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Tópico: "... Mas livrai-nos do mal, amém."

  1. #1
    Avatar de Thomazml
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    "... Mas livrai-nos do mal, amém."



    - É John, você ta fodido – sibilou uma voz maligna, ecoando pelo pequeno cárcere. O ar estava frio, e não havia nenhuma fonte de luz para iluminar o local. John levantou a cabeça, assustado. Estivera deitado num amontoado de palha, que ele chamava de cama. Não dormia direito desde a semana anterior, o que provocara profundas olheiras em sua face magra e pálida.

    - Quem está ai? – perguntou, num sussurro rouco. Sua voz, muito pouco utilizada nos últimos dias, saiu arrastada e pesada. Estava ofegante, com medo. Olhou para os lados, tentando ver a origem da voz grave. – É mais um guarda? – lamuriou-se – Já disse tudo o que eu sabia! Não sei mais nada! Por favor, não façam isso comigo!

    O homem esquálido começou a soluçar, tremendo o maxilar e deixando escapar um filete de baba sobre o queixo peludo.

    - Não John, não sou um guarda. Sou um... conselheiro. Um... amigo dos loucos. – respondeu a voz, pronunciando as palavras num tom intensamente zombeteiro.

    - Mas eu não estou louco – murmurou o homem, arregalando os olhos, pensando na tenebrosa possibilidade. Será mesmo que não estava louco? Não era esse o veredicto do rei? Sua cabeça tremeu, e seus olhos cansados se encheram d’água.

    - Claro, afinal, falar com uma voz imaginária é uma prova de que a pessoa é sã – ironizou a voz. John deixou uma lágrima rolar pelo rosto sujo. Então era verdade, ele era um louco.

    - Você não existe? – perguntou, trêmulo, o homem. A voz soltou uma gargalhada fria, como uma criança maligna que consegue seu intento torpe. – Se existo? Não estou falando contigo neste exato momento? – respondeu a voz, com uma entonação jocosa.

    - A pergunta, John, não é se eu existo. A pergunta é: até quando você vai existir? – a voz declarou a pergunta e soltou risadinhas mal abafadas. O homem abriu a boca ressecada, sem conseguir dizer a resposta. Outra lágrima escorreu pelo rosto magro.

    – O que houve? O grande pensador não tem resposta? Deixa eu te ajudar: HOJE! – berrou a voz, no ouvido do prisioneiro, que soltou um gemido e se encolheu.

    - Isso mesmo John, hoje você vai morrer. Sabe, é interessante isso! Porque, se você fosse religioso, estaria feliz por morrer e ir aos céus. Mas, não! O senhor perfeição, que clama ter a sabedoria da ciência lógica, nega Deus. E, pelo mesmo motivo que é levado a morte, não encontra consolo nela. Ironia, não? – a voz continuava, impiedosa.

    - Não tenho medo de morrer – o homem respondeu, olhando para o chão. A voz riu, desdenhando da resposta. Até mesmo ele, John, duvidava do que acabara de dizer. Engoliu em seco e mordeu os lábios, impotente.

    - Não tem medo, John? Realmente não tem medo de morrer? Não tem medo do que pode... vir? – insinuou, maliciosamente, a voz. O prisioneiro virou a cara como se tivesse levado um tapa. Não tinha certeza de nada, sentia-se abandonado por tudo, seu intelecto, sua convicção e seu brilhantismo.

    - Vou te dizer uma coisa, John, é melhor você estar certo. Afinal, se existir um inferno, é muito provável que você vá para lá – falou a voz, num tom de um amigo que confessa uma coisa íntima. Mas esse clima confissão foi logo quebrado com um risinho malévolo da voz. O prisioneiro gemeu, sofrendo em suas terríveis dúvidas.

    - Realmente, morrer por besteiras... se ainda fosse morrer por verdades! – suspirou a voz. O homem sentiu o desespero aumentar, agarrando a cabeça e arregalando os olhos. A voz riu de novo.

    - Não... não! Eu não vou morrer por mentiras! Tudo o que eu disse é verdade! Tudo! – gritou o homem, mais para se convencer do que para qualquer outra coisa. Suas certezas, seus princípios, tudo, tudo se desvanecendo ante a cruel verdade da voz.

    - Verdade? Qual verdade que disse? Que Deus não existe? Que o.... povo, é governado por um Rei que não dá a mínima para eles? – perguntou a voz, fingindo interesse.

    - Sim! São verdades, inquestionáveis! – bradou o prisioneiro, pela primeira vez conseguindo ver um ponto lúcido em sua mente. Uma ponta de esperança, na qual ele agora estava agarrado firmemente.

    - Inquestionáveis? São mentiras, são falácias! Quem é você para dizer que Deus não existe? Se ele não existisse, porque você, herege, será morto? Se o rei não dá a mínima para o povo, porque ele vai os presentear com um espetáculo hoje? – vociferou a voz, destruindo de vez a esperança do homem, que desatou a soluçar, balançando a cabeça, entregue ao desespero.

    - O papo até que está bom, mas... ouça! Passos no corredor! – de fato, um barulho crescente de passos chegava da porta. Esta foi bruscamente aberta, deixando entrar um resquício de luminosidade. Porém, dois soldados logo encapuzaram o prisioneiro com um pano preto fedido, amordaçando-o.

    - São seus últimos passos, John. Qual é sensação? – perguntou a voz, num tom falsamente curioso. – Ah! Esqueci, você está amordaçado. Sabe porque, não é? Porque você é um herege, e pode dizer coisas ruins para o povo. E sabe o porquê de estar encapuzado? Para não fitarem seus olhos esbugalhados, quando pender na corda - O homem, que cambaleava, sendo empurrado rispidamente pelos soldados, tentou falar uma coisa. Foi calado com um forte soco na sua costela.

    -Shhh! Quietinho, John! Não precisa falar, eu sei o que você iria dizer. Iria dizer que o que você está fazendo é para o povo. – a voz soltou outro risinho de desprezo. A claridade ofuscou os olhos derrotados de John, mesmo encapuzado. Deviam ter saído para o pátio externo da prisão. O coração do condenado batia forte no peito magro. De repente, ouviu um rugido. O povo estava lá, gritando obscenidades parar ele, xingando-o.

    - Vê o que o povo quer de você, John? Eles estão pouco se fodendo para suas teorias mirabolantes. Não dão a mínima para suas conspirações e falácias. Eles querem ver você pendurado, se mijando, enquanto morre, balançando na corda. – a voz continuava, acima dos ruídos intermináveis da massa, ao redor. John começou a chorar, embora não pudesse ver o povo. Sua respiração era rápida, entrecortada por soluços. Seus músculos tremiam e sua boca estava seca.

    - Como você é tão detestável, John, nem vão ler sua sentença, vão direto para o enforcamento. Pena você não ter nenhum amigo para segurar teus calcanhares enquanto balança na corda. Sabe, o corpo humano agüenta diversos minutos, até horas, pendendo na corda. Isso se o laço não for tão eficiente. Dará tempo para você fazer todas as dancinhas que souber.

    O carrasco colocou a corda, e firmou o laço. John chorou e olhou para os céus, levando logo um soco na cabeça, para ficar parado. Fechou os olhos, começando a rezar o pai nosso. O povo se calou, na expectativa.

    - ... seja a feita a vossa vontade ...-

    - Adeus, John – cortou a voz. O chão desapareceu, um corpo tombou e a multidão urrou.


    Espero que tenham gostado =)

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  2. #2
    Avatar de Ashirogi Muto
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    Como já disse, o texto está bem feito e o tema é interessante. Mas eu achei um pouco mal-executado, e também o texto podia ser explorado um pouco mais. Achei também meio sem sentido o homem começar a rezar no final, não vi motivo para tal.

    Obs.: Espero que com esse post possa me redimir de meu voto ter feito você perder o concurso.

  3. #3
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    Achei superficial e pouco profundo, com algumas cenas bastante mecânicas.

    Diria até mesmo tendencioso, como se os acontecimentos fossem convencionados; como se todo ateu fosse rezar ante a morte; como se todo ateu não desacreditasse em deus totalmente...

    Pode não ter sido a sua intenção, mas foi isso que senti.

    Mas funcionou bem com o seu texto. Soou bastante realista, com uma ideia consistente, embora não tão bem executada.

    Parabéns pelo texto.

  4. #4
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    Achei legal.Poderia ter descrito um pouco o lugar da cena, mas legal.

    Só uma coisa:
    Foi calado com um forte sono na sua costela.
    Deram um sono na costela dele?


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  5. #5
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    Foi outro bom conto do concurso. Não votei nele, mas todos mereceram votos. Eu achei meio súbita a mudança de opinião do personagem. Mas como ele estava sob um efeito extremo, essa mudança ficou bem colocada.

    A príncipio achei meio forçado por causa disso, mas olhando bem, a pressão psicologica do personagem contribuiu para sua conversão.

    Excelente texto, teve merecidamente o pódio do concurso.




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  6. #6
    Avatar de Emanoel
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    Achei a "voz" caricata demais. E como detesto personagens (quase sempre malignos) que vivem aos risos, acabou sendo um ponto negativo.

    Eu não considero o texto tendencioso, muito pelo contrário, parece crítico. Por sinal, o protagonista não foi condenado por apenas duvidar da existência divina, mas por contestar o sistema hierárquico do reinado. E a argumentação da "voz" é tão obtusa (vide décimo oitavo parágrafo) que não dá para levar a sério. Já o condenado se vê em um beco sem saída, solitário e infeliz, acaba sendo (mais um) dobrado pelo sistema.

    Também reparei no "sono".

    E gostei da maneira como os sentimentos foram exprimidos.

  7. #7
    Avatar de Thomazml
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    Consertei.

    Eu reparei, depois de algum tempo, que muitas passagens realmente ficaram mecânicas e não naturais. A voz, a princípio, é a dúvida do personagem. É o inconsciente que o aterroriza, porque ele não acredita piamente no que prega. E se tudo que ele defendeu for mentira? E se o que o espera for o Inferno?

    Obrigado pelos comentários
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  8. #8
    Banido Avatar de Hovelst
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    Thomazml, o Bernard Cornwell do fórum.

    Eu discordo de quem acha que não está natural. Em verdade, o fato de ser as dúvidas dele que são postas em voga por uma voz irônica e sarcástica, o que já é fora do comum, faz do texto um momento de insanidade diante da morte.

    Acontece que o fato de existir uma voz já deixa o processo do texto não-natural, porque isso já é fora do convencional. Logo, supor que as conversas estão mecânicas, na minha opinião, é demonstrar o óbvio, porque não há como transformar a conversa em um chá da tarde, da onde só sai asneira.

    No mais, o texto tem uma critica sobre como em um momento que você está em cheque, como a própria morte, seus atos vem à tona e surge a dúvida do que é concreto e do que não é. Apesar de ser um pouco clichê isso ainda - aliás, o que não é hoje? - foi interessante porque se formos pensar apenas na literatura forista, isso ainda não tinha surgido pelas pairagens, pelo menos, não me lembro de algo assim...

    Abraços para quem não desgosta de mim e que um carro atropele quem me quer se ver livre de mim.
    Que cumprimento longo, lol.

  9. #9
    Avatar de Drasty
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    Diferente da maioria, gosto da voz. Me faz pensar que o protagonista está projetando algum esteriótipo do próprio medo, como um ser maligno que veio debochar da sua morte. Entretanto, John me encomoda, parece assustado demais para alguém que sabia das consequências de se mexer com as idéias da Igreja ou de seu tempo.

    A confusão e pressão mental dele consigo mesmo, me soa realista. Afinal, embora você não esteja pronto para morrer, ainda sim quer defender seus ideais.

    Gosto muito da sua forma simples e comprometida de escrever, nunca chega a impressionar, mas não decepciona. E os detalhes são sempre bem estruturados. Parabéns, Thomaz.

  10. #10
    Avatar de Thomazml
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    Hovelst, obrigado pelo elogio. Consegui passar para você tudo o que pretendia, pelo o seu comentário. =)

    Drasty, ao meu ver, ninguém é o mesmo, nem tem certeza de nada, na hora da morte. A voz é justamente isso: o "eu" dele, que põe em dúvida tudo o que antes é razão. Afinal, quem aceita a própria morte, tem que ter uma mente super bem estruturada. Então, embora soubesse das consequências, isso não faz dele um homem menos assustado com o seu fim marcado.

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