Pessoal,
Segue a aguardada disputa!
O Tema da disputa foi: Cyclopolis
Todos podem votar, basta lerem os dois textos e votarem no que acharem melhor (Texto 1 ou Texto 2)!
PS: Não vou revelar quem escreveu cada um, e peço que vocês também não revelem.
Texto 1
Spoiler: Texto 1O esconderijo dos gigantes
“Tarde foi quando percebi a admirável amizade que Thuriel e Zaria dedicavam a mim e aos meus camaradas. De início, me mostrei muito inflexível e endureci meu coração para aqueles que buscavam nada mais do que a boa amizade, não querendo reconhecê-los por serem diferentes. Por fim... Me entreguei às suas irreverências... Humanos...
Espero tão somente que esse laço se prolongue e ultrapasse até mesmo o tempo e vença as gerações futuras, para honra e perpetuação da amizade entre os nossos descendentes.”
Foram as palavras que Tíenor, no conforto de sua poltrona, leu em um livro, velho e surrado, que encontrou na montanha ao norte de Edron e que intitulava-se “Memórias de Orfo, O Ciclope”. Tais palavras lhe causaram estranheza, primeiramente por um ciclope saber escrever, sempre imaginou aquelas criaturas de apenas um olho como verdadeiros palermas no tocante a arte de saber se exprimir em palavras escritas. Segundo, como poderia conceber a ideia de uma amizade entre humanos e ciclopes? E, longe de ser mais esquisito, de que forma os nomes dos seus avós foram parar ali? Sendo, ainda, nomes nada comuns em Edron?
Nosso jovem cavaleiro desconcertou-se diante do que acabara de ler. Que explicação poderia dar para uma coincidência dessas? A primeira pessoa que pensou em consultar foi o seu amigo Sendir, mago dedicado a leitura de livros tanto de feitiços quanto de outros assuntos, ele com certeza teria alguma explicação.
Buscando seu amigo, saiu de casa correndo pelas ruas de Edron olhando para todos os lados, um tanto desajeitado, até que avistou uma figura com um chapéu pontudo azul-marinho e uma roupa longa púrpura. Eis que o objeto observado estava imerso em sua leitura e carregava diversos livros, como sempre o fizera, era, sem sombra de dúvidas, Sendir.
— Seeeendiiiir – gritou Tíenor quase sem fôlego encostando bruscamente no seu amigo, de forma que fez com que derrubasse todos os livros que carregava.
Sendir apenas fez menção de se virar para ver quem o chamava com tanto entusiasmo e sentiu os livros escorregarem de seus braços. Por sorte, não teve o mesmo destino que estes. Então, exclamou:
— Pelas barbas dos sábios, Tíenor! Deuses! Por que tanto alarde? Meus pobres livros... — disse o mago, preocupado, esticando as mãos em direção ao chão para alcançar seus livros. — Matilda vai me matar! Mal peguei estes livros emprestados e olha o que me ocorre! E pensar que ela brigou comigo por umas poucas orelhas em alguns... — suspirou e virou os olhos para cima.
— Não temos tempo para pensar em livros, em barbas... Que seja! Venha comigo! - falou Tíenor abruptamente agarrando o amigo pelo braço de forma tão veloz que ele não teve tempo nem de socorrer seus pertences. — Prometo que será rápido.
Tíenor guiou Sendir que tropeçava na própria barra de sua túnica, através das ruas de Edron. Chegando em sua casa pegou o livro, causa de todo o mal, e o entregou nas mãos do feiticeiro.
— Então? O que me diz? — perguntou Tíenor ofegante e curioso.
Sendir colocou seu chapéu e os oclinhos de meia lua no lugar e, após isso, passou os olhos pela capa do livro, depois olhando-o por todos os ângulos, disse: — O quê? Uma ficção muito bem elaborada. Um ciclope escrevendo? Você só pode estar brincando — passava a mão na longa barba escura que encobria a boca que estava prestes a gargalhar.
— Sei que é um absurdo, mas só me preocupei porque os nomes dos meus avós estão escritos bem aqui — o cavaleiro abriu o livro nas mãos do mago e mostrou o trecho que citava o nome dos seus avós.
O feiticeiro refletiu enquanto colocava o livro sobre uma mesinha de madeira que estava a sua frente e então finalmente disse:
— Você deveria prestar maior atenção aos detalhes, meu caro amigo. Preste atenção, é evidente que a capa desse livro foi feita do mesmo material dos manuais de forja que os ciclopes ferreiros de Cyclopolis utilizam para construir suas armaduras e armamentos. É claro que se comunicam por desenhos, sendo completamente estranho que saibam escrever e, pior, escrevam memórias pessoais. Tirando esse “detalhe”, vejo muitas dessas capas em bibliotecas que visito — disse Sendir com a maior naturalidade, adorava exibir seus conhecimentos. — Se é o que quer saber, encontrará mais respostas, suponho eu, em Cyclopolis. Onde mais poderia ser?
Quando Tíenor, que estava olhando o livro durante o falatório de seu amigo, foi se virar para vê-lo, apenas o que viu foi a ponta da túnica de seu amigo, este já tinha saído pela porta e dizia lá de fora:
— Agora se me permite... Tenho que socorrer meus livros. Já ouço... Já ouço... Como se suplicassem por ajuda. Afinal, um insensível fez com que se separassem das mãos de seu senhor.
O cavaleiro apoiou a mão sobre a mesa perto do livro e, olhando a porta, esboçou um sorrisinho. Que fanático era seu amigo...
Desviou o olhar para o livro e se recordou do mistério que, ainda, não tinha descoberto. Pensou em deixar para lá, mas como poderia? Aventureiro como era... Não! Com certeza iria até lá e descobriria do que se tratava. Nem que tivesse que comprar briga com os ciclopes.
Foi até o quarto e colocou sua armadura reluzente. Já fazia algum tempo que não a usava, pois preferia usar sua armadura velha para caçadas. Agora, porém, iria a usar, pois tratava-se de uma aventura diferenciada.
Colocou a armadura e sua espada em mãos e sentiu a adrenalina percorrer pelo seu corpo. O que o aguardava? Sentia-se um aventureiro.
Acontece que com os pensamentos no porvir, se distraiu a ponto de se desequilibrar com o peso da armadura que não estava acostumado. Ficou de pé com apenas uma perna o sustentando, tentava recobrar o equilíbrio, quando falou com sigo mesmo:
— Calma aí... Calma aí... EeeeEE... Aii – gemeu o jovem que havia se desequilibrado e caído deitado, tendo se sentado, massageou a cabeça. — Espero que nada como isso aconteça enquanto eu estiver lidando com os ciclopes. Que todos os deuses olhem por mim e pelo meu desastre! — bradou Tíenor levantando com um só pulo e brandindo a espada — À Cyclopolis! Lá vou eu!
Nosso aventureiro pegou sua mochila, que já estava cheia de carne preparada para a próxima caçada, e rumou em direção às montanhas que ficavam à norte de Edron. Sabia, já ouvira falar, que esta tal de Cyclopolis ficava depois das montanhas beirando o rio, muitos peregrinos e aventureiros já viram ciclopes andando perto de uma construção de pedras que escondia um buraco no chão, do qual entravam e saíam.
Tíenor andou com firmeza durante todo o percurso decidido a descobrir o que significava aquele livro, até o levou dentro da mochila.
Se alimentou da carne que levara e matou alguns lobos no caminho, juntando a carne destes para que não lhe faltasse o alimento. Não dormiu enquanto não chegou ao esconderijo dos ciclopes, estava ansioso por isso.
Quando avistou a construção de pedras que os peregrinos falavam, se escondeu atrás de alguns arbustos e árvores e viu um ciclope. Era tão grande que o fazia sentir-se um gafanhoto. Olhava de um lado a outro vigiando se nenhum estranho espreitava a morada sua e de seus camaradas.
O cavaleiro sentiu seu coração bater acelerado dentro do seu peito. Sabia que teria que atacar se não, como poderia adentrar aquele local? Reuniu suas forças e desembainhou sua espada. Levantou e foi em direção ao ciclope com a espada em punho.
O ciclope que vigiava de um lado a outro logo avistou seu oponente que vinha veloz segurando a espada ao lado do corpo com as duas mãos.
— Você pensa que passará, humano? — disse o ciclope debochando de Tíenor. O ciclope falava, mas o que dizia era quase indiscernível. — Venha — disse, com sua voz desengonçada e com o olho vidrado no cavaleiro. Percebeu que Tíenor colocou a espada de volta na bainha.
Tíenor jogou algumas pedrinhas esfarelantes, que encontrou no chão, no olho do ciclope. Que disse algo como:
— Seu inseto, o que jogou em meu olho...
O cavaleiro investiu com uma rolada em meio às pernas do inimigo, que se encontrava com as pernas abertas, e, aproveitando-se da fragilidade do oponente, deu um grande salto e bateu com o cabo da espada na cabeça, quase calva, do ciclope com toda a força que reunia.
O gigante, que estava tentando limpar seu olho com as mãos, com a pancada que levara desmaiou no chão causando um grande som abafado.
Tíenor pensou, imediatamente, que não devia ter feito tanto barulho, talvez os ciclopes podiam ouvir. Não sabe o que ou o porquê, a única coisa que sabia é que algo o havia levado a poupar a vida daquele ciclope, um sentimento dominador e irresistível.
Logo nosso nobre cavaleiro ouviu um som vindo de dentro do buraco, como que muitas vozes juntas. Pensou em tentar se explicar, perceberiam que não tinha agido de má-fé, já que não havia matado um dos seus companheiros.
Desceu no buraco já dizendo:
— Vejam bem... Não fiz mal ao ciclope lá em cima... Só quero saber sobre este... — Tíenor foi mexer na mochila para pegar o livro. Todos os ciclopes o observavam boquiabertos e alguns até falavam em alta voz abafando a voz do cavaleiro:
— Um humano! Um humano!
Até que todos se apercebessem do que estava acontecendo, bem diante dos seus olhos, levou um tempo. Tempo suficiente para que Tíenor chegasse a conclusão de que não iria conseguir, assim tão fácil, a confiança dos ciclopes.
Pegou a espada pela bainha e usou da mesma artimanha que tinha utilizado com o primeiro ciclope, sem as pedrinhas, utilizando apenas sua velocidade. Assim tombou dois ciclopes, mas ainda restavam três e estes haviam percebido, com o cair de seus parceiros, o que estava acontecendo.
— Peguem esse rato! — gritou Toot, um ciclope que tinha uma cicatriz perto do grande olho estalado.
— Sim... — gemeram os outros dois.
Vendo que Tíenor estava entre eles, viraram-se para pegá-lo, mas Tíenor novamente rolou por entre as pernas do ciclope mais gordo e fez com que batessem as cabeças. Estes caíram sentados passando a mão na cabeça atordoados.
O cavaleiro distraiu-se com a cena, achando tudo muito engraçado, e deixou-se ser pego por Toot.
— Viram, inúteis? É assim que se pega um camundongo – Toot segurou-o com as duas mãos, mantendo seus braços presos e bateu sua cabeça na de Tíenor com um sorriso desdentado.
Foi a última coisa que nosso amigo descuidado viu antes de desmaiar. Provou do próprio remédio.
Os ciclopes o levaram para um cômodo abaixo de onde estavam. Amarraram suas mãos por detrás do corpo e deixaram-no sentado no chão com as costas apoiadas em uma rocha que havia no centro do local.
Ficou atordoado, apenas vendo que tinha vários ciclopes à sua volta, pareciam discutir seu destino, o que fariam com ele. Não conseguia entender, apenas via borrões e já era difícil de entender o que eles falavam quando estava lúcido, imagine, então, atordoado como estava.
Quando sentiu-se um bocado melhor, ouviu que alguns queriam simplesmente matá-lo e empilhá-lo em meio aos demais humanos ousados que tentaram entrar lá. Outros, menos sanguinários, diziam que deveriam deixá-lo ir, porquanto não havia matado nenhum dos seus irmãos. Uns, com maiores requintes de crueldade, sugeriam que levassem Tíenor para o cômodo onde havia um buraco de lava com uma prancha de madeira. Deveriam empurrá-lo lá, afinal, eles detestavam os humanos.
Enfim, decidiram queimar Tíenor vivo e colocar seus restos mortais como troféu junto aos outros humanos mortos.
Mesmo contrariados, a minoria dos ciclopes que queria deixar Tíenor ir, acabou por concordar. Levaram-no para o local que tinha esse buraco de lava. Dois ciclopes o seguravam, cada um segurava um de seus braços.
Tíenor já estava despertando e por isso começou a debater-se, apesar de estar cansado da viagem e com sono. Os ciclopes abriam suas bocarras formando semblantes medonhos enquanto o cavaleiro gritava:
— Me soltem! Seus monstros! Bárbaros!
Um dos ciclopes mais atrás dos que levavam Tíenor, Piffo, remexia em sua mochila e os ciclopes que o levavam, Fedo e Bano, fizeram questão de mostrar ao cavaleiro o que estava acontecendo com suas coisas.
— Ei! Não mexa nas coisas dos outros! Sua mãe não te ensinou a não mexer nos pertences alheios?
Todos ciclopes gargalharam juntos. Piffo pegou um bom pedaço de carne da mochila de Tíenor e mordeu com gosto, comendo de boca aberta, deixando transparecer toda a comida em sua boca. Tíenor balbuciou:
— Nojento...
Foi quando Piffo, com a mão suja de carne, pegou um livro de dentro da mochila do cavaleiro. O cavaleiro a essa altura já havia até esquecido do tal livro e do porquê estava lá.
Fedo e Bano, se apressaram a colocar Tíenor na prancha. Bano disse:
— Temos que dar um fim logo nesse humano, antes que os anões e os outros percebam o que está acontecendo e queiram também discutir o que vamos fazer com ele.
— Espere, Bano! — disse Piffo. — Parece que esse humano não é um malfeitor como o julgamos. Talvez ele tenha algum motivo para estar aqui, de acordo com esse livro. Esse livro fala de Ofro, nosso parente.
Piffo pareceu exercer imediatamente sua autoridade sobre Bano e Fedo. Parecia que ele realmente tinha algum poder, porque imediatamente os ciclopes tiraram o cavaleiro da prancha e o colocaram no chão desamarrando as mãos deste.
— Diga humano, o que quer com os filhos de Brog, o Feroz Titã? — disse o orgulhoso ciclope líder.
Tíenor, apesar de não entender por completo o que os ciclopes estavam falando, deduziu que era sua chance de se defender, por isso disse:
— Bem, acontece que achei este livro perto das montanhas, ao sul deste local, e, lendo, vi que o ciclope Ofro se referia aos meus avós. Quis entender de que forma ele os conhecia, o porquê de os ter citado. É por isso que estou aqui, sou neto de Thuriel e Zaria. Me chamo Tíenor.
Os ciclopes ficaram em silêncio olhando uns para os outros até que o silêncio foi quebrado por burburinhos como: “Thuriel e Zaria?”, “Ele? Neto de Thuriel e Zaria?” e “Você ouviu o que ele disse? Eu entendi?”.
Tíenor não entendia como tantos ciclopes conheciam seus avós. Piffo fez com que se calassem e falou:
— Meus caros irmãos, ouviram o que este pequeno humano, acabou de falar? Isso significa que estamos diante do homem que tanto procuramos. Nosso parente Ofro, líder na época de Thuriel e Zaria, teve grande amizade por estas nobres figuras, é por isso que temos que ter grande estima por... Hum...
— Tíenor, senhor — disse o cavaleiro, tímido, vendo que Piffo o olhava tentando lembrar seu nome, que acabara de proferir.
— Sim... Temos que ter em grande estima Tíenor, pois seu avô nos ensinou com grande paciência a falar e a escrever, para que mais facilmente pudéssemos passar nossa arte de forjar para nossos descendentes. Zaria também se esforçou em conquistar a amizade de nossos antepassados, ao lado de seu marido, e não esperou nada em troca, apenas buscavam nada mais do que a boa amizade. Querem prova maior do que este livro, – disse o ciclope erguendo o livro para que todos vissem – escrito pelo próprio Ofro, e a nobreza desse jovem que arriscou a própria vida para não derramar o sangue de nossos irmãos? Certamente, o que fez com que não erguesse a lâmina contra nós foi o sangue que corre em suas veias.
Bano e Fedo ergueram Tíenor no alto de suas cabeças e todos os ciclopes se alegraram. O cavaleiro fez amizades com os ciclopes e também com os anões e com todos que lá, em Cyclopolis, habitavam. Como o fizera seus avós, Tíenor habitou com os ciclopes certo tempo, dividindo suas experiências com eles e também aprendendo muito, principalmente no que desrespeito às forjas. Os anões também colaboraram com receitas maravilhosas, de cervejas, que somente eles conheciam, é claro. Todos colaboraram com algo durante a estadia do cavaleiro por lá, até que chegou a hora de partir.
Tíenor, já fora do esconderijo, preferiu não olhar para trás. Todos os ciclopes estavam aglomerados para se despedir de Tíenor, acenando com alegria. Tíenor apenas abanava de costas indo embora. Piffo, junto aos seus irmãos, deixou escorrer uma lágrima. Quem diria? Um ciclope chorando...
Tíenor foi ajeitar sua mochila que estava aberta, para por às suas costas, quando viu outro livro fora o de Ofro. Tirou-o da mochila e leu. Intitulava-se “Memórias de Piffo, O Ciclope”. O cavaleiro se emocionou, tinha certeza de que o desejo de Ofro tinha se realizado.
Texto 2
Spoiler: Texto 2Torrente Rubra.
- Olhe para o alto. – Conan disse ao seu companheiro de vigia, Holf. – Chacal, o que vê?
- Vejo a chuva que está a caminho. – Respondeu com desdém. – Você sabe meu nome. Porque me toma por Chacal?
- Você conhece os chacais de Zao, não conhece? – Holf anuiu, e virou-se para as campinas do leste de Edron, olhando-as até o horizonte cinza. – Você me lembra um. Sempre à espreita, à espera de algo.
- Não estou à espera de nada. – Holf trocou a grande lança de aço polido de mãos, e afagou o bigode grisalho por debaixo do elmo. Era um homem de idade, porém pertencia à Guarda da Cidade de Edron como a coroa de ouro pertencia ao Rei Tibianus. – E você, o que vê acima de nossas cabeças?
- Eu vejo a guerra que está por vir. – Conan levantou a viseira do elmo, e olhou para o céu, sem lua, sem estrelas. Uma noite nublada e cheia de nuvens negras pairando sobre suas cabeças. – Também sinto cheiro de sangue. – Holf gargalhou.
- Está preocupado com aquele bando de ciclopes das montanhas nortenhas? – Ele tossiu, e respirou sonoramente em seguida. – Não é nada de mais. Deixe-os batucando em suas bigornas e forjando armas inúteis, que nem mesmo eles usam.
- Você conhece as histórias. Mal avistou as pilastras da entrada de Ciclópolis, e diz à Edron inteira que foi até o mais fundo dos salões do lugar. – Logo depois que disse, Conan sentou-se acima de uma ameia, e ouviu o resfolegar da cota de malha. – Não são só gigantes que habitam o subterrâneo daquela choça. – Chacal enfureceu-se, girou a lança e estocou a muralha de pedra cinza. Seu golpe à Conan fora desviado por uma pequena adaga, na mão de um homem que vestia uma túnica negra, de capuz, e sem armaduras. – Obrigado, Stiff.
- É um homem sábio, mas precipita-se demais em suas atitudes, velho. – Stiff retirou o capuz. – A próxima vez que tentar atacar um companheiro, será punido. – Afirmou o Comandante da Guarda da Cidade.
- Por que raios está aqui em cima? – Chacal abaixou o olhar.
- Venho observando a Patrulha da Muralha de perto. Tremores de terra acusam trabalho sob o solo há mais de três semanas. – Stiff brincou com a adaga nas mãos. – Não há mineiro algum em Edron, muito menos na área norte, onde a atividade é mais intensa. – Conan fitou demoradamente Chacal, depois abaixou a viseira do elmo.
- Duvidou-me de que não havia nada a temer. – Conan levantou-se vagarosamente. Ajustou o manto azul-celeste, bordado em dourado da Patrulha, e sussurrou. – Conte os murmúrios. – Stiff suspirou, e pôs-se a falar.
- Alguns anões de Cormaya segredam que, no andar mais sombrio de Ciclópolis, os gigantes cultuam uma estátua de mármore branco, roubada de um templo da Ilha dos Reis... – O comandante foi rispidamente cortado.
- Eu cuspo nessas mentiras que os anões contam. O melhor a se fazer é cortar suas línguas e colocar no salão do Governador Daniel, para que suas tolices não fossem... – Holf foi calado pela batida da lança de Conan em seu elmo, fazendo-o estremecer.
- Fala de mais, escuta de menos. Cale-te e não interrompa Stiff novamente. – Disse, em tom mais alto. Chacal deu de ombros.
- Além de ser cultuada, a estátua é guardada pelos Sete. – O comandante suspirou. – Tememos que essa estátua, possa ser...
- O corpo do deus Brog. Seus servos estão tentando ressuscitar seu espírito, por isso os Sete Magos Vermelhos por lá. – Conan completou, em murmúrio. – Isto é completo segredo, Holf. – Era a primeira vez que ele o chamava pelo nome. – O segredo que é escutado por ouvidos aguçados, é guardado para ser dito na hora certa. – Chacal afastou-se.
Um longo momento de silêncio varreu o lugar, mas logo Conan relembrou com Stiff das antigas histórias contadas por Andreas Fenyt, um bibliotecário de Thais muito simpático, que passou algumas temporadas em Edron aprimorando seus conhecimentos, e que deixou vários amigos nessas terras.
Conheceu-o por acaso, espalhando seus enormes documentos por acidente na biblioteca das Torres de Marfim. Desculpou-se, e ficou várias horas conversando com o homem de cabelos longos e barba trançada. O bibliotecário contou-lhe como andava o Império do Sul, sobre os problemas de Thais, e o maldito Monte Sternum e seus habitantes imundos.
- Recorda-se daquele homenzinho branco, Stiff, sábio como ninguém? Seu sotaque thaiano era inconfundível. – Os dois gargalharam, e Conan por alguns instantes se viu fitado pelos olhos amendoados e atentos de Stiff. – Contou-me sobre os ciclopes de Monte Sternum com voracidade, como se precisasse contar isso a alguém a todo custo. – Sua respiração exalava uma nuvem logo à frente de seu elmo.
- Lembro-me bem de seu sotaque, mas do que contava, com um pouco de trabalho ainda posso recordar. Que lhe disse sobre Monte Sternum e os ciclopes? – Novamente, os dois sentiram os tremores de terra, balançando a muralha. Cruzaram olhares rápidos, desentendidos.
- Sobre a história de sua raça, o que eu pouco me interessava. Eu era um jovem de vinte e poucos anos, histórias eram a menor preocupação para mim. – Conan olhou para o chão da muralha. Estava úmido e rescendia o frio. Stiff esperou calmamente. – Somente sua história... Que seu deus Brog os criou e ensinou a batalhar, mas quando os abandonou, os ciclopes ficaram confusos, e dividiram-se. Uns ficaram em Monte Sternum, estatelando-se no meio do caminho entre Thais e as demais cidades. Outra parte foi à Mistrock, aquela ilha de Yalahar cheia de túneis infestados deles, e...
- Aqui em Edron, em Ciclópolis. Em tempos passados vagavam pelas montanhas do norte, até que Rei Tibianus I, o Responsável, aprisionasse-os naqueles túneis, logo depois de Tradespot tomar o nome de seu pai recém-falecido e o tivesse como rei. – Houve uma pausa demorada. – E aí estão, ressuscitando seu deus. – Stiff completou.
- Certamente, meu Senhor. – Conan retomou seu posto. Havia de guardar a muralha até a alvorada, conversas não faziam parte de seu trabalho.
Horas depois, uma chuva fria caiu sobre toda a ilha. Acinzentando ainda mais a madrugada. A visão tornou-se fraca, mas nenhum guarda saiu de seu posto.
Alguns dias mais tarde, Conan e Holf foram trocados de turno, sob ordem de próprio Stiff. Agora vigiariam a muralha após o pôr-do-sol até pouco mais da meia-noite.
Os dias que se seguiram foram iguais. Com noites cinzentas, gélidas, e chuvosas. As tochas da muralha pouco iluminavam o campo ao leste. As luzes fracas de Stonehome sobrepunham-se na noite, onde mais nada se destacava, se não fossem as tremulações na muralha. Chacal preferia não mais que sentir os tremores em silêncio, já Conan limitou-se a cogitar sua causa.
Uma quinzena depois da conversa na muralha, os guardas foram convocados para uma assembleia secreta, no subsolo do castelo do Governador, no início do turno da noite.
- Alguns de vocês podem saber o que está acontecendo, e por que foram chamados aqui. – Daniel Steelsoul, Governador de Edron tomou a palavra. – Os murmúrios correm mais rápido que o sopro do vento, e eu não posso mais controlar a situação. – As velas do enorme castiçal da mesa central emitiam alongadas sombras dançantes por todo o saguão. Conan correu o olhar pelo aposento e reconheceu vários rostos da realeza de Edron.
- São os ciclopes. – Ele sussurrou à Holf, que estava por perto.
- Temos notícias de que Ciclópolis planeja um ataque à Edron e temos que arranjar tropas para deter seus homens. Mandei uma carta ao Rei ontem à noite. Os thaianos haverão de chegar a nossas terras daqui uma semana ou mais. Nós temos um milhar e meio de homens descansados e armados. Seis centenas de magos e uns tantos arqueiros. – O Governador disse, em receio. – Nossa situação não é nada boa. Os ciclopes estão em vantagem em número homens. Eles se reproduzem como coelhos naquela imundice.
- Não vamos esperar esses ciclopes em nossas muralhas, temos de atacá-los primeiro! – Um cavaleiro gritou, no fundo do saguão.
- Não conhecemos bem aqueles labirintos, aquilo é território deles! Deverão ter centenas de armadilhas! – Um mago de túnica roxa gritou, e logo depois uma discussão geral explodiu.
- Basta! – Daniel levantou-se da enorme cadeira acolchoada de veludo vermelho, e gritou. – Não venceremos essa batalha discutindo! – Todos se calaram e colocaram-se a ouvir o Governador. – Stiff Pedragon, como Governador da ilha de Edron, dou-lhe a tarefa de dividir as tropas e planejar as estratégias de batalha. – Stiff estava sentado a poucas cadeiras do Governador. Levantou-se e fez uma breve reverência.
- Às suas ordens, meu Senhor.
Vários títulos foram condecorados a outros nobres, como Comandante dos Feiticeiros, Médico Geral de Edron, Conselheiros Reais, Comandante da Guarda de Edron, dentre outras.
Uma semana mais tarde, os cavaleiros thaianos aportaram nas costas de Edron. Vinte navios com duzentos homens em cada.
Stiff decidiu esperar o ataque dos ciclopes, com a cidade totalmente guarnecida de soldados, arqueiros e feiticeiros. Os curandeiros estariam a postos quando as tropas se chocassem contra os gigantes. Em tese, os ciclopes deveriam chegar até os campos ao redor de Edron para serem eliminados pelas armadilhas e pelos arqueiros.
As lanças foram polidas, as espadas afiadas e as flechas aguçadas.
Torres foram levantadas para as catapultas e arqueiros, com várias caixas de brasa para flechas de fogo. Armadilhas foram construídas nas imediações de Edron; Trincheiras enormes circundavam a cidade, e centenas de baldes com piche foram jogados no campo, para que se incendiassem com as flechas de fogo.
Poucos dias depois, as tremulações cessaram de repente. Edron calou-se e esperou sob aquele céu de nuvens volumosas e cinzentas. Os cavaleiros puseram-se a fora da cidade, esperando qualquer movimentação. Duas centenas esperavam pelo ataque, imóveis no campo cheio de armadilhas. Cinco dezenas de arqueiros empunhando arcos de alta aptidão aguardavam o comando nas torres, dentro das muralhas da cidade.
Conan estava no mesmo batalhão que Holf, e mal podia esperar para decapitar alguns ciclopes.
- Vocês estão aqui por Edron, e por Edron lutarão! – Adder, o novo comandante gritava. – Pela lealdade e pela honra, matarão quantos ciclopes puderem! Pensem em suas esposas e filhos, pensem na vitória, homens! – Adder articulava e andava a volta dos soldados, em formação.
- Estamos aqui por Edron, e por Edron lutaremos! – Gritavam em uníssono.
Os relâmpagos cortavam o céu quando um tremor foi sentido. Logo, ouviu-se a trombeta de guerra ao norte. Holf apertou o pé contra a grama da campina e rangeu os dentes.
Gritos abafados nas florestas do norte acusavam: A guerra havia começado.
- Arqueiros, preparem-se! – Um grito da muralha ecoou.
Tum tum tum tum, era o som que se escutava. Os guerreiros retiraram suas espadas da bainha e preparam seus escudos. De súbito, os gigantes saíram da floresta fechada, correram através de um riacho, e marcharam ao sul, gritando e batendo seus martelos no chão.
Caíam uns por sobre os outros. Behemoths apareceram por de trás dos ciclopes, urrando como touros. Os arqueiros das torres atiraram suas flechas em direção aos ciclopes.
“Baik Brogs blood, asrak Raging Akkor!” Eles gritavam incessantemente.
Suas armaduras enferrujadas bloqueavam poucos ataques, porém as flechas mal penetravam na pele dos gigantes. Alguns iam caindo nas trincheiras, outros afundavam no piche e logo depois eram incendiados com as flechas de fogo dos arqueiros.
O céu enegrecido desabou em chuva quando o primeiro gigante desferiu um golpe de sua clava em um cavaleiro.
Eram extremamente fortes. O som da chuva e do metal rangendo era a melodia que regia aquela batalha.
Conan foi pego por dois ciclopes, com o dobro de seu tamanho. Ele feriu a um no joelho com sua espada, mas foi acertado por sua enorme maça no ombro. Ele caiu na grama, mas foi amparado por mais três soldados, que derrubaram os gigantes. Sentiu o sangue quente escorrer por seu braço. Sentia muita dor, deduziu que o tinham quebrado. O vermelho vivo saía pelas dobras do metal, e lavado pela chuva.
Holf, em meio à batalha, o viu por acaso olhando para o céu e correu até ele. Pulou por um corpo de um ciclope morto, e uma linha de sangue de um cavaleiro que acabara de cair morto à sua frente, o atingiu, entrando pelo elmo.
- Crunor é bondoso. – Conan lhe disse, olhando perdidamente para o alto. A chuva entrava pela viseira do elmo aberto. Logo que chegou, Holf o segurou pelas costas.
- Levante-se, Conan! – Disse-lhe, empurrando-o para cima. – Estamos no meio do campo, andemos, ou iremos morrer! Que houve ao teu braço fora atingido? – Ele disse, jogando o companheiro às costas, e correndo para longe dali.
- Sim... Acho que foi... Quebrado. – Conan disse pausadamente. – Mas Crunor ainda é bondoso... Chacal...
- Seu tolo, como pode Crunor ser bondoso? Olhe seu braço, olhe em volta, olhe para o céu. – Holf suspirava pelo peso do amigo. – Como pode Crunor ser bondoso? – Chacal quase caíra em uma trincheira.
- Não haverá sangue... Não haverá sangue em nossos campos hoje, Chacal... As lágrimas de Crunor caem com tristeza em nossa terra... – A voz de Conan ia desaparecendo aos poucos.
- Cale-se, poupe forças. Vou te levar para os curandeiros. – Uma flecha passara zunindo aos seus ouvidos. – Você não morrerá, Conan. Haverá de guardar a Muralha comigo por muito tempo, maldito. Aguente mais um pouco. – Conan não respondera.
Holf desviava dos corpos jogados no chão, e pulava as trincheiras até o portão de Edron. Reforços esperavam para auxiliar os que batalhavam no portão.
Ele já via as armaduras por de trás do portão de ferro. Chacal pediu para que o abrissem, mas aparentemente não o ouviram. Ele falou mais alto, gritou, porém não o escutavam. O som da chuva era mais alto.
Finalmente, olharam-no, mas com olhos de horror. Apontaram para Holf, falaram algo que ele não pôde escutar, e de repente, sentiu algo chocar-se à suas costas, com muita força. Fora lançado por um martelo de um ciclope ao portão de ferro. Bateu de frente a ele, as mãos de Conan desapareceram de seus ombros. Não sentiu nada.
Viu-se no chão. Estava ofegante. Seu rosto estava quente e molhado, e a chuva fria o flagelava. De repente, tudo se tornou negro, e sua consciência desaparecera.
***
A batalha daquele dia estendeu-se por horas, e nos dias seguintes, e nas semanas seguintes, tudo foi igual. Invasões seguidas, com perdas mínimas, mas os soldados que voltavam das batalhas vinham fatigados e cansados.
Os ciclopes não cessavam suas invasões há semanas, mas certa vez, tudo se acalmou. Não houve ciclopes, nem nenhum gigante, nem sangue. Os cavaleiros de Edron urraram de felicidade, haviam, certamente, ganhado a guerra contra os ciclopes.
Holf acordara confuso naquela manhã. Sentia fortes dores nas costelas, mas estava vivo, e deitado em uma cama. Olhou o aposento, viu druidas por todos os lados, correndo com poções, pomadas e unguentos de todos os tipos, e tratando dos homens feridos da guerra. Ele estava ali, sem saber o que havia acontecido. Puxou pela manga da túnica, um druida muito jovem, que passava por perto.
- O que houve por aqui, curandeiro? Edron ganhou a guerra? – O jovem olhou-o com suspeitas.
- Edron está salva. Não há mais ciclopes nessas terras. Está tudo bem, senhor... – Ele olhou um dos papéis que segurava. – Senhor Holf. Edron saiu vitoriosa nessa guerra contra os gigantes.
- E quanto à Conan, Conan Brinden? Ele está vivo?
- Lamento senhor, mas Conan Brinden está mor... – Neste momento, um estrondo ensurdecedor encheu os ouvidos de todos. Logo depois, os adornos nas paredes do aposento começaram a cair, e um forte tremor assolou Edron.
Um som de implosão de rocha fora ouvido, e uma voz rouca ecoou: “Pelo meu sangue, e pelo sangue derramado dos meus servos, que a Torrente Rubra caia sobre este mundo!”.
A votação ficará aberta até as 23:59 do dia 23.04.2012 (segunda-feira), podendo ser prorrogada por mais 2 dias em caso de empate!![]()
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