Dançando com a Fúria.
- Ótimo. Sim. – O relampejar das espadas era uma melodia aos ouvidos de Vihil Elaluel, Mestre de Armas de Shadowthorn. – Mais força em sua investida, Finath.
Daryn, um jovem elfo de cabelos dourados duelava com Finath no campo central. As espadas de aço thaiano arranhavam-se uma à outra em faíscas, alumiando o campo verde em crepúsculo. Daryn avançou em ataque e seu adversário estremeceu abaixo de suas armaduras. Rodeou-o e arrochou a espada contra o peitoral de Finath. Este, em defesa, jogou o corpo para trás, a fim de aliviar a pressão sob sua armadura.
A longa espada de Daryn encravou-se no lugar do impacto, e com um movimento brusco, Finath girou em volta si, levando Daryn junto à espada. Finath brandiu sua arma entorno de seu oponente. Pronto para dar sua última estocada, Daryn arrancou-lhe a espada do peito e a acertou seu ombro direito. Ele a arrastou e lhe fez um corte até o umbigo. Os ferros retorceram-se e a armadura de Finath abriu-se como um botão de flor.
- Basta! – Vihil rugiu – Os duelos de corpo-a-corpo estão acabados por hoje. Daryn é o vencedor dessa disputa. – Olhou o jovem vitorioso por um longo momento e murmurou. – Não se esqueça de seus compromissos amanhã. A embarcação até Rookgaard lhe espera em Ab’Dendriel na boca da noite. – Vihil fez um gesto para os que estavam presentes se afastarem.
- Mas, por que diabos tenho de ir à Rookgaard amanhã? – Daryn guardou sua espada ao cinto, e viu Finath se afastar maldizendo seu nome.
- Há de ajudar as castas que lá chegaram. Já se esqueceu disso também? – Vihil bateu no capacete de seu discípulo e gracejou. – Você tem que melhorar isso rapaz, já está mais do que na hora.
- Desculpe-me, Mestre. – Disse, retirando seu capacete. – Tenho de ir agora. A escuridão chegará em breve e ainda estou com esses equipamentos de prova.
- Faça como quiser. Até mais tarde, Daryn. – Disse Vihil, em tom sonolento.
O elfo despediu-se e seguiu até o edifício onde se encontravam os aprendizes que participaram daquelas disputas. Lá estavam boa parte do grupo retirando suas armaduras e seguindo para suas casas.
- Lutou bem, Daryn. – Algo lhe agarrou o braço. – Como uma gazela, pulando e saltitando pelo campo. – Uma chuva de gargalhadas ecoou. Os rostos que enchiam o aposento se tornaram bruscamente rosados. Daryn virou-se e deparou com Thun, um elfo com um grotesco senso de humor.
- Thun, agora não. – Daryn rebateu. – Agora não é hora para suas piadinhas toscas. – Daryn lhe disse em tom um tanto quanto alto, e fitou o rapaz. Thun enfuriou-se, bufou, e fechou o punho em uma cimitarra que estava por perto. Daryn percebeu sua ira e agarrou o punho de couro de sua espada. Uma mão puxou o grande elfo para trás, como uma sombra. Uma voz pôs-se a dizer:
- Aqui não é o devido lugar para duelos. – A mesma mão que o puxou para trás, agarrou-se à cimitarra das mãos de Thun. – Todos, especialmente os dois aqui, retirem seus equipamentos imediatamente e vão embora. – Daryn reconheceu sua voz. Era Kath Bariel, comandante dos arqueiros.
Thun se encolheu e tirou rapidamente suas armações. Não muito tempo depois, se foi sem olhar para trás. Daryn fez a mesma coisa um pouco mais lentamente, e quando saiu, deixara a sós, Kath e meia dúzia de outros rapazes.
Fora para casa a licenciosos passos largos. A noite caíra e a vila acomodava-se.
Finalmente poderei rever meus amigos, Daryn pensou.
E minha família também, concluiu.
Preparou uma sopa de vegetais e cenouras para lhe matar a fome da noite. Esvoaçava um cheiro quente e incrivelmente apetitoso. A impetuosa brisa que entrava pela janela o estava incomodando, assim, fechou-a e acendeu sua lareira, confortando-se em frente a ela. O ar quente e puro derramava-se sobre a sala.
Daryn pestanejou. Seus olhos estavam pesados, e viu-se tomado pela sonolência. Buscou um vaso d’água e o aqueceu no fogo. Derramou a água fervente em uma tina de carvalho, e ali se banhou. Secou-se. Logo, pôs-se dentro de uma túnica branca de dormir e se aninhou em sua cama.
De súbito, Daryn estava em Rookgaard, a postos na base de sua casta. Saiu de sua guarda e vagueou por perto. Não havia nada, a não ser ele. Andou pelos campos e deparou-se com uma rocha enorme, e de fronte, uma abertura negra como breu. Olhou-a por um momento. Daryn viu dois pontos vermelhos na escuridão como se fossem rubis vindos ao seu encontro. Ele recuou, estremecendo. De lá, saíra dois chifres, depois uma cabeça de touro e o corpo, mestiço de homem e pés em cascos. A coisa mugiu a ele, sonoramente. Daryn não retirou os olhos da criatura nem por um momento, e rapidamente, apanhou o ar onde deveria estar uma espada em seu cinto.
O minotauro o derrubou, e Daryn caiu de costas à grama. O monstro o olhava no fundo nos olhos, como se pudesse arrancar-lhe a alma.
Ele vai me matar, pensou,
ele vai me matar!
- Ele vai me matar! – Daryn gritou por entre os lençóis da cama. Arregalou os olhos amendoados e varreu o aposento. Dedos de luz atravessavam as cortinas, já era de manhã. Sua testa estava mergulhada em suor. – Deuses... Isso foi um sonho.
Passara-lhe na mente o momento onde não encontrou sua espada. E se isso pudesse realmente acontecer? Um jovem elfo, mal armado, com uma criatura sedenta por seu sangue. Deveria partir imediatamente em busca de uma solução para isso; Ab’Dendriel.
Daryn atarracou-se em uma maleta e a recheou com suas roupas e utensílios.
Preciso de dinheiro também, ele pensou. Pegou seu porta-níqueis e o prendeu no cinto, depois, armou-se e partiu. Andou a passos largos até o portão norte, havia-o atravessado alguns metros e um guarda roubou-lhe a atenção.
- Daryn, onde pensa que vai? – Ele apoiou o arco no chão de madeira da ponte. – Penso que ao menos avisou seu mestre Vihil sobre isso. – Ele suspirou. – Ou estou errado?
- Isto não é de seu interesse, guarda. – Daryn pôs ao chão a maleta, ainda de costas. – Se for de importância, mande uma carta à Ab’Dendriel endereçada à casa de meus pais, e eu a apanharei antes de viajar. – Virou seu rosto e o retribuiu com um sorriso. – Não se preocupe. Vihil sabe disso.
- Então que seja. Até mais breve, Daryn. – O jovem lhe correspondeu com um aceno.
Ele serpenteou o pântano em direção à Venore, e foi de encontro ao seu grande porto, cheio de mercantes e de navios vindo e partindo. Alguns instantes depois já embarcara num enorme navio, com destino à Ab’Dendriel.
A viagem foi entediante a abafada. Meia centena de passageiros acotovelava-se no trajeto.
Finalmente na terra natal, Daryn foi até a torre onde um conhecido ciclope trabalhava como ferreiro. Subiu-a e o viu polindo a lâmina de uma espada realmente diferente, sentado em um banco de madeira. Era branca como osso, incrustada de espinhos, e sua lâmina, feita de um material puro e transparente.
- Dê o preço nessa espada e eu a comprarei – Daryn lhe disse convicto. – Essa é a mais forte que pode me oferecer, não é? – O gigante ergueu os olhos da espada. Mesmo sentado, ele tinha o tamanho de Daryn em pé, e a espada era uma pequena adaga em suas mãos.
- Essa espada não está à venda. Muito atrevido de sua parte, garoto elfo. Tem de ser mais educado com suas palavras. – Voltou a polir a lâmina da espada.
- Por... Por favor... Preciso de uma boa espada, para partir à Rookgaard esta noite. Estou dando... – o ciclope ergueu a espada do ar, fitou-a contra a luz do sol, e depois, olhou de cima a baixo o jovem Daryn.
- Escolta às castas recém-chegadas lá? – Ele riu – Então vejamos. Esta espada foi um tanto difícil forjá-la. Ah, foi sim. Mas, o senhor seu comprador pode esperar mais alguns dias para tê-la em mãos. Pegue jovem, treine. – Jogou a espada rodopiando à Daryn, que a pegou com dificuldade.
Ele sentiu como se a espada fosse uma extensão do braço. Brandiu-a, desferiu golpes no ar, defendeu um ataque imaginário e a olhou mais de perto.
- Ótima, não é? – o gigante levantou-se. – Assim como ela, precisará de um escudo mais resistente, e que tal uma nova armadura de aço negro? - Ele agarrou o jovem e o levou onde estavam estampados os escudos.
O gigante lhe ofereceu os mais belos e maciços escudos. Assim como as armaduras. Eu só precisava de uma espada, Daryn pensava, mas as armaduras que nos ofereceriam lá não seriam das melhores, terminou.
Entregou-lhe o saco cheio de moedas de platina, e um par de moedas de cristal azul.
- Cobrarei somente a armadura e o escudo. Contanto que traga histórias de vitória para cá novamente, não farei conta de lhe pedir pela espada. – o gigante disse em tom honroso.
- Obrigado, mais uma vez. Será de grande valia todos esses equipamentos. – Lhe disse, e quando descia a torre, manejava a espada como se estive diante do minotauro do sonho.
Fora para a casa dos pais, que lhe receberam e o acomodaram em sua casa, orgulhosos do filho, que saíra de casa como garoto, e voltara como o homem que protegeria a base dos elfos em Rookgaard.
Passara o resto da manhã e a tarde conversando com seus pais, comendo bolinhos e bebericando vinho fresco. Daryn deleitava-se mais uma vez, jogando conversa fora, que há muito não fazia.
O fim da tarde chegara tão rápido, que Daryn não viu o tempo passar. Seus pais o acompanharam até o porto da cidade, e o esperaram até que o barco partisse. Daryn subiu ao barco, junto da centena de elfos que partiam. Seus pais acenaram incansavelmente até a embarcação perder-se no horizonte rosa-escuro do pôr-do-sol.
Dentro da embarcação, Daryn cruzou o olhar com um elfo alto, guardado por um chapéu negro. Ele não desviou os olhos por nenhum momento. Daryn achou o achou estranhamente familiar. O homem avançou e Daryn disfarçou.
- Olá Daryn. É muito bom vê-lo aqui. – O elfo veio ao encontro do garoto. – Honra seus pais por isso. – Ele deu um risinho, e retirou o chapéu. Era Kath Bariel.
- Olá, senhor. Desculpe-me, porém não me lembro de estar na lista dos que viriam à Rookgaard. – Ele torceu os lábios.
- As coisas mudam rapaz. Deve estar preparado a elas. E sim, eu não estava naquela lista. Tomei essa decisão por mim mesmo. – Ele hesitou por um momento. Seus olhos perderam-se na vastidão do oceano. – Guardará qual casta?
- Os Teshial. Hei de encontrar sua colônia na costa oeste, junto a uma montanha. – Daryn lhe disse, apoiado a uma haste de madeira que ostentava o estandarte dos Kuridai. Kath aquietou-se por um bom tempo.
- A pior casta a ser protegida em Rookgaard, suponho. – Ele finalmente disse, em tom solene. – Sua base fica acima daquela maldita montanha. – Ele enterrou o olhar caído em Daryn. – Seja cauteloso ao entrar ou sair de lá. Muitos perigos habitam aquela maldita rocha cinzenta. – Seus olhos se perderam novamente no oceano.
Perigos na montanha? Daryn não se atreveu a dizer. Estaria mostrado medo, e isso era a última coisa que queria que soubessem de si. Finalmente, lembrou-se do sonho, mas abanou a cabeça e dissipou a ilusão.
O barco foi adentrando o oceano tibiano, assim como ia adentrando à noite. O navegador acompanhou a costa norte do continente, passando assim por Northport. Eram aproximadamente dez horas da noite quando avistaram Folda e Senja, duas massas de cor cinza escuro no negro da noite, em pleno Oceano Nórdico. Daryn descansava no convés, em uma roda, ouvindo a melodia de um habilidoso músico com sua harpa no centro. Já quando o navio passou pela costa das Terras Amaldiçoadas, Daryn já ressonava alto em seus cobertores.
Quando finalmente o barco havia chegado à costa sul da ilha, ouviu-se um solavanco sonoro, e um baque. Daryn acordou e logo entendeu que haviam chegado.
Apressou-se a sair do barco e pisar nas terras recém-descobertas pelos elfos. O lugar recendia à floresta, natureza. Os outros saíram aos montes da embarcação logo depois de Daryn. Foram-lhe instruídos a formarem grupos.
- Deraisim, por aqui! – Deram-se berros. – Kuridai, aqui!
Daryn se dirigiu até o homem que gritava, e seguiu para onde ele apontava os defensores dos Teshial. Eram um punhado de elfos que iam se estabelecer em Rookgaard na base aonde Daryn ia também. Uma dúzia, se não menos.
Com todos os grupos devidamente formados, eles se dirigiram até a parte oeste da ilha, se esgueirando por entre os grandes salgueiros da costa. As bases dos elfos ficavam quase à beira-mar, numa linha contínua da costa noroeste até o oeste. Os Teshial ficavam ao profundo oeste, muito além das outras bases, e foi pra lá que o punhado de guerreiros elfos se dirigiu.
Trepadeiras despencavam por sobre a enorme rocha, e uma escada entalhada na pedra esperava os rapazes vindos. Uma clareira foi formada à volta da base, e uma trilha de cascalhos seguia da floresta até a escada. Acima da grande rocha cinzenta, uma rústica base de bambu entrelaçado impunha-se.
- Esta é vossa casa agora. Familiarizem-se, explorem o terreno. Vocês estão cientes do que lhes cerca aqui. – Um precursor que conduzia o grupo disse, depois de um longo suspiro. – Quando o sol estiver no topo do céu, subam até o Salão Comum, na base. – Ele apontou para o alto da montanha. – Faremos uma reunião a esse horário. – Daryn, agarrou-se ao punho de sua espada. Não havia aviso algum sobre a montanha naquelas palavras, e não lhe orientaram sobre tal, o que era desconfortante.
O grupo se dissipou até só sobrar Daryn na clareira. Ele desembainhou sua lustrosa espada e pôs-se a explorar. Rodeou a montanha por alguns minutos, e a lembrança do sonho lhe voltou à cabeça. Essa montanha é grande demais, pensava, [I]mas, aquilo foi um simples sonho[I].
Passava pela parte em que as trepadeiras que se agarravam pela rocha caíam sobre as árvores, um ambiente sombrio, quando avistou uma abrupta abertura na pedra. Estalactites esparramavam-se do teto quase ao chão dali.
- Impossível... – Daryn sussurrou quase inauditamente. Suas palavras foram levadas pela brisa para longe. Ele olhou para dentro da caverna, depois para o céu, tentando sem sucesso avistar o sol.
O jovem cruzou velozmente a floresta, subiu os degraus de pedra e se atirou para o falatório da reunião, no alto da montanha.
***
- O próximo turno é seu, Daryn. Vasculhará a parte nordeste da montanha. – Um guarda dissera à Daryn quando este se vestia adequadamente. – Certifique-se de que tudo está correndo nos conformes.
- Entendido. Asha Thrazi.
Daryn desceu até a clareira e seguiu a trilha que rodeava a montanha, recentemente construída, no terceiro dia depois de sua chegada. Até já perdera seu medo daquela caverna, que ficava justamente no lado nordeste, perto do seu local de vistoria.
Ele havia acabado de chegar a seu posto, quando ouviu um ruído, diferente do canto dos pássaros ou da água do mar batendo nos rochedos. Um som estridente. Armou seu escudo e manejou a espada. De súbito, o som passou a ecoar. Daryn soube que era alguma coisa na caverna. A caverna.
Na entrada do buraco, gritou:
- Quem está aí? Apareça.
Não precisou de respostas. Uma enorme figura saiu da escuridão e agarrou-lhe o pescoço. Daryn fitou a figura, quase asfixiado. Ela o lançou na terra úmida de orvalho da manhã, e ouviu-se um gritante ruído. Daryn caíra sobre o braço que segurava a espada, e sua armadura negra de aço rangeu sob a lâmina da arma.
Com a luz do sol em seu corpo, Daryn percebeu que aquilo que lhe agarrara o pescoço era um minotauro, armado de um machado e trajando uma armadura azul.
- S... So... Socorro! – Daryn esforçou-se a dizer.
O maldito tinha olhos penetrantes, vermelhos como fogo, vermelhos como sangue. Ele chutou o escudo de Daryn para longe, e brandiu o machado, acertando o elfo na nuca. Kaplar, ele balbuciava em fervor. Daryn sentiu o sangue vivo escore-lhe pelos cabelos. E novamente, o minotauro acertou uma machadada em seu pescoço. Pra quê serviu-me você, maldita? Daryn pensou, olhando para sua espada enquanto engasgava com o sangue.
O minotauro pisou com seus grandes cascos no corpo que jazia sem vida no chão enquanto pegava a reluzente espada. Olhou-a por um momento e desapareceu com ela na floresta.
***
- É isso que contam sobre Rookgaard? Maldito seja. Um minotauro? – Raiou Rei Tibianus.
- Sim, Vossa Majestade. Um minotauro causou estas várias catástrofes em Rookgaard, como conta a carta, e continua causando até que Vossa Majestade dê-me uma ordem para com esse assunto.
- Claro. Um minotauro? – Ele repetiu. – Por favor. Tenho assuntos mais importantes.
- Mas, Vossa Majestade, ele já destruiu cinco dos postos élficos na costa oeste, se não fizermos alguma coisa imediatamente... – Disse Chester Kahs. – Rumores dizem que os pássaros fogem e os animais se escondem quando a criatura brande a espada.
- Os postos dos elfos? – Ele olhou desolado à Chester. – Temos de fazer alguma coisa rápida, Chester. Junte quantos homens forem precisos, ou melhor, chame os magos Arkulius, Gundralph e Zoltan de Edron, e mande-os para lá. Eles devem saber o que fazer.
- Ao seu comando, Vossa Majestade.
Imediatamente, Chester escreveu de próprio punho três cartas que foram enviadas até Edron. Depois, ele recrutou homens para a batalha contra o minotauro, instruiu-lhes incansavelmente até captarem o plano.
No dia seguinte embarcaram em viagem até Rookgaard, e chegaram ao final da manhã. Os três feiticeiros esperavam meio desentendidos, na costa da vila. Os tripulantes desceram, eram um cento ou mais.
- Olá, senhores. Sairemos à caça da criatura hoje. – Disse Chester aos três magos, que o fitaram de olhos esbugalhados.
- Estamos a par da situação. – Zoltan disse de imediato. – Preparamos um feitiço específico para o monstro. Partiremos imediatamente?
- Se desejarem, senhores. Amber nos informou que ele se encontra fazendo ronda perto de uma montanha, no lado oeste do rio principal.
- Então, por favor, andemos logo. – Arkulius manifestou-se.
Os defensores foram rumo ao norte, e os três feiticeiros se mantiveram atrás. Atravessaram o rio por uma ponte, e chegaram àquela montanha que lhe Amber havia informado.
- Mas onde diabos aquele minotauro foi enfiar-se? – Disse Gundralph ao ver que nada havia por perto.
- Ele pôde se retirar para a floreste quando nos viu... – Chester disse quando foi abruptamente interrompido por um som muito alto. – O que se passa aí à frente? – Ele gritou.
Uma movimentação dos soldados foi sentida. Alguns gritavam de horror, outros se escondiam nas imediações da floresta.
Kaplar, Kaplar, Kaplar! Era o som que se exaltava.
- Olhe, o minotauro está ali! – Zoltan apontou para um canto, onde uma figura negra segurava uma espada branquíssima e brilhosa, e desviava dos golpes dos soldados com leveza. – Rápido, evoquem os poderes das runas. Arkulius use o feitiço especial, Gundralph, atire a runa da morte. Eu evocarei o poder da runa da estrela. Isso deverá ser o suficiente.
Mal Zoltan terminava suas palavras, o minotauro havia aberto caminho até perto deles. Quando brandia a espada, um som aterrorizante era a melodia daquela dança da morte.
- Utana Vid – Disseram os feiticeiros em uníssono, enquanto se tornavam invisíveis.
Chester apareceu e duelou com o minotauro por alguns minutos.
- Zoltan, Gundralph, Arkulius, rápido! – Chester proferia.
- Utori Kor. – Arkulius murmurou por perto. No mesmo instante, Gundralph acertou o minotauro no peito com o poder evocado de sua runa, e Zoltan atirou a força de sua runa contra o inimigo de costas.
O minotauro começara a sangrar pela boca e não mexera nem um músculo. Chester olhou à sua volta, e vira menos da metade de seus homens gemendo nos campos cheios de sangue.
- Exana Ina. – Gundralph resmungou, e seus companheiros apareceram novamente.
- Obrigado, senhores. Agora temos o maldito em mãos. Que faremos? – Chester disse, lamentando a perda de seus homens.
- Uma punição. – Houve uma pausa. – Tenho uma ideia, em que ele se arrependerá pelo resto de seus dias. – Arkulius disse.
- Explique seu plano, Arkulius. – Zoltan disse, voltando seus olhos para o minotauro paralisado. – Não fale nenhuma bobagem em que ele possa escapar.
O mago explicou o que havia em mente. Seus companheiros concordaram e partiram à execução. Chester ficou pelo campo guardando o minotauro, para que não voltasse ao normal. Arkulius pegara a espada e levara consigo, e seus dois amigos feiticeiros foram com ele.
Dirigiram-se até a costa, em silêncio. Arkulius olhou o oceano sem fim, e jogou a espada à água, que flamejava em vermelho de sangue. Ela brilhou uma última vez e caiu no mar, deixando as águas vermelhas.
Sussurrou algo para Gundralph, e este, com outras palavras ainda mais baixas, elevou a terra submersa, onde a espada havia caído, deixando-a exposta à superfície.
Os três fitaram a espada longamente. Zoltan balbuciou um feitiço que lhe trouxe à mão um pedaço de uma madeira clara e polida. Com a ajuda de Arkulius, fincaram com uma estaca a plaqueta na terra molhada, e lhe foram talhadas às palavras “Apenas os humildes podem tocar a Espada da Fúria”.
- Exori Flam. – Gundralph sussurrou. As terras à volta da espada começaram a pegar fogo. Novamente o mago suspirou mais algum feitiço incompreensível, e explicou que havia deixado impregnado aquele fogo eternamente na terra.
Os três voltaram até o campo, acenaram para Chester, e chamaram alguns soldados para carregar o enorme minotauro. Subiram a montanha que havia por perto, e ali colocaram o minotauro paralisado, bem no topo, olhando diretamente para a espada. Gundralph fez uma fogueira ao lado, para que a criatura não morresse de frio nas noites. Zoltan pediu aos presentes para se afastarem, e lançou ao redor do minotauro uma barreira mágica, a qual lhe tomou todo seu poder e o deixou enfraquecido.
- Agora é seu dever guardar pelo resto de sua vida, a espada que lhe pertenceu. Seu nome será Fúria, a Espada da Fúria. – Praguejou Arkalius. – Esse dia será contado até o fim dos tempos. E a Espada da Fúria será lembrada pela eternidade.