando ao vento, em devaneio, tentou distinguir alguma coisa daqueles desenhos misteriosos.

    Despertou, num susto, ao presenciar a queda da janela, que antes mantivera-se erguida por causa de uma dobradiça enferrujada. Depois voltou-se para o quarto de modo a achar o pijama e sair logo dali. Primeiro procurou na cama, depois na cômoda perto do espelho, sob o colchão, atrás do armário...
    Nada.

    Quando estava para desistir, ouviu um barulho atrás de si. Ao tentar se virar, sentiu algo o empurrando pelas costas, derrubando-o. Garras cravaram-se no seu ombro, fazendo-o berrar de dor. Enquanto lutava para se soltar, olhou pelo canto dos olhos, e conseguiu ver que era um animal que estava o atacando.

    Uma cotovelada certeira no focinho do bicho o fez recuar, dando espaço para tatear a procura da arma, perdida durante a queda. Na sua frente, uma onça, de mais ou menos um metro, preparava um novo ataque, obrigando Castor a agir rapidamente. Rolou até a saída do quarto, e tentou se levantar. A porta que levava para fora da cabana estava fechada.

    Enquanto corria pela sala, procurou desesperadamente algum outro lugar para se esconder. Foi então que lembrou da cozinha. Entrou e tentou fechar a porta, não conseguindo, pois estava emperrada devido à ferrugem. Procurou alguma faca, ou coisa semelhante. Só achou uma panela de ferro, a qual apanhou e virando-se para a onça, começou a encará-la, tentando deixar de lado o medo.

    - Calma bichano, num quero te machucar. Vai embora.

    O animal pareceu vacilar por um instante. Abriu a boca arreganhando seus enormes dentes. Castor começou a jogar colheres para perto da onça. Esta recuou e pulou pela janela aberta.

    Castor respirou aliviado e olhando ao redor, viu que a cozinha estava iluminada por uma fonte de luz que vinha de outra porta à esquerda. Caminhou lentamente e entrou no que parecia ser um porão. Havia caixas e mais caixas estocadas uma em cima da outra, mas o que chamou a atenção foi uma grande rachadura na parede. Castor se aproximou, e espiando pelo vão, enxergou um corredor iluminado por uma luz opaca.

    - Num to ligando pra isso não. Vou pegar o pijama e cair fora daqui – sussurrou ele, indo novamente para o quarto.

    O lampião estava caído ao chão, mas por sorte não havia quebrado, e sua chama crepitante ainda iluminava o quarto. Castor apanhou a arma, que havia caído do lado do espelho, e depois recomeçou a busca pela peça de roupa. Após mais alguns minutos, um pensamento absurdo tomou conta de sua cabeça.

    “E se o pijama tiver lá no porão? Ah... besteira... Mas num faz mal nenhum dar uma olhada, vai que eu encontre alguma coisa boa...”

    Em poucos segundos, Castor viu-se novamente diante do vão na parede, só que desta vez carregava consigo o lampião e a espingarda. Tentou alargar a rachadura batendo com um pedaço de pedra encontrado no porão. Não demorou a abrir uma passagem grande o suficiente para que um homem do seu tamanho pudesse passar.

    O longo corredor possuía várias janelas minúsculas que se projetavam em cada parede, de onde saíam pequenos raios de luz que iluminavam todo o caminho. Parecia que havia algum rio, ou algo semelhante por perto, pois Castor conseguia ouvir claramente o som de água em movimento.

    Não foram necessários muitos passos até chegar a uma sala pequena, onde se encontravam uma escrivaninha e uma única poltrona de couro. Havia também um cabide, e pendurado nele, um pijama prateado feito de seda.

    Boquiaberto, Castor se aproximou da roupa. Entusiasmado pegou-a e a guardou na bolsa, para depois examinar o lugar. Na escrivaninha, dois livros chamaram sua atenção, estavam cheios de mapas e anotações.

    Castor abriu a única gaveta da escrivaninha e tirou de dentro um retrato empoeirado. Nele, dois homens sorridentes estavam lado a lado. Castor conhecia muito bem um deles, e o outro possuía um rosto bem familiar. Imediatamente, largou o item e continuou a mexer na gaveta. Encontrou um pequeno álbum de fotografias datado de 1979. Viu os mesmos dois homens em várias páginas, pareciam ser grandes amigos. Encontrou também uma anotação que lhe chamou muito a atenção. Mas o objeto mais intrigante veio a seguir.

    Um papel envelhecido e bem fino mostrava um outro desenho, igualmente estranho ao presenciado por Castor do lado de fora da cabana. Eram diferentes, mas de certa forma eram muito semelhantes.
    Sem pensar duas vezes, Castor guardou tudo e saiu triunfante da pequena câmara. Do lado de fora da cabana, tomando cuidado para não ser surpreendido por nenhum animal selvagem, despregou o tapete e também o guardou na bolsa. Estava voltando para casa e trazia consigo um grande presente.


    -Jucelino, vai ver quem é homi – gritou uma voz esganiçada.

    - Calma muié – bradou um sonolento Jucelino - mas quem será as seis da matina?

    As batidas fortes na porta pareciam ter acordado o cachorro do vizinho que agora latia incessantemente. Jucelino vestiu o seu roupão e coçando a cabeça foi abrir a porta.

    Encontrou Castor Gonçalves, seu velho amigo.

    - Ora, tinha esquecido de ocê, vamo sair daqui que a muié ta brava – Jucelino colocou a cabeça para dentro de casa – Joana, eu volto já, vou ali com o Castor.

    O amanhecer trazia um cheiro agradável da chuva fina que caía no povoado. Castor e Jucelino agora procuravam um lugar para conversarem sossegados. Encontraram o refúgio na soleira da propriedade dos Gonçalves.

    - Ocê duvidava de mim, mas mesmo assim eu trouxe seu pijama – disse Castor, tirando de dentro da bolsa a requintada peça de roupa.

    - E num é que ocê foi mesmo? Essa lenda do fantasma num ta com nada. Ocê viu o fantasma?

    - Vi foi uma danada de uma onça. Mas também vi outras coisas bem mais interessantes.
    Castor mostrou as fotografias do álbum, e com um sorriso perguntou:

    - Reconhece o homi da foto? Esse da esquerda?

    - Ora, é ocê! E do lado do coroné Jerônimo.

    - Não. É o meu pai, João Gonçalves.

    - O que que o seu pai ta fazendo junto do coroné?

    - Eu andei olhando essas anotações aqui – Castor pegou um dos papéis que havia trazido da cabana – e vi que meu pai trabalhava para o coroné Jerônimo. Ele era o braço direito do homi, e depositava muita confiança nele.

    Jucelino caiu na gargalhada – Uai, eu trabaiava pro coroné e nunca que havia visto ele lá.

    - Sabe que o coroné era rico, e que possuía muitas terras depois do rio né? Meu pai administrava a terra mais produtiva enquanto o coroné tratava dos negócios dele aqui em Riacho das Três Pedras.

    - Não to entendendo aonde ocê quer chegar – comentou Jerônimo.

    - O coroné morreu e ninguém soube na verdade com quem ficou as terras não foi?

    - Foi. E o que isso tem a ver com o falecido seu pai?

    - Aí vem a parte mais interessante – Castor esfregou as mãos de prazer - Encontrei essa cópia do testamento, que deixava metade dos bens do coroné para João Gonçalves, o meu pai.

    - Isso quer dizer... – Jucelino se levantou num salto – Ocê ta rico!

    Castor riu – Calma, essa ainda não é a melhor parte. Ocê viu a data do álbum? 1979. E quem que aparece nas foto? Meu pai.

    - E o que que tem?

    - Meu pai só tinha morrido em 77.

    Jucelino fechou a cara – Então isso aí na foto é um fantasma?

    - Claro que não. Significa que meu pai ainda tava vivo quando tirou esta foto.

    - Ainda num to entendendo essa história. Ocê andou bebendo Castor? Se ele ta vivo, aonde é que ele ta então?

    - Num tenho certeza, mas talvez saiba por onde começar a procurar – E finalmente
    Castor tirou da bolsa, o tapete e a outra folha fina. Colocou esta por cima do primeiro. As figuras formaram um confuso mapa.

    - Esse num é o mapa da capital? – perguntou Jucelino.
    - É. Tentei relacionar os desenhos durante boa parte da noite inteira. – Castor olhou para Jerônimo com os olhos molhados de lágrimas – Jucelino, meu pai pode estar vivinho da silva. E vou procurar por ele. Na capital.
    As vozes cessaram, deixando o tranquilo som da chuva preencher completamente o ar. Jucelino batendo as mãos subitamente, disse:

    - Então ocê num quer saber da cumadre Gina?

    Castor riu e pondo-se de pé deu uma batida amigável no ombro de Jucelino – Só descobri essas coisas por causa de que ocê me ajudou. Só então pude superar o medo. E por causa disso encontrei essa grande surpresa – Castor suspirou - Quero que cuide da minha propriedade enquanto estiver fora.

    - Ocê é esperto né? Só olho sua casa se me trouxer da capital, aqueles doces enlatados que eles fazem lá.

    Os dois se abraçaram repetindo o gesto feito pelo pai na última fotografia do álbum.

    Pela estrada de gramíneas caminhava o velho Castor. Trazia na mão esquerda a coragem para expulsar os medos, e na direita a determinação para encontrar o pai.
    Enfrentou os temores e descobriu tesouros que jamais poderia imaginar. Agora Castor segue para a capital e sabe que irá enfrentar outros medos para só assim encontrar por trás deles a verdade e a grande recompensa que o espera. Seu pai.



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