Capítulo 2 – Acontecimento Inesperado
Seis horas, “merda, sua tonta”, penso eu, tinha esquecido de ajustar o despertador para as cinco da manhã...
Levanto rápido, tenho meia hora para acordar Davi, arrumar sua roupa, preparar o café, me trocar para ir trabalhar e leva-lo à escola. Enquanto isso, meu marido Gustavo roncava assustadoramente alto, já que hoje ele entraria no trabalho mais tarde, e decido não acorda-lo, não queria atrapalhar...
Vou correndo arrumar minhas coisas, e na pressa derrubo a bolsa no chão, droga! Arrumo a bagunça e vejo um livro no meio... Ué... Que livro é esse? De dentro dele cai um bilhete...
Bilhete?
De repente me relembro de tudo de ontem à noite, no ônibus, mas não era hora nem momento para pensar nisso, já estava muito atrasada.
Como de costume, logo após deixar Davi na escola me encontro com Amanda no ponto de ônibus, e ficamos conversando até ele chegar, lotado, apinhado de gente, como toda manhã...
Ela desce dois pontos antes de mim. Ela trabalha como atendente de uma loja da Pernambucanas, onde ganha um mísero salário mínimo.
Porém ela nem precisaria desse emprego, já que seu marido é um bem sucedido engenheiro. Mas, eu entendo os motivos dela fazer isso. Perfeitamente... Até demais.
Chego em meu local de serviço minutos depois. O dia transcorre normalmente, enfadonho como sempre, em um banco mais enfadonho ainda, com sua aparência fria, com paredes, teto, chão, tudo em um tom cinza deprimente, como em qualquer outro lugar burocrático.
Até que, depois de passadas duas horas nesse ritmo entediante, vejo um homem, branco, com quase toda a face coberta por uma barba mal-feita, vestindo roupas simplórias, e que aparentava não ter mais de quarenta anos, discutindo vigorosamente com uma colega minha de trabalho, Chris. Resolvo ver o que estava acontecendo e caminho até eles. “Mais uma discussãozinha boba”, penso enquanto ando. Estando ao lado dos dois, que já tinham mais da metade das pessoas em volta os observando, pergunto, do jeito mais formal e falso possível:
- Desculpe, mas posso ajudá-lo em alguma coisa, senhor?
O homem, que parecia nervoso, e ao mesmo tempo preocupado, desvia seu olhar para mim, ignorando uma Chris que corava de vergonha em meio à situação embaraçosa em que se encontrava.
- Me desculpe, é que preciso falar com o gerente daqui,o senhor Rafael Santos de Almeida.
- Qual seria o assunto?
- Sou um amigo de infância. Preciso falar com ele urgentemente sobre um assunto pessoal...
- Sinto – lhe informar, mas Rafael pediu demissão faz dois dias, desde então eu peguei o emprego dele como gerente.
Quando dou esta notícia, seu rosto fica pálido, parecendo um fantasma, anêmico, estava quase chorando, mas consegue se segurar e fala, gaguejando:
- Ma... Ma... Mas a senhora sabe se tem como entrar em contato com ele?
-Desculpe... Senhor?
- João Carlos.
- Senhor João Carlos, infelizmente não sabemos como entrar em contato com ele, e mesmo se soubéssemos, não poderíamos lhe contar, compreenda...
- Entendo... – Interrompe, agora olhando para o chão - Bem, obrigado mesmo assim...
- De nada, tenha um bom dia!
O vejo sair do banco, cabisbaixo, com uma face tão lúgubre que dava até pena.Gostaria de ajudá-lo, mas não poderia, não ali...
Ali não.
- Chris, poderia ficar no meu lugar, é rápido, só uns cinco minutos.
- Ah, claro, tudo bem.
Saio do banco, vou à rua e olho para todos os lados, procurando aquele homem. Barracas de camelô, ônibus, carros, tudo atrapalhava minha visão e dificultava a procura por ele.
Por que eu iria fazer isso?
Quase desistindo, quase caindo em si, pensando que aquilo nada tinha a ver comigo, finalmente o acho, sentado em um banco num ponto de ônibus, olhando uma foto que imediatamente esconde no bolso direito da calça quando repara na minha aproximação.
- Senhor, desculpe, esqueci seu nome...
- João Carlos. O que houve, sabe de alguma coisa?
- Não, infelizmente – E retribui com uma cara de decepção – Mas se o senhor quiser, poderia passar o seu número de telefone para eu lhe ligar caso descubra algo.
- Sim, sim, mas, não tenho onde anotar...
- Tome, escreva aqui – E estendo um pedaço de papel e uma caneta a ele.
- Obrigado. Tome. Pode ligar a qualquer hora.
- Obrigada.Então... Qualquer coisa eu ligo para o senhor. Agora tenho que ir, tchau!
- Tchau, senhora...
- Vanessa.
- Senhora Vanessa, obrigado mais uma vez.
E pela primeira vez vejo se formar naquele rosto, que estava desde então com um semblante triste, um sorriso, um tímido sorriso, mas animador. E caminho de volta ao banco, enquanto perco de vista aquele sujeito chamado João Carlos que acabara de entrar em um ônibus com destino à Barra Funda.
Eu fiz o certo?
De volta ao banco...
- Ufa, desculpe pela demora, é que eu...
- Não, tudo bem.
- Aliás, Chris, você conhecia o rapaz que aquele homem estava procurando, o Rafael?
- Mais ou menos, nunca falei nada com ele além de um simples oi. Mas ele é um gato! Você tinha que ver os...
- Não precisa contar! Tudo bem, pode ir...
- Tá bom...
E o resto do expediente permanece “normal” com apenas os rotineiros serviços que tinha eu de fazer...
Sete horas. Pego o ônibus de volta para a casa, me encontro com Amanda alguns pontos depois, e lhe conto o ocorrido no serviço...
- Que estranho, do jeito que você falou, fiquei até com dó dele!
Não, não ficou.
- É, eu também, espero que ele encontre esse rapaz....
Passamos pela moradia de Amanda, me despeço dela e continuo sozinha em direção à minha casa. Snoopy dormindo, sem marcas de patas sujas na roupa hoje... Chego, sou indagada com a entediante pergunta de meu marido “Como foi o trabalho hoje?”, enquanto ele brincava com Davi na sala de estar com alguns brinquedos e assistindo televisão. E como de praxe, respondo, automaticamente:
- A mesma coisa de sempre...
...
Novamente, faço a janta, comemos em silêncio, tomo banho, vou para a cama. Em cima do travesseiro encontro o livro, e decido ler algum poema até cair no sono, algo que meu marido já havia feito há tempos. Pego o bilhete de novo, leio e releio várias vezes, e decido dormir de uma vez.
O coloco em cima da cabeceira da cama, e resolvo abrir a janela do quarto, estava muito calor, como de costume no verão paulista. Abro, um brisa suave se espalha por todo o cômodo, e faz o bilhete cair virado para baixo no chão do aposento. Agacho-me para pegá-lo, e vejo que havia algo a mais escrito nele, na parte de trás... Apenas mais algumas palavras:
“Preciso que venha para cá rapidamente, eles
Estão ficando cada vez mais impacientes e violentos.”
Seu amigo,
Rafael S. de Almeida
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